quinta-feira, 10 de março de 2022

 “BORDADOS”

ou

(...EM FILIGRANAS

DE OURO.)

ou

(AMOK

SENDO AMOK.)



     Para mim, todos os dias são “DIA INTERNACIONAL DA MULHER”, mas foi escolhido, oficialmente, e não sei por qual motivo, o dia 8 de março, para tal comemoração. Tomo a liberdade de transcrever um depoimento, encontrado numa matéria, na internet, da professora Maria Célia Orlato Selem, mestre em Estudos Feministas pela Universidade de Brasília e doutoranda em História Cultural pela Universidade de Campinas (Unicamp), com o qual concordo plenamente: “O 8 de março deve ser visto como momento de mobilização para a conquista de direitos e para discutir as discriminações e violências morais, físicas e sexuais ainda sofridas pelas mulheres, impedindo que retrocessos ameacem o que já foi alcançado em diversos países”.



 E por que inicio esta crítica dessa forma? Porque, coincidentemente, começo hoje, dia 8 de março de 2022, a escrever sobre um espetáculo a que assisti, no último domingo, no Teatro III do CCBB – Rio de Janeiro, “BORDADOS”, o mais recente trabalho da AMOK TEATRO, cuja temática tem tudo a ver com a posição da mulher na sociedade e as palavras da festejada professora.



       Embora o texto da peça se concentre na figura da mulher oriental, do mundo árabe, ainda que tudo o que lá se fale seja sobre o tratamento que é dado à mulher daquela cultura, infelizmente, encontramos, em toda a peça, pontos de intercessão entre os valores culturais do mundo oriental e do ocidental, com um foco maior para o Brasil, de ontem e de hoje. Algumas conquistas as mulheres já alcançaram, entretanto muito ainda há de ser conquistado por elas, para que possam ser reconhecidas como iguais aos homens, porque todos o somos, e merecedoras, portanto, do respeito a que fazem jus.


       



SINOPSE:

O espetáculo “BORDADOS”, do AMOK TEATRO, convida o público a participar de uma conversa entre mulheres árabes e a mergulhar na intimidade de relatos compartilhados ao longo de uma sessão de chá.

Elas narram histórias de casamentos, paixões, família, filhos, revelando sonhos, perdas e conquistas.

Histórias de mulheres, que refletem os desafios de viver em uma sociedade marcada pela tensão entre tradição e modernidade.

O texto é uma costura de depoimentos reais de pessoas comuns, das mais diferentes origens e culturas do planeta.


 

 


    A peça aborda temas universais, a partir do universo feminino, e “explora o TEATRO como um espaço de produção de saúde”. Tudo se passa num encontro entre mulheres árabes, ao longo de uma sessão de chá. Em torno dessa bebida, como em um ritual, cujo acesso só é permitido às mulheres, elas desenrolam os fios das suas histórias, sem medo, de uma forma desprovida de pudor, porque se sentem, no fundo, protegidas e acolhidas, umas pelas outras. Nessas conversas animadas, “vazadas para uma plateia”, um tema predomina: o amor.



    O espetáculo é a segunda etapa do “Ciclo das Mulheres”, depois da encenação de “Jogo de Damas”, em 2019, e não conta uma história única, mas, de maneira fragmentada, nos apresenta pequenos relatos das experiências vividas por seis mulheres, os quais, a princípio, podem parecer bem distantes da nossa realidade, partindo-se da enorme diferença cultural que existe entre o mundo árabe e a cultura brasileira, entretanto, em pouco tempo, o público começa a se identificar com aquelas personagens, principalmente as mulheres, quando percebem que muitas daquelas dores e mazelas estão bem mais próximas a nós do que podemos imaginar; delas, principalmente. A comoção toma conta da plateia, incluindo os homens, quando a identificação própria começa a se instaurar, a partir do momento em que traçamos uma analogia entre aqueles casos, lamentos e dores com os de mulheres próximas a nós ou, até mesmo, distantes, dos quais já ouvimos falar. Muitas mulheres, da plateia, se veem representadas pelas seis personagens, e isso provoca muita emoção e o choro de algumas. Testemunhei, pesaroso, tal fato.



    “‘BORDADOS’ é uma costura de relatos reais, recolhidos entre as centenas de entrevistas reunidas no documentário “7 Bilhões de Outros”, que faz parte do projeto “Humanos”, do realizador francês Yann Arthus-Bertrand. O documentarista percorreu o mundo, para tentar responder à questão: O QUE NOS TORNA HUMANOS?” (Trecho retirado do “release” que me foi encaminhado por FLÁVIA TENÓRIO – LEAD COMUNICAÇÃO – ASSESSORIA DE IMPRENSA).



  ANA TEIXEIRA, que dirige a montagem, ao lado de STEPHANE BRODT, este também, com ela, na assinatura da dramaturgia, fez uma seleção dos já referidos relatos, sobre o amor, a felicidade, o sentido da vida e a morte e os colocou nas bocas de seis personagens, criadas, dentro da dramaturgia, as quais atuam como porta-vozes de todas as outras, anônimas, que deram seus depoimentos. E o objetivo da obra é o mesmo, explorado pela linguagem teatral, que o desejado pelo cineasta francês. Também o AMOK lança a pergunta, nas entrelinhas, pela boca das personagens, e para reflexão: “O QUE NOS TORNA HUMANOS?”.



  Cabe a cada espectador, atento aos relatos e desenvolvendo o seu sentido de empatia, procurar chegar a uma resposta para aquele questionamento. Se é fácil ou difícil, ou, até mesmo, impossível, para este ou aquele, isso já ultrapassa a tarefa dos dramaturgos e da direção do espetáculo, que atuam como provocadores das nossas consciências.



  ANA TEIXEIRA e STEPHANE BRODT, bastante acostumados a esse tipo de trabalho, fazem uso de uma carpintaria teatral que facilita, ao espectador, acompanhar e avaliar, com bastante fluidez, as frases ditas por aquelas seis mulheres, conformadas, quase sempre, ou na grande maioria das vezes, com o que lhes é imposto, em termos de falta de liberdade, de direitos iguais aos dos homens. Conformam-se com o machismo que as rodeia, embora, ainda bem, nos dias atuais, já possamos perceber um pouquinho de afrouxamento dos nós que as atam a um obscurantismo, num mundo “dito civilizado”.



    Ainda retirado do “release”: “‘BORDADOS’ é acolhedor e sua linguagem, totalmente feminina, convida o público a entrar numa casa árabe e a ouvir histórias que refletem os desafios de amar e viver em uma sociedade marcada pela tensão entre tradição e modernidade. Histórias que, embora tragam a realidade de uma outra cultura, parecem tão próximas e nos convidam a refletir sobre a vida, o amor e a liberdade. O aroma de hortelã e chá verde perfuma toda a encenação.”.



  A direção da montagem houve por bem alocar algumas mulheres ao redor das atrizes, para participarem, também, daquele ritual do chá, o que penso ter sido uma excelente ideia, uma forma de integração entre elenco e público. Infelizmente, por conta da pandemia de COVID-19, foi mantida a configuração, contudo não mais lhes é servido o chá, por orientações das autoridades sanitárias e, acima de tudo, pelo bom senso da direção/produção.



     O espetáculo chegou a estrear, no mesmo CCBB, no início de março de 2020, entretanto cumpriu uma meia dúzia de apresentações, apenas, e foi interrompido, quando todos os Teatros do Brasil foram obrigados a cancelar suas programações. E o que se viu, durante, praticamente, dois anos, em termos de TEATRO, embora eu não os considere com tal, foi o que chamo de “experimentos cênicos virtuais”, tudo “on-line”, vistos numa tela, o que impede a comunicação total e completa, e necessária, entre o artista e o espectador, o que fez, em muito, esses “experimentos” perderem sua qualidade e valor, agora, recuperados pelo TEATRO presencial. Sobre isso, diz, com muita propriedade, ANA TEIXEIRA: “A comunicação mediada pelas novas tecnologias não contempla a necessidade que temos de nos comunicar, olhando nos olhos. A comunicação intermediada pelas telas nos priva de percebermos as emoções que afloram, quando conversamos frente a frente, em tempo real. Daí a crise de empatia que vivemos hoje. Conversar é um ato de afeto e um ato político, remédio contra a solidão e contra a (o)pressão da vida moderna e uma restauro da saúde relacional”. Excelente observação de ANA!!!



   De uma forma muito especial, ANA e STEPHANE conseguem abordar o “feio” de uma maneira tão sutil, tão cheia de filigranas, tão suave e, também, lírica ou muito levemente humorizada, que o espectador deixa o Teatro, após 80 minutos de conversas, leve, feliz, sem perder, porém, o foco naquilo que deve ser feito a favor do livre pensar a agir a que todas as mulheres do mundo têm direito. QUE DELICADEZA DE ESPETÁCULO!!! 


   

  Na verdade, no nosso silêncio de espectador, também participamos daquelas conversas, com a nossa conversa interior, quando concordamos, ou não, com o que dizem, quando nos revelamos rebeldes, para não aquiescer àquela aceitação delas, para gritar a elas, com os nossos olhos, que alguma coisa “está fora da ordem” e que é preciso que elas lutem, na defesa de seus direitos; de mulheres, porém, mais que isso, de seres humanos, femininas.



     Em cena, seis excelentes atrizes, fazendo seus trabalhos com a maior competência, todos no mesmo nível, dão o tom das conversas e estabelecem o rumo da prosa. São elas: CARMEN FRENZEL (FATHMEH), FLÁVIA LOPES (MASSARAT), JACYAN CASTILHO (HIBA), SANDRA ALENCAR (KHADIJA), VANESSA DIAS (NESRINE) e VANIA SANTOS (WALLA).



  Além de darem forma ao texto, ANA TEIXEIRA e STEPHANE BRODT também se ocupam da direção do espetáculo, e o fazem com a mesma maestria como, até hoje, vêm fazendo, desde a fundação do AMOK TEATRO, em 1998, a partir de quando todos os seus espetáculos mereceram, como este, o aplauso – eu diria unânime – do público e da crítica, o que lhes tem garantido muitos prêmios, os quais, certamente podem estar reservados à montagem em tela. “Os espetáculos do AMOK tratam de temas contemporâneos, sem perder de vista a busca de uma linguagem poética e a afirmação da cena como um espaço cerimonial.”.



    Sempre foi uma das maiores marcas da Companhia a beleza, a criatividade, o requinte e o acabamento, sempre presentes nos cenários e figurinos, o que se repete aqui, ambos criados por ANA TEIXEIRA e STEPHANE BRODT. A cenografia representa uma sala “de estar” de uma típica casa árabe, com muitos detalhes decorativos, de finíssimo bom gosto nos objetos espalhados pelo espaço cênico. Sobre os figurinos, eu diria que são roupas típicas das mulheres árabes, porém confeccionadas como se fossem para uma festa, dado o bom gosto, na paleta de cores, nas combinações dos matizes e nos acessórios que compõem os seis trajes.



    Um espetáculo de grande beleza plástica ganha mais realce, quando é convidado a criar o desenho de luz um profissional do quilate de RENATIO MACHADO, bastante comedido, nas cores e intensidades, mas contribuindo, a contento, para nos encantar os olhos.



    Uma atenção deve ser dada às canções que são tocadas e/ou cantadas, durante a peça, as quais estarão fazendo parte de um álbum, de RUDÁ BRAUNS, a ser lançado brevemente. O disco com a trilha sonora da peça.


 

 


FICHA TÉCNICA:

 

Texto e Direção: Ana Teixeira e Stephane Brodt

Assistente de direção: Gustavo Damasceno

 

Elenco (Personagem / Atriz):

Fathmeh - Carmen Frenzel

Massarat - Flávia Lopes

Hiba - Jacyan Castilho

Khadija - Sandra Alencar

Nesrine - Vanessa Dias

Walla - Vania Santos

 

Cenário e Figurinos: Ana Teixeira e Stephane Brodt

Iluminação: Renato Machado

Músico: Rudá Brauns (off), Vanessa Dias e elenco (live)

Direção musical: Stephane Brodt

Edição de som: Gabriel Petit

Operador de Luz: João Gaspary

Operadora de Som: Júlia Limp

Fotos: Sabrina Paes e Júlia Limp

Assessoria de Imprensa: LEAD COMUNICAÇÃO (Flávia Tenório)

Produção: Amok Teatro

 

 

 





SERVIÇO: 

Temporada: De 05 de março a 24 de abril de 2022

Local: Centro Cultural Banco do Brasil – Teatro III

Endereço: Rua Primeiro de Março, 66 - Centro, Rio de Janeiro - RJ

Dias e Horários: de quarta-feira a sábado, às 19h30min; domingo, às 18h

Valor dos Ingressos: R$30,00 (inteira) / R$15,00 (meia entrada)

Capacidade: 75 lugares

Classificação Etária: 12 anos

Duração: 80 minutos

Gênero: Drama

 

 

 



          Sem a menor sombra de dúvida, “BORDADOS” é uma peça feita com muito carinho e amor, delicadeza e bom gosto, com uma proposta muito além de oportuna, e pode ser considerado um dos melhores espetáculos em cartaz, no momento, no Rio de Janeiro, o que só me faz recomendá-lo.

 









 


FOTOS: SABRINA PAZ

e

JÚLIA LIMP

 

 

 



E VAMOS AO TEATRO,

COM TODOS OS CUIDADOS!!!

 

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO

DO BRASIL,

COM TODOS OS CUIDADOS!!!

 

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE!!!

 

RESISTAMOS, SEMPRE MAIS!!!

 

 















































































Um comentário: