“BRINQUEDOS
CONSERTADOS”
ou
(UMA JUSTA,
E MERECIDA, HOMEGAEM A UM
HOMEM
DE/DO TEATRO.)
Não seria preciso repetir que sou muito cético, com relação ao TEATRO INFANTOJUVENIL, e motivos, para isso, não me faltam, visto que, a despeito de as produções, nesse nicho, nos últimos anos, virem subindo de nível, ainda a maioria, infelizmente, é de péssima qualidade, em todos os sentidos, o que é um verdadeiro desastre, um desserviço, já que são montagens destinadas a seres em formação, os quais poderão, ou não, estar nas plateias do futuro. É óbvio que, depois de terem assistido a uma sucessão de espetáculos ruins, sofríveis ou péssimos, as crianças, que são a plateia mais exigente e espontânea que existe, nas suas reações, começam a “pegar ranço” do TEATRO, perdendo todo e qualquer interesse por ele. E não merecem elas nenhum tipo de censura. Estão certíssimas. É uma pena que, por conta disso, fiquem, cada vez mais, “coladas” às telas e telinhas, que também, em excesso, são nocivas para a sua formação humana e intelectual.
Recebo muitos convites para espetáculos
destinados aos pequenos, sendo que, muitas vezes, quando assisto a alguns,
percebo que podem, e devem, ser vistos e prestigiados pela família inteira.
Alguns contêm um certo grau de complexidade, de hermetismo, e não atingem, “de
primeira”, o seu objetivo, uma vez que as crianças deixam de entender
algumas coisas. Mas, por outro lado, isso pode não ser considerado um fator
negativo, porque faz com que os pais, os adultos que acompanham os “baixinhos”
(Baixou a “entidade” Xuxa. Momento descontração.),
possam explicar, aos miúdos, o que eles não entenderam e, assim, fica
fortalecido o elo do diálogo entre aqueles e estes. Não é o caso de “BRINQUEDOS
CONSERTADOS”, que é uma peça bastante simples, fácil de ser
entendida, que parece mostrar o óbvio, o previsível, entretanto, podem as
crianças não perceber – e cabe aos adultos fazer a complementação –, existem mensagens
subjacentes, no texto, nas quais o autor pode até não ter
pensado, quando o escreveu. No caso da encenação ora analisada, acho que
ele pensou, sim, porque a dramaturgia não foi criada por qualquer um. É
produto da prodigiosidade de um homem de/do TEATRO, um dos artistas
mais respeitados do TEATRO BRASILEIRO, no chamado “TEATRO de
adultos”. Falo de um gênio, infelizmente falecido em março
de 2019: DOMINGOS OLIVEIRA, que, além de dramaturgo, foi diretor
de TEATRO, ator e um dos nossos maiores cineastas.
Para não me estender muito, não falarei
do grande DOMINGOS, como autor de textos para o TEATRO, cinema
e televisão. Não falarei do DOMINGOS grande diretor de TEATRO.
Também não é o consagrado cineasta que me interessa aqui. Estou fixado
no DOMINGOS, pai da Mariana (Maria Mariana, atriz,
escritora e roteirista.), que foi a fonte de inspiração (para) ou
a “mola propulsora” deste texto, escrito em 1977,
quando a pequena tinha apenas 4 anos de idade. DOMINGOS só
escreveu duas peças infantis, tendo sido “BRINQUEDOS CONSERTADOS”
a primeira, fruto de seu desejo de se comunicar com a filha. Trata-se de uma adaptação,
para o TEATRO, de uma peça, “Os Brinquedos Consertados”,
escrita, inicialmente, para a TV, em 1963.
Ao contrário do que muitos possam pensar, TEATRO
INFANTIL é uma coisa muito séria e demanda muito cuidado e atenção,
por parte de quem escreve os textos, dirige as peças ou as representa.
Não pode ser feito de qualquer maneira, porque “se é pra criança, serve
qualquer coisa”. Sinto muita pena de quem pensa dessa forma. DOMINGOS
tinha consciência de que “o TEATRO INFANTIL é um grande desafio, e a peça
surge da sua busca em conquistar e manter a atenção das crianças”, “essa
gente pequena maravilhosa, fonte de toda a sabedoria humana”, como ele
dizia.
SINOPSE:
O velho Gepeto (FRED
EÇA) tem uma oficina de brinquedos.
Em uma manhã, ao receber o leiteiro
(MOISÉS BITTENCOURT), se depara com três brinquedos quebrados na porta
de sua oficina.
Eram um tambor furado (Tambor
Arquibaldo – o mesmo MOISÉS), um palhaço com a corda
quebrada (Palhaço Tic-Tac – FELIPE FAGUNDES) e um ursinho
de pelúcia, sujo, encardido e manchado (Urso Afonso – JOÃO MIRANDA).
Ao trazê-los para dentro, como num
passe de mágica, eles ganham vida e contam que viviam na casa de um menino pobre,
Paulinho (MIGUEL VENERABILE), o qual não tinha condições
financeiras para consertá-los, o que os levou a fugir de lá.
Gepeto resolve consertá-los,
com a condição de que voltassem para a casa do menino, que devia estar sofrendo
com o sumiço dos brinquedos.
Depois de prontos, os três se
negam a voltar e, então, são vendidos a um outro menino Gaspar (O
mesmo MIGUEL.), este muito rico, porém sem nenhum apreço pelos
brinquedos que possui.
Lembrando do carinho que tinham com o menino pobre e de como este gostava deles e os tratava muito bem, os três resolvem fugir novamente, mas, dessa vez, de volta aos braços do menino pobre, que os recebe com imensa alegria, na noite de Natal!
O diminutivo, na língua
portuguesa, pode ser empregado com várias intenções, além da mais comum,
que é nomear algo de pequenas dimensões. Entre essas intenções, uma é o desejo
de designar alguma coisa de pouco valor, um emprego pejorativo. Então,
quando eu digo que esta peça é uma “historinha bonitinha”,
isso poderia ser compreendido como um eufemismo: “Essa peça não é
feia, não é ruim.”. (Mas, também, não é boa.) A fim de
que não paire nenhuma dúvida, deixo bem marcada a minha intenção de afirmar que
“BRINQUEDOS CONSERTADOS” é uma peça que conta uma “historinha
bonitinha”, no sentido mais afetivo possível. Na verdade, no
palco, pode faltar tudo, menos amor, afeto, carinho, por parte
de todos os envolvidos no projeto, o qual, acima de tudo, é uma belíssima
homenagem à memória de DOMINGOS OLIVEIRA.
Tanto é fato, que me sinto na obrigação
de compartilhar, com quem me honra com sua leitura, algumas informações
interessantes às quais tive acesso, via “release”, a mim enviado
por LEILA MEIRELLES (Assessoria de Imprensa).
A ideia de montar a peça veio de FERNANDO GOMES, seu diretor, no momento em que, ao fazer uma mudança de residência, encontrou, vasculhando suas gavetas, o texto da peça, que lhe havia sido entregue por DOMINGOS, há muitos anos, quando trabalhavam juntos. Diz FERNANDO: “Achar esse texto, nesse momento, pareceu um sinal para realizar o projeto.”. Digo eu: SANTO SINAL! SANTA MUDANÇA! SANTO PROJETO!
A partir de lá, o diretor
procurou arrebanhar profissionais de TEATRO, gente que tinha laços
afetivos com DOMINGOS, seus “amigos-discípulos”, para
que, juntos, pudessem concretizar uma linda e merecida homenagem ao
inesquecível amigo, o que vemos no palco de Teatro XP. Para isso,
por exemplo, FERNANDO convidou MARCELA NUNES, que despertou para
a carreira artística como fã do espetáculo “Confissões de
Adolescente”, que marcou época e uma geração, adaptação, para o TEATRO,
do livro homônimo, de Maria Mariana, exatamente aquela para quem “BRINQUEDOS
CONSERTADOS” foi escrita. Também se chegou aos dois FREDERICO EÇA, filho
do maestro Luizinho Eça e de Lenita Plonczynski. Durante
o casamento de Lenita com DOMINGOS, FRED EÇA foi
criado por DOMINGOS, como seu filho. Ainda houve espaço para MOISÉS
BITTENCOURT, que começou, como contrarregra, no Teatro do
Planetário, o qual foi dirigido por DOMINGOS, de 1996
a 2001, e, logo, virou seu assistente de direção. Depois,
foram sendo agregados ao projeto outros nomes, todos compondo o time que
transforma em realidade a proposta sensível do pai de Maria Mariana.
Tudo funciona corretamente, nesta
montagem, pelo que parabenizo seus produtores, que não economizaram
e se preocuparam com os mínimos detalhes, com o intuito de agradar, de verdade,
ao público, aqui representados pelas crianças e pelos adultos. É
importante dizer que um ou outro pequeno ajuste feito ao texto, visando
a torná-lo mais próximo à realidade de hoje, 45 anos após ter sido escrito
por DOMINGOS, não lhe altera, em nada, as mensagens e os recados que seu autor
desejou que fossem captados. No texto, o autor “procura a
inocência do olhar da criança e apresenta uma dramaturgia fortemente
influenciada pelas histórias de Hans Christian Andersen, de quem sempre foi
admirador”. DOMINGOS OLIVEIRA disse que “a inocência, como
o amor, é um estado de alma que permite ver o mundo como ele é, como Deus o
fez, e que todos nós a tivemos sob nossa posse”. Simbolicamente,
os três brinquedos que precisavam de reparos, partindo de suas próprias
reflexões, fazem uma escolha e pagam um preço por ela. O importante é que, como
acontece com todos os humanos, no decorrer de suas vidas, as escolhas, certas
ou erradas, devem ser feitas, sempre visando à felicidade. E, se tiver sido
errada, “faz parte do jogo”. É “levantar, sacodir a poeira
e dar a volta por cima”, mirando, sem medo de ser feliz, aquilo que,
realmente, importa na vida, tendo o amor como alvo. Esses importantíssimos e
necessários ensinamentos estão presentes num texto simples, escrito num nível
de linguagem bem acessível até aos mais pequenininhos.
E já que falei em simbolismo, há
um outro, muito importante, na peça, porque DOMINGOS escolheu,
não por acaso, o dia de Natal, uma comemoração do nascimento daquele
que, para os que creem, veio ao mundo para pregar apenas a paz e o amor ao
próximo, para que os três brinquedos, agora perfeitos e prontos para alegrar a
vida do menino pobre, retornassem à casa deste.
Um detalhe, nesta peça, da maior
importância é a preocupação de levar às crianças a mensagem de que não devem
gastar tantas horas de seu dia em contato direto com o mundo virtual, que se
torna mais imperativo, a cada dia, e, sim, se voltar para a valorização dos
brinquedos simples, educativos, que levam o “brincante” a
explorar sua imaginação. “Num mundo acelerado, em que as crianças
transitam no virtual, desde que nascem, praticamente, a montagem resgata,
através do universo lúdico proposto, brinquedos simples e criativos, que
despertam a fantasia infantil, propondo uma experiência mais sensorial e
singela nas relações, em que o afeto se sobrepõe à imagem.”. A peça
fala, sobretudo, de amor, de relações, da vida. De amor
à vida e sua valorização.
Esgotados os comentários que julguei pertinentes ao texto, desvio o foco para o ótimo trabalho de direção, de FERNANDO GOMES, que apostou no “menos é mais” e fez uma direção “redonda”, sem maiores complicações, com excelentes soluções para algumas cenas e conflitos. Não é fácil dirigir criança e, mais ainda, quando um(a) pequeno(a) ator (atriz) está em cena, como numa ilha: uma criança cercada de adultos por todos os lados. E mais difícil, ainda, é o trabalho do diretor, quando essa criança, extremamente talentosa, é um menino de 9 anos, chamado MIGUEL VENERABILE, que parece “estar ligado a uma tomada de 220 volts”, “brincando de fazer uma coisa séria, de trabalhar”, com a maior naturalidade possível.
Um espetáculo para crianças pede muita cor e movimento. As cores, bem vivas e variadas, estão presentes na cenografia, nos figurinos e no desenho de luz. O movimento, tanto nos deslocamentos dos atores, em cena, como nas execução das coreografias traz a marca do trabalho de ANA MAGDALENA, precisa e criativa em tudo.
Já que deixei o assunto ser desviado
para o elenco, falando do MIGUEL, titular dos personagens Paulinho
e Gaspar (Ele tem um “stand-in”, HAROUN ABUD.),
afirmo que me deixei encantar por sua atuação, seu grau de verdade e
esperteza, a ponto de colocar “cacos”, no texto, quando
acha que deve, sem deixar de acrescentar que os dois meninos personagens que
ele representa são diametralmente opostos, “antipodais”. Tem
um grande futuro pela frente esse ator mirim.
Miguel Venerabile.
Idem.
Haroun Abud.
Idem.
Todos os demais que compõem o elenco
tem atuações excelentes, alguns dos quais em papéis duplos. Um dos
principais requisitos, quando se representa para um público infantil,
é saber como estabelecer uma boa comunicação com a plateia, e disso
todos entendem muito bem e sabem como pôr em prática.
O respeito ao público infantil,
principalmente, não permite que os elementos de criação sejam relegados
a segundo plano. Tudo tem de ser de feito com capricho e bom gosto. Então, que
sejam contratados profissionais de ponta, para a execução de cenários,
figurinos, iluminação e outros. Não há um nome, na FICHA
TÉCNICA, cujo trabalho mereça um comentário negativo.
A bela cenografia foi criada por uma premiadíssima e sensível artista, a cenógrafa CLÍVIA COHEN, que, mesmo residindo, há algum tempo, em Portugal, provou que a distância não impede um verdadeiro artista de criar um lindo, alegre e expressivo cenário, repleto de detalhes interessantíssimos, o qual é mais valorizado pelo trabalho caprichado de ANDRÉ SALLES, um cenotécnico dos mais requisitados, por sua dedicação no ofício de dar formas concretas ao que o(a) responsável pelo trabalho de idealização e criação do cenário colocou no papel.
A mesma CLÍVIA assina os figurinos,
lindos, alegres, coloridos, com pequenos detalhes que
saltam aos nossos olhos, todos totalmente ajustados a cada personagem.
Para realçar tudo o que está sobre o
palco, nada mais indicado do que uma correta iluminação, esta sob a
responsabilidade de FREDERICO EÇA, que utiliza uma paleta bem variada e,
também, compôs as canções que fazem parte de uma trilha sonora
original.
Poucas vezes valorizado pelos críticos
de TEATRO e jurados de prêmios, o visagismo, que corresponde
à maquiagem e a outros detalhes que entram na composição exterior dos
personagens, é da melhor qualidade, trabalho de MATHEUS PASTICCHI.
FICHA TÉCNICA:
Texto: Domingos Oliveira
Direção: Fernando Gomes
Assistência de Direção: Lara Gay
Direção de Movimento e Coreografias:
Ana Magdalena
Elenco (por ordem alfabética): Felipe
Fagundes (Palhaço Tic-Tac), Frederico Eça (Gepeto), João Miranda (Urso Afonso),
Lina Mello (Mãe / Lápis), Miguel Venerabile (Paulinho / Gaspar), Moisés
Bittencourt (Leiteiro / Tambor Arquibaldo), Haroun Abud (“stand-in”), Lara
Gay (“stand-in”)
Cenários e Figurinos: Clívia Cohen
Cenógrafo Assistente: José Cohen
Cenotécnico: André Salles
Figurinista Assistente: Lucila
Belcic
Aderecistas: Márcia Marques,
William Marcelo e Adriana Dias
Iluminação e Trilha Sonora Original:
Frederico Eça
Gravação e Execução: Sigaud
Homestudio
Visagismo: Matheus Pasticchi
Arte “Design”: Thiago
Ristow
Contrarregra (e Pinóquio): Phael
Carvalho
Diretor de Palco: Bené Benevides
Operador de Luz: Kelson Santos
Operador de som: Aline Monteiro
Assessoria de Imprensa: Leila
Meirelles e Marcela Nunes
Redes Sociais: Marcella Rodrigues
Fotos: Edu Rodrigues e Duda Ferreira
Direção de Produção: Marcela Nunes
e Ricardo Fernandes
Realização: Mnunes Produções Artísticas
SERVIÇO:
Temporada: De 05 a 27 de novembro
de 2022.
Local: Teatro XP.
Endereço: Avenida Bartolomeu
Mitre, nº 1110 – Leblon – Rio de Janeiro (Dentro do Jockey Clube Brasileiro).
Telefone: (21)3807-1110.
Dias e Horários: Sábados e
domingos, às 16h.
Valor dos Ingressos: R$70,00
(inteira) e R$35,00 (meia entrada).
Venda “on-line”: Plataforma Sympla.
Duração: 50 minutos.
Classificação Indicativa: Livre.
Gênero: Teatro Infantil.
Mesmo bastante assoberbado, com várias críticas
para serem escritas, não pude deixar de me dedicar a esta, seguindo o meu
princípio de somente escrever sobre espetáculos que me agradam e mereçam
que eu me deixe ocupar por muitas horas, como sempre se dá.
RECOMENDO
ESTE ESPETÁCULO, que me deixou mais “leve”, no fim da
tarde do último sábado, 12 de novembro de 2022.
FOTOS: EDU RODRIGUES
e
DUDA FERREIRA
VAMOS AO TEATRO,
COM TODOS OS CUIDADOS!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO
DO BRASIL,
COM TODOS OS CUIDADOS!!!
A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE!!!
RESISTAMOS, SEMPRE MAIS!!!
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PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!
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