BOQUINHA –
E ASSIM SURGIU O MUNDO
(CIÊNCIA x POESIA, TUDO JUNTO E MISTURADO,
EM PROL DO BOM TEATRO.)
Cá estou
eu, mais uma vez, atrevendo-me a escrever sobre TEATRO INFANTIL, que não é bem a minha “praia” e que só faço, bissextamente,
quando o espetáculo muito me encanta, como foi o caso deste “BOQUINHA – E ASSIM SURGIU O MUNDO...”,
o mais recente texto de TEATRO, para
crianças (e para adultos também), escrito por LÁZARO RAMOS, um monólogo estrelado por ORLANDO CALDEIRA, com direção
do próprio LÁZARO e de SUZANA NASCIMENTO, em cartaz, em
meteórica temporada, no Mezanino do
Espaço SESC.
Este é o
terceiro espetáculo infantil que sai da cabeça (e do coração) de LÁZARO RAMOS. Os dois anteriores
fizeram boas temporadas, no Rio de Janeiro
e em São Paulo, “A Menina Edith e a Velha Sentada” e “As Paparutas”, tendo merecido ótimas críticas, casas lotadas e
indicações a prêmios, com algumas concretizações.
Descoberta.
O TEATRO INFANTIL de LÁZARO não visa apenas a divertir; são textos didáticos e voltados
para temas profundos, que recebem um tratamento capaz de encantar crianças e
adultos. No caso do espetáculo em tela, considero excelente a ideia e bom o texto, o qual me pareceu um pouco
confuso, hermético, para o entendimento dos pequeninos, já que, desta vez, o
mote é a criação do mundo, mas não
apenas sob a visão cristã, e sim contada, também, pela ótica de outras crenças,
como a yorubá, tupi-guarani, hindu e chinesa, não deixando de abordar a
clássica visão científica do Big Bang.
Apesar do pouco tempo de duração do espetáculo, 40
minutos, neles há uma grande concentração de informações e nomes não familiares
ao universo infantil, os quais podem atrapalhar o raciocínio das crianças. Por
outro lado, da mesma forma que “qualquer
maneira de amor vale a pena”, acrescente-se que qualquer interpretação para
a origem do mundo é válida, quer voltada para a ciência, quer numa abordagem
mítico-religiosa. O importante é que todas sejam respeitadas e admiradas, na poética
que cada uma carrega em si.
Uma prova
de que alguns detalhes não são decodificados pelas crianças, no texto, pode ser dada por um testemunho
meu. No dia em que assisti à peça, mal terminou o espetáculo, uma senhora, sentada
atrás de mim, com seu filho, de uns oito ou nove anos, perguntou a ele se havia
gostado da peça e sua resposta foi afirmativa, acrescentado que achou tudo “muito bonito e engraçadão”, mas que
não entendera bem a “história”.
Imediatamente, a mãe passou a explicar-lhe o objetivo do texto. Ele deve ter
gostado mais da peça, a partir de então.
Habilidades
circenses.
SINOPSE:
“BOQUINHA - E
ASSIM SURGIU O MUNDO...” é uma peça, para crianças e adultos, que conta a
história do surgimento do mundo, inspirado em contos e lendas de diversas
culturas, por meio de um ser, feito de dobraduras de papel, que guiará as
crianças em uma mágica viagem, em busca de respostas para muitas dúvidas.
Na escola, a professora pergunta: "Como surgiu o mundo?". No
sótão de sua casa, JOÃO VICENTE acha a caixa de
pesquisas do avô, escritor, e parte, numa aventura mágica, pelas muitas versões
sobre a criação do mundo, segundo as tradições regionais de vários lugares e
crenças.
Sozinho, no palco, ORLANDO CALDEIRA utiliza o circo, a
manipulação e a música, para estimular, de forma lúdica, a imaginação das
crianças.
“O ‘BOQUINHA’ é uma contação de história para crianças, tentando usar,
da maneira mais simples possível, brincadeiras com papel, origami e um ator em
cena. Contando várias versões de como surgiu o mundo, o espetáculo estimula as
crianças a pensar como as coisas são criadas, mas também fundamentalmente,
estimula as crianças a cuidar das coisas, cuidar do mundo, dos objetos, das
pessoas e de si mesmas.”, define o espetáculo o autor e diretor
LÁZARO RAMOS.
Agradou-me,
sobremaneira, o trabalho da direção.
Não sei de que forma os dois diretores,
LÁZARO e SUZANA, trabalharam, entretanto, em função de tantas atribulações
daquele, penso que o dedo desta tocou mais forte, na condução dos trabalhos. E
digo isso, também, pelo fato de reconhecer, na linha de direção, a marca de uma atriz ímpar, quando se trata de contar
“causos”. SUZANA nasceu para ser
contadora de histórias, ainda que seja, também, uma grande atriz e diretora.
Gostei da
solução encontrada para marcar os três sinais que antecedem o início do
espetáculo. Além de diferente - o ator entrando em cena e atirando uma gaivota
de papel, em direção à plateia -, desperta a curiosidade do público, uma vez
que a primeira é bem pequena, a segunda é bem maior e a terceira... Assistam,
para saber.
Uma das cenas mais lindas do espetáculo conta com a
projeção de sombras das figuras ligadas a cada crença ou cultura que explica a
criação do mundo.
Os “criadores” do mundo.
A
utilização de uma linguagem circense, acrescida de técnicas de dobraduras,
manipulações, projeção de sombras e a interação, entre ator / plateia, agregam
um dinamismo muito útil e necessário a um espetáculo infantil. Um monólogo, para crianças, aproxima-se do
monótono, se não tiver uma boa história, uma criativa direção e um intérprete
à altura de ORLANDO CALDEIRA.
Foram esses ingredientes que me levaram a escrever sobre a peça.
ORLANDO CALDEIRA, além de ator, tem uma
formação circense, que lhe permite atuar bem e explorar bastante seu corpo,
principalmente no que se refere à elasticidade, além de saber como interagir
com crianças, área que poucos atores dominam, uma vez que elas são
imprevisíveis.
Certamente,
ORLANDO, que
interpreta o personagem JOÃO VICENTE,
valoriza o texto e é responsável por
uma ótima atuação, conseguindo passar de um personagem a outro com bastante
desenvoltura, principalmente quando se trata de representar o avô. E além de
tudo, canta, inclusive cantarola, para o divertimento da plateia, frases de “Just The Way You Are”.
Seu JOÃO VICENTE é um menino com uma
ideia fixa, qual seja a de pesquisar muito, para saber como surgiu o mundo. Em
sua cabecinha, borbulham dúvidas: Quem veio primeiro?
A barriga ou o umbigo? A chuva ou a sombrinha? O ovo ou a galinha?
Nessa busca, o menino acaba encontrando, no sótão de
sua casa, uma caixa, do avô, escritor e pesquisador, um grande estudioso, contendo
cartas muito antigas, escritas pelo velho, e constrói BOQUINHA, um objeto/ser/personagem,
uma espécie de origami, feito de dobraduras de papel, formando uma dupla de
“pesquisadores” muito curiosos.
Contribuiu bastante, para a “performance” de ORLANDO, o trabalho de direção de movimento, a cargo de MARCELA RODRIGUES.
O cenário da peça, de ALBERTA BARRO e GABRIELLE WINDMÜLLER, é muito interessante, contendo detalhes de
pequenas dimensões, totalmente necessários ao desenvolvimento da peça. O que se
vê são partes da casa do menino, principalmente o sótão e seu quarto. O
material utilizado é bem simples e rústico, como tecidos e papel, de diversos
tamanhos, texturas, e cores; caixas e caixotes; uma mesa, com objetos diversos;
uma tela, enrolada, que, num determinado momento, serve à projeção de sombras; uma
bola grande, representando, numa licença poética, o globo terrestre. O quarto
de JOSÉ VICENTE pouco se assemelha
ao de um menino de sua idade.
A dupla
de cenógrafas também assina o figurino, colorido, de difícil
descrição, porém de ótima praticidade e adequabilidade, para o ator, o personagem
e a peça, em si.
Funciona,
a contento, a iluminação, de VALMYR FERREIRA, assim como a peça ganha mais contornos de alegria, com a trilha
sonora original, composta por RICCO
VIANNA e ANTÔNIO VAN AHN.
Recomendo
este espetáculo, para a família, como um dos melhores infantis que tive a
oportunidade de ver neste semestre. Nesta peça, abundam as delicadezas do texto, da direção e da interpretação. Tudo isso, sem
falar na linda mensagem, no final da peça, que prega o fato de não interessar
tanto como o mundo surgiu nem quem o criou (todas
as teorias são válidas), e sim como nós vamos cuidar dele, para preservá-lo
e entregá-lo, íntegro e saudável, às futuras gerações.
FICHA TÉCNICA:
Texto: Lázaro Ramos
Direção: Suzana Nascimento e Lázaro Ramos
Elenco: Orlando Caldeira
Direção de Movimento: Marcela Rodrigues
Trilha Sonora: Ricco Vianna e Antônio Van
Ahn
Iluminação: Valmyr Ferreira
Assistente de Iluminação: Cíntia Barbosa
Cenografia e Figurino: Alberta Barro e
Gabrielle Windmüller
Costureiras: Maria de Jesus e Zezé Gomes
Assistente de Adereços: Malu Von Kruger
Pesquisa: Susan Kalik
Design Gráfico: Fernanda Guizan
Assessoria de Imprensa: Minas de Ideias
Marketing Digital: Letícia Cordeiro –
Urgh.us
Coordenação de Projeto: Orlando Caldeira
Assistência de Produção: Heder Braga
Direção de Produção: Drayson Menezzes
Curioso...
E surge Adão
(?)...
O Homem ocupa o seu lugar no universo.
SERVIÇO:
Temporada:
De 07 até 29 de maio de 2016.
Local:
Espaço Sesc - Mezanino.
Endereço:
Rua Domingos Ferreira – nº 160 - Telefone: (21) 2548-1088 – Rio de Janeiro.
Horários:
Sábados, às 16h, e domingos, às 11h.
Duração:
40 min.
Preço:
R$20,00 (Inteira), R$10,00 (meia-entrada), R$5,00 (Associados Sesc).
Capacidade:
90 lugares.
Classificação:
Indicado para crianças a partir de 3 anos.
Gênero:
Infantil
Funcionamento
da Bilheteria: (Inclusive vendas antecipadas): De 3ª feira a domingo, das 15h
às 21h.
(FOTOS: JÚLIO RICARDO
e
CARLOS RAFFAELI.)
(Da esquerda para a direita: Luana Martau,
Ricco Vianna, Rose Lima, Orlando Caldeira,
eu e Drayson Menezzes. (Foto particular.)
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