UMA
RELAÇÃO PORNOGRÁFICA
(“MONOTONIA” EXCITANTE.)
PHILIPPE BLASBAND, um iraniano, nascido
em 1964, é
um escritor, roteirista e cineasta, que mora em Bruxelas e escreve em
francês. No Brasil, não é muito
conhecido, mesmo por aqueles que, como eu, respiram TEATRO. Mas é dele o bom texto
da peça que está em cartaz, no Teatro I
do Centro Cultural Banco do Brasil, a que assisti e que me causou uma
excelente impressão: UMA RELAÇÃO
PORNOGRÁFICA.
Certamente, um
título provocativo, como esse, será responsável por atrair pessoas à procura de
algo “picante” , literalmente “pornográfico”, as quais sairão
do teatro decepcionadas, a não ser que o seu conceito e definição para os dois
vocábulos (“picante”, “pornográfico”) sejam diferentes dos que a eles são atribuídos.
A tradução seguiu
à risca o original : Une Liaison
Pornographique.
Os dicionários de
língua portuguesa, em sua quase totalidade, manifestam-se de formas diferentes,
quanto ao adjetivo “pornográfico”:
- Há os que ligam o termo a tudo o que se relaciona a “devassidão sexual, obscenidade, licensiciosidade, indecância, imoralidade...”.
- Um até diz que “é a descrição ou representação de coisas consideradas obscenas, geralmente de caráter sexual”.
- Diz um outro: “Qualquer conteúdo que possui cenas ou imagens obscenas ou de apelo sexual.”
- De forma totalmente exagerada e distorcida, um dicionarista afirma: “Estudo ou descrição da prostituição”. É o mesmo que acrescenta ao verbete: “Qualquer coisa (livro, revista, filme etc.) de caráter sexual, com intenção de provocar excitação ou satisfação sexual das pessoas, quase sempre de maneira obscena, chula.Prefiro, e entendo melhor, o que diz a Wikipédia: “qualquer expressão humana que desperta pensamentos sexuais.”Pois bem! E o que temos em cena, no palco do CCBB?Não há nada de devasso, imoral, obsceno, indecente, prostituição... Há um apelo sexual, sim, que, até, poderá “provocar excitação ou satisfação sexual na plateia”. Não foi o meu caso e creio que nem o de ninguém que lá estava naquela sessão. E nem nas que já aconteceram ou acontecerão, a não ser que as pessoas não consigam atingir a proposta do espetáculo, que é apresentar um conflito, “para que possam ser discutidos temas, como a solidão, o individualismo e a dificuldade de criar laços, desafiando, de forma crescente, preconceitos e valores do ser humano”.
SINOPSE:
Um
casal, ELE – anônimo (GUILHERME LEME
GARCIA) e ELA – também anônima (ANA
BEATRIZ NOGUEIRA), se conhece por meio de um “site” de relacionamento, encontra-se
em um café e vai para um hotel.
Eles
passam a se encontrar toda semana, sempre no mesmo hotel.
Nenhum
dos dois sabe nada da vida do outro; apenas sabem que querem realizar suas
fantasias sexuais.
Nesses
encontros, não falam de suas vidas íntimas, trabalho, endereços e nem mesmo de
seu nomes.
Mas,
com o passar do tempo, eles percebem uma inesperada afinidade, trazendo novas
indagações a respeito dessa relação, ainda que o casal tente negar, ou lute
para impedir, um inevitável envolvimento romântico. Os sentimentos vão se tornando, aos poucos,
complexos e envolventes.
Para o casal, não
existe um passado nem lhe interessa o que vai acontecer no futuro. O importante, o que tem sentido, e vale a
pena, é viver o presente. Anônimos,
podem ser batizados com os nomes de quaisquer pessoas que assistem à peça. Ou cada espectador pode subir ao
palco e assumir seus desejos reprimidos, projetando-se nos personagens.
Para o diretor do
espetáculo, VICTOR GARCIA PERALTA, a
peça “fala do medo que as pessoas têm de se
entregar num relacionamento. Começa como
uma brincadeira, mas, no final, eles se envolvem. Relacionamento requer trabalho, especialmente
quando o auge da paixão passa, e muitos ainda fogem deste envolvimento”.
Antes de ser
encenada, pela primeira vez, na Espanha, partindo para outras montagens, em
vários outros países, sempre com sucesso garantido, UMA RELAÇÃO PORNOGRÁFICA foi levada às telas, em 1999, também com
enorme sucesso de público e crítica.
FICHA TÉCNICA (com alguns comentários):
Autor: PHILIPPE
BLASBAND – Bom texto, que começa simples e vai ganhando corpo, com o
desenrolar do envolvimento entre o casal.
É construído de modo a levar o espectador a se tornar cúmplice naquela
relação. Apresenta algumas pitadas de um
humor superficial, leve. Desenrola-se
por meio de diálogos e de solilóquios ou “conversas, algumas um pouco longas,
com a plateia”. Engana-se, porém, quem
pensar que esse formato possa tornar o espetáculo monótono, enfadonho. Isso não ocorre. Ninguém consegue ficar desatento nem
desinteressado durante os 75 minutos de texto e ação.
Tradução:
LIANE LAZOSKI
Elenco: GUILHERME
LEME GARCIA e ANA BEATRIZ NOGUEIRA –
Os dois tarimbados atores parecem ter servido de inspiração ao autor do
texto, tal é a maneira natural e correta como vestem as cores dos
personagens. GUILHERME e ANA
exploram, com maestria, todos os detalhes das personalidades de ELE e ELA e valorizam determinadas discussões e situações, com uma
perfeita modulação da voz, detalhe que enriquece suas atuações.
Ana Beatriz Nogueira e
Guilerme Leme Garcia.
Direção: VICTOR
GARCIA PERALTA – VICTOR optou por uma direção a mais discreta possível, sem
grandes firulas, sem grandes movimentações, sem gestos largos, mas extraindo,
dos atores, o máximo de emoção. Fixou-se
mais nos sentimentos e no que as palavras possam expressar que nos gestos e nas
marcações, numa movimentação farta em cena.
Acreditou nas possibilidades dos atores, e acertou. A princípio, o espectador pode achar que “a
peça será chata”, o que, nem de perto, é uma verdade.
Assistente
de Direção: PEDRO OSÓRIO
Iluminação:
MANECO QUINDERÉ – Mais um grande acerto do MANECO.
Iluminador
assistente: RUSSINHO MAFRA
Cenário: VICTOR
GARCIA PERALTA e GUILHERME LEME
GARCIA – Apenas duas cadeiras giratórias em cena. Não precisa de mais nada.
Figurino: ANA
BEATRIZ NOGUEIRA e GUILHERME LEME
GARCIA – Justos.
Trilha Sonora:
MARCELLO H – Excelente, como costumam ser todas as trilhas assinadas por
ele.
Fotografia:
MARCELO CORRÊA
Programação
visual: ROBERTA DE FREITAS
Visagismo:
ADRIANA ALVES
Operadora
de som: GISA PITHAN
Vídeo
release: FÁBIO NAGEL
Assessoria
de imprensa: BIANCA SENNA
Produtora
Executiva: SILVIA REZENDE
Direção de
Produção: SÉRGIO SABOYA e SÍLVIA
REZENDE
SERVIÇO:
Local: Centro Cultural Banco do Brasil (Rua
Primeiro de Março, 660 – Centro - Rio de
Janeiro) – Teatro I
Temporada: 19 de setembro a 19 de outubro
Horários: de quarta-feira a domingo, às
19h.
Duração: 75 min.
Para
encerrar esta resenha, lembrei-me de uma canção, de Caetano Veloso, chamada TÁ
COMBINADO, que se encaixa, perfeitamente, nesta peça.
TÁ COMBINADO
(Caetano Veloso)
Então, tá combinado, é quase nada,
é tudo somente sexo e amizade.
Não tem nenhum engano nem mistério,
é tudo só brincadeira e verdade.
Podemos ver o mundo juntos,
é tudo somente sexo e amizade.
Não tem nenhum engano nem mistério,
é tudo só brincadeira e verdade.
Podemos ver o mundo juntos,
sermos dois e sermos muitos,
nos sabermos sós, sem estarmos sós.
Abrirmos a cabeça,
para que, afinal, floresça
o mais que humano em nós.
Então, tá tudo dito e é tão bonito
Abrirmos a cabeça,
para que, afinal, floresça
o mais que humano em nós.
Então, tá tudo dito e é tão bonito
e eu acredito num claro futuro
de música, ternura e aventura
pro equilibrista em cima do muro.
de música, ternura e aventura
pro equilibrista em cima do muro.
Mas e se o amor pra nós chegar,
de nós, de algum lugar,
com todo o seu tenebroso esplendor?
Mas e se o amor já está,
Se, há muito tempo, que chegou
e só nos enganou?
Então, não fale nada, apague a estrada
que seu caminhar já desenhou,
porque toda razão, toda palavra
vale nada, quando chega o amor...
e só nos enganou?
Então, não fale nada, apague a estrada
que seu caminhar já desenhou,
porque toda razão, toda palavra
vale nada, quando chega o amor...
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