segunda-feira, 3 de julho de 2023

 “GARGALHADA SELVAGEM!

ou

(“RIR É O MELHOR REMÉDIO”;

ATÉ DE SI MESMO.)

ou

(UMA COMÉDIA “UNDERGROUND”, IÇADA À CATEGORIA DE “MAINSTREAM”.)





        Há muitos espetáculos de excelente qualidade, no momento, em cartaz no Rio de Janeiro, graças aos DEUSES DO TEATRO! (Infelizmente, também alguns “equívocos”, que a gente esquece que viu.) Por conta disso, muitas críticas para serem escritas, e eu não sei como dar conta disso. Tenho uma fila delas, esperando seu momento de ocupar um espaço no blogue, mas parei o que estava escrevendo, para falar do espetáculo a que assisti no último sábado, dia 1º de julho (2023). A peça é “GARGALHADA SELVAGEM” (“Laughing Wild”, no original. “Rindo Selvagem”.), que está em cartaz no Teatro XP, e aportou no Rio de Janeiro, vindo de São Paulo, onde fez grande sucesso, e de uma pequena turnê por algumas cidades.

 

 

 

   Trata-se da primeira versão brasileira para o texto do nova-iorquino CHRISTOPHER DURANG, transbordando críticas, sob a forma de ótimas piadas, que teve 13 outras montagens em países como Austrália, Inglaterra, Espanha e Argentina. Ao todo, as produções acumularam mais de cinco milhões de espectadores, em todo o mundo. O texto teve produções de grande sucesso nos Estados Unidos, sendo um marco na Off Broadway, em Nova Iorque.

  

 



SINOPSE:

“GARGALHADA SELVAGEM” é uma comédia provocativa sobre os perigos e tensões da vida moderna em uma grande cidade.

Um homem e uma mulher, ambos atores, se esbarram em um supermercado, no momento em que estão comprando uma lata de atum.

A partir desse encontro, eles dividem, com a plateia, as suas angústias e passam a habitar, de forma hilária, os sonhos e os pesadelos um do outro. 

 

 


        Lendo a SINOPSE, já dá para perceber que um dramaturgo bom entendedor do seu ofício tem às mãos ingredientes de sobra para escrever uma deliciosa comédia, um “produto de primeira necessidade” e, infelizmente, raro no mercado. CHRISTOPHER DURANG é um desses. Dramaturgo norte-americano, DURANG é conhecido por obras de “comédia ultrajante e, muitas vezes, absurda”. A bem da verdade, a peça em tela flerta bastante com o TEATRO do Absurdo, ouso dizer. Aliás, no “release” que me chegou às mãos, via PEDRO NEVES (Clímax Assessoria de Imprensa), o diretor da peça afirma que esta montagem presta uma homenagem ao TEATRO do Absurdo.

 

 

 

O autor tornou-se bastante popular nas décadas de 1980 e 1990 (“GARGALHADA SELVAGEM” foi escrita em 1987.). Suas principais peças lidam, criticamente, com problemas sociais e urbanos e sua produção dramatúrgica carrega muito da estética do “humor negro”, um estilo que aborda a visão fatalista da vida. DURANG “sugere que sua forma de humor requer uma dupla consciência, uma capacidade de registrar cenas de crueldade ou dor, ao mesmo tempo que compreende o humor”, extremamente inteligente, o que exige, em contrapartida, que o público esteja preparado para recebê-lo, o que, para muitos, infelizmente, passa ao largo.

 

 

   Sabe-se que, por meio do humor, afloram críticas com vários endereços. “A metralhadora atira para todos os lados e procura acertar bem no meio de seus alvos”. Todo humor é crítico e, em geral, rimos do outro, sempre colocado numa poisição de ridículo, e não aceitamos quando riem de nós, por estarmos nessa situação heteróclita, porém, nesta peça, o autor nos leva a gargalhar de nós mesmos, quando nos impele a uma identificação com os personagens da peça. É, exatamente, o que DURANG faz nesta excelente COMÉDIA. Fazendo uso, com total maestria, de um humor ácido, “pop” e debochado, ele parte de um fato trivial para a sugestão de uma análise do ser humano, quando colocado em “situações limites”. Para eles, pelo menos.

 

 

 

O humor pode, e quase sempre o é, uma forma de resolver conflitos e ansiedade. Nesta peça, o dramaturgo vai além, com o objetivo de “aliviar a tensão, em relação a assuntos em que, normalmente, são difíceis de se pensar”.

 

 

 

Devo registrar que, a despeito de eu não conhecer o texto original da peça, aprovei a tradução de BÁRBARA DUVIVIER e GUILHERME WEBER, assim como a adaptação deste. Foram muito bem incorporadas ao texto piadas datadas e internas, da mesma forma como devem existir na versão original, as quais, se traduzidas, “ipsis litteris”, não alcançariam o público brasileiro. Consideradas de cunho “politicamente incorreto”, ao ressaltar uma “suposta burrice inerente às mulheres louras”, aqui, a exploração dessa personagem, em algumas piadas, se dá como uma forma crítica a elas; a esse tipo de piada. São utilizadas, a meu juízo, como uma forma de se dizer que não devem ser feitas. O texto acabou se tornando muito agradável, assaz divertido e flui de uma maneira ímpar, a ponto de nosso tempo interior, o psicológico, não acreditar que 70 minutos passam numa rapidez incrível. A peça termina e fiamos com aquele “gostinho de quero mais”.

 

 

 

Além de um ótimo ator, GUILHERME WEBER já acertou em direções anteriores, com destaque para a mais recente, antes desta (2022), “Tudo”. A peça se apresenta em três momentos: dois solos, o primeiro com ALEXANDRA RICHTER, seguindo-se outro, com RODRIGO FAGUNDES, os protagonistas da peça. No terceiro, os dois se encontram, e entra em cena o terceiro personagem, interpretado pelo ator JOEL VIEIRA. É nesse tempo, considerado o ápice da trama, em que se alternam o embate, o pesadelo, o colapso e o delírio, que o trabalho de direção se faz mais notado, em função das marcações de WEBER, considerado, aqui, também, a valiosíssima colaboração de TONI RODRIGUES, como preparador corporal. O diretor soube, primorosamente, explorar o talento do trio de atores. A cena é de um dinamismo tal, que “acende” qualquer espectador, até então, mais comedido nas risadas.

 

 

Guiherme Weber.


 

Que elenco “redondo”! Quanta entrega e troca de energia há entre o trio! Quanta generosidade existe entre ALEXANDRA, RODRIGO e JOEL, revezando-se, os três, na função de titulares das falas e “escada” para os outros dois! Sem dúvida, foi muito feliz a escalação do elenco, com destaque para a dupla que representa os dois personagens que disputam uma lata de atum num supermercado, até que a mulher "nocauteia" o homem, com um soco ("latada") na cabeça – situação bizarra, esdrúxula - e, depois, acabam se encontrando, para um jantar, na casa do personagem masculino, casado com Beto, interpretado por JOEL.

 

 

 

Por sua bela aparência física e elegância, ALEXANDRA RICHTER está mais para uma atriz “séria” do que para fazer rir. Quando se olha para ela, fora dos refletores, ninguém é capaz de se imaginar diante de uma grande atriz cômica, entretanto sua veia humorística é algo indescritível, já amplamente provado também em outras mídias, como o cinema e, principalmente, a TV. Seu trabalho aparece mais no terceiro bloco, visto que, no seu solo, que abre a peça – uma tarefa meio “inglória” -, a plateia demora um pouco a embarcar nas coisas “sem sentido” que ela diz, por parecerem tão absurdas quanto loucas. Como ela entra em cena abruptamente, com os cabelos eriçados, que ele ajuda a manter arrepiados, com os próprios dedos, passa a imagem de uma louca e histérica mulher. Aos poucos, o público começa a se soltar. “Ah! É para rir? Mas isso é engraçado mesmo! Que mulher estranha! De onde saiu isso?!” Saiu do nosso cotidiano, da nossa casa, talvez. “Quem sabe não sou eu ou alguém que conheço?!” Um talento na arte de provocar o riso até sem falar, por meio de suas caretas e expressivas máscaras faciais.

 

 


RODRIGO FAGUNDES parece ter nascido com a missão de nos fazer rir. E faz isso com muita vontade mesmo. Ele parece achar graça de tudo, internamente, junto com o público. Embora com bastantes traços afeminados, o personagem tenta conquistar a mulher e reage, aborrecido, sempre que ela lhe faz referência como “homossexual”, corrigindo-a, dizendo-se “bissexual”, casado com outro homem. Conhecendo-o como o conheço, são dele alguns “malabarismos corporais”, na construção do personagem, que, por si só, mesmo sem um texto, como suporte, são muito engraçados, sem falar nas modulações de voz, abarcando ritmo, intensidade e tons. Acho que RODRIGO seria capaz de, fora de um contexto, fazer alguém rir até com a frase “Eu te amo!”. Seu “timing” para a COMÉDIA não encontra tantos como ele, os que se atrevem a mergulhar na dificílima arte de fazer rir. Rir não é para todos; é para quem sabe fazer. RODRIGO sabe tudo relacionado a fazer rir e seu trabalho é excelente.

 

 

 


A grande surpresa, para mim, recaiu sobre JOEL VIEIRA, que eu nunca havia visto pisar as tábuas e cujo trabalho conhecia, apenas superficialmente, nas telas: You Tube, com seu canal “aNellysando”, criado para postar paródias, esquetes e histórias pessoais, e por sua participação na plataforma "Porta dos Fundos", uma produtora de vídeos de comédia, veiculados na internet. No material de divulgação da peça, seu nome aparece como uma “participação especial”. Esperava ser algo muito inferior àquilo com que ele nos presenteia, com seu enorme talento de ator cômico, igualando-se ao casal protagonista. Trata-se de uma “participação” muito “especial” mesmo. JOEL faz uso de todos os bons recursos de que o humor dispõe e, por muitas vezes, me fez lembrar os inesquecíveis espetáculos de “besteirol”, que eu adoro (Saudade dos falecidos Guilherme Karan, Mauro Rasi, Vicente Pereira e Miguel Magno!).

 

 

 

Um bom texto, um bom diretor e um bom elenco. Sendo assim, ainda que também importantes, na construção de um espetáculo teatral, os elementos de criação ficam, aqui, num segundo plano, entretanto todos com total acerto e funcionalidade. A cenografia, criada por DINA SALEM LEVY, é bem interessante, com pouquíssimos elementos cênicos. O palco fica completamente desimpedido, até o terceiro momento, o final da peça, quando entram em cena uma mesa de jantar, cadeiras e um banco, além de vários adereços de cena. O espaço cênico é todo cercado, ao fundo e nas laterais, por altas portas, do tipo “vai e vem”. Uma cenografia “clean”que apresenta, na boca de cena, ao alto, a indicação do local chave para o desdobramento da peça: letras formam a palavra “SUPERMARKET(“Spermercado”).

 

 


O consagrado e premiado iluminador RENATO MACHADO assina uma luz sem grandes mudanças e novidades – não percebi nenhuma intenção que mereça destaque -, procurando deixar, ao máximo, o espaço cênico todo coberto por uma luz branca bem presente.

 

 

 

KIKA LOPES criou figurinos que carregam bastante de elementos que saltam aos nossos olhos, por seus cortes e cores extravagantes, com uma predominância do roxo, tanto para o traje, único, da personagem de ALEXANDRA como para o infantilizado vestido usado por JOEL, na pele do personagem Beto. As combinações de cores, ou melhor, as “descombinações”, propositais, são um elemento que nos provoca risos. O mesmo pode ser dito com relação ao traje, bem sóbrio – até a página 5 -, usado pelo personagem de RODRIGO, apresentando, porém, alguns detalhes jocosos.

 

 

 

A grande qualidade do espetáculo é proporcional à sua extensa FICHA TÉCNICA, uma prova de que NÃO SE FAZ TEATRO SOZINHO, ainda mais quando o intento é apresentar um produto de comprovada excelência, como é a proposta de “GARGALHADA SELVAGEM”.

 

  

 



FICHA TÉCNICA: 

Texto Original: Christopher Durang

Tradução: Bárbara Duvivier e Guilherme Weber

Direção Geral e Adaptação: Guilherme Weber

Assistente de Direção: Pedro Rothe

 

Elenco: Alexandra Richter, Rodrigo Fagundes e Joel Vieira

 

Cenário e Adereços:  Dina Salem Levy

Assistente de Cenografia no Rio de Janeiro: Raquel Winter Kreis

Figurinos e Adereços: Kika Lopes

Assistente de Figurino: Mirian Cavour

Costureira: Fátima Félix

Desenho de Luz: Renato Machado

Trilha Sonora: Jayme Monsanto

Visagismo: Verônica Rodrigues

Preparador Corporal: Toni Rodrigues

Preparadora Vocal: Carla Guapyassú

Diretor de Palco: Diego Rodrigues

Contrarregra: Adriana Oliveira

“Design” Gráfico:  Leticia Andrade e Natalia Farias

Produção Executiva: Aline Gabetto e Clarice Coelho

Fotos: Nana Moraes, Leekyung Kim e Flávia Canavarro

Vídeos: Chamon Audiovisual e Sonan Filmes

Operador de Som: Kelson Santos

Operador de Luz: Luana Della Crist

Camareira: Silvia Oliveira

Assistente de Produção: Bruna Sirena

“Motion Design”: JLStudio

Mídias Sociais: Ismara Cardoso

Gestão de Projetos: Deivid Andrade

Coordenação Administrativa: Leticia Napole

Assessoria Contábil: Leucimar Martins

Assessoria Jurídica: PMBM Advocacia.

Assessoria de Comunicação: Pedro Neves / Clímax

Direção de Produção: Bruna Dornellas e Wesley Telles

Apresentado por: Ministério da Cultura, Vivo e Prio

Produtora Associada: WB Entretenimento

Realização: WB Produções

 

 

 

 

 SERVIÇO: 

Temporada (curta): De 30 de junho a 30 de julho de 2023.

Local: Teatro XP.

Endereço: Avenida Bartolomeu Mitre, nº 1110 – Leblon (Dentro do Jockey Club Brasileiro.) – Rio de Janeiro.

Telefone: (21)3807-1110.

Dias e Horários: Às 6ªs feiras e sábados, às 20h; aos domingos, às 19h. (Aos domingos, as sessões contam com intérprete de Libras.)

Valor dos Ingressos: Plateia: R$100,00 e R$50,00 (meia-entrada).

Preço Promocional: R$ 50,00 e R$ 25,00

Bilheteria: Aberta somente nos dias de espetáculo, três horas antes da atração.

Vendas: Teatro XP Investimentos (sympla.com.br)

Clientes Vivo Valoriza, plataforma de relacionamento da Vivo, têm desconto de 50%, na compra de até dois ingressos.

Formas de Pagamento: Cartão de crédito e débito.

Classificação: 14 anos.

Duração: 75 minutos.

Capacidade: 366 lugares.

Estacionamento no local.

Gênero: COMÉDIA

 

 


 

        O que se vê, em “GARGALHADA SELVAGEM”, é umasátira social que usa o poder corrosivo da COMÉDIA para satirizar e refletir sobre costumes, como a neurose da vida em uma grande cidade, os relacionamentos amorosos, a positividade sufocante que a sociedade nos exige e o artificialismo de algumas relações”. Não esperem nada além disso, o que já é bastante.

 

 

 

       É muito raro encontrarmos, nas críticas, citações aos produtores do espetáculo, sem os quais uma peça não toma forma. Sempre que posso, não me furto a celebrar seus nomes. Aqui, os aplausos vão para BRUNA DORNELLAS e WESLEY TELLES, produtores e idealizadores do espetáculo, pela WB Produções, “que, em sua pesquisa de dramaturgia, se encantaram com a ferocidade e a comicidade do texto e resolveram apostar em uma versão brasileira”. 

 

 

 

        Considerando que a temporada é curta – apenas um mês – não perca tempo e garanta logo o seu ingresso! Vou torcer para conseguir disponibilidade de tempo, a fim de rever este excelente espetáculo, que, obviamentre, merece a minha aprovação. Recomendo-o com bastante empenho!

 

 


 

 

 

FOTOS: NANA MORAES, 

LEEKYUNG KIM

e  

FLÁVIA CANAVARRO.

 

 

 

GALERIA PARTICULAR

(Fotos: Guilherme De Rose.)

 

 




Com Rodrigo Fagundes.

 

 

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