quinta-feira, 2 de março de 2017


 RENT

 

 

(UM MUSICAL ATUAL, VIBRANTE, DELICIOSO, HUMANO, REALISTA

E TRISTE.)

 
 



            O último adjetivo do subtítulo desta crítica pode parecer destoante, em relação aos que o antecedem, até porque não costuma combinar com “musical”; mas, se é realista, por que não ser triste também? A vida não é cor de rosa; a vida é feita de vários matizes, uma paleta de cores infindáveis, quentes e frias, alegres e tristes. E ninguém é feliz 24 horas por dia, desde que nasce até morrer.

Corria o ano de 1998. Fiz eu uma viagem a New York, para uma comemoração em família. Na verdade, a comemoração era apenas um pretexto, para que eu pudesse me fartar de TEATRO, me lambuzar, como uma criança, principalmente de musicais, na Broadway.

Pude assistir, então, aos grandes, na época, em cartaz: “Miss Saigon”, Cats”, “O Fantasma da Ópera”, “O Rei Leão”, “A Bela e a Fera” e outros. Um, porém, oriundo da “off-Broadway”, era a grande sensação de crítica e de público. Um espetáculo revolucionário, libertador, algo que mexeu com as estruturas da sociedade americana, ameaçou o “american way of life”, da mesma forma como acontecera, em 1968, com “Hair”.
 
 
 








            Falo de “RENT”, que vi com o elenco original e que me arrebatou, fazendo-me, no dia seguinte, procurar a mega loja da Virgin, em Times Square, à procura do CD, com a trilha sonora da peça, ótima, por sinal. Hoje, além de ouvi-la, constantemente, também me delicio com o DVD da versão cinematográfica, lançada, nas telonas, em 2005, também muito boa.
 
 
 
 
 
 
 



            A vida passa, o tempo voa, mas o que é bom e atual permanece “numa boa”.

            Há quase vinte anos, confesso que, apesar de ter amado o espetáculo, me assustei um pouco com o que vi no palco, que me pareceu muito mais próximo à realidade norte-americana, porém um pouco distante da nossa (felizmente, pensava eu, sem muito refletir, naquele momento, sobre a realidade brasileira).

A AIDS, no Brasil, já era um fantasma, que assustava, e matava, mas nem tanto como lá, e a chegada do AZT trazia esperanças para os portadores do vírus HIV; a luta por um teto, o mínimo para a conquista da dignidade humana; a resistência contra a exploração humana; o grito pelo direito à cidadania; a convivência com o horror das drogas... Talvez eu não tivesse tantos motivos para me impressionar demasiadamente com aquele texto, mas, na verdade, todos aqueles problemas tinham também as cores da nossa bandeira.

            O que mudou, de lá para cá? Quase nada. “RENT” é, portanto, atualíssima, “here, there and everywhere” (em quase todos, pelo menos).

            O espetáculo conta um ano na vida de oito jovens, que têm de encarar as aventuras e desventuras de seus amores, amizades, conflitos, problemas financeiros, o transparecer da sexualidade e a assunção de suas preferências sexuais (não opções), o conflito íntimo com as drogas e o embate com a finitude humana. “RENT” é uma corrente de amor, que, nem sempre, é suficiente para poupar vidas. Mas vale pela tentativa.

            O projeto é do ator BRUNO NARCHI, assim como a produção, ao lado de BEL GOMES. BRUNO confessa ter sido “RENT” o detonador de sua vontade de fazer musicais. Que bom que isso aconteceu, BRUNO!!! Devemos mais uma a “RENT”.
 
 
 
Bruno Narchi.
 
 


De início, a ideia era apenas uma montagem amadora, para satisfação própria, só para realizar um desejo, uma espécie de “capricho”. Felizmente, o projeto ganhou força e a adesão de gente muito competente na área do TEATRO MUSICAL, experiente e importante, que acabou por gerar uma obra que honra e dignifica o teatro MUSICAL BRASILEIRO.

            A jornada de BRUNO, para erguer “RENT”, iniciou-se em 2014, com a compra dos direitos da peça, em contato com os escritórios dos que detêm tais direitos, nos Estados Unidos. A partir daí, foram chegando os companheiros de “viagem”, os que acreditaram que aquele “querer” poderia ser transformado num “poder”. E que PODER!!!

            A opção por um horário alternativo é um dos grandes achados desta produção. Se o espetáculo fosse apresentado no chamado “horário nobre” (de 5ª feira a domingo), segundo NARCHI, teriam de concorrer com grandes musicais em cartaz. O horário das 3ªs e 4ªs feiras é perfeito, pois são dois dias de poucas ofertas no mercado, além de um dado muito especial: o elenco, com acontece de fato, poderia contar com grandes nomes que atuam, simultaneamente, nos outros dias, em outros musicais, como THIAGO MACHADO, MYRA RUIZ, TIAGO MONTEZ e outros. Deu tudo certo e quem lucra mais é o público amante de musicais.

            Ainda que não tenha condições de me lembrar de detalhes da versão a que assisti na Broadway, há quase duas décadas, e pela qual me apaixonei, posso afirmar, sem falso ufanismo, que a nossa não fica nada a dever àquela.



 



 
SINOPSE:
 
O musical foi composto pelo dramaturgo norte-americano JONATHAN LARSON (1960-1996), que, infelizmente, não chegou a ver a estreia de sua obra, pois morreu um pouco antes, e conta a história de um grupo de oito amigos, que vivem no bairro do Village, em New York no final dos anos 80.
 
Aborda alguns temas que marcaram aquela época, e que nos acompanham até hoje, como o desemprego, o uso e a dependência de drogas, a homossexualidade, a liberação sexual e a AIDS, além da falta de um teto para morar e o poder do capitalismo selvagem.
 
A história começa na véspera de natal, na cobertura de uma antiga editora musical, um “loft” industrial, onde moram MARK (BRUNO NARCHI), cineasta perdido, que saiu debaixo das asas de seus pais, para tentar a sorte na cidade grande, e ROGER (THIAGO MACHADO), músico ex-integrante de uma quase bem-sucedida banda de “punk rock”, que perdeu sua inspiração, ao se ver frente a frente com a morte, por ser soropositivo.
 
Em meio ao frio congelante, MIMI (INGRID GAIGHER), a vizinha do andar de baixo, bate na porta deles, em busca de fogo, e acaba reacendendo a vida de ROGER.
 
COLLINS (MAX GRÁCIO), gênio da computação e professor universitário, aparece na cidade, para passar a noite de Natal com seus amigos. Após um assalto, acaba caído em um beco qualquer, onde encontra seu(sua) salvador(a), ANGEL (DIEGO MONTEZ), percussionista de rua e “drag queen”.
 
BENNY (MAURO SOUSA), antigo amigo e proprietário do imóvel, aparece, para cobrar o aluguel e se mostra insensível ao drama dos dois rapazes.
 
MAUREEN (MYRA RUIZ), ex-parceira de MARK, é uma artista performática, que prepara seu protesto, contra a cobrança e a desapropriação dos terrenos da região, com a ajuda de JOANNE (PRISCILA BORGES), advogada feminista e sua namorada.
 
 
A partir de uma única noite, acompanhamos o recorte de um ano na vida dessas pessoas. “Um close” nos encontros e desencontros, na amizade, no agora, na saudade, na solidão, na companhia, na vida, na perda, no cuidar do outro e, acima de tudo, no amor.
 
 
Para garantir sua sobrevivência, o grupo percebe a necessidade de uma união, para lutarem, juntos, contra todos os percalços e, assim, poder resolver seus problemas pessoais, profissionais, existenciais e financeiros. O binômio amor-união seria a única tábua de salvação para eles. Ou não?
 

 
 
 


O musical, que revolucionou a Broadway, comemorou, em 2016, 20 anos de história. Estreou como um musical Off Broadway, ganhando, logo, a meca dos musicais. Hoje, é um dos que permaneceram, por mais tempo, em cartaz, na Broadway (12 anos consecutivos), de 1996 a 2008, no Nederlander Theatre, e venceu o “Tony Award”, o Oscar do TEATRO, no nicho “musicais”, em quatro categorias, a saber: Melhor Musical, Melhor Texto, Melhor Trilha Sonora e Melhor Ator Coadjuvante. Também fez jus ao Prêmio Pulitzer de Teatro.

Como já foi dito, está entre os espetáculos de carreira mais longeva, na história da Broadway, já tendo sido apresentado, também, em versões locais, em mais de 100 cidades, traduzida para 22 idiomas. Um verdadeiro fenômeno do TEATRO MUSICAL!!! Pode-se dizer que se trata de uma obra universal, por ter ganhado o mundo e pelas temáticas, sempre atuais, que aborda.

No Brasil, o musical já havia sido encenado numa primeira versão, em 1999, à qual, infelizmente, não tive a oportunidade de assistir. A atual estreou no dia 14 de dezembro de 2016, ano em que se comemoraram os 20 anos de sua estreia, na Broadway. Aqui, a peça pode ser vista no Teatro Frei Caneca, em São Paulo.
 
Talvez o espetáculo também tenha dado tão certo, pelo que diz seu idealizador, BRUNO NARCHI: “Um grupo de amigos falando de um grupo de amigos”.
 
Retirado do “release” da peça, enviado por BETH GALLO (MORENTE FORTE COMUNICAÇÕES), “Poético, visceral e humano, ‘RENT’ não pode ser visto apenas como ‘mais um musical’. (Realmente, não o é, acrescento.), Revolucionário e atual, ele nos envolve, com nossos questionamentos diários, convida-nos para a sua realidade palpável e nos provoca, com nossas semelhanças. Uma trama de escolhas e consequências, que nos mostram a fragilidade da vida, a velocidade do tempo e a força de um sentimento. A busca por uma voz. A vida mensurada em amor...”.

            Não sou chegado a listas do tipo “Top 10 Qualquer Coisa”, mas, se o fosse, “RENT”, com toda certeza, faria parte dela. O texto, além de ser ótimo, é quase todo cantado e as canções são lindas e com letras muito expressivas.
 
           Não tive acesso ao original, mas agrada-me muito a versão, de MARIANA ELISABETSKY, um dos motivos do sucesso desta montagem. Ela deve ter tido um trabalho hercúleo, na transposição da linguagem do Village para a nossa. Reconheço que quem vai ao teatro sem saber nada sobre a peça, a princípio, poderá sentir um pouco de dificuldade para entender o enredo, mas, se ficar atento ao texto e às entrelinhas, logo, logo, vai se encantar pelo que vê e ouve.


 




 
 
 
 

 
 
 

 
FICHA TÉCNICA:
 
Texto: Jonathan Larson
Versão Brasileira: Mariana Elisabetsky
Direção: Susana Ribeiro
Direção Musical: Daniel Rocha
Direção de Movimento e Coreografia: Kátia Barros
Cenografia: André Cortez
Figurino: Fause Haten
Visagismo: Leopoldo Pacheco
Iluminação: Wagner Freire
 
Elenco: Myra Ruiz, Bruno Narchi, Diego Montez, Thiago Machado, Ingrid
Gaigher, Mauro Sousa, Max Grácio, Priscila Borges, Thuany Parente, Carol Botelho, Lívia Graciano, Zuba Janaína, Bruno Sigrist, Arthur Berges, Philipe Azevedo, Felipe Domingues, Guilherme Leal e Kaíque Azarias.
 
Produtores Associados: Bruno Narchi e Bel Gomes
Realização: IBELIEVE R.A. e BELELEO PRODS.
 


 

 



            Por oportuno, faz-se necessário dizer que o musical foi inspirado na ópera “La Bohème”, de Giacomo Puccini e que todo o texto, incluindo as belas canções (adoro “Seasons Of Love”), foi escrito pelo dramaturgo LARSON.

            Também é bom lembrar que, estruturalmente, o musical se diferencia do modelo tradicional, pois, além de ser quase todo feito por meio de músicas, há diálogos também cantados, mesmo sem o acompanhamento da ótima banda ("a capella"), que dá suporte aos atores/cantores/bailarinos.

            O musical é contagiante, arrebatador, humano, lindo por vários motivos.

            Pelo texto, em si, pela costura dos temas, entrelaçados, formando uma teia gigante. Por sua seriedade, ainda que quebrada, vez por outra, por uma tentativa de humor, que até funciona, a despeito de ser áspero, cáustico, por vezes, recheado de muito sarcasmo, voltado para a crítica (toda forma de humor é crítica). Os personagens, quase que sem querer, zombam de si próprios, talvez porque possa doer menos.

            Pela segura e competente direção de SUSANA RIBEIRO, que, além de grande diretora de espetáculos que não são musicais, já provou que entende do assunto, quando dirigiu o grande sucesso “Cazuza – Pro Dia Nascer Feliz, O Musical”. SUSANA mensurou bem o potencial de cada membro de seu rico elenco, distribuiu, muito cuidadosamente, os papéis e soube explorar a potencialidade de cada um, quer interpretando, quer cantando.
 
 
 

            Pela magnífica atuação de todo o elenco, sem nenhuma exceção, inclusive dos profissionais que interpretam personagens fora do eixo dos oito “protagonistas” (acho que posso assim me referir a estes). Eu não saberia dizer quem me tocou mais, quem se destacou, uma vez que todos brilham, em seus momentos solos e quando não estão em tanta evidência. É comovente vê-los interpretando e, mais ainda, cantando. Que vozes privilegiadas! Quanto sentimento em cada canção! Impossível, em algumas cenas, conter as lágrimas!!!
 
 
 





“RENT” não é um musical a que os espectadores assiste e, depois, vão saborear suas pizzas, jogando conversa fora. É para ser visto e ”digerido” em casa, em reflexões solitárias ou em conversas com outras pessoas.

            Pela excelente direção musical de DANIEL ROCHA e pela ótima banda, os quais atiçaram minha memória musical e me reportaram àquele CD da versão original. Como eu gostaria de ter as nossas versões, em português, à minha disposição, para ouvi-las quando quisesse!!!

            Pela perfeita cenografia, de ANDRÉ CORTEZ, que se supera a cada trabalho. Tudo bem feito e bastante prático, deixando o palco mais livre para as atuações.

            Pelos corretos e acertados figurinos, de FAUSE HATEN, simples, realistas e bonitos.

Pela ótima direção de movimento e coreografia, de KÁTIA BARROS. O que não falta é dinamismo em cena.

Pelo acertado visagismo, de LEOPOLDO PACHECO, mostrando o quanto de dor e sofrimento, de resistência e verdade há em cada personagem.

Pela linda iluminação, de WAGNER FREIRE, outro que só faz crescer, a cada novo trabalho. Que luz linda!

Por ser “RENT”

Por ser “RENT”

Por ser “RENT”...

 
 



 
Grand finale!!!

 
 

 
SERVIÇO:
 
Local: Teatro Frei Caneca.
Capacidade: 600 lugares.
Endereço: Shopping Frei Caneca – Rua Frei Caneca, 569 – 7º andar – São Paulo.
Temporada: Até 29 de março de 2017.
Dias e Horários: Às 3ªs e 4ªs feiras, às 21h.
Horário de Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a domingo, a partir das 13h.
Telefone da Bilheteria: (11) 3472-2229.
Aceita todos os cartões de débito e crédito; não aceita cheque.
Estacionamento do Shopping - R$10,00, as duas primeiras horas.
Vendas: 4003.1212 - www.ingressorapido.com.br
Valor do Ingresso: R$100,00, com direito a meia-entrada, para quem fizer jus ao benefício.
Duração: 150 minutos.
Recomendação Etária: 14 anos.
Gênero: Musical.
 

 
 
O MAGNÍFICO ELENCO:
 
 
 




 
 
 
 


















            Infelizmente, por compromissos assumidos em outros trabalhos, o elenco sofrerá algumas alterações, a partir de março (já houve uma ou outra em fevereiro), entretanto, como o que não nos falta, graças aos DEUSES DO TEATRO, é gente competente para assumir substituições, não serão baixas, e sim acréscimos, tenho a certeza disso.

            Espero que consigam vir para o Rio de Janeiro, quando, poderei rever o espetáculo muitas vezes, como é meu desejo e hábito, sempre que me apaixono por um espetáculo, principalmente um se for musical; principalmente um “RENT”.
 
 
 
 
(FOTOS: DIVULGAÇÃO.)  





 GALERIA PARTICULAR:
 
 
AplausoS 1!


Aplausos 2!


Com Myra Ruiz e Diego Montez.


Com Bruno Narchi.


Com Thuany Parente.


Com Thiago Machado.





 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



 

 


 

 

 

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