“À SOMBRA DO PAI”
ou
(PARADOXALMENTE,
UM HUMOR ESCRACHADO
E REFINADO.
ou
(DA ARTE DE
FAZER RIR,
DA PARTE DE QUEM
SABE FAZÊ-LO.)
Há quem torça o nariz para a COMÉDIA. Não gosto desse tipo de gente, a qual, antes de qualquer coisa, é digna de pena. Há os que torcem o nariz para este ou aquele ator cômico, pelos mais diferentes motivos, indo desde sua orientação sexual até seu posicionamento político, passando por vários outros “motivos”. Também não me entendo com esses. Sou daqueles que, embora na “reserva”, jogam no time do saudoso Paulo Gustavo, que disse, com muita propriedade que “a gente não vive sem a graça, sem humor”. E mais: “O humor salva, transforma, alivia, cura, traz esperança pra vida da gente.”.
Não querendo, mas sendo obrigado a bater na mesma tecla, no óbvio, fazer rir é extremamente muito mais difícil do que fazer chorar; a COMÉDIA é muito mais desafiadora e exigente, para os atores, do que o drama. Do ponto de vista teórico e prático, a meu juízo – e posso estar errado -, qualquer ator cômico pode se sair bem numa interpretação dramática, entretanto a reciproca, via de regra, não é verdadeira, visto que aqueles que se propõem a fazer COMÉDIA são atores “diferenciados", porque têm que ter um “timing” específico, exigido pelo gênero, bem como ser dotados de uma inteligência acima do que é considerado normal e um forte poder de improvisação, para tirar partido de uma situação não prevista e “faturar” em cima dela, arrancando gargalhadas de uma plateia. É muito desagradável ver quem não tem graça querendo ser engraçado. Ser chistoso, jocoso, não é para quem quer; é para quem pode. Formar-se em ator/atriz qualquer um pode, desde que estude muito e se esforce para tanto, embora possa vir a se tornar um(a) “canastrão/ona”. Para ser um(a) ator/atriz cômico(a), a pessoa precisa ter algo intrínseco, que já nasce com ela, faz parte da sua essência.
O Brasil é um grande celeiro de
artistas cômicos, não só os veteranos, a maioria, infelizmente, já fazendo rir
em outras dimensões, como também uma nova geração e os “do meio”, entre os 40 e
os 70 anos, dentre os quais destaco PEDRO
CARDOSO, que vem merecendo destaque do público e da crítica com o monólogo “À SOMBRA DO PAI”, ocupando o palco do Espaço
Tom Jobim, do Hall EcoVilla Ri Happy, localizado dentro do Jardim
Botânico do Rio de Janeiro, onde cumprirá uma temporada, já considerada de
sucesso, até o dia 10 de dezembro próximo (VER SERVIÇO.).
A forma como se deve fazer humor, no Brasil,
veio passando por várias transformações e ressignificações, até chegar ao estágio
atual, quando, ao se ter em mente produzir algo que faça o outro rir, é preciso
que se pense “trocentas mil vezes”, até que fique bem clara e definida a
certeza de que o que vai ser dito cabe nos limites do “politicamente correto”.
Sim, há limites para o humor; para mim, perlo menos. Esse conceito, embora,
algumas vezes, considerado “chato, castrador, repressor”, sem a
menor sombra de dúvidas, é importantíssimo de ser seguido, visto que chega a
ser uma crueldade explorar os “defeitos, imperfeições, deficiências, desvirtudes, fraquezas e senões” de terceiros.
Sou um inveterado amante do humor e
da COMÉDIA
e, por conta disso, me tornei um telespectador assíduo do Canal VIVA, que exibe
muitos programas antigos na TV, a maioria já fora das grades, há bastante tempo,
e fico me perguntando como eu e milhões de outras pessoas podíamos achar graça
em piadas que exploram seres humanos, como todos nós: negros, “gays”,
deficientes
físicos e mentais, profissionais subalternos... Haja “tira
manchas” para remover essa mácula de nós, muito embora nem tenhamos
tanta culpa por aqueles deslizes, uma vez que não havia, por parte da grande
mídia, um trabalho conscientizador de que “não há a menor graça em se rir da ‘desgraça’
alheia”.
O humor só nos atinge,
provocando o nosso riso, quando não estamos inseridos na situação que provocou
aquela “graça”. Se, por exemplo, um indivíduo escorrega numa casca de
banana e eu acho graça, ele há de me perguntar: “Está rido de quê?!”. E
completar, muito “P...” da vida: “Não acho a menor graça!”. Se, logo
depois, for eu a vítima da casa de banana, quem escorregou nela, antes de mim,
há de rir, enquanto eu “não acho a menor graça nisso”. Eu,
que ri do outro, antes. Acho que, de uma forma bem simples, consegui me fazer
entender. Mas passemos aos comentários que tenho a fazer sobre a peça em tela.
SINOPSE:
“À SOMBRA
DO PAI” é uma COMÉDIA absoluta, que
provoca o público, pedindo a ele que se procure em algum dos personagens da
história.
Em tom de blague, PEDRO CARDOSO diz que quem não se
reconhecer em nenhum dois cinco protagonistas da história que
ele representa, no palco, deve voltar no dia seguinte e tentar novamente.
Mas tal hipótese é muito improvável,
pois, para quem não se reconhecer em nenhum daqueles, existe ainda a chance de
se ver espelhado num sexto personagem.
(Para não dar nenhum “spoiler”,
suprimi o final da SINOPSE.)
PEDRO CARDOSO estava
fazendo falta nos palcos cariocas, visto que, há oito anos, mantém uma
residência fixa em Portugal e, há quatro se apresentou por aqui pela última vez, em 2019,
quando, juntamente com Graziella Moretto, realizou sete espetáculos
em uma ocupação artística que, merecidamente, venceu o “Prêmio do Humor”,
idealizado por Fábio Porchat, na categoria “Prêmio Especial”. PEDRO retorna ao Rio de Janeiro, depois de
um imenso sucesso em São Paulo, trazendo na mala a COMÉDIA-solo
“À SOMBRA DO PAI, espetáculo escrito
e dirigido por ele mesmo.
Ainda que distante, geograficamente,
do Brasil,
o artista mantém viva sua ligação com o país, através de aclamadas crônicas
políticas, publicadas em suas redes sociais e, em 2019, transformadas, pela
Editora
Record no livro “Pedro Cardoso Eu Mesmo: Em busca de um
diálogo contra o fascismo brasileiro”. Segundo o ator, “a pandemia
foi o principal impedimento para que eu estivesse em cena no Brasil, nos
últimos anos, e, por esse motivo, considero que a volta aos palcos, neste
momento de reconstrução do país, tem um significado particular”. São
suas palavras: “É comédia, a mais desavergonhada comédia, pois, na minha opinião,
apenas o humor é linguagem ampla o suficiente para dar conta de descrever o
Brasil”. E eu acrescento: O Brasil não é para amadores.
Quando assisti às suas duas mais
recentes peças, “O Auto Falante” (com essa grafia mesmo) e “Os Ignorantes”, confesso
que me diverti muito e dei boas gargalhadas, mas não esperava que iria quase
explodir, de tanto gargalhar com a trama de “À SOMBRA DO PAI”. De uma forma extremamente inteligente e
criativa, PEDRO escreveu um texto "fatiado" em seis partes, sendo que todas se entrelaçam; os elementos de uma
aparecem em outras, com novos desdobramentos, criando, a cada momento, uma situação
de surpresa. E tudo vai se desenrolando como uma “bola de neve” que tem
como limite o infinito.
Segundo o “release” que recebi, de HERNANE CARDOSO, produtor e diretor técnico do
espetáculo, a peça “é uma provocação ao espírito crítico da plateia,
e à nossa capacidade (ou falta dela) de nos colocarmos uns no lugar dos outros”.
Como podem perceber, é uma espécie de “empatiômetro”.
(Foto: Gilberto Bartholo.)
O espetáculo, que começa no horário
cravado – PALMAS PARA PEDRO CARDOSO E SUA EQUIPE!!! – com o ator se apresentando ao
público e mostrando a proposta do espetáculo. Diz que vai representar cinco tipos
bem diferentes de pessoas e que cada espectador deve procurar se reconhecer em alguma
delas, ou, até mesmo, em mais de uma. E complementa, convidando a voltar, no
dia seguinte, pagando um novo ingresso, naturalmente, aqueles que não o
conseguirem. Mas também acrescenta que seria, praticamente, impossível isso
acontecer, já que, em caso de uma não identificação com qualquer um dos cinco
personagens, ainda haveria uma sexta chance, na qual ele considera impossível
alguém não se encaixar.
Pela ordem de apresentação, as cinco
personalidades são: um homem de DIREITA, um de ESQUERDA, um POETA,
um NINGUÉM
e um de CENTRO. Quanto ao sexto, não revelo nada, nem sob a
tortura de ter que ouvir uma entrevista do atual (DES)governador
do Rio
de Janeiro, dizendo como pretende acabar coma milícia na EX-Cidade Maravilhosa. (Momento descontração.)
A meu juízo, o mais hilário de todos
é o primeiro – “Seria cômico, se não fosse sério.”. O personagem fala e gesticula
como um dos “trogloditas” que faziam parte da “entourage” que sempre
acompanhava o nefasto e inominável sujeito que ocupou a cadeira de presidente
da República, nos últimos quatro anos, sem ter a menor noção do que o cargo
exige e representa, em termos de tudo.
O segundo não difere muito do
primeiro, em termos de extremismo, e também provoca muitos risos. No fundo,
quando rimos do que dizem os dois personagens, sabemos que não há nada de
engraçado neles. Talvez – é melhor pensar assim – a gente ache graça é da da corretíssima forma
como um ator os representa.
Nas duas primeiras “fatias”,
PEDRO se movimenta livremente no
palco, totalmente desengonçado, o que é muito hilário, e não há como não ter
saudade do personagem “Agostinho” – entonações, máscaras faciais e
gestos lembram muito o personagem -, que ele interpretou, durante quase
14
anos, no “sitcom” “A Grande Família”, transmitido pela
TV
Globo. Na terceira, porém, o ator permanece sentado no chão, de costas
para o público, com um microfone na mão, e vai lendo um texto, sério, projetado, aos poucos, num telão que fica no fundo do palco.
Seguem-se as participações de um Ninguém
e de um homem de Centro, durante as quais a história
vai se encaminhando para o final, sem falar – nada de “spoiler” – no que
virá na sexta, e última, “fatia”.
O espetáculo é muito simples, em
termos de elementos de apoio, como cenário, figurino e luz,
por exemplo. Basicamente, é um ator e um texto, ambos excelentes. A cenografia,
assinada por GRINGO CARDIA, se
limita a um telão, ao fundo do palco; uma arara, com algumas peças de roupa
(camisetas), num dos cantos do palco; e uma espécie de cavalete, de pintura,
onde há placas, com a identificação de cada personagem, que o ator vai retirando,
ao final de cada cena (“fatia”). O figurino, idealizado e
criado por GIOVANNA MORETTO, contempla
uma calça básica, tênis e seis ou sete camisetas, que o ator vai trocando, a
cada cena, com inscrições relativas ao tema da peça. RODRIGO BELAY não pensou em nada especial, para a iluminação,
até porque não seria mesmo necessário, e bolou uma luz quase perene. A produção
do espetáculo é impecável, tudo acontecendo a tempo e hora precisos,
graças ao trabalho de HERNANE CARDOSO.
(Foto: Gilberto Bartholo.)
FICHA TÉCNICA:
Idealização: Pedro Cardoso
Texto: Pedro Cardoso
Direção: Pedro Cardoso
Atuação: Pedro Cardoso
Cenografia (Imagens): Gringo Cardia
Figurino: Giovanna Moretto
Iluminação: Rodrigo Belay
Operação de Luz: Rafael Maia
Produção: Hernane Cardoso
Operação Audiovisual : Hernane
Cardoso
Direção Técnica: Hernane Cardoso
Assistência de Produção: Lucca Valor
Fotos: Produção / Divulgação
SERVIÇO:
Temporada:
De 06 de outubro a 10 de dezembro de 2023 (exceto dias 20, 21 e 22 de outubro).
Local:
Espaço Tom Jobim - Hall EcoVilla Ri Happy –
(dentro do Jardim Botânico do Rio de Janeiro).
Endereço: Rua Jardim
Botânico, nº 1008 – Jardim Botânico – Rio de Janeiro.
Telefone: (21)2018-0394.
Dias e
Horários: 6ªs feiras e sábados, às 20h; domingos, às 19h.
Valor dos
Ingressos: R$100,00 e R$50,00 (meia-entrada).
Vendas
presenciais (sem taxa de conveniência) e pela plataforma EVENTIM (com taxa de
serviço.).
Lotação:
325 lugares.
Classificação
Etária: 12 anos.
Duração:
90 minutos.
Gênero:
COMÉDIA.
Para
sintetizar, valho-me de uma parte do “release” da peça, quando diz que “PEDRO CARDOSO encena a
fábula sobre o uso pervertido do cristianismo, para um projeto de poder”.
Antes de
dizer que RECOMENDO MUITO este
espetáculo, divulgo uma excelente novidade, oferecida ao público pelo Hall
Ecovilla Ri Happy, que inaugura seu horário noturno de atrações para
adultos com este excelente solo de PEDRO
CARDOSO. Como muitos pais desejam ir ao Teatro, porém não têm com
quem deixar seus filhos pequenos, este agradabilíssimo espaço oferece um
serviço que me parece pioneiro no Brasil. Os pais, enquanto assistem à
peça, podem deixar suas crianças, de 05 a 12 anos, sob a responsabilidade
de recreadores, só às sextas-feiras, inicialmente, das19h30min às 21h30min. Além de
atividades recreativas, os pequenos podem jantar. O valor cobrado pelo serviço
é de R$150,00,
por criança. Para grupos de dois ou mais pequenos, o valor é de R$120,00, por
cada um.
Estão
curiosos para saber com qual dos cinco personagens eu me identifiquei? Ou com o
sexto? Respondo que minha identificação total vai mesmo para PEDRO CARDOSO.
FOTOS: PRODUÇÃO / DIVULGAÇÃO.
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ESPETÁCULO DO BRASIL!
A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE; E SALVA!
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