SILÊNCIO
(INTOLERÂNCIA E HIPOCRISIA,
TEU NOME É “SILÊNCIO”.)
A
cada novo texto, RENATA MIZRAHI se
supera em talento, criatividade e sensibilidade.
O comentário
supra se faz valer pelo lindo espetáculo em cartaz, infelizmente apenas até o dia 24 de agosto, no Teatro de Arena do Espaço SESC Copacabana:
SILÊNCIO, no qual, além de autora do
texto, RENATA é a idealizadora do
projeto.
A
decisão de sair de casa, no Rio de janeiro, e enfrentar toda sorte de
obstáculos, com o objetivo de ir a um teatro, é para fazer a pessoa pensar mais de uma
vez, até se tomar a corajosa decisão de concretizar o desejo. Mas tem de ser por algum espetáculo que,
realmente, valha a pena. E, para ver SILÊNCIO, não se deve perder tempo nem
poupar esforços. É para a pessoa ir logo, na
certeza de que sairá do Espaço SESC
Copacabana feliz e recompensada, por ter travado conhecimento com um texto magnífico,
interpretado por um elenco de primeiríssima categoria, sob a direção da própria
autora da peça, junto com PRISCILA VIDCA,
repetindo a vitoriosíssima dobradinha de OS
SAPOS, que, até este SILÊNCIO, era
o melhor texto de RENATA, ela que já
nos brindou com alguns outros bons exemplos da dramaturgia contemporânea, como
é o caso de Bette Davis e a Máquina de
Coca-Cola, em parceria com outro grande talento jovem, Jô Bilac, além de vários textos premiados em teatro infantil.
Suzana Faini.
O tema da peça é considerado um tabu, no seio
das famílias judaicas, principalmente entre os mais ortodoxos e
tradicionais. Fala da existência e do
sofrimento de mulheres judias, trazidas, do Leste Europeu, para o Brasil (a
maioria) ou vindas por conta própria, no final do século XIX e início do
passado, até o período da 2ª Grande Guerra Mundial, para serem escravizadas, sob a
forma de prostitutas, até por seus próprios pares, homens judeus
inescrupulosos. Eram chamadas de “polacas”.
Apesar da
originalidade do tema e da grandeza do texto de SILÊNCIO, o assunto já fora, ainda que por um viés bem diferente,
explorado em outra peça, encenada, recentemente, em terras brasileiras, em 2012, aqui, no Rio
de Janeiro, no CCBB, com grande sucesso: As
Polacas – Flores do Lodo, um musical, escrito e dirigido por João das Neves, sendo o elenco formado
por Alexandre Akerman, Gilray Coutinho, Ilea Ferraz, Ivone Hoffman, e Luciana Mitkiewicz, dentre outros.
A sinopse de SILÊNCIO pode ser assim, de forma bem sucinta mesmo, apresentada:
A história se passa nos
dias de hoje, num jantar de família judaica, em que o patriarca DAVID (JITMAN VIBRANOVISKI), marido de ESTHER (SUZANA FAINI), conta que está
escrevendo um livro sobre sua vida. As
revelações provocam indignação, brigas e um final surpreendente.
Jantar em “família”
(Shabat).
Esmiuçando a sinopse, podem ser acrescidos os seguintes detalhes:
1) O jantar se realiza no apartamento de DÉBORA (GABRIELA ESTÊVÃO), a neta mais nova do casal DAVID e ESTHER. Trata-se de um
jantar comemorativo do SHABAT, nome dado ao dia de descanso semanal, no judaísmo,
simbolizando o sétimo dia em Gênesis, após os seis dias de Criação.
Também o tal jantar serve como motivo de comemoração dos cinquenta anos
de REGINA, a mãe da anfitriã.
2) Os primeiros a chegar são
os avós. Estão sendo, ainda, esperados, os pais
de DÉBORA, BETO (ALEXANDRE MOFATI) e REGINA
(VERÔNICA REIS), e a outra filha do casal, CLARA (KAREN COELHO).
3) Há, por parte de quase
todos, também, uma expecativa pela presença de FLÁVIO (VICENTE COELHO), noivo da dona da casa, especialmente
por parte da avó, que vê, naquela oportunidade, uma grande esperança de um
pedido de casamento por parte do rapaz, para livrar a jovem neta de “ficar para
titia”.
4) Fica-se sabendo que o avô vive trancado em seu quarto, guardando um grande segredo, o qual, no decorrer da peça é revelado: um livro que está escrevendo.
5) Sabe-se, também que CLARA
trabalha para o avô, numa misteriosa pesquisa, fornecendo-lhe subsídios para a
escrita do livro.
Preparando o ambiente para o jantar.
Desde sua primeira aparição, até quase o final da peça, ESTHER se revela uma criatura ranzinza,
intolerante, uma vítima do “mundo cruel”, de tudo e de todos, e não poupa
comentários desairosos, desferidos contra o marido, DÉBORA e, principalmente, CLARA,
a quem ofende, de forma mais explícita e agressiva.
A chegada do casal BETO e REGINA põe em relevo uma relação
matrimonial de fachada, representada por um homem totalmente alheio ao seu
papel de marido, dominador, quase perverso, insuportavelmente desagradável e
inoportuno nas suas tentativas de levar leveza ao ambiente, por meio de piadas
sem a menor graça, e uma mulher fraca, física e interiormente, destruída pela
submissão e pelo péssimo tratamento que lhe é imposto pelo cônjuge.
As múltiplas e sucessivas discussões, quase sempre provocadas e
iniciadas por ESTHER, vão num
crescendo, muitas delas girando em torno da cumplicidade entre DAVID e CLARA e no mistério oculto pelos dois, e explode num momento em que, depois de muitas farpas
trocadas e, também, de muitas palavras engolidas, os silêncios não digeridos,
como em Os Sapos (a personagem de Paula Sandroni, lá, se assemelha um
pouco à de VERÔNICA REIS, cá), DAVID, de forma surpreendente, sai do
seu silêncio, guardado ao longo de quase toda a narrativa, e explode numa revelação
bombástica, num extenso e denso monólogo, de levar o público às lagrimas,
concluindo, assim, o quebra-cabeça que vai sendo construído ao longo da
história.
Alegria aparente
(SHALOM!).
Aspectos relevantes na trama:
a) Não se pode falar, propriamente, num confronto entre as duas jovens
irmãs, entretanto há um grande contraste entre elas: enquanto DÉBORA é a própria “Poliana”,
enxergando um mundo cor-de-rosa, lutando pela preservação da harmonia familiar,
fechando os olhos à hipocrisia e aos preconceitos que, a todo momento, vêm à
tona, uma jovem, até certo ponto, ingênua e conformada, CLARA é destemida, independente, representa o perigo, o desafio para
a porção tradicional do clã. Foge
completamente à ortodoxia da sua cultura e se mostra aberta a novos
conhecimentos, a novas experiências, ao novo, ao vivo. É revolucionária sem o ser; apenas está
antenada, atenta à modernidade, aos avanços tecnológicos e sociais que ditam os
valores no mundo moderno em que vive, sem desprezar, totalmente, suas raízes e
disposta a auxiliar o avô a corrigir uma grande injustiça, que vai abalar toda
a família nos dez ou quinze minutos finais da peça.
b) A diferença de pensamentos, de visões de mundo, das duas irmãs jovens e a conduta do jovem DAVID, em relação à postura dos demais personagens, põem em relevo um certo conflito de gerações, do ponto de vista cultural, que é desfilado ao longo de toda a trama. RENATA, que, como pessoa, consegue reunir a doçura de DÉBORA ao arrojo de CLARA, soube, muito bem, trazer para a ficção essa realidade que venho observando, já há algum tempo, dentro das famílias de queridos amigos judeus com os quais convivo.
c) Há de se louvar a longa e minuciosa pesquisa desenvolvida pela autora, sobre o tema, indispensável para o belo resultado do texto final da peça.
d) A despeito de se tratar de uma família judaica e da temática central da peça girar em torno de algo que diz respeito, diretamente, a uma determinada cultura, pode-se perceber, na discussão familiar, traços comuns a qualquer outro tipo de família, uma vez que, pelo palco, desfilam situações e relações de verdade e mentira, amor e ódio, drama e humor (principalmente provocado por ESTHER), crueldade e compaixão, falsidade e verdade, saudosismo e modernidade, ingredientes presentes em qualquer relação ou encontro familiar.
Sobre os atores e seus personagens:
SUZANA
FAINI (ESTHER) – Essa magnífica atriz haverá de marcar este ano teatral de 2014, com sua magistral
composição da personagem. Com seus 81
anos de idade e com algumas décadas de experiência no palco, como atriz e
bailarina, além do cinema e da televisão, é a atração maior desta montagem,
não só pela força da sua personagem, mas, principalmente, pela qualidade de sua
interpretação, do início ao final do espetáculo. Não há um momento em que seu talento não seja
notado e reconhecido em cena (aplausos em cena aberta), mesmo quando não participa dela, diretamente, ou quando fica
fora, literalmente, do foco dos refletores. ESTHER é sarcástica, cruel,
excessivamente “sincera” em suas posições e é a grande provocadora de boas
gargalhadas, motivadas por suas falas, desprovidas de qualquer censura e
autocrítica. Acha-se modelo de virtude,
de mãe e de mulher, e julga-se a detentora de todo o saber dentro da família, a “dona
da verdade”, demonstrando, sempre, uma preocupação com “o que os outros irão
pensar ou dizer”. Defende,
descaradamente, o genro, contra a filha, a quem classifica como uma “fraca”. É um privilégio poder aplaudir, de pé, essa
grande dama do TEATRO BRASILEIRO.
Suzana Faini, roubando a cena.
JITMAN
VIBRANOVSKI (DAVID) – Acompanho seus trabalhos, desde o tempo do antigo Conservatório Nacional de Teatro,
embrião da atual UNI-RIO, no
final da década de 60, e não me lembro de tê-lo visto tão completo e intenso,
em cena, como neste espetáculo. De
início, com SUZANA FAINI “roubando”
a cena, parece que DAVID estaria
fadado a ser uma “escada” para a mulher, entretanto, ao longo da trama, JITMAN vai evoluindo, em termos de
interpretação, acompanhando o grande desejo de seu personagem, em colocar seu
silêncio para fora, e chega, nos minutos finais da peça, a mexer tanto com a
sensibilidade da plateia, que, a cada mínimo hiato de seu longo texto, o voar
de uma mosca poderia ser auditivamente percebido no ambiente. Um grande momento para o TEATRO BRASILEIRO é a sua revelação e a composição de seu personagem.
ALEXANDRE
MOFATI (BETO) – Demora um pouco a entrar na trama, mas, quando o faz, marca
presença em cena, com sua composição de um ser profundamente inconveniente, bajulador,
principalmente dos sogros; é daqueles que gostam de “jogar para a plateia”;
falso, hipócrita, dúbio, cínico, até certo ponto; insensível e totalmente alheio
à esposa (a quem humilha, sem piedade), ao seu sofrimento, aos seus
sentimentos, fazendo sempre questão de demonstrar seu falso interesse por REGINA, mas foi incapaz de acudir a
mulher, no momento em que esta passa mal, relacionando o mal-estar da esposa à
falta de alimentação, forçando-a a ingerir “batatinhas”, como uma panaceia para
curá-la do que ele julgava ser uma simples indisposição, por falta de alimentação.
Ótimo o trabalho do ator.
VERÔNICA
REIS (REGINA) – É a personagem de menor texto na trama, mas,
paradoxalmente, a detentora dos silêncios mais expressivos. Enquanto todos tentam, de uma maneira ou de
outra, de forma mais ou menos contundente, “vomitar” suas angústias, suas revoltas,
suas inquietações, suas mágoas, ela se mantém, a maior parte do tempo, calada, submissa, mas
é a única a vomitar, literalmente, após o jantar, o que não conseguiu digerir,
numa somatização autoexplicável.
Discreto e, ao mesmo tempo, excelente o trabalho da atriz.
GABRIELA
ESTEVÃO (DÉBORA) – Boa presença em cena, a atriz conseguiu, já no dia da estreia,
atingir o tom de interpretação que julgo devido à sua personagem. Apaziguadora, por excelência, sua posição de
tolerante em potencial, candidata à “Medalha Madre Teresa de Calcutá”, se opõe
ao caráter belicoso da avó. Descobra-se,
dentro de suas possibilidades, para manter a paz e a harmoina dentro da família,
tentando, até onde consegue, adiar a explosão da bomba-relógio preparada pela
autora do texto.
KAREN COELHO (CLARA) –
Trata-se de uma boa atriz, que, mais uma vez, consegue vestir sua personagem
com as roupas adequadas à sua função na trama.
Por fora, uma doce figura feminina, com uma aparência que contrasta,
totalmente, com suas atitudes, quando se trata de defender suas ideias e valores. É firme e correta nas cenas em que precisa de
muito vigor, para despejar, sobre seus “adversários”, a argumentação, por mais
fria e cruel que possa parecer esta, para provar que sempre esteve certa em
aceitar o desafio do avô e auxiliá-lo em suas pretensões. Valoriza bastante o texto de RENATA.
VICENTE COELHO (FLÁVIO) – É um
personagem de menor relevância na trama, mas surge num momento muito importante
e, na sua "inocência", pois não sabe o que ocorrera naquela sala de jantar,
minutos antes de sua chegada, vai auxiliar na aparente restauração de um
ambiente familiar. Chega como um arauto
de boas novas, de bons ventos, inclusive oficializando o tão aguardado pedido
de casamento, para alívio de ESTHER. Bela composição de personagem.
Vicente Coelho (Flávio).
Elenco.
Após a
surpreendente revelação de DAVID,
que omitirei, para não roubar ao leitor o prazer e a emoção de sabê-la, é como
se um tsunâmi invadisse a arena, gerando um incômodo estarrecer, que leva a
matriarca a um ligeiro desfalecimento, até que, uma vez restabelecida, passa a fazer
parte, também, da “celebração” religiosa, um ritual comandado por FLÁVIO, numa bela e emocionante
interpretação de uma oração seguida de um cântico.
Sim, o tão
aguardado Flávio, que surge, providencialmente, para pedir a mão de DÉBORA em casamento, para alegria de
todos, prontos a dar prosseguimento à vida, sabe-se lá como, mas com a certeza
de que “o ‘show’ tem que continuar”.
A peça é feita de silêncios e sons; aqueles tão importantes quanto estes.
RENATA MIZRAHI disse, em palavras e em silêncios, tudo o que havia para ser dito.
E, despudoradamente plagiador, digo que "o resto é SILÊNCIO"!
Chegada de David (final do jantar).
O texto da
peça é um primor, não só pela temática, como também pelo movimento nos diálogos,
a linguagem simples, com a utilização de um vocabulário econômico, porém de
profundo alcance significativo. RENATA MIZRAHI tem como uma de suas
maiores características a propriedade de falar pouco e dizer muito, inclusive
com seus silêncios.
É muito boa a direção da dupla RENATA e PRISCILA,
principalmente por saberem explorar muito bem o espaço de que dispõem numa
arena. Num palco italiano, certamente,
as soluções para entradas e saídas dos atores, assim como a arquitetura
cenográfica seriam outras, de mais fácil resolução, não sei se de igual excelente resultado, como acontece nesta montagem.. A opção das diretoras foi manter os atores à
vista do público, porém fora dos focos de luz, em espaços convencionados como
uma cozinha e um quarto. Excelente ideia!
Quanto à
condução dos atores, a orientação passada a cada um, fiquei com a impressão de
que o texto é tão fluente, as situações são tão do cotidiano, à exceção da
grande e misteriosa revelação final, que não houve muito o que dizer a cada um
dos actantes sobre o que e como fazer.
Pareceu-me que todos se empenharam bastante na condução de suas linhas
de interpretação, e o resultado global é excelente.
Esther, a “sempre vítima”.
Por oportuno,
já que nos referimos aos elementos cenográficos, aplausos, mais uma vez, para NELLO MARRESE, por seu belíssimo e
prático cenário, contando com a
assistência de LORENA LIMA.
Os figurinos, de BRUNO PERLATTO, se integram, perfeitamente aos personagens e às exigências do texto. São muito bonitos e expressivos, mesclando o moderno com o tradicional e, ao mesmo tempo, sóbrios e elegantes, tendo FRANCESCA FACHINELLO como assistente.
A iluminação, de RENATO MACHADO, também me agradou bastante, ela que, discreta, não apresenta grandes variações, pela própria natureza do texto e da encenação.
Completam a ficha técnica:
MÁRCIO FREITAS – PROGRAMAÇÃO VISUAL
RENATO MANGOLIN – FOTOGRAFIAS
SID ANDRADE – VISAGISMO
TAMIRES NASCIMENTO – PRODUÇÃO EXECUTIVA
ALAN ISIDIO – ADMINISTRAÇÃO
SHEILA GOMES – ASSESSORIA DE IMPRENSA
SANDRO RABELLO – DIREÇÃO DE PRODUÇÃO
Aplausos!!! BRAVO!!!
SERVIÇO:
Local: Teatro de Arena, no Espaço SESC
Copacabana
Endereço: Rua Domingos Ferreira, 160 –
Copacabana
Data: de 1º de agosto a 24 de agosto de
2014
Horário: de quinta a sábado, às 20h30;
domingo, às 19h
Preço: R$ 5 (associados SESC), R$ 10
(estudantes e idosos) e R$ 20 (inteira)
Bilheteria (vendas antecipadas): de terça a
domingo, das 15h às 21h
Duração: 80 minutos
Classificação etária: 12 anos
Capacidade de público por sessão: 240
lugares
Informações: (21) 2547-0156
Criatura (Suzana
Faini/Esther) e criadora (Renata Mizrahi).
As diretoras: Priscila Vidca e Renata Mizrahi.
A autora e diretora (Renata) “invade” a cena. Com Jitman Vibranovski e Verônica Reis.
(FOTOS: RENATO MANGOLIN)
Quanta "coltura" de merda de hipócritas asiáticos sionistas!
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