domingo, 3 de abril de 2022

 “A VOLTA

AO MUNDO

EM 80 DIAS”

ou

(ENCOLHERAM

O TEMPO

E EXPANDIRAM

A NOSSA ALEGRIA.)


 

 

        Insisto em dizer que, infelizmente, a grande maioria do que vejo em cartaz, do nicho TEATRO INFANTO JUVENIL, é de qualidade duvidosa, para usar um eufemismo, e algumas montagens, péssimas, quase me levam às lágrimas, de raiva e por ter perdido meu tempo em ir ao Teatro, entretanto, nos últimos tempos, na proporção, mais ou menos de três ou quatro, para dez, os espetáculos desse gênero têm variado de BONS a OBRAS-PRIMAS, como é o caso de “A VOLTA AO MUNDO EM 80 DIAS (OBRA-PRIMA), a que assisti, no último sábado, dia 02 de abril de 2022, no Teatro II, do CCBB – Rio de Janeiro. E, se é bom, merece uma crítica.



        O espetáculo, concebido e apresentado pela "CIA. SOLAS DE VENTO", de São Paulo, faz parte de uma trilogia, a ser desenvolvida e completada nos meses de maio (“Viagem ao Centro da Terra”) e junho ("20.000 Léguas Submarinas"), por meio da qual o CCBB – Rio de Janeiro presta uma homenagem à obra de um grande escritor, JÚLIO VERNE (1828 – 1905). São três montagens teatrais que convidam o público infantojuvenil e os adultos a embarcarem, juntos, no universo fantástico do consagrado escritor e, também juntos, imergirem em uma cenografia que mistura vertentes das artes cênicas e da tecnologia. Essas três montagens teatrais provocam o imaginário, com livre adaptação do grupo. Através das obras literárias encenadas pela "CIA. SOLAS DO VENTO", os espectadores são convidados a viagens cheias de ludicidade, com momentos imagéticos, delicados e divertidos, pelo ar, pelo mar e nas profundezas do mundo subterrâneo.”. (Extraído do “release”, enviado por NEY MOTTA (Assessoria de Imprensa).


 



SINOPSE:

A peça conta a extraordinária aventura de MR. FOG (RICARDO RODRIGUES), um lorde apaixonado por geografia e PASSEPARTOUT (BRUNO RUDOLF), seu fiel criado francês.

Tudo começa quando MR. FOG descobre que, segundo seus cálculos, eles seriam capazes de dar uma volta, completa, pelo mundo, em 80 dias

Assim, é dada a partida para uma grande viagem, repleta de peripécias.

Mas eles não contam com a presença do misterioso MR. FIX (RICARDO RODRIGUES), o vilão da viagem, que surge, de forma inusitada, para atrapalhar a dupla.

Atravessando a Europa, o Egito, a Índia, a China, o Japão e os Estados Unidos, os dois aventureiros correm contra o tempo e contra as armadilhas provocadas por MR. FIX.

 

 


        Acredito que os adultos que não leram JÚLIO VERNE tiveram uma infância incompleta, da mesma forma como gostaria de que todos os pais de hoje incentivassem seus filhos a ler a obra desse magnífico escritor francês, considerado, por muitos críticos literários – e, aqui, eu me incluo, mesmo sem o ser -, como o inventor da ficção científica, já que, em suas obras futuristas e cheias de fantasia, antecipou a invenção de várias tecnologias, como o submarino, a televisão, as naves espaciais e até o fax. Além disso, durante muito tempo, ele foi considerado um dos escritores mais influentes e traduzidos do mundo todo. “Forçando, talvez, um pouco a barra”, poderíamos dizer que VERNE foi o Leonardo da Vinci do século XIX e iniciozinho do século XX, já que morreu em 1905. A diferença entre os dois é que ele apenas imaginava e escrevia, enquanto este criava, de verdade, seus maravilhosos e engenhosos inventos. Sua obra é vastíssima, entretanto a trilogia que o CCBB do Rio de Janeiro se propôs a encenar engloba seus três livros mais conhecidos e admirados. Muitas vezes, adaptado para o TEATRO, também teve muitas de suas obras levadas ao cinema.



       Não conhecendo, até então, infelizmente, o trabalho da "CIA. SOLAS DE VENTO", fui ao CCBB “meio no escuro”, confesso, porém com muita boa expectativa, que foi superada, em muito, o que sempre me deixa muito feliz. O espetáculo é uma OBRA-PRIMA, em função de uma excelente adaptação, assim como uma super inventiva e correta direção, sem falar na dupla de magníficos atores / palhaços e em todos os outros elementos de criação, dos quais depende uma boa montagem teatral.



       “Viajamos”, também, na agradável companhia de dois palhaços, sem a tradicional maquiagem, porém com a alma, o espírito e a técnica dos bons “clowns”. Extraído do “releasae”, enviado por NEY MOTTA (Assessoria de Imprensa): “Em ‘A VOLTA AO MUNDO EM 80 DIAS’, o enredo é composto pela alternância de cenas cômicas e momentos imagéticos. Como num jogo de Tangram (Tangram é um quebra-cabeças geométrico, chinês, formado por 7 peças, chamadas “tans”: são 2 triângulos grandes, 2 pequenos, 1 médio, 1 quadrado e 1 paralelogramo. Utilizando todas essas peças, sem sobrepô-las, podemos formar várias figuras. Segundo a “Enciclopédia do Tangram”, é possível montar mais de 5000 figuras diferentes. – Como eu não sabia o que era Tangram, fiz a minha pesquisa, na Wikipédia.), os dois atores manipulam peças de ferro, rodas e sucatas, para construir os diversos lugares e transportes usados na viagem. A partir dessas peças, aparecem barcos, trens, montanhas, carroça e até um elefante. A encenação conta também com o uso de 3 câmeras de vídeo, manipuladas ao vivo, para captar e projetar, no fundo do palco, formas criadas com as sucatas, personagens e ilustrações dos lugares visitados. Uma das câmeras, pendurada no teto, permite revelar a movimentação dos atores deitados no chão para criar imagens inusitadas e trazer uma dimensão fantástica aos episódios da história.”.



      Ninguém que me lê pode imaginar o que seja tudo isso num palco de TEATRO. Só mesmo “vendo com seus próprios olhos, que a Terra há de comer”, pleonasmo, ainda que literário (quando se pretende, propositalmente, enfatizar alguma coisa), e não vicioso ou grosseiro (resultante da “ignorância dos significados dos vocábulos”, tais como encarar de frente, hemorragia de sangue, multidão de pessoas...), do tempo da minha avó, ou mais para trás, ainda.



       Voltando ao parágrafo que antecede o anterior, só posso dizer que fiquei encantado com o que vi: com tanta criatividade, inteligência e bom gosto, numa direção, que utiliza poucos elementos cenográficos e a tecnologia, simples esta, até certo ponto, para criar cenas que, dificilmente, sairão da memória de quem assiste ao espetáculo. É tudo muito lúdico, bastante simples, porém criativo e de um bom gosto indescritíveis. E o resultado disso tudo é um espetáculo que vale a pena ser visto e revisto. Estou, até, pensando nisso.



       “A VOLTA AO MUNDO EM 80 DIAS”, existe desde 2011. Foi o primeiro espetáculo infantojuvenil da "CIA. SOLAS DE VENTO", já alcançando o sucesso, de crítica e público, tendo-lhe rendido premiações: Prêmio APCA 2011, de Melhor Ator (BRUNO RUDOLF) e Melhor Direção (CARLA CANDIOTTO); e no Prêmio FEMSA 2011 de Teatro Infantil, na categoria de Melhor Ator, além das indicações de Melhor Produção e Melhor Cenografia.

        ACHA QUE DÁ PARA PERDER TEMPO E FICAR ESPERANDO 80 dias? VÁ, LOGO, CONFERIR O QUE ESTOU DIZENDO!!!



      Para mim, foi uma gratíssima surpresa ter conhecido o trabalho da "CIA. SOLAS DE VENTO" e, certamente, não perderei as outras duas peças da trilogia. Saibamos um pouco sobre a COMPANHIA, para que não percamos nada do que eles tenham a nos oferecer, quando voltarem, em outras visitas ao Rio. Eu, quando for a São Paulo, não deixarei de assistir a nada do que eles façam, caso estejam em cartaz: “A CIA. SOLAS DE VENTO nasceu em 2007, na cidade de São Paulo, da parceria entre o ator e bailarino francês BRUNO RUDOLF, mestre do TEATRO físico, da manipulação de boneco e de técnicas circenses, e o brasileiro RICARDO RODRIGUES, artista circense, especialista em técnicas aéreas e da palhaçaria. Desde sua criação, a CIA. utiliza, em sua dramaturgia, a mescla de elementos de pantomima ou teatro gestual, sem o uso de palavras, das técnicas circenses e da dança contemporânea, enquanto as trilhas sonoras originais pontuam a movimentação em cena. Somam-se à identidade do grupo, o emprego de projeção, ao vivo, de vídeos e a manipulação de objetos. A simbiose desses elementos dá suporte para linguagem e trânsito entre gêneros e cria espaços e situações impactantes.”. Tudo isso significa, simplesmente, que eles têm o seu excelente diferencial, que eles têm uma digital, única, que serve para lhes abrir portas e mantê-las abertas. Tenho a certeza de que os que assistiram, ou ainda vão assistir a este espetáculo, para o qual lhes foi aberta uma porta, voltarão ao CCBB, e vão encontrar essa mesma porta aberta, para as duas próximas viagens, de certo tão excelentes quanto esta primeira.



      É, deveras, interessante, o processo de criação do espetáculo, que utiliza, como cenário, criado e construído pela própria CIA., estruturas e peças de metal, além de material de sucata e um ou outro elemento de muito baixo custo. Tudo isso, junto e misturado, leva o espectador a ver ou imaginar “de um tudo”, como já foi dito no parágrafo pós-SINOPSE, o que torna desnecessário a sua repetição. Mérito, também, nesta área, para a direção de arte, assinada por LU BUENO.



       Dialogando, “no mesmo diapasão”, com a cenografia há uma iluminação muito correta, associada a projeções, ao vivo, captadas por câmeras, como também já foi mencionado, ou vindas de um retroprojetor, objeto já meio em desuso, porém muito bem aproveitado na montagem. Não havia, na ficha técnica, um único nome, responsável pelo item iluminação, o que me levou a crer que se tratava de uma “criação coletiva”, e excelente, entre elenco e direção, entretanto, posteriormente à publicação da crítica, chegou-me a informação de que o trabalho de criação de um desenho de luz fora feito pelo grande iluminador WAGNER FREIRE. Várias vezes, arregalei os olhos, de admiração, diante dos efeitos ilusórios criados, como, por exemplo, um homem sustentando outro, equilibrando-o, com um só braço. Não tomem isto, por favor, como um "spoiler", porque são tantas as agradabilíssimas surpresas desse gênero contidas no espetáculo, que um só não é nada.



       O figurino, de OLINTHO MALAQUIAS, não segue a tradição das vestes dos palhaços, até porque não havia a menor necessidade disso, e são de muito bom gosto e funcionalidade, traçando bem a diferença de comportamento, de personalidades, entre os dois “actantes”.

Aproveitando um “gancho”, passo a fazer, agora, algumas considerações acerca dos nomes dos personagens, os quais, de certa forma – por favor, eu não estou estabelecendo uma comparação direta -, nos lembram o meu amado Dom Quixote e seu fiel escudeiro Sancho Pança. Aquele estaria para o MR. FOG (Em inglês, “fog” significa “nevoeiro denso”), um sonhador, um visionário, com a mente meio turva, não conseguindo perceber as dificuldades de concretizar o seu projeto de uma volta ao redor do planeta (QUE É REDONDO!!!) em, apenas, 80 dias. Diria que seus pensamentos e desejos eram meio “quixotescos”. Numa consulta ao “Dicionário Caldas Aulete”, podemos encontrar, no meio de outros significados para PASSEPARTOUT, Chave que serve para abrir quase todas as fechaduras: CHAVE MESTRA". Ou seja, tal como o Sancho, do fantástico livro de Miguel de Cervantes, o serviçal de MR. FOG era aquele que tentava lhe mostrar as dificuldades e os perigos que poderiam encontrar pela frente, ao mesmo tempo que sempre procurava “trazer o patrão para o chão”, fazê-lo “pisar em solo firme” e deixar de “voar”. (Pode ser que o meu “voo”, nessas considerações, tenha sido muito mais alto do que o de um dos protagonistas da peça.)



Cabe, aqui, um espaço para a ótima trilha sonora, a cargo de MARCELO LUJAN (EXENTRICMUSIC).

Tudo isso não teria nenhum valor, não funcionaria, se não pisassem as tábuas dois grandes artistas, BRUNO RUDOLF e RICARDO RODRIGUES, os quais, no seu tempo e contando, cada um, com seu talento profissional, dão vida aos dois personagens de forma irretocável e conseguem manter, durante os 70 minutos de duração da peça, uma interatividade com o público. Poucas vezes, assisti a uma derrubada da quarta parede efetuada de forma tão fácil e bem aceita pelo público, Crianças e adultos se divertem à farta com os dois, e os menores participam, afetiva e efetivamente, do espetáculo, e isso é um dos sinais, se não for o principal e o mais importante, de que a peça é boa, de que o objetivo de quem a faz foi atingido.  

 


 


FICHA TÉCNICA:

Criação: Carla Candiotto e Cia. Solas de Vento

Texto e Direção: Carla Candiotto

 

Elenco: Bruno Rudolf e Ricardo Rodrigues

Direção de Arte: Lu Bueno
Figurino: Olintho Malaquias

Adereços: Michele Rolandi
Ferragens Cenográficas: Cia. Solas de Vento

Ilustrações: Iara Jamra
Trilha Sonora: Exentricmusic (Marcelo Lujan)

Iluminação: Wagner Freire

Operação de Luz: Marcel Alani Gilber

Operação de Som: Luana Alves

Operação de Vídeo: Bobby Baq

Assessoria de imprensa: Ney Motta

Fotos de Divulgação: Mariana Chama

 




 


SERVIÇO: 

Temporada: de 02 abril a 01 de maio de 2022

Local: Centro Cultural Banco do Brasil – Rio de Janeiro - Teatro II

Endereço: Rua Primeiro de Março, nº 66 – Centro - Rio de Janeiro

Informações pelo telefone (21) 3808-2020

Dias e Horários: sábados e domingos, às 16h

Valores dos Ingressos: R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia entrada)

Indicação Etária: para maiores de 5 anos

Duração: 70 minutos

 

OBSERVAÇÃO: Os ingressos poderão ser adquiridos na bilheteria do CCBB ou, antecipadamente, pelo site eventim.com.br

 

Gênero: Teatro Infantojuvenil

 

 



        Mais nada a acrescentar, a não ser a recomendação de que assistam à peça, que é para a família inteira, uma diversão sadia e barata (MAIS BARATO QUE CINEMA.), o quanto antes possível. O brasileiro, em sua grande maioria, tem a mania de deixar tudo para a última hora. Não seja um “brasileiro”, neste momento.

 

 



FOTOS: MARIANA CHAMA

 

 

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