“O
DRAGÃO”
ou
(É
OBRA-PRIMA
QUE
SE DIZ, NÃO É?)
ou
(ESTE
É O BRASIL
QUE
QUEREMOS
E
MERECEMOS:
COM
MUITA
ARTE
BOA.)
ou
(É
TUDO TÃO PLURAL,
É
TUDO TÃO SUPERLATIVO,
É
TUDO TÃO ABUNDANTE,
É
TUDO TÃO DESLUMBRANTE,
É
TUDO TÃO...)
Já experimentaram a sensação de perder o fôlego, diante de algo
tão fantástico e inacreditável, dentro de um espaço destinado ao TEATRO?
Eu já, algumas vezes, e a mais recente foi na noite de 08 de novembro
passado, e repetida quinze dias após a primeira experiência, quando fui ao ARMAZÉM
DA UTOPIA, que corresponde ao armazém 6 e algumas áreas anexas, do Porto
do Rio de Janeiro, transformado em espaço para a ARTE, mais
especificamente, para o TEATRO, para assistir a “O DRAGÃO”, encenado
pela COMPANHIA ENSAIO ABERTO.
Antes,
porém, de iniciar a análise dessa verdadeira OBRA-PRIMA, preciso falar
um pouco sobre o ARMAZÉM DA UTOPIA, de como aquela área se tornou um espaço
artístico, e da COMPANHIA ENSAIO ABERTO. Para tanto, vou tomar como
base dois “releases”, que me foram enviados por FLÁVIA TENÓRIO
(LEAD Comunicação – Assessoria de Imprensa).
Desativado, a partir de 2010, o armazém
portuário ganhou uma nova função social, totalmente diferente do objetivo para
o qual fora construído. Foi a partir de então, que a COMPANHIA ENSAIO ABERTO
passou a utilizá-lo, para suas atividades de TEATRO, e ele recebeu o
nome de ARMAZÉM DA UTOPIA. A COMPANHIA tinha, e tem até hoje,
como princípio, “forte atuação em projetos de democratização do acesso,
de inclusão social, de formação e capacitação, atendendo a todo o estado do Rio
de Janeiro, fortalecendo a 'Lei Porto Cidade', a qual preconiza que o porto deve
estar voltado aos interesses da cidade. Além de local para as
apresentações dos espetáculos produzidos pela COMPANHIA, o espaço
também abriga os acervos de figurino, objetos de cena e cenografia de 27
espetáculos teatrais do grupo, que completa 30 anos em 2022”.
Este ano, de 2021, apesar de tanta tristeza em que estamos
mergulhados, por conta da pandemia de COVID-19, a COMPANHIA ENSAIO
ABERTO tem algo muito importante para comemorar. É que, oficialmente, o ARMAZÉM
DA UTOPIA se tornou Patrimônio Imaterial do Rio de Janeiro, título
aprovado, recentemente, por unanimidade, pela Alerj, o que abrange o
imóvel e todas as atividades exercidas no ARMAZÉM DA UTOPIA - armazém 6 e
áreas anexas (anexo 5/6 e pátio 6/7).
Sobre a COMPANHIA ENSAIO ABERTO, é necessário dizer que ela está
às vésperas de completar 30 anos de excelentes serviços prestados ao TEATRO
BRASILEIRO, tendo nascido no ano de 1992, “com a proposta de
retomar o TEATRO épico, no Brasil, e fazer, dos palcos, uma arena de discussão
da realidade, resgatando sua vocação crítica e politizada”. Fundada
pelo ator e diretor LUIZ FERNANDO LOBO e pela atriz
TUCA MORAES, a COMPANHIA “explora a ideia do ensaio, como
experimento, e busca romper a ilusão do TEATRO, questionando e reinventando a
relação palco-plateia”.
Com quase trinta espetáculos em seu currículo, não me lembro de
um – assisti a quase todos - que não me tenha agradado imensamente, assim
como ao grande público e à crítica especializada: Cito alguns: “O Cemitério
dos Vivos (1993), a primeira montagem da COMPANHIA, com uma
segunda edição, em 1994; “A Missão”, ainda em 1993; “Cabaré
Youkalt (1995); “A Mãe” e “O Noviço”, ambas em 1996;
“Missa dos Quilombos”, em 2002, um acontecimento na cidade do Rio
de Janeiro, que ficou mais de dez anos em cartaz e tornou-se um
símbolo do trabalho do grupo; “Havana Café” (2004); “Olga Benário, Um
Breve Futuro” (2006); “Sacco e Vanzetti”, em 2014, outra montagem
emblemática da COMPANHIA; “Que Tempos São Esses?” (2016), uma criação
a partir da obra de Bertolt Brechet; “Dez Dias Que Abalaram O Mundo”
(2017); “A Mandrágora”, a última montagem da ENSAIO ABERTO,
até então, em 2019, um dos maiores sucessos da temporada teatral
carioca, da época.
“O DRAGÃO” é um belo exemplo do TEATRO ÉPICO, texto
do dramaturgo e escritor russo EUGÈNE SCHWARTZ, uma “superultramegahipermaster” produção, envolvendo proporções e números “estratosféricos”,
pouquíssimas vezes às vistas de um público de TEATRO. É sua obra mais
conhecida e aplaudida no mundo ocidental. SCHWARTZ começou a escrever a peça
às vésperas do início da Segunda Guerra Mundial (1941). Forçado ao
exílio, o autor só retomou a escrita desse texto em 1943.
No final de 1944, a peça foi encenada, em Moscou, e
suspensa, CENSURADA, após a primeira apresentação. A representação só foi retomada em 1964,
20 anos depois. EUGÈNE SCHWARTZ morreu em 1958 e não teve
a oportunidade de assistir sua obra no palco.
Segundo LUIZ
FERNANDO LOBO, diretor do espetáculo, “O DRAGÃO é
encenado no mundo inteiro até hoje. É uma peça que, apesar de escrita em 1943,
traz, de volta, as conquistas do TEATRO russo-soviético dos anos 20 e dos anos
30 e traz a mágica de volta para o TEATRO, embora essa mágica não seja uma
mágica alienante. Um texto profundamente político, mas no qual a fantasia tem
um papel fundamental.”.
SINOPSE:
Há 400 anos,
uma cidade é dominada e enganada por um DRAGÃO de três cabeças.
Um conto de
fadas para adultos, uma fábula, que narra a história de um
povo que não conhece a verdadeira liberdade.
A montagem
da COMPANHIA ENSAIO ABERTO leva à cena o encantamento e a
imaginação dos contos fantásticos.
A peça conta a
história do cavaleiro LANCELOT (LEONARDO HINCKEL), que se propõe a matar
o DRAGÃO (LUIZ FERNANDO LOBO), no entanto, em sua busca, ele tropeça em
uma comunidade, governada por uma hierarquia burocrática, usando o DRAGÃO
para cobrir seu próprio uso de poder.
Esta peça, a
mais “madura” das peças de SCHWARTZ, considerado um
“autor para crianças”, é uma sátira política, abordando o totalitarismo
em todas as formas.
O enredo é
baseado na tentativa do herói, LANCELOT, de libertar as pessoas, em uma
terra que sofre, sob o domínio brutal do DRAGÃO, mas seus esforços
encontram resistência, já que a maioria das pessoas se acostumou com o monstro,
e considerou seus métodos, embora severos, o único caminho possível; suas almas
tornam-se, de certa forma, aleijadas, por causa dessa incapacidade e indisposição
de resistir.
Diz o DRAGÃO, na
peça: “Veja! A alma humana é muito resistente. Corte o corpo ao meio, e o
homem coaxa. Mas rasgue a alma, e ela só se torna mais flexível, só isso. Não,
sério! Você não poderia escolher uma melhor variedade de almas em qualquer
lugar. Só na minha cidade. Almas sem mãos. Almas sem pernas. Almas mudas, almas
surdas, almas acorrentadas, almas delatoras, almas condenadas.”
LANCELOT,
matando o DRAGÃO, em uma luta sangrenta, não libertou o povo; tudo o que
mudou foi o BURGOMESTRE (CLÁUDIO SERRA), aceitando a posição
anteriormente ocupada pela fera e exigindo que ELSA (LUIZA MORAES),
a mesma garota que estava destinada a ser sacrificada ao DRAGÃO, se
tornasse sua esposa.
Quando LANCELOT
retorna à cidade, um ano depois, percebe que sua tarefa é muito mais complexa:
“Este vai ser um trabalho muito meticuloso ... Temos que matar o DRAGÃO em cada
um deles.”
Apontado,
pelos que estudam a sua obra, como “um bom contador de histórias”,
EUGENE L. SCHWARTZ sempre pediu que, em seus contos, não se procurassem
subtextos e alegorias. Paradoxalmente, entretanto, o próprio
afirmou – li na crítica escrita pelo amigo, Wagner Corrêa de Araújo
– que “Não se conta um conto de fadas
para esconder, não. Mas para revelar, para dizer, o mais alto que puder, tudo
que você sente.”.
Não há como não enxergar ambiguidades no texto desta peça!
O certo é que ele jamais poderia contar que seu pedido fosse atendido, uma
vez que o texto de “O DRAGÃO” é cheio de metáforas e alegorias,
recados dados nas entrelinhas, e, mesmo que alguém não assista a esta peça,
por exemplo, perceberá, apenas pela SINOPSE, que essas metáforas
e alegorias abundam, notará muitos pontos em comum com a nossa triste
realidade brasileira de hoje e que a obra é atemporal, uma vez que
opressores e oprimidos sempre existiram e, parece que não há jeito, sempre existirão,
mundo afora, mais em alguns lugares que em outros.
Farei uma
pequena digressão, para relatar um fato muito marcante, para mim, porque
justifica o que eu disse no parágrafo supra, ocorrido, logo no início dos anos 1970,
quando eu protagonizei uma peça “infantil”, de Oscar Von Pfhul,
a qual contava, no elenco, com Regina Duarte, apolítica, à época,
no auge de seu sucesso na TV, e com um jovem, recém-chegado de Brasília,
chamado Ney de Souza Pereira, que viria, logo depois, a estourar, no
mercado artístico-fonográfico, como Ney Matogrosso. A peça
chamava-se “Dom Chicote Mula Manca E Seu Fiel Companheiro Zé Chupança”,
uma “paródia” do “Quixote”. O meu personagem,
assim como o herói de Cervantes, era louco e se julgava um cavaleiro, “defensor
dos fracos e oprimidos”, até que se propõe a ajudar um pequeno pastor
de ovelhas, personagem de Regina, cujos animais que estavam sob
sua guarda haviam sido roubados. Depois de muitas peripécias, o herói descobre
que quem havia mandado roubar os animais era o próprio rei e segue, com uma
passeata, até o palácio, para, segundo ele, “fazer justiça”. Isso,
essa “justiça”, fica meio em aberto. Não se esqueçam de que os
milicos estavam no poder. Aliás, na época da ditadura
militar, era muito comum os autores se
utilizarem das histórias infantis, para fazer seus protestos e colocação de
suas verdades e reivindicações, nas entrelinhas. Pois bem, num belo dia,
à saída do espetáculo, eu e Regina estávamos comprando pipocas,
no pipoqueiro que fazia ponto na porta do antigo Teatro Casa Grande,
quando um menininho, dos seus oito ou nove anos, acompanhado da mãe – ambos
haviam assistido à peça – perguntou-lhe, bem alto: “Mãe, aquele rei é
o Médici, não é?” (O ditador de plantão.) Silêncio total, depois do “Cala a boca, menino!”,
saído da mãe. Ele, muito perspicaz, havia associado rei e ditador ao poder,
porque, certamente, devia ouvir, em casa, comentários negativos sobre o general.
Façamos de
conta, agora, que a cidadezinha dominada e explorada pelo DRAGÃO possa
ser ampliada para um país. Estaríamos longe de alguma verdade? Façamos
mais de conta: que o DRAGÃO possa assumir uma forma humana, como na peça
(Só na forma.), que já tivesse vestido farda, a qual jamais honrou, e se
julga eleito para ser um imperador ditador, e não um presidente de
uma República, que deveria viver sob a égide do estado soberano de
direito, respeitando uma Constituição! Onde estaria o erro?! E o que
dizer de um povo que, por tantos anos, se acostumou a ser subjugado e pensa que
não tem forças para lutar contra o DRAGÃO ou que é adepto ao “ruim
com ele, pior sem ele”? E não seria verdade que matar o DRAGÃO
não bastaria, para livrar o povo de seu jugo? Quantos filhotes ele já gerou? TERÍAMOS
QUE MATAR UM DRAGÃO POR DIA. OU POR HORA? OU POR MINUTO? OU POR SEGUNDO? A
“falange” é grande!
“Trata-se de
uma peça satírica, vista como subversiva no clima político da Rússia
do pós-guerra.”. Hoje, pelo menos por enquanto, podemos ter o prazer de
assistir a ela, porque, talvez, uma censura explícita não fosse o melhor
para “eles”. “Eles”? Sim, “eles”. Durante
os “anos de chumbo”, a probabilidade de este espetáculo
ter sido encenado, creio, seria muito pouca, ou nenhuma. Porque ele fala a
verdade; porque ele mostra os desmandos e os abusos dos ditadores; porque ele
mexe nas feridas, que “eles” preferem, e precisam, manter protegidas por
um bom curativo, que as oculte...
Creio
que tudo o que deveria falar sobre a qualidade do texto já o fiz, mas é
preciso, também que se faça menção a quem se dedicou à sua tradução, MARIA
JULIETA DRUMMOND DE ANDRADE, de modo a manter o que penso estar contido no original
e a fazê-lo fluir correntemente, sem mistérios para a compreensão da narrativa.
A indicação etária é de 12 anos, porém, talvez, pudesse ser
diminuída, já que “entender a história”, do ponto de vista de uma
fábula, pode ser tarefa acessível a crianças acima dos 8 anos,
talvez. Já as entrelinhas... Nem muitos adultos conseguem enxergar o que há
nelas, infelizmente.
Costumam
dizer que um desfile de escolas de samba pode ser considerado uma “ópera
ao ar livre”, que necessita de muitas pessoas gabaritadas, para
garantir o sucesso do desfile. Agora, pensemos que “O DRAGÃO” é uma montagem
de tão alta complexidade, sob a ótica dos elementos estruturais, que
garantem um espetáculo de elevadíssimo gabarito. É um trabalho coletivo,
como qualquer montagem teatral também, contudo necessita de um batalhão
de competentes profissionais, para dar conta de toda a magia que ele nos
proporciona; todos, porém, seguindo a batuta de um grande “maestro”,
LUIZ FERNANDO LOBO, à frente da direção do espetáculo.
Tudo,
nele, é plural, superlativo, abundante, deslumbrante,
que eu não me cansaria de revê-lo várias vezes. Ainda pretendo ter esse
imenso prazer uma terceira vez, talvez, no último dia da temporada.
É
magistral a direção de LUIZ FERNANDO LOBO: original, inventiva
e de muito bom gosto e competência, sabendo explorar, com maestria, todo o
gigantesco espaço de que dispõe, para transformá-lo num espaço cênico. Só
vendo, para crer! LOBO definiu, para os atores, uma linha de
interpretação magnífica, focando numa proposta que, a princípio, pode
parecer artificial, meio farsesca; mas não o é. É de propósito, e o resultado é
excelente. Muita impostação de voz e um trabalho de projeção e postura corporal
impecáveis. Para esta última parte, contou com o apoio profissional de PAULO
MAZZONI, na preparação corporal de solo e aérea, e de JULIANA
MEDELLA.
Um elemento
que chama muito a atenção, que me fascinou, sobremaneira, foi a direção
musical, a cargo de FELIPE RADICETTI. Acho que já posso contar, aí,
com os três sinais para o início da peça, feitos por fortes sons de
trombetas, anunciando que algo de magnífico se aproxima. Depois, durante todo o
espetáculo, as vinhetas e as canções inseridas na montagem são de
mexer com o nosso coração; sons épicos, que estão totalmente acordes com a narrativa
e a proposta do espetáculo. Grande trabalho! Tudo dentro do
universo dos filmes épicos.
Meu
Deus! O que dizer da cenografia, idealizada e criada por um
dos maiores cenógrafos deste país, J. C. SERRONI, premiadíssimo e
que merecia, este ano, todos os prêmios, por seu exuberante cenário
alegórico? Tudo é belo, no espetáculo, mas o cenário chama
muito a nossa atenção, por suas dimensões, sua confecção, os detalhes nele
contidos e pela brilhante ideia de ser construído em partes, que se juntam,
como um quebra-cabeças. Algo, praticamente, indescritível. Além de
ressignificar todos os espaços do ARMAZÉM 6 e arredores, já criando um
clima, para o espectador, quando este adentra aquele espaço, o cenário,
propriamente dito, da peça é algo que jamais conseguirei apagar da minha
memória. Ele é composto por cinco grandes plataformas, como se fossem carros
alegóricos, de uma escola de samba, manejados, comandados, movimentados pelos
próprios atores, peças essas que se juntam, se encaixam, perfeitamente,
para criar um cenário/espaço maior, como a casa do arquivista CARLOS
MAGNO (GILBERTO MIRANDA) e o palácio real, por exemplo. São, triplamente,
grandiosos: nas suas proporções físicas, na sua beleza e na funcionalidade. São
dois, nas laterais, à frente; dois, atrás destes; e um quinto, ao fundo, que só
é movimentado, aproximado-se do público, no encerramento da peça. J.C.
SERRONI é um gênio, que eu já admiro, faz tempo, e que, agora, me faz seu
maior fã e admirador de seu trabalho.
E o
que dizer dos figurinos, de BETH FILIPECKI
e RENALDO MACHADO? Lindos e criativos! Os dois artistas utilizam-se
de materiais não tão dispendiosos, porém que produzem efeitos belíssimos, sem
falar no aproveitamento de sucatas, se não cometo algum engano, do uso de
objetos transformados em outros, como bacias, que viram escudos, com toques de
alguma customização, e, a utilização de partes de figurinos de
espetáculos já montados pela COMPANHIA, creio, com as devidas
modificações e acertos. Penso que foi dessa forma que se chegou ao figurino
da peça, também com a criação de peças inéditas, é claro! Mas o
que importa é o efeito que o conjunto da obra faz. Figurino também digno de
premiações.
Aproveito o ensejo para elogiar o trabalho de EDUARDO ANDRADE / ARTE
5, pela confecção do DRAGÃO ALADO e da máscara do GATO, duas
obras primorosas.
CESAR
DE RAMIRES assina uma iluminação que eu diria que não seria para
um TEATRO convencional. O desenho de luz, que se aplica a todo o
espaço do ARMAZÉM, é das coisas mais lindas e vibrantes que já vi num
palco de TEATRO. Digo “de TEATRO”, porque a luz nos
remonta a grandes, megas, espetáculos de bandas, em festivais de música: muita
luz; uma orgia de cores; fantásticos efeitos artísticos, para os momentos de
tensão; criação de sombras necessárias a algumas cenas; valorização de alguns mini
espaços, dentro daquele macro espaço... Enfim, uma iluminação que nos
hipnotiza e que “aquece” o espetáculo de tal forma, que é
impossível não reagir, com muita admiração e êxtase, diante daquele trabalho. Seria
mais um prêmio a caminho, para esta montagem.
Vou
fechar os comentários técnicos, analisando o trabalho do elenco,
porém, antes disso, por total e merecida justiça, sou levado a enaltecer o
trabalho de produção e das dezenas de profissionais que ficam nos
bastidores, suando, para que a ARTE se faça. Méritos para TUCA MORAES
(Direção de Produção), CIDA DE SOUZA (Coordenação de Produção Executiva),
JOB CENTER (Produção Executiva), INGRA OLIVEIRA e JOB CENTER (Assistentes
de Produção), ISIS PATACHO e JOB CENTER (Produção de “Set”),
fora a grande quantidade de técnicos que operam luz, som e outros
equipamentos, os cenotécnicos e os muitos, mas muitos mesmo, colaboradores,
que trabalham na orientação ao público, no sentido de ocupação de seus lugares
e evacuação do local da peça, após seu término. É tudo feito no maior
padrão de organização, respeitando-se as prioridades para crianças,
idosos e pessoas com necessidades especiais e/ou dificuldade de mobilização.
PARABÉNS A TODOS!
“O
DRAGÃO” é um “bolo que contém mais cerejas do que massa”.
Já falei de várias e preciso me dedicar ao elenco; ou melhor, ao estelar
elenco, formado por grandes atores e atrizes não favorecidos pela
grande mídia, porém excelentes profissionais, e admirados por uma legião
de fãs, como eu, os quais estão acostumados a vê-los nas suas produções
teatrais. São conhecidos do público do TEATRO e pela classe artística,
mas quem não os conhece entra para o “fã-clube”, logo na primeira
vez que os vê em ação. Os comentários que ouvi, na saída e dentro do VLT,
na volta para casa, nas duas vezes em assisti à peça, me deixaram emocionado e
orgulhoso, por conta deles. E quem são eles? Os de cá não são com o “eles”
lá de cima, os “do mal”.
É um
elenco muito numeroso, 20 atores, porém a grande maioria dos que
estão em cena defendem pequenos papéis, sem nenhum demérito para eles.
Pelo contrário, todos são importantes e perceptíveis, quando em ação, cada um
cumprindo, com a maior correção, a sua parte, por menor que ela seja. Por outro
lado, há um núcleo menor de atores e atrizes que assumem os principais
personagens da trama. É sobre eles que dissertarei.
O grande
herói e o monstruoso vilão; o bem contra o mal: LEONARDO HINCKEL
(LANCELOT) e LUIZ FERNANDO LOBO (DRAGÃO), ambos em atuações
estupendas. LEONARDO encarna aquele que poderia libertar os que se
recusam a conquista da liberdade. Excelente ator, já o demonstrou em
muitas das produções anteriores da COMPANHIA e ratifica isso com
o seu atual personagem. Além de um excelente domínio de palco, LEO
vestiu não só o figurino do personagem, mas também absorveu suas
características, muito próximas às de seu homônimo, da Corte do Rei Artur.
Mas isso é outra história. É excelente a sua postura em cena e, apesar de ser
um homem com uma compleição física “normal”, parece crescer, em
dimensões, em cena. Sou um grande admirador de seu trabalho e aplaudo-o, sem a
menor restrição, como LANCELOT.
Com
a mesma intensidade, dirijo meus aplausos para LUIZ FERNANDO LOBO, como ator,
que encarna o DRAGÃO, quando este assume a forma humana. Não sei se
estarei cometendo alguma heresia, mas comparo sua vilania à de um dos inimigos
do Batman, o Coringa, pelo tom debochado como se comporta, a
maior parte do tempo, garantindo-se na sua força e poder e no medo que causa à
população. Ele a domina, tem consciência da sua supremacia e o personagem,
pela ótima interpretação de LOBO, apesar de vilão, não consegue provocar
a antipatia do público. Faz-nos rir dos absurdos que profere. Seria, talvez,
mais que vilão, um anti-herói, uma espécie de “Odorico Paraguaçu gringo”.
Uma cena em que o personagem nos faz rir bastante é quando ele acha que ELSA
cumprirá suas ordens e matará LANCELOT, com um punhal envenenado. O DRAGÃO
vibra, na expectativa de que o ato seja consumado, como uma criança torce, para
que o “mocinho” derrote o “bandido”. Essa atitude
mostra quão covarde era o DRAGÃO.
TUCA
MORAES, a quem já aplaudi tantas vezes, merece, agora, muito mais
aplausos pela sua interpretação de GATO. Sim, há um GATO (MIMI),
no enredo, que fala e tem comportamentos e sentimentos humanos, como em
qualquer fábula, papel que exige muito da atriz, mas que não é problema
para ela. Favorecida, talvez, por um formidável figurino e por uma linda
máscara, já citada, TUCA assume posições e atitudes felinas, fruto,
certamente, de muito trabalho de pesquisa e preparação física. Aliás, em termos
de preparação física, todos do elenco merecem loas.
Há
um arquivista, na trama, chamado CARLOS MAGNO, papel muito
bem interpretado por GILBERTO MIRANDA. O ator responde à altura,
na interpretação, em todas as cenas em que o personagem é
requisitado. É ele quem, talvez, melhor represente a acomodação daquele povo.
O arquivista
tem uma bela filha, a jovem ELSA (LUIZA MORAES), que fora a escolhida
para ser a sacrificada do ano, pelo DRAGÃO, e a quem LANCELOT se
propõe salvar, até porque, por ela, se apaixonou. Não seria, simplesmente,
evitar que mais um ser humano fizesse parte da estatística com relação às
vítimas fatais do monstro, mas tratava-se de sua “donzela”, o que
lhe garantia maior força e coragem para enfrentar a fera, assim como Dom
Quixote daria sua vida por sua amada Dulcineia. LUIZA também
se comporta com destaque e correção, na personagem.
CLAUDIO
SERRA interpreta o BURGOMESTRE (Salvo engano ou “engolimento
de barriga”, o personagem não é chamado por nenhum nome próprio,
apenas pelo título, que equivale ao primeiro magistrado de uma pequena região. CLAUDIO
e seu personagem são responsáveis por provocar muitas gargalhadas na
plateia, por se tratar de um tipo meio “bobo da corte”, que, de “bobo”,
não tem nada. É muito perspicaz, matreiro e extrema e propositalmente
exagerado, beirando o ridículo, quando fala, incluindo modulações agudas na
voz. Resumindo, um “gaiato”, um personagem para nos divertir, para
fazer desopilar o fígado, muito bem interpretado pelo ator.
O BURGOMESTRE
tem um filho, HENRIQUE, que é interpretado, de forma correta, pelo ator
ARUAM GALILEU.
FICHA TÉCNICA:
Autor
- Eugène Schwartz
Tradução -
Maria Julieta Drummond de Andrade
Direção
- Luiz Fernando Lobo
Assistente de
Direção - Kailani Vinicio
Direção de
Produção - Tuca Moraes
Cenografia e
Espaço Cênico - J.C. Serroni
Iluminação
- Cesar de Ramires
Figurino -
Beth Filipecki e Renaldo Machado
Direção
Musical - Felipe Radicetti
Dragão Alado e
Máscara Gato - Eduardo Andrade / Arte5
Coordenação de
Produção Executiva - Cida De Souza
Programação
Visual - Tatiana Rodrigues e Marcos Apóstolo
Preparação
Corporal de Solo e Aéreo - Paulo Mazzoni
Preparação
Corporal - Juliana Medella
Efeito Aéreo
Dragão - Cláudio Baltar
Rigger -
Carlos Eduardo Índio
Mágicas -
Mágico Janjão
Aulas de
Arame - Cinthia Nunes
Produção
Executiva - Job Center
Assistentes de
Produção - Ingra Oliveira e Job Center
Produção de "Set" - Isis Patacho e Job Center
Operação de
Som - Milena Fernandes, Rafael A. Soares e Alumiando Produções
Operação de
Luz - Rafael França e Alumiando Produções
Coordenação
Ciência do Novo Público e Gestão De Redes Sociais - Agnes De Freitas
Ciência do
Novo Público - Gilberto Miranda, Kauane Ribeiro e Milena Fernandes
Fotos: Renam Brandão
Assessoria de
Imprensa: LEAD Comunicação (Flávia Tenório)
ELENCO E
PERSONAGENS:
Luiz Fernando
Lobo – Dragão
Leonardo
Hinckel - Lancelot
Tuca
Moraes - Gato
Gilberto
Miranda – Carlos Magno
Claudio
Serra - Burgomestre
Luiza
Moraes - Elsa
Aruam Galileu
- Henrique
Bruno Peixoto
– tecelão, coro operário, tropa de choque e lanceiro
Berg Farias –
violinista, coro operário, cuspidor de fogo, tropa de choque e lanceiro
Farley Matos –
ferreiro, coro operário, tropa de choque e lanceiro
Felipe de Gois
– chapeleiro, coro operário, tropa de choque e lanceiro
Grégori Eckert
- coro operário, tropa de choque e lanceiro
Igor Federici
– jardineiro, tecelão, coro operário, tropa de choque e lanceiro
Isabela
Coimbra – amiga Elsa, coro operário, tropa de choque e lanceiro
Kauane Ribeiro
– coro operário, cuspidora de fogo, tropa de choque e lanceiro
Mateus Pitanga
– sentinela trompetista, coro operário, tropa de choque e lanceiro
Natália
Gadiolli – tecelã, coro operário, tropa de choque e lanceiro
Natássia Vello –
coro operário, tropa de choque e lanceiro
Nelson Reis -
coro operário, tropa de choque e lanceiro
Rossana Russia
– tecelã cantora, coro operário e tropa de choque
Tayara Maciel
– amiga Elsa e coro operário
Fotos: Renam Brandão
Assessoria de
Imprensa: LEAD Comunicação (Flávia Tenório)
SERVIÇO:
Temporada: De
05 de novembro até 06 de dezembro de 2021 (NÃO HAVERÁ PRORROGAÇÃO DA TEMPORADA.)
Local: Armazém
da Utopia
Endereço:
Armazém 6, Porto do Rio de Janeiro
Como chegar:
De VLT: Parada Utopia / AquaRio
Telefone: (21)
2516-4893 / 98909-2402 (WhatsApp)
Dias e
Horários: De 6ª feira a 2ª feira, às 20h (Abertura da casa 1 hora antes do
início do espetáculo.)
Classificação
Indicativa: 12 anos
Capacidade:
256 lugares
Duração: 105
minutos
Ingressos
disponíveis, GRATUITAMENTE, no Sympla: www.sympla.com.br/armazemdautopia
Gênero: Teatro
Épico
Observação: O Armazém da Utopia oferece
rampas, para acesso, e banheiro adaptado para cadeirantes, propiciando
condições de acessibilidade para idosos, pessoas com deficiência e com
mobilidade reduzida. Também conta com intérprete de libras em uma das apresentações
para pessoas com deficiência auditiva e disponibilizaremos "folders" em “braile”.
Existem, no texto e na encenação, propriamente dita,
detalhes que não podem passar em branco, numa crítica mais profunda,
como, por exemplo, a utilização de um coro operário, reafirmando a
tradição do TEATRO ÉPICO e a potência histórica da luta do povo, que
remete à realidade dos tempos atuais. O público se identifica bastante com o
comportamento da população daquele lugarejo, em determinadas cenas, pensando
nos movimentos de rua, de hoje.
Há falas que dão margem a interpretações muito pertinentes, com relação
ao Brasil de hoje. Uma delas é quando o GATO, como justificativa
para o comportamento de acomodação, diz, a LANCELOT, quando este lhe
pergunta se não vai responder por que os patrões não estão em casa, a qual ele
adentrou, por estar escancarada: “Porque, quando a gente está num lugar
quentinho e fofo, meu filho, é melhor ficar quieto e dormir.”. Essa
fala será repetida, logo depois, com o acréscimo de outra: “Assim não se
pensa no futuro e nas coisas tristes.”.
Quando LANCELOT pergunta ao arquivista sobre o perigo que
o DRAGÃO representa para aquele povo e como eles reagiam a isso, CARLOS
MAGNO lhe responde, “como um cordeirinho”, de uma forma, bem
explícita, de aceitação: “Já estamos tão acostumados... Há quatrocentos
anos que ele vive conosco.”. E a quantos anos convivemos, os
brasileiros, com “dragões opressores”?
O mesmo CARLOS MAGNO, ratificando sua posição de acomodação e
descrença na possibilidade de que o DRAGÃO seja vencido, e com medo de
que possa haver algo pior que seu jugo, diz a LANCELOT: “Mas, pelo
menos, enquanto ele estiver aqui, nenhum outro DRAGÃO se meterá conosco.”.
Quando LANCELOT, à espera de um DRAGÃO, se vê cara a cara
com um homem, um senhor – o próprio – o questiona acerca da descrição que lhe
haviam feito, do monstro, e este lhe responde, em tom bem debochado: “Hoje,
estou à vontade, à paisana.”. Nós também conhecemos “dragões à
paisana”, bem próximos a nós.
Quando o BURGOMESTRE pergunta a seu filho, HENRIQUE, se ele está
precisando de dinheiro, que aquele poderia lhe dar, em pagamento por um “serviço
de espião”, que este lhe prestara, e o filho lhe responde
negativamente, o pai lhe diz: “Vamos! Não se envergonhe, estou cheio de
dinheiro. Ontem, tive, de novo, um ataque de cleptomania. Vamos, aceita!”.
Isso não nos lembra os “cleptomaníacos” que nos assaltam todos os
dias?
Uma passagem também bastante interessante se dá, quase no final da encenação,
quando o BURGOMESTRE, que se dizia ter sido o verdadeiro matador do DRAGÃO,
o que o levou a assumir o cargo de Presidente da Cidade Liberada, tenta
convencer o arquivista disso e este não aceita, pois sabe que o grande
herói fora LANCELOT, HENRIQUE, então, diz ao pai que a recusa de
tal aceitação está ocorrendo, porque o BURGOMESTRE não havia dado a CARLOS
MAGNO aquilo que lhe prometera “e tudo o que ele quer”. Assim,
o BURGOMESTRE se pronuncia: “Tá certo, CARLOS MAGNO. A partir de
hoje, você fica sendo meu secretário particular.”. E, ainda, propõe-lhe
mais mordomias e “penduricalhos”: “Te ofereço uma
residência oficial, junto ao parque. Tem 53 quartos, todos dando para o norte. E
o ordenado é fabuloso. Viáticos, para ir ao escritório. E gratificação especial,
para quando não quiser trabalhar. Ajuda de custo, dia sim, dia não. E dois
ordenados durante as férias.”. Por acaso, alguém está fazendo uma
ligação com a já nossa tão conhecida e nefasta, imoral, política do “toma lá, dá cá”?
E essa magnífica, apoteótica e visceral montagem termina, quando LANCELOT
volta, um ano depois de ter derrotado o DRAGÃO, manda prender o
usurpador BURGOMESTRE e HENRIQUE, e o povo clama por restaurar a
democracia ali e ouve, atentamente, um belo discurso de LANCELOT, de
encorajamento e esperança por dias melhores: “NÓS VAMOS TER QUE TRABALHAR MUITO. TRABALHAR COM MUITA PACIÊNCIA.
TRABALHAR BEM DEVAGAR, COMO SE ESTIVÉSSEMOS BORDANDO. NÓS TEMOS QUE RECONSTRUIR
TUDO!”.
Era a catarse de que nós, público, precisávamos, naquele momento; e
agora.
Confesso que saí do “ARMAZÉM
DA UTOPIA”, nas duas vezes em que assisti a “O DRAGÃO”, “nas
nuvens”, “voando ao lado dele”, com o maior orgulho de
ser brasileiro: por aqueles artistas e por ter a certeza de que havia assistido
a um espetáculo de padrão internacional, que há de fazer muitos estrangeiros
passarem a respeitar o nosso verdadeiro TEATRO.
(As cinco fotos abaixo foram tiradas por GILBERTO BARTHOLO. São partes do cenário da peça.)
FOTOS: RENAM BRANDÃO
E VAMOS AO TEATRO,
COM TODOS OS
CUIDADOS!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS
DE ESPETÁCULO
DO BRASIL,
COM TODOS OS
CUIDADOS!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI, SEMPRE!!!
RESISTAMOS, SEMPRE
MAIS!!!
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TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!