PIPPIN
(NÓS TEMOS MÁGICAS, PARA
FAZER;
RISOS, PARA DIVERTIR;
E EMOÇÃO, PARA OFERECER.
ou
Sempre
que, formal ou informalmente, me pego conversando sobre TEATRO MUSICAL, sou levado a falar do grande salto que esse gênero teatral deu, no Brasil, nas três ou quatro últimas
décadas, graças ao trabalho de algumas iluminadas pessoas, profissionais do
mais alto nível, dentre os quais – tantos - destaco os nomes de CHARLES MÖELLER e CLAUDIO BOTELHO. Outros, evidentemente, graças aos DEUSES DO TEATRO, no Rio e em São Paulo, principalmente, também vêm dando sua inestimável
colaboração, a ponto de tornar o Brasil
já reconhecido e respeitado, até no exterior, como um celeiro de grandes produções musicais.
Na
década de 70, a oferta de musicais, no Brasil era bem pequena, mas começava a ganhar algum corpo, “comendo
pelas beiradas”, porém não havia pessoas que se interessassem tanto, e diretamente,
pelo gênero e o “consumissem”, como nos dias de hoje. Atualmente, ou já há
algum tempo, há um público cativo, que vem crescendo substancialmente, muito grande, para o TEATRO MUSICAL, pessoas ávidas de boas produções. Estas, mesmo com todos os óbices que surgem, pipocam,
aqui e ali, principalmente no eixo Rio-São
Paulo, fazendo a alegria das pessoas e nos enchendo de orgulho.
Como um
privilegiado, que, de vez em quando, tem a oportunidade de conferir, “in loco”,
grandes musicais, em Nova York (Broadway) ou em Londres (West End) – recentemente, até
em Toronto, Canadá, quando assisti a uma versão do velho e açucarado “Grease” -, fico feliz em ver quão
excelentes são muitas das nossas montagens.
Não
tínhamos “matéria-prima” para colocar nos palcos. E, quando digo isso, sempre
uso, como referência ou exemplo, duas produções
da década de 70 e um grande diretor, infelizmente, já falecido: Flávio Rangel. Ele dirigiu duas
belíssimas obras, que marcaram a história dos musicais brasileiros: “O
Homem de La Mancha”, inaugurando o Teatro
Adolpho Bloch, em 13 de janeiro de
1973, e “PIPPIN” (Estreou em 20 de julho de 1974.), no mesmo Teatro. Flávio teve muita dificuldade, de verdade, para formar os dois elencos, uma vez que os atores não cantavam nem dançavam. Um ou
outro se arriscava numa das duas vertentes, com atuações sofríveis ou razoáveis.
E não era culpa deles, porque não tinham aprendido aquilo, na sua formação profissional;
não lhes ensinavam o canto e a dança, com raras exceções, repito.
Bissextamente, aparecia alguém, com um enorme talento, como Marília Pêra, por exemplo, que dava
conta do recado, e muito bem, jogando na defesa, no meio-campo e no ataque. Marília, além de grande atriz, tinha formação em dança e canto. E era uma grande estudiosa. Foi ela, inclusive, a escolhida
para ser a MESTRA DE CERIMÔNIAS, na
primeira montagem de “PIPPIN”.
Paulo Autran, um verdadeir “ícone”
do Teatro Brasileiro, fez um brilhante e inesquecível Dom Quixote, em “O Homem de La Mancha”, mas, praticamente, declamava as letras das canções, mais do que as cantava. Grande Otelo, que fazia um inesquecível Sancho Pança, na mesma montagem,
também não dominava o canto. A
exceção, no trio de protagonistas,
era a diva Bibi Ferreira, a Dulcineia. Esta, sim, representava, cantava e dançava, tudo
maravilhosamente, com total perfeição.
Naquela
época, os diretores que pretendiam
montar um musical sofriam, por não
terem, às mãos, gente capacitada a encarar um. Hoje, eles também sofrem, mas
por outro motivo: o oposto. Sofrem, por terem de dispensar tanta gente com
talento em excesso, pois, para cada nova audição,
candidatam-se centenas de talentosos jovens, lutando por um papel. E os atores mais velhos estão procurando,
também, aprender a cantar e a dançar, porque há espaço para eles
também. Hoje, ainda surge uma nova “exigência”, já tão posta em prática, que é
o/a ator/atriz saber tocar um
instrumento musical. Aí, fica tudo completo.
Feito
esse extenso preâmbulo, vamos ao alvo desta crítica, que é uma modesta análise de uma segunda montagem de um dos meus musicais favoritos, “PIPPIN”, em cartaz no Teatro Clara Nunes (VER SERVIÇO), desta
vez pelas mãos de CHARLES MÖELLER e CLAUDIO BOTELHO. Não farei nenhuma
comparação com a primeira montagem,
há 44 anos, por não ver o menor sentido
nisso e porque são duas realidades e propostas completamente diferentes, ambas
estupendas.
Assisti
ao “PIPPIN” 2018 duas vezes (por
enquanto): na sessão para convidados e três dias depois. Vi dois espetáculos distintos, o segundo bem melhor que o primeiro. A
razão disso é muito simples de se entender. No dia da estreia e na sessão para
convidados, regra geral, quase todos, em cena, com algumas exceções, deixam-se
tomar por um nervosismo, até compreensível, uma vez que serão “julgados” por
pessoas que têm intimidade com o TEATRO,
e não pelo público comum, o qual, além de seu bom (ou mau) gosto, não tem
embasamento técnico para avaliar uma peça.
Por conta disso, tenho evitado, o quanto posso, comparecer a sessões de estreia
ou às chamadas VIPs (não costumo
utilizar o termo, pois “vips” são todas
as pessoas). Apenas em casos especiais (“PIPPIN” era um, para mim, pois aguardava a atual montagem, ansiosamente, fazia tempo.), compareço
a sessões adjetivadas como “especiais”.
Adoro o musical e a atual montagem
está linda, porém houve alguns problemas que não me deixaram cem por cento feliz
com o que vi, na primeira vez. Mas, assim mesmo, valeu a pena. Fiz questão,
porém, de rever logo a peça, com o
intuito de escrever sobre ela, na certeza plena, e ratificada, de que assistiria a um espetáculo mais “limpo”, com os problemas resolvidos e que,
evidentemente, melhorará, mais ainda, a cada nova sessão. Pretendo aplaudir “PIPPIN” mais algumas vezes.
SINOPSE:
Comandada pela MESTRA DE CERIMÔNIAS / LÍDER DE UMA TRUPE
TEATRAL (TOTIA MEIRELES), a “companhia” teatral conta a história do
príncipe PIPPIN (FELIPE DE CAROLIS),
filho e herdeiro do trono do REI CARLOS
MAGNO (JONAS BLOCH).
Em busca do sentido da sua
vida e para atingir uma existência "extraordinária", algo que o completasse totalmente, como ser humano, ele segue os
conselhos de BERTHE, sua avó (NICETTE BRUNO), estes positivos, e da
madrasta FASTRADA (ADRIANA GARAMBONE),
nada construtivos.
Passa por batalhas, experimenta o poder, a
simplicidade e o amor, até atingir seu objetivo maior na vida. (Ou não?)
Um clássico dos musicais, na década de 70
(estreou em 1972), “PIPPIN” recebeu
onze indicações ao Tony Awards e conquistou cinco prêmios: Melhor Ator, Melhor Cenografia,
Melhor Iluminação e Bob
Fosse ganhou os de Melhor
Direção e Melhor Coreografia. A montagem causou uma revolução estética
na Broadway, “com uma estrutura ousada e a
aposta na metalinguagem” (o TEATRO dentro do TEATRO). Decididamente, “PIPPIN” não é um musical como os outros; ele é quase único. Em 2013, mereceu um “revival”,
na meca dos musicais, com estrondoso
sucesso, ficando, por quase dois anos, em cartaz e ganhando quatro prêmios Tony.
Às
vésperas de completar 30 anos de
vitoriosa parceria, este é o 43º
espetáculo assinado pela dupla MÖELLER
& BOTELHO. Com os direitos de
montagem adquiridos por eles, já há algum tempo, os dois foram adiando, por
motivos vários, esta encenação, mas
valeu a pena, pois se trata de uma de suas melhores criações, dentre tantas
outras. Para falar a verdade, quase todas o são. Eu tenho o meu “top 41”, com relação às peças assinadas por M&B, com direito às minhas preferidas, que não cabem nos dedos
das duas mãos. Acho que nem se os dos pés entrassem na contagem. Mas por que 41, de 43? Porque, que eu me lembre, apenas duas montagens da dupla não me agradaram como as outras, mas os
que me leem ficarão sem saber quais foram, para evitar celeumas.
A
atual leitura de “PIPPIN” é digna de
todos os elogios e, com certeza, estará brigando por premiações, ao final da temporada de 2018, já que,
merecidamente, faz jus a elas.
O
espetáculo tem uma “dramaturgia arrojada”, que foge aos
padrões da grande maioria dos musicais,
valorizada, entre nós, pela versão
brasileira, de CLAUDIO BOTELHO.
Por ser uma peça política, na sua
essência, na melhor acepção do termo, BOTELHO
resolveu acrescentar detalhes, na sua versão,
que aproximam mais o público brasileiro do espetáculo,
das mensagens que o texto contém e
já trazia, de outra forma, no original. Colocou, na boca de alguns personagens, falas que nos dizem muito,
de perto, as quais podem ser associadas à vida política nacional, chegando até,
por meio de uma “pérola, brilhante e 'cheia' de sentido”, dita
pelo rei CARLOS MAGNO, a nos lembrar
uma folclórica, para ser mais leve, chefa do governo brasileiro, mestra nesse
tipo de frases: “O pôr do sol parece com o nascer do sol; mas é diferente.” (ou
vice-versa, o que dá no mesmo). Além disso, CLAUDIO aproximou o passado do presente, e faz, na sua versão, alusão a “fazer um doc”; usa a adjetivação “bela, recatada e do lar”; critica a Guerra Santa, as 1ª e 2ª
Guerras Mundiais, a Guerra da Síria,
não perdendo a oportunidade de comentar sobre os números de mortos por
violência, no Brasil, superior aos daqueles conflitos bélicos. Não poderiam ficar
de fora, também, as “fake news”, sem
falar no pouco caso das “autoridades” brasileiras no tocante à cultura, em
geral, ao colocar, na boca de um personagem, algo como isto: “Quando
o rei faz cortes no orçamento, a primeira coisa a ser cortada é a arte.”.
Abriu espaço, também, para um oportuno “Fora, Carlos!”.
Como
deve ser mesmo um musical, as 15 canções que compõem o “set list” ajudam a contar a história, totalmente inseridas em cada cena a que estão atreladas, no que diz
respeito às letras, estas, no
original, escritas por STEPHEN SCHWARTZ,
o mesmo gênio que também criou outras OBRAS-PRIMAS,
como “Godspell” e “Wicked”, por exemplo, também compositor das belíssimas melodias. E, já que estamos no quesito “canções”, não posso deixar de dizer
que sou apaixonado por todas e que me atrevo a cantá-las, no chuveiro, com as
letras em inglês, enquanto não tenho acesso às versões, o que espero conseguir
em breve.
Eu
poderia relacionar muitos motivos para que se assista a este fantástico espetáculo, porém vou
ater-me a apenas alguns, o que já fará esta crítica, que vem sendo escrita “em capítulos”, interrompida, várias
vezes, por diversos motivos, bastante extensa. Mas não posso frear as minhas
emoções, diante de uma maravilha,
como “PIPPIN”.
O
texto, sem dúvida, já bastaria para
credenciar a peça como excelente, por sua estrutura, temática
e viés político, como já disse, atingindo a públicos, creio eu, de diversas
nacionalidades, idades, sexos, credos, já que o protagonista carrega consigo um drama existencial, por isso mesmo, universal,
ou seja, a procura pelo eu, pela sua própria essência, por sua razão de existir.
A
direção preocupou-se com uma montagem leve,
bastante humanística, bem humorada, cercando-se dos melhores profissionais nas
áreas que servem de apoio a uma montagem
teatral. É muito valiosa a ficha
técnica do espetáculo, aqui
dissecada, com detalhes.
ROGÉRIO FALCÃO, com mais de vinte projetos desenvolvidos
com a dupla M&B, sem a menor
dúvida, assina uma de suas melhores cenografias,
ao mesmo tempo simples, arrojada e funcional; acima de tudo, deslumbrante. O que predomina é algo
como o ambiente de um circo-teatro
mambembe, abrindo-se espaços para outras ambientações, com o auxílio de
poucas peças, como um trono e uma cama, por exemplo, além de objetos de cena,
menores. A imagem cenográfica que
ficará, com total certeza, na memória de todos os que assistirem ao musical será a belíssima boca de cena, peça que, como já disse,
em críticas anteriores, sobre trabalhos de ROGÉRIO, merecia um
lugar de destaque num museu de cenários,
se este existisse.
A
figurinista, LUCIANA BUARQUE, foi de uma felicidade ímpar, ao desenhar os figurinos da peça, que atendem às necessidades do espetáculo, todos de um padrão “top”,
em termos de beleza, bom gosto e apuro técnico, com destaque para os trajes do REI CARLOS MAGNO e da avó, BERTHE, ambos ostentando a riqueza da realeza.
Também destaco o figurino usado por CRISTIANA POMPEO, na pele de CATHARINA, pelo que apresenta de simples,
bucólico, criativo e divertido. LUCIANA
utilizou uma paleta que vai do Oiapoque
ao Chuí.
A
lindíssima iluminação, de ROGÉRIO WILTGEN, é um detalhe
especialíssimo, para criar um clima onírico em que se dá a encenação. Contribuem, para isso, as variadas cores que são lançadas
sobre tudo o que ocupa o espaço cênico,
na proporção exata de cada exigência. Tudo ganha mais beleza e dinamismo, com a
magnífica luz de ROGÉRIO.
ALONSO BARROS, cujo talento jamais me
canso de elogiar, é o responsável pelas complexas coreografias da peça,
algumas lembrando outras versões, inclusive a original, mas todas com o seu
toque especial e criativo. ALONSO
abusa, no melhor sentido, de passos e
traços coreográficos ligados a pantomimas
circenses, não desprezando, também, o velho e bom sapateado.
Na
parte musical, não posso deixar de fazer
referência à beleza de todas as canções,
sem qualquer exceção, que compõem uma intrincada trilha sonora original, cujas partituras são de difícil execução,
para quem toca e para os que cantam. O elenco
e os músicos, porém, não veem, nisso,
grande obstáculo e se jogam, com todo o seu potencial, nas suas execuções. A direção musical, tarefa das mais
difíceis, nesta montagem, é assinada
por um talentoso mestre no assunto, JULES
VANDYSTADT, que compôs arranjos
adicionais para a orquestração
original de LARRY HOCHMEN, tudo sob
a supervisão musical geral de CLAUDIO BOTELHO. A peça oferece a todos os personagens
de destaque, na trama, momentos de solo, cada um melhor que o outro.
E,
já que falamos nos músicos, quero
fazer justiça ao fantástico desempenho da banda,
que ocupa as duas laterais superiores do palco, formada por HEBERTH SOUZA (regência / teclado 1), EVELYNE
GARCIA (teclado 2 e acordeão), LEONARDO FANTINI (violino), TASSIO RAMOS /
LEANDRO VASQUES (contrabaixo elétrico e acústico), ANDRÉ BARROS / THIAGO
TRAJANO (guitarra e violão), MÁRCIO ROMANO (bateria e percussão), DIOGO GOMES
(trompete e flugelhorn) e ALEX FREITAS (flauta, piccolo, clarinete, sax soprano
e sax alto). São poucos, quantitativamente, oito elementos, mas que dão a impressão de estarmos ouvindo uma
orquestra de muitos músicos.
Não se podem apontar falhas na sonorização, graças ao ótimo trabalho
de desenho de som, a cargo de MARCELO CLARET, um antigo parceiro da
dupla M&B, mais uma vez pondo em
prática seus conhecimentos técnicos, para garantir que tudo seja ouvido com
clareza e precisão.
A estética dos personagens deve muito ao ótimo trabalho de visagismo, bastante lúdico, assinado
por BETO CARRAMANHOS, outro
antigo colaborador nos projetos da dupla de encenadores.
É muito raro - quase nunca acontece –
alguém mencionar um(a) profissional muito importante, numa montagem teatral, que trabalha na produção de elenco, aqui representado por uma mulher, bastante
tarimbada, na função, que acerta, em cheio, nas suas indicações, que é MARCELA ALTBERG. Ela tem um dedo certeiro
e um “faro” apurado, nas suas escolhas; ou melhor, nas suas sugestões, já que a
escolha final do elenco é feita por
um grupo de técnicos, profissionais, com o peso maior da direção.
Graças ao profissionalismo de MARCELA e dos diretores da peça, assim
como outros que opinam, chegou-se a um elenco
nota mil, do protagonista ao
mais simples personagem, dos atores mais consagrados e presentes,
com frequência, na grande mídia, aos menos conhecidos; dos que atuam aos que dançam.
FELIPE
DE CAROLIS atrai as atenções do público, por protagonizar a peça, na
pele de um jovem que parece o único ser real, no meio de seres e entidades
voláteis. FELIPE se projetou num musical
da dupla M&B, “O Despetrar da Primavera”, em 2008, e, de lá para cá, atuou em grandes
espetáculos, musicais ou não, ousando, com total sucesso, investir, também, na
função de produtor, como o faz nesta montagem, associando-se à M&B. Leva grande vantagem, para
conquistar a simpatia do público, graças a seu talento, carisma pessoal e ao do
personagem. Todos sentimos vontade de
levar o personagem para casa e tentar resolver o seu “problema”, o seu drama existencial.
Por ter atuado em outros musicais, FELIPE representa, canta e dança bem,
não encontra grandes desafios na composição do personagem, a não ser o de enfrentar a hercúlea tarefa de dominar o
canto, em solos ou duetos, numa
partitura de difícil resolução, como a de “PIPPIN”.
Nota-se o seu grande esforço e imensa dedicação nos números musicais, saltando, do conforto das notas ajustadas ao seu
registro vocal, de tenor, salvo engano, para as mais agudas, incluindo a
necessidade de apelar para os falsetes, tudo dando certo, no final. É uma alegria muito grande vê-lo em
cena, um prazer que se renova a cada peça
de que participa.
A TOTIA MEIRELES cabe a incumbência de “narrar” e conduzir o
espetáculo, como MESTRA DE CERIMÔNIAS /
LÍDER DA TRUPE TEATRAL, costurando as cenas e fazendo intervenções
absolutamente necessárias, com toques de um ótimo humor, que cabe à personagem, quando, para citar apenas
um momento, funciona como o “Google”
do ano 840 d.C., explicando, à
plateia, por exemplo, o que vem a ser “frísios”
e “visigodos” (um glossário ao
vivo). TOTIA é uma de nossas mais
completas atrizes e, sem dúvida, um
nome de respeito na galeria das grandes cantrizes
brasileiras. Nem me atrevo a dizer o número de grandes musicais de que participou, sempre com o maior brilhantismo. Jamais
a vi num papel menor ou numa atuação idem. Cada vez que entra em cena, nesta peça, parece que o palco fica mais
iluminado, com o acréscimo de sua luz própria. O seu papel, originalmente, foi
escrito para ser interpretado por um homem, como o fez, brilhantemente, o
grande Ben Vereen, na primeira
montagem de “PIPPIN”. No “revival”, de 2013, Patina Miller fez
o(a) personagem, mas não foi a primeira mulher a representá-lo(a), uma vez que, no Brasil, como já disse, o papel foi
defendido, muito antes, por Marília Pêra
e, depois, por Suely Franco, que a substituiu.
Meus amigos, alguém pode me dizer o
que é NICETTE BRUNO em cena? Ou
melhor, DONA NICETTE, como merecem
ser tratadas todas as grandes divas
do TEATRO? E num musical? Ela não é, somente, uma atriz; é uma “entidade”, uma “deusa”,
que nos faz arrepiar, saudada, com calorosos aplausos e gritos, quando aparece
no palco, antes mesmo de dizer a primeira palavra; arranca aplausos da plateia
durante toda a sua breve, porém marcante cena; deixa-nos emocionados e
orgulhosos de seu impecável trabalho, com sua jovialidade, do alto dos seus 85 anos de idade e cabeça de uma “mocinha”.
Sua baixa estatura ganha extensão e projeção, no palco; cresce, pela força de
seu talento, carisma, simpatia e, também, pela personagem que interpreta, a irreverente, libertária e hedonista,
para a quem “o prazer é o supremo bem da
vida humana”, BERTHE, avó de PIPPIN, a qual vive autoexilada, por
não aprovar o casamento de CARLOS MAGNO
com FASTRADA, com a qual não tem a
menor afinidade. Entra em cena, cercada por um grupo de rapazes “sarados” e tira
proveito dessa situação, insinuando, de forma levemente “picante”, uma, talvez,
“intimidade” com eles. É hilária e inesquecível a sua participação na peça, o que atinge o auge, no final da
cena, quando, cantando, a seu jeito, com a alma, mais que com a voz, a canção “A Vida É Uma Só” (“No Time At All”), dá conselhos ao neto, para
que viva intensamente e desfrute dos prazeres da carne, destacando-se um refrão, no qual a personagem solicita, à plateia, que a acompanhe, enquanto a letra da canção é projetada ao fundo: “VAI, QUE A VIDA É SÓ UMA
/ VAI SE BAGUNÇAR, DEPOIS A GENTE TE ARRUMA / VAI SEM PENSAR, PORQUE NÃO TEM
TALVEZ / VIVER É SÓ UMA VEZ”.
A figura do REI
CARLOS MAGNO combina muito com o “physique
du role” e a postura do ator JONAS BLOCH. O papel lhe cai muito
bem e ele o defende com competência, deixando bem claros os traços de sua personalidade,
extrapolados, propositalmente, pela dramaturgia. É inconsequente;
debochado; engraçado; ausente, para os seus súditos; e, até mesmo, cruel. JONAS
o faz próximo a um anti-herói.
FASTRADA,
a “MÁ-drasta” de PIPPIN, é interpretada por ADRIANA GARAMBONE, outra muitas vezes
presente nos musicais que levam a chancela
de M&B. Ótima atriz, ainda canta
e dança com perfeição, nada ficando a dever às atrizes que já interpretaram a personagem, fora do Brasil. Fica bem implícita uma
incestuosa relação, entre FASTRADA e
seu filho LEWIS. Na segunda vez em
que assisti à peça, a personagem foi vivida,
extremissimamente bem, por BEL LIMA.
A direção da peça soube
explorar a veia cômica de CRISTIANA
POMPEU, que interpreta CATHARINA,
uma viúva, fazendeira, “do interior mineiro”, com um forte sotaque regional, um
verdadeiro achado. CRISTIANA é muito
espontânea e construiu a personagem
na medida certa, sem apelações para o humor barato. Suas cenas são bem
descontraídas e agradam, sobremaneira, ao público.
GUILHERME
LOGULLO também desempenha bem sua
função, como LEWIS, o meio-irmão do protagonista, dentro do que se pode
considerar um bom trabalho.
Para finalizar a apreciação sobre os personagens de proa da peça, reservo um comentário especial
para o menino LUIZ FELIPE MELLO, que
vive o personagem THEO, filho de CATHARINA e que se dá bem com PIPPIN (A boa relação entre os dois vai
sendo construída paulatinamente.), durante um ano, tempo que durou a relação
entre este e aquela, na fazenda. O menino, que deve ter doze ou treze anos – na
verdade, um pré-adolescente -, é veterano na TV e já atuou em diversas peças
teatrais, inclusive com M&B, em “Nine – Um Musical Felliniano”,
espetáculo no qual, bem mais jovem, interpretava o personagem Guido Contini,
quando criança. Ele é um ator mirim
muito firme e determinado, que leva a sério o que faz e me surpreendeu bastante,
ao cantar, atingindo notas altas e sustentando-as; apesar de pequeno, sua voz
já está bastante amadurecida, para a sua idade. É uma grata surpresa, na peça.
Ao todo são 19 atores, em cena, contando com os bailarinos, que também atuam. Além dos que interpretam os
principais personagens, sobre os
quais já falei, todos os demais, que vivem dezenas
de personagens, dentro da trupe
teatral, têm um desempenho excelente. São eles, por ordem alfabética: ANALU PIMENTA, BEL LIMA, BRUNINHA ROCHA, DANIEL LACK, FLÁVIO ROCHA, JÉSSICA AMÊNDOLA, JOÃO FELIPE SALDANHA, PAULO VICTOR, RODRIGO CIRNE, SÉRGIO
DALCIN e VICTORIA AGUILLERA.
Na coordenação
artística, TINA SALLES é
fundamental, uma vez que dela depende toda a organização dos ensaios, obedecendo ao método de trabalho dos
amigos e parceiros de longa data, M&B,
desde 2003, para que tudo seja feito
da melhor maneira e no menor tempo possível. Ela otimiza os ensaios, de modo a
que tudo flua a contento.
Um pouco do “release”, enviado por PEDRO
NEVES (FACTORIA COMUNICAÇÃO – ASSESSORIA DE IMPRENSA): “Este
é um musical com muito mais substância e camadas do que se imagina. ‘PIPPIN’ é uma comédia cínica, que traz um
protagonista absolutamente moderno, cheio de dúvidas e questionamentos, com um
vazio existencial que jamais será preenchido. É um dos motivos pelo qual é
chamado de ‘Hamlet’ dos
musicais. Ele rejeita antigos clichês e quebra com algumas tradições do
gênero. Como se não bastasse, ele retoma essa ideia do ‘teatro dentro
do teatro’ e traz um grupo teatral e a figura da MESTRA DE CERIMÔNIAS, para contar a história”, diz CHARLES
MÖELLER. E continua: “O musical fala muito sobre a decisão entre
enfrentar um mundo real ou permanecer em um mundo de aparências ou de magia,
como o que é mostrado em cima de um palco. É um tema muito atual, em um mundo
de redes sociais e realidades falseadas”.
A
cena de abertura do musical, com a
emblemática “Temos Mágicas” (“Magic To
Do”), já prende a atenção total do espectador e é um prenúncio do que vai acontecer
em duas horas e meia de espetáculo, com um
intervalo. O conjunto música/coreografia/figurinos/iluminação
é o grande responsável por isso.
Outras
cenas também merecem destaque e, para elas, chamo a atenção de quem vai
assistir ao musical. Dentre
tantas, posso citar a da batalha contra os visigodos; a sugestiva cena de uma
orgia sexual, toda coreografada e sem qualquer apelação ou elemento de mau
gosto; outra em que FASTRADA
encoraja PIPPIN a trair e matar seu
próprio pai, para, depois, ela colocar, no trono, seu outro filho, LEWIS (Prestem atenção à brilhante
ideia do jogo de xadrez!); e o “gran
finale”, que surpreende bastante.
FICHA TÉCNICA:
Um espetáculo de CHARLES
MÖELLER & CLAUDIO BOTELHO
Texto: ROGER O. HIRSON
Música & Letras: STEPHEN SCHWARTZ
Elenco: Felipe de Carolis (Pippin), Totia Meireles (Mestra de Cerimônias / Líder da Trupe Teatral) Nicette Bruno (Berthe), Jonas Bloch (Carlos Magno), Adriana Garambone (Fastrada), Cristiana Pompeo (Catharina), Guilherme Logullo (Lewis), Luiz Felipe Mello (Theo), Analu Pimenta
(Trupe), Bel Lima (Trupe), Bruninha Rocha (Trupe), Daniel Lack (Trupe), Flávio
Rocha (Trupe), Jéssica Amêndola (Trupe), João Felipe Saldanha (Trupe), Paulo
Victor (Trupe), Rodrigo Cirne (Trupe), Sérgio Dalcin (Trupe) e Victoria Aguillera
(Trupe).
Músicos:
Heberth Souza (regência / teclado 1), Evelyne Garcia (teclado 2 e acordeon), Leonardo
Fantini (violino), Tassio Ramos / Leandro Vasques (contrabaixo elétrico e
acústico), André Barros / Thiago Trajano (guitarra e violão), Márcio Romano
(bateria e percussão), Diogo Gomes (trompete e flugelhorn) e Alex Freitas
(flauta, piccolo, clarinete, sax soprano e sax alto)
Direção : Charles Möeller
Versão Brasileira: Claudio Botelho
Direção Musical: Jules
Vandystadt
Orquestração Original:
Larry Hochman
Arranjos Adicionais:
Jules Vandystadt
Supervisão Musical:
Claudio Botelho
Coreografia: Alonso Barros
Cenografia: Rogério Falcão
Figurino: Luciana Buarque
Design de Som: Marcelo Claret
Iluminação: Rogério Wiltgen
Visagismo: Beto Carramanhos
Coordenação Artística: Tina Salles
Coreografia: Alonso Barros
Cenografia: Rogério Falcão
Figurino: Luciana Buarque
Design de Som: Marcelo Claret
Iluminação: Rogério Wiltgen
Visagismo: Beto Carramanhos
Coordenação Artística: Tina Salles
Produção de Elenco:
Marcela Altberg
Produção Executiva: Luciana Conde
Produção Executiva: Luciana Conde
Coordenação de
Produção: Carla Reis
Direção de Produção:
Beatriz Braga
Produtor Associado:
Felipe de Carolis
Realização: M&B e E_MERGE
Realização: M&B e E_MERGE
SERVIÇO:
Temporada: De 03 de agosto a 21 de outubro de 2018.
Local: Teatro Clara Nunes.
Endereço: Rua Marquês de São Vicente,
42 – Shopping da Gávea – 3º andar – Gávea – Rio de Janeiro.
Dias e Horários: 5ª feira, às 17h; 6ª feira e sábado, às 21h;
domingos, às 19h30min.
Valor dos Ingressos: 5ªs e 6ªs feiras: R$50,00 (balcão) e R$80,00
(plateia); sábado e
domingo: R$70,00 (balcão) e R$120,00 (plateia).
domingo: R$70,00 (balcão) e R$120,00 (plateia).
Classificação Indicativa: 12 anos.
Duração: 150 minutos.
Gênero: Musical.
Considero “PIPPIN” uma OBRA-PRIMA,
como já disse, e a montagem atual, por ser lúdica, alegre e moderna, merece muito ser vista, até mais de uma vez, por quem aprecia o gênero musical, na certeza de que
pagarão por um produto de excelente qualidade, o qual, terminada a sessão, fica,
indelevelmente, guardado na memória afetiva dos amantes do TEATRO e, em especial, dos musicais, como eu.
E
VAMOS AO TEATRO!!!
OCUPEMOS
TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!
COMPARTILHEM
ESTA CRÍTICA, PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS
DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO
BRASILEIRO!!!
(FOTOS: DANIEL COELHO.)
GALERIA PARTICULAR
(FOTOS: JOÃO PEDRO BARTHOLO.)
Com Totia Meireles.
Com Bel Lima.
Com Cristiana Pompeo.
Com Guilherme Logullo.
Com Rodrigo Cirne.
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