3 MANEIRAS
DE TOCAR
NO ASSUNTO
(E MUITO MAIS QUE
TRÊS MOTIVOS
PARA SE ASSISTIR AO
ESPETÁCULO.)
Para quem aprecia o bom
TEATRO e sabe reconhecer que uma peça será boa, ao final, logo nos
primeiros cinco minutos de ação, não há como não assistir a “3 MANEIRAS DE
TOCAR NO ASSUNTO”, indiscutivelmente, um dos melhores monólogos a que
assisti, neste ano de 2019, e, por que não dizer, na minha vida de “rato-de-TEATRO”,
em cartaz no Teatro Poeirinha (VER SERVIÇO.).
E, se a peça se
propõe a mostrar apenas três maneiras para se abordar uma temática das
mais importantes a ser visitada e revisitada, nos dias de hoje, o que não
faltam são motivos para se conferir o espetáculo, escrito e interpretado
por LEONARDO NETTO, sob a direção de FABIANO DE FREITAS.
Dizer, como está no “release”,
enviado por PAULA CATUNDA (ASSESSORIA DE IMPRENSA), que o solo “aborda
a homofobia na sociedade moderna” seria muito pouco. No mesmo
“release”, porém, há um trecho que apresenta o espetáculo
como “um manifesto contra a intolerância”. Talvez seja, até,
muito mais do que isso.
SINOPSE:
Interpretado por LEONARDO NETTO, o espetáculo se apresenta sob a forma de três solos independentes, os quais colocam em pauta questões relacionadas à homossexualidade e ao preconceito e à intolerância contra o homossexual e a comunidade LGBT, em geral.
No primeiro, uma “aula” de como se praticar o “bulliyng”,
baseado em histórias reais de crianças e jovens, que sofreram com a
intolerância e o preconceito na escola, sem falar no depois, na vida.
O segundo parte do depoimento ficcional de um
dos participantes da “Revolta de Stonewall”, ocorrida em junho de
1969, em Nova York, marco fundamental da luta pelos direitos da
comunidade LGBT, que completou 50 anos, em 2019.
Para fechar a tríade, o último texto foi
construído a partir de falas do ex-deputado federal Jean Wyllys,
proferidas entre janeiro de 2011 e dezembro de 2018,
Como se pode notar, o
que desfila, em cena, não é fruto da imaginação do dramaturgo, não é uma
alucinação, uma fantasia. A ficção se alimenta de fatos reais e muito tristes,
além, obviamente, de intoleráveis, inaceitáveis, sob todos os pontos de vista.
Um tema para três solos
curtos, entretanto poderia ser abordado numa infinidade de outros,
infelizmente, uma vez que a temática está presente, de forma negativa, no dia a
dia de todos nós, no Brasil e, creio que, em todas as partes do mundo, em
maior ou menor escala. Entre nós, a temática passou a ganhar um destaque maior
ainda, a partir da eleição do atual presidente da república, um ser
assumidamente homofóbico e instigador do ódio contra a grande massa que forma a
população LGBT, no Brasil, país em que se mata, em que se ASSASSINA o maior
número de homossexuais no mundo.
O
espetáculo, inédito, “é um manifesto artístico contra a homofobia
na sociedade moderna”. É um grito de alerta e de revolta contra a
discriminação e toda a sorte de maldades praticadas contra cidadãos de bem, que
trabalham, cumprem seus deveres, pagam seus tributos, impostos pela lei, e TÊM todo o direito de cuidar da sua vida sexual, íntima, que só a cada um interessa
e diz respeito. E todos merecem e TÊM de ser respeitados, por todo
mundo, porque, antes de sua orientação sexual, são seres humanos.
Que
bom é ter, de volta, o grande ator LEONARDO NETTO, acumulando dois ofícios
(Viva DONA FERNANDA MONTENEGRO, que adora usar este vocábulo: OFÍCIO!!!),
o de intérprete e de dramaturgo, na escritura de uma dramaturgia,
depois do grande sucesso que fez, em 2018, com “A Ordem Natural das Coisas”,
texto que foi indicado a vários Prêmios de TEATRO, tendo saído
vencedor num deles.
O
texto é bastante denso e cheio de citações de fatos reais, ocorridos no Brasil,
que tiveram alguma, ou grande, repercussão, cada um à sua época, mas que acabaram
por cair no esquecimento. E é muito bom que LEONADO volte a eles, para
dar uma “sacudida” em todos nós, mesmo os que compreendemos a dor e o
sofrimento por que passam os homossexuais e para que nos coloquemos ao seu
lado, na luta contra a discriminação a essa grande concentração de cidadãos
brasileiros, que é o que nos interessa, em primeiro lugar, mas que tem a ver
com gente do mundo inteiro. Durante o espetáculo, num mergulho ao
passado recente, voltamos a nos lembrar de fatos escabrosos, trazidos à luz pelo
autor: “Homofobia mata todo mundo: o pai,
que teve a orelha arrancada, por beijar o filho; os irmãos, que foram linchados,
por andarem abraçados. Não adianta achar que você está livre, porque você não é
‘gay’. Estamos vivendo um retrocesso de entendimento sobre isso, um conservadorismo
estúpido. A população LGBT, no Brasil, está alijada de quase setenta direitos
previstos na Constituição”.
O autor escolheu abordar o
tema por três vieses diferentes e todos muito fortes, um para cada texto:
Escola, Lei e Estado. Foi muito acertada a escolha, por se
tratarem, as instâncias eleitas por ele, de três suportes para a formação e o
sustento da cidadania.
O
primeiro solo recebe o título de “O HOMEM DE UNIFORME ESCOLAR”, e,
nele, é mostrada, de forma bastante real, a prática de “bullying”
homofóbico, que, por incrível que possa parecer, começa, muitas vezes,
em casa, ganha força na escola e chega ao ápice, quando o homossexual, já
totalmente abatido, enfraquecido, fragilizado, humilhado, chega à idade adulta.
Muitos não chegam a esse estágio da vida (“VIDA”?), porque são
assassinados ou cometem suicídio, ainda quando crianças e adolescentes, alguns. É de estarrecer!!! O público fica sabendo o que é o “bulliyng”, de que forma é
praticado e quais as suas consequências físicas e emocionais, por meio – e isso
é o mais triste - de histórias reais de crianças e jovens, marcadas,
emocionalmente, para o resto de suas vidas (Eu disse “vidas”?). Quero
acrescentar que, dos três, o primeiro solo foi o que mais me marcou e
incomodou, já que, como professor, da segunda fase do ensino fundamental até a
graduação, na universidade, por 47 anos de magistério, fui testemunha de
muito o que é relatado na peça, já tendo, inclusive, em várias
oportunidades, de ter de intervir a favor das vítimas dessa prática cruel,
covarde e “fascista”.
No
segundo, “O HOMEM COM A PEDRA NA MÃO”, que se baseia num fato
real, a “Revolta de Stonewall”, na ótica ficcional do depoimento de um dos participantes
do movimento, salta aos olhos a capacidade de o personagem narrar os
fatos de uma forma tão crível, nos mínimos detalhes descritivos, que nos levam
a “ver” as cenas. Somos transportados à madrugada do dia 28 de junho de 1969,
à cena do crime, e conseguimos “enxergar”, sem piscar os olhos, completamente
presos à “imantável” interpretação do ator, a ação dos
frequentadores de um reduto “gay” (“gays”, lésbicas,
travestis, “drag queens”), o bar “Stonewall Inn”, no bairro
do Village, contra a truculência da polícia, defendendo, os "gays", o seu sagrado
direito de se divertir à sua maneira, de forma privada, sem incomodar ninguém
nem invadir a privacidade de outrem. Vale lembrar que o bar funcionava de forma
clandestina, graças aos subornos pagos a uma polícia corrupta (Já havia naquela
época, e nos Estados Unidos da América. Quem diria, não é?), e que, até 1962,
“qualquer prática homossexual era considerada crime em todos os estados
americanos e a punição variava entre longa pena em regime fechado, trabalhos
forçados ou mesmo a pena de morte” (Vítor Paiva, via internet.).
IMAGENS DA "REVOLTA DE STONEWALL"
(Fotos de autoria desconhecida, encontradas na internet.)
(Fachada atual do prédio.)
Já
no último solo, parece que, com “pena” de nós, o autor nos
premia, com um delicioso momento de catarse. Chama-se este “O
HOMEM NO CONGRESSO NACIONAL”, construído a partir de falas do ex-deputado federal Jean Wyllys, entre janeiro de 2011 e dezembro de 2018, tempo em que durou sua atuação no Congresso e que
culminou com a renúncia ao cargo eletivo e um autoexílio, por receio de
drásticas consequências, a partir das graves ameaças de que vinha sendo vítima;
inclusive de morte. “Para criar o texto, LEONARDO assistiu (a)
e transcreveu discursos, pronunciamentos, entrevistas e declarações do Jean e,
cuidadosamente, criou o depoimento de um deputado ‘gay’ e ativista, na tribuna da
Câmara”. Nunca fui eleitor desse senhor, mas respeito-o, antes, como
cidadão, mas, também, pela sua luta em defesa própria e de seus pares. Creio
que qualquer pessoa, pertença ela à comunidade LGBT ou não, que preza o
respeito às diferenças e à liberdade e o sagrado direito de elas existirem, todos aqueles que
não julgam o outro e aceitam as pessoas como elas são hão de, como eu, dizer
que esse ex-parlamentar me representa. Com este último texto, o espetáculo
é encerrado com chave-de-ouro e consegue “lavar a nossa alma”, aliviando, um
pouco, a forte tensão a que somos submetidos, nos dois anteriores.
Reparem
que, de forma muito correta e coerente, o autor faz questão de utilizar o vocábulo “HOMEM”,
nos títulos dos três solos, já que, independentemente da orientação ou
preferência sexual dos três personagens, eles são HOMENS, no
sentido de gênero masculino e de ser humano.
Extraído
do “release” e muito oportuno: “Os textos propõem uma
interlocução direta com o público: o que há, afinal, de tão incômodo, maléfico
e repugnante na homossexualidade? Por que, através dos tempos, ela teve sempre
de ser punida? Por que a orientação sexual de uma pessoa a transforma num
cidadão de segunda classe, com menos direitos que o resto da população?”.
O texto é brilhante, todo escrito - muito bem
escrito, diga-se de passagem - numa linguagem fácil de ser entendida, para que
as mensagens possam ser absorvidas sem muito esforço. É direto, denso,
verdadeiro, construído com um vocabulário sem rebuscamentos e com construções
sintáticas muito simples, diretas; refinadas, porém. LEONARDO mostra-se,
mais uma vez, um grande conhecedor da língua portuguesa, o que não é tão
comum, nos dias de hoje. Tudo é dito com muita lucidez, sem o menor nível de
agressão ou vitimização exacerbada e o autor se mostra detalhista ao
extremo, para que nada fique subentendido ou varrido para debaixo do tapete.
Ele não nos poupa do sofrimento, em solidariedade aos personagens.
Eu e LEONARDO somos ligados, há muito tempo, pela
mesma paixão, o TEATRO, e creio que nunca deixei de assistir a uma montagem
em que seu nome estivesse impresso na ficha técnica, em qualquer que
fosse a função. Como ator, acho-o muito competente e prova disso ele já
me deu em muitas ocasiões, porém confesso que nunca vi um LEONARDO NETTO
representando com tanta força, verdade, profundidade, visceralidade. LÉO
se agiganta em cena, nos três monólogos, principalmente no último, se bem que,
no segundo, é impressionante a sua capacidade de nos envolver no relato dos
fatos, como se estivéssemos presentes ao triste episódio, o qual acabou se
tornando positivo, por gerar um certo empoderamento da população LGBT. Até
a página 5, pelo menos, porque, apesar de alguns avanços, ainda somos
obrigados a conviver, infelizmente, com o desrespeito e a agressão aos nossos
parentes e amigos “diferentes”.
Na
direção da peça, está o ator, dramaturgo e diretor
FABIANO DE FREITAS, “um artista-pesquisador dos temas LGBTI+”.
Assisti a “O Homossexual ou a Dificuldade de se Expressar” e “Balé Ralé”, os dois espetáculos que abordavam a mesma temática da montagem em
tela, a homossexualidade, ambos dirigidas por FABIANO, totalmente
diferentes da atual, em termos de estrutura, mas encontrei, nesta encenação,
o mesmo vigor e inteligência que ele empregou naquelas. Um bom diretor
completa o trabalho de um bom ator, e vice-versa.
A
direção optou, sabiamente, por uma economia na cenografia (ELSA
ROMERO) e concentrou mais o foco das atenções no ator e seu
magnífico trabalho. O pouco de concreto que há em cena é mais do que suficiente
para LEONARDO expressar as intenções do texto. Uma cenografia
simples, porém muito importante e integrada à proposta de encenação.
LUIZA
FARDIN é outro acerto, na ficha técnica, como figurinista,
havendo por bem vestir o ator-narrador-personagem com um traje de
passeio completo, um sóbrio e elegante terno cinza, risca de giz, que atribui,
ao personagem, um ar de seriedade e respeito, dentro dos padrões
convencionais da sociedade moderna, em contraste com o modo de se vestir, mais
descontraído, da maioria dos homossexuais, o que, por sinal, não faz a menor
diferença. Ou não deveria fazer. O caráter de ninguém não pode ser avaliado por
sua sexualidade nem por seu jeito de se trajar. Mas achei muito boa a proposta.
Outro
ponto alto da montagem se concentra na ótima iluminação, assinada
por RENATO MACHADO.
Para
sublinhar alguns dos mais importantes momentos da peça, entra uma ótima trilha
sonora, criada por RODRIGO MARÇAL e LEONARDO NETTO.
MÁRCIA
RUBIM é a responsável pela direção de movimento,
que deixa o ator muito à vontade e impede que a peça, que dura 80 minutos, possa gerar algum momento
de monotonia ou simples diminuição de ritmo.
Para
atingir, externamente, a construção do visual dos personagens, o espetáculo conta com um bom trabalho de visagismo, a cargo de MÁRCIO MELLO.
FICHA TÉCNICA:
Texto e Atuação: Leonardo Netto
Direção: Fabiano de Freitas
Cenografia: Elsa Romero
Figurino: Luiza Fardin
Cenografia: Elsa Romero
Figurino: Luiza Fardin
Iluminação: Renato Machado
Direção de Movimento: Márcia Rubin
Trilha Sonora: Rodrigo Marçal e Leonardo Netto
Visagismo: Márcio Mello
Vídeos: Leonardo Netto
"Video Mapping": Renato Krueger
Trilha Sonora: Rodrigo Marçal e Leonardo Netto
Visagismo: Márcio Mello
Vídeos: Leonardo Netto
"Video Mapping": Renato Krueger
"Design" Gráfico: Lê Mascarenhas
Fotos: Dalton Valério
Assessoria de Imprensa: Paula Catunda
Fotos: Dalton Valério
Assessoria de Imprensa: Paula Catunda
Mídias Sociais: Rafael Teixeira
Operação de Luz: Bruno Aragão
Operação de Som e Vídeo: Rodrigo Marçal
Operação de Luz: Bruno Aragão
Operação de Som e Vídeo: Rodrigo Marçal
Direção de Produção: Luísa Barros e Rafael Faustini
Realização: Fulminante Produções Culturais, Faustini Produções e Produtora Luísa
SERVIÇO:
Temporada: De 03 de outubro a 22 de dezembro de 2019.
Local: Teatro Poeirinha.
Endereço: Rua São João Batista, 104 – Botafogo - Rio de Janeiro.
Dias e Horários: De 5ª feira a sábado, às 21h; domingo,
às 19h.
Informações: (21) 2537-8053.
Horário de Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a
sábado, das 15h às 21h; domingo, das 15h às 19h.
Valor do Ingresso: R$50,00 (inteira) e R$25,00 (meia
entrada).
Duração: 80 minutos.
Capacidade do Teatro: 49 lugares.
Classificação Etária: 14 anos.
Gênero: Drama.
O encerramento do espetáculo é
impactante, com o ator imóvel, encostado na parede do fundo e sobre eles
são projetadas muitas imagens (fotografias, vídeos e filmes), ligadas aos brutais
crimes cometidos contra os homossexuais, num belo trabalho de edição. O responsável pelos vídeos é o próprio LEONARDO NETTO e, pelo "video mapping", RENATO KRUEGER.
“3 MANEIRAS DE TOCAR NO ASSUNTO” é um
grande desafio e uma prova de coragem dos envolvidos no projeto, uma vez que,
por motivos diversos, as pessoas procuram não tocar no assunto. Mas é preciso
tocar, sim. E muito. É preciso gritar e lutar pelo direito, inquestionável, de qualquer cidadão,
de exercer a sua cidadania e viver sua vida sexual da maneira como desejar. Nesse
sentido, além de tantos outros motivos, a peça nos apresenta um, em
especial: é fundamental na luta para o esclarecimento sobre o que significa a homossexualidade
e de como os homossexuais TÊM de ser tratados. É um espetáculo de
utilidade pública.
É preciso dizer que recomendo, sem a menor restrição, a peça e que espero revê-la, muito em breve?
Leonardo Netto e Fabiano de Freitas.
E VAMOS AO TEATRO!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS
DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI!!!
RESISTAMOS!!!
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TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
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(FOTOS: DALTON VALÉRIO.)
(GALERIA PARTICULAR.
FOTOS: GILBERTO BARTHOLO e
ANA CLÁUDIA MATTOS.)
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ANA CLÁUDIA MATTOS.)
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