“CIRCUNCISÃO
EM NOVA YORK”
ou
(UMA COMÉDIA
COM “C” MAIÚSCULO.)
ou
(EVOÉ, JOÃO
BETHENCOURT!)
Em
tempos pandêmicos e de perseguição à classe artística, por parte do
(des)governo federal e do firme e explícito propósito deles, de prosseguir num
processo de desmanche da CULTURA, a qual os incomoda e não lhes
interessa, para que atinjam seus escusos objetivos, sair de casa, para ir ao Teatro
e assistir a uma boa COMÉDIA é uma excelente pedida e uma válvula de
escape, por conta de tanta tensão. E não deixa de ser, também, uma prova de
coragem e resistência.
Quando assisti à peça que me serve de motivação para esta crítica, espetáculo do qual gostei bastante, fiz uma postagem, numa rede social, divulgando-o e recomendando-o, e lamentei não poder escrever sobra a montagem, por total falta de tempo, visto que passo por um momento muito assoberbado de trabalho. Mas confesso que fiquei muito triste, já que tenho por hábito escrever sobre os espetáculos de que gosto. E só sobre eles. E, como jamais escrevo sobre o que não me agrada, embora possa ser o maior sucesso de bilheteria, fiz questão de deixar bem claro que não haveria uma crítica minha, apenas por falta de tempo, mas que eu gostara bastante da peça. Consegui, com bastante esforço, encontrar uma brecha na minha agenda, para analisar "CIRCUNCISÃO EM NOVA YORK".
Embora seja,
de uma forma geral, infelizmente, considerada um “gênero menor”,
até mesmo por alguns "críticos" e gente da classe artística, tenho o maior apreço
pela COMÉDIA, as boas, evidentemente, gênero muito difícil de ser
escrito, dirigido e interpretado. Se não for assim, saímos do Teatro
chorando, ao invés de rir. Não me canso de repetir que é muito mais difícil
a carpintaria de uma boa COMÉDIA do que a de qualquer outro tipo de peça,
dentro do gênero dramático.
E quem, no Brasil,
entendia de COMÉDIAS e as escrevia melhor que ninguém do que aquele que
considero o maior comediógrafo brasileiro de todos os tempos? A resposta
está na ponta da língua: JOÃO BETHENCOURT, que, infelizmente, nos deixou
num 31 de dezembro, em 2006, aos 82 anos de idade, tendo
produzido uma gama de excelentes textos cômicos, dezenas de peças,
além de outras tantas traduções dos grandes clássicos da comédia francesa e
italiana, principalmente. Seus textos foram traduzidos para vários
idiomas e vêm sendo encenados, até hoje, em mais de 40 países. Também
adaptou, para os palcos, alguns textos que não foram escritos para serem
representados, como foi o caso de “Memórias de um Sargento de Milícias”,
um clássico do romantismo, escrito por Manuel Antônio de Almeida.
Poucos sabem
que JOÃO era húngaro e veio para o Brasil aos dez anos de
idade. Sua brasilidade superava a de muitos nativos. Além de um excelente dramaturgo,
como se notabilizou, no Brasil e no exterior, JOÃO BETHENCOURT
também se destacou como diretor, ator e tradutor de TEATRO húngaro.
Seu texto mais festejado é “O Dia em que Raptaram o Papa”,
o texto brasileiro mais encenado no exterior. Além deste, merecem
destaque “Mister Sexo”, “Como Matar um Playboy”, “O
Crime Roubado”, “A Cinderela do Petróleo”, “Linhas
Cruzadas”, “Frank Sinatra 4815”, “A Venerável Madamne
Gouneau”, “Bonifácio Bilhões”, “Tem um Psicanalista
na Nossa Cama” e, evidentemente, “CIRCUNCISÃO EM NOVA YORK”,
aqui analisada.
Sua dramaturgia abrange, de forma simples,
porém profunda, a comédia de costumes e ele sempre volta sua
metralhadora para aqueles que fazem jus a uma crítica, pessoal ou social, dentro de uma
temática abordada. JOÃO sempre atinge públicos de variadas idades, em
função de suas tramas, universais e atemporais, e de uma ação muito ágil, com
diálogos de grande e fácil comunicabilidade e aceitação popular. JOÃO
dominava, como ninguém o “timing” da COMÉDIA, um dos
principais ingredientes garantidores de sucesso. O diretor que consegue
acompanhá-lo e um bom elenco, capaz de "emparelhar com ele, na corrida",
certamente, serão recompensados com os aplausos do público, como está se dando
agora, no Teatro Vannucci, no Shopping da Gávea (VER SERVIÇO.),
onde uma montagem de “CIRCUNCISÃO EM NOVA YORK” vem atraindo
grande número de pessoas, ávidas por voltar às salas de espetáculo, a
fim, exclusivamente, de um bom divertimento, sem outras pretensões, sem ter que
mergulhar em reflexões complexas.
Segundo
o grande e inesquecível crítico teatral Yan Michalski, já falecido, sobre JOÃO BETHENCOURT, “...ninguém
pode negar-lhe o mérito de ter delimitado, com nitidez, e explorado, com
eficiência, um espaço específico de criação teatral: o de um “entertainment” ameno,
mas nos seus momentos mais felizes, dotado de uma real visão crítica, de uma
incontestável competência técnica, e de uma rara identificação com o gosto de
amplas faixas de consumidores do seu trabalho”.
SINOPSE:
A peça, conta a história de MIRIAM
(NARJARA TURETTA) e EMILLY (ROBERTA FOSTER), filhas de tradicionais
famílias judaicas, que são companheiras e resolvem ter um filho, via
inseminação artificial.
O pai de MIRIAM, ABRAÃO (SERGIO
FONTA), sem desconfiar de nada, nem da homossexualidade da filha, nem do
método usado para concepção do primogênito, vibra com a notícia de que será avô,
até descobrir que seu neto, ABRAÃOZINHO, veio ao mundo através de
métodos nada normais, segundo ele.
A peça propõe uma discussão
contemporânea sobre a diversidade sexual, colocando uma luz sobre esse tema tão
importante.
Tudo de forma divertida e leve.
Claro que sem deixar de tocar em
pontos importantes desta questão.
Não há muito o que escrever sobre esta
encenação, para não ser repetitivo, porém o dever do ofício me leva a
fazê-lo, já que não seria justo deixar de comentar cada “tijolinho”
que entra na construção deste espetáculo.
Sobre o texto, julgo não ser
necessário dizer mais nada, a não ser que, como uma das características desse
tipo de COMÉDIA, vê-se, no palco, uma sucessão de coincidências (Será?)
e quiproquós, que se sucedem, num “crescendo”, e as complicações
vão se desenhando, cada vez mais, num ritmo frenético, gerando situações
bizarras e esdrúxulas, as quais levam o público a dar boas gargalhadas. E
não é para isso que serve uma COMÉDIA? Não só para isso, mas,
principalmente para criticar e atirar dardos em quem os mereça, o que não é
tanto a proposta deste texto, que foca mais numa crítica ao
conservadorismo da família.
Quem serve de “para-raios”,
para “passar panos” e tentar não permitir que o pavio da bomba
queime até o final é SARAH, mulher de ABRAÃO e mãe de MIRIAM.
A personagem de SYLVIA MASSARI é maravilhosamente interpretada
por uma das grandes atrizes do nosso TEATRO. Suas falas são
recheadas de um “humor, até certo ponto, cínico”, pelo
constrangimento que a filha lhe causa. Ela age, a princípio, de forma quase
revoltada, por não aceitar a condição, de lésbica, da filha e, muito menos,
aquela ideia “estapafúrdia” de ter um filho, por meio de
inseminação artificial, dividindo a maternidade com a companheira. Mas, diante
do irremediável, acaba entrando no jogo e “aceitando” a
realidade; ou, pelo mesmo, conformando-se com ela. Parabenizo SYLVIA,
por seu excelente trabalho.
Fiquei muito feliz com o retorno, aos
palcos (Sua falta já estava sendo sentida.), de um querido amigo e ótimo
profissional, SERGIO FONTA, que interpreta ABRAÃO, o patriarca da
família e sempre “o último a saber”. As situações de
mal-entendidos, e, principalmente, os diálogos entre ele e SYLVIA são
muito engraçados, hilários. FONTA voltou com muita “gana de palco”,
o que, para nós, público, é ótimo. Ri muito com ele, o personagem,
muito bem interpretado, por conta de tanta “ingenuidade”.
Uma grande surpresa, para mim, pelo
menos, foi ver NARJArA TURETTA (MIRIAM), afastada, fazia tempo, dos
palcos, aquilo que se poderia dizer, no popular, “enferrujada”,
mostrar que ser um bom ator ou atriz é como andar de bicicleta. Uma vez
dominada a técnica, jamais se esquece. NARJARA está ótima, na defesa de
sua personagem, libertária, de mente aberta, no seio de uma família que a
educou dentro de todos os métodos que seus pais consideravam o certo, o “normal”.
Fazendo dobradinha com NARJARA,
EMILY, aquela que geraria a criança, ROBERTA FOSTER, sabe como
receber os passes que lhe são direcionados e “chuta muito bem a gol”.
Como dá certo misturar atores
mais jovens, de menor experiência profissional, com os veteranos, como é o caso
de DANIEL BARCELOS JAIMOVICH, que
já frequenta as tábuas há muitos anos, carregando a honra de ser filho de um
dos maiores atores do TEATRO BRASILEIRO, o grande SENHOR Jaime
Barcelos, tendo participado dos elencos de grandes montagens,
como “A Alma Boa de Setsuan”, “Blue Jeans”, “Trair e
Coçar é Só Começar”, “Violetas
na Janela”, “Peer Gynt” e “O Santo Inquérito”!
Bastante versátil, o ator. Seu trabalho sempre foi maior na
televisão. Nesta peça, DANIEL é SAMUEL, amigo de ABRAÃO e
pai de EMILY, e pensa que a filha está grávida de um namorado, sem
saber, também, de sua condição sexual e que era companheira de MIRIAM,
que ele também não sabia ser filha do seu amigo! Olha a confusão formada,
quando os dois amigos se encontram e trocam confidências, dizendo, um ao outro,
que aguardam, ansiosamente, um netinho, ABRAÃOZINHO!!! MIRIAM e EMILY
moravam juntas, como “boas amigas”. Também elogio bastante o trabalho
de DANIEL.
Não conhecia o trabalho do ator
DANTON LISBOA (RALPH), o doador de esperma, num banco especializado
nisso, para que ABRAÃOZINHO pudesse vir ao mundo, e, apesar de ser um personagem
que não aparece tanto, na trama, vejo, com bons olhos, a sua atuação.
E “last, but not least”,
cito CARLOS LOFFLER, que não tem a menor noção da minha admiração por
ele, por ser neto de um dos meus ídolos, de sempre, e para sempre, um dos
maiores atores cômicos deste país, que tantas alegrias me proporcionou, na
minha infância e adolescência, nas telas do cinema, nas deliciosas chanchadas
da Atlântida, um artista que nunca mereceu, neste país, as honras
de que é merecedor: Oscar Lorenzo Jacinto de La Inmaculada
Concepción Teresa Díaz, ninguém mais do que o
inesquecível e impagável SENHOR Oscarito. Conheço bem o trabalho de LOFFLER
na TV e no cinema. Nesta peça, seu personagem, o RABINO, DR.
MEYER, é o encarregado de proceder à cerimônia da circuncisão, o “brit-milá”, uma operação cirúrgica que remove o prepúcio,
no oitavo dia após o nascimento do menino. O personagem só entra por
pouco tempo, no final da COMÉDIA, e quase não fala, por meio de
palavras, porém suas expressões faciais e seu silêncio são como se fossem as
piadas mais engraçadas do planeta. E a plateia gosta. Eu adorei.
O cenário
da peça é bastante simples, mas atende, plenamente, ao que é
necessitado: uma sala comum, de uma família judia, classe média, em Nova
York. Sua concepção é creditada a AUGUSTO PESSÔA. Agradou-me
bastante, assim como os figurinos, acertados, também assinados pelo
mesmo artista de criação.
A peça
não requer nada de especial, em termos de iluminação, permanecendo,
praticamente, estável, quase o tempo todo do espetáculo, e é mais um dos
acertos desta montagem. Aqui, nesse caso “menos é mais”.
Quem a desenhou foi o diretor do espetáculo, JACQUES LAGOA,
contando com colaboração de EDER OLIVEIRA.
E já que
falei em direção, considero bom o trabalho de JACQUES, que não
teve a menor intenção de criar nada de novo e descaracterizar uma obra de JOÃO
BETENCOURT. Já li vários textos do dramaturgo e percebi que
ele se preocupava, creio que não intencionalmente, a, por meio de muitas rubricas,
dar uma “ajudinha” a quem fosse dirigir um texto seu. Cacoete,
talvez, de quem também trabalhou em muitas direções. Os atores se
movimentam, em cena, obedecendo a uma marcação correta e a direção
conduziu-se de forma a explorar bastante o potencial de cada ator/atriz,
dentro das características de seus personagens.
Para
finalizar esta modesta análise desses elementos, que ajudam a sustentar uma montagem
teatral, falta fazer referência a uma deliciosa trilha sonora,
assinada por GUILHERME DELRIO.
FICHA TÉCNICA:
Texto: João Bethencourt
Direção: Jacques Lagoa
Assistência de Direção e Produção Executiva:
Guilherme DelRio
Atriz Convidada: Sylvia Massari
(Sarah)
Elenco: Sergio Fonta (Abraão),
Narjara Turetta (Miriam), Daniel Barcelos Jaimovich (Samuel), Roberta Foster
(Emily), Carlos Loffler (Rabino, Dr. Meyer) e Danton Lisboa (Ralph)
Cenário e Figurinos: Augusto Pessôa
Iluminação: Jacques Lagoa, com
colaboração de Eder Oliveira
Trilha Sonora: Guilherme DelRio
Assessoria de Imprensa: Simone Frota
Fotos: Rogério Fidalgo
SERVIÇO:
Temporada: de 02 a 31 de março de
2022
Local: Teatro Vannucci
Endereço: Rua Marquês de São Vicente,
53 – Shopping da Gávea – 3º piso
Dias e Horários: às 4ªs e 5ªs feira
de março de 2022, às 20h
Valor dos Ingressos: R$80,00
(inteira) e R$40,00 (meia entrada)
Ingressos à venda na Bilheteria do Teatro,
pelo “site” Sympla e pelo “site” Rio no Teatro.
Indicação Etária: 16 anos
Duração: 60 minutos
Gênero: COMÉDIA
Com muita alegria, atesto, em cartaz, no Rio de Janeiro,
a encenação de uma boa COMÉDIA, e isso faz com que eu deseje
compartilhar tal informação com os amigos que me prestigiam com a leitura das
minhas críticas.
Recomendo muito o espetáculo!
FOTOS: ROGÉRIO FIDALGO
E VAMOS AO TEATRO,
COM TODOS OS
CUIDADOS!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS
DE ESPETÁCULO
DO BRASIL,
COM TODOS OS
CUIDADOS!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI, SEMPRE!!!
RESISTAMOS, SEMPRE
MAIS!!!
COMPARTILHEM ESTE
TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!
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