A MENINA
DO KUNG FU
(SIMPLICIDADE,
INTELIGÊNCIA E SENSIBILIDADE:
TRÊS SUBSTANTIVOS PARA
SE FAZER
E cá estou eu, “fabricando tempo”, para escrever sobre
mais um espetáculo não destinado aos adultos e que me deixou feliz, por saber que existe luz no fim do túnel, porque, em meio a tantas montagens
destinadas ao público infantojuvenil, o qual será a plateia adulta de amanhã, a
maioria dessas “encenações” de qualidade duvidosa, para ser generoso e
educado, aparece, de vez em quando, uma produção merecedora de elogios,
como “A MENINA DO KUNG FU”, recém-estreada no Teatro Ipanema (VER
SERVIÇO), para uma curta temporada. Em função disso, digo-lhes que
vão logo conferir o que vou escrever aqui sobre este espetáculo, que é
para crianças de todas as idades, inclusive as que habitam em vocês, pais, tios,
avós, padrinhos, adultos irmãos de “temporões”...
Depois do grande sucesso obtido, há
nove anos, com “Joaquim e as Estrelas”, espetáculo premiado e belíssimo,
escrito por Renata Mizrahi e dirigido por DIEGO MOLINA e Gisela
de Castro, DIEGO volta-se, novamente, para o público infantojuvenil,
desta vez como autor do texto e diretor de uma obra tão poética
quanto aquela, falando de temas do nosso dia a dia, que não podem ser varridos
para debaixo do tapete e que têm de vir à luz, para debates e reflexões. DIEGO
escreveu uma peça, com supervisão de BOSCO BRASIL, 100% didática,
sem usar a técnica do didatismo, que entedia e pode até afastar o público-alvo.
Imaginem seus acompanhantes!!!
SINOPSE:
A peça, para crianças a partir dos cinco anos de idade, porém mais voltada ao público entre 9 e 13 anos, conta a história de BELINHA (MONIQUE VAILLÉ), menina de 9 anos, cega, que se matricula numa academia de Kung Fu.
Logo no primeiro
dia de aula, ela tem de encarar a desconfiança dos colegas de turma e da
professora, a MESTRA (JANAÍNA BRASIL), além das peripécias de PEDROCA
(FÁBIO NUNES), o líder do grupo, e seus dois amigos, CLÁUDIO (VICTOR
ALBUQUERQUE) e YOSHI (JORGE NEVES), que adoram
praticar “bullying”.
Com garra e determinação,
BELINHA consegue superar todas as dificuldades e provar, aos colegas e à MESTRA
que é capaz de fazer o que quiser, como uma pessoa dita “normal”.
O espetáculo é,
acima de tudo, um exemplo de superação e de incentivo à inclusão.
O lema de campanha do, então, candidato à presidência dos
Estados Unidos, Barack Obama, que acabou por ser eleito, “Yes,
we can!” (Sim, nós podemos!), pelo fato de ser “diferente” – um
negro lutando pelo comando da nação mais rica e poderosa do planeta - se
encaixa, perfeitamente, no tema desta peça. BELINHA não é uma só.
Se assim o fosse, o mais aplicável seria “Sim, EU posso!”, entretanto
ela é uma voz, uma grande voz, uma porta-voz de todos os que apresentam uma
deficiência física ou mental, mas que devem, e merecem, antes de tudo, ser
respeitados por todos e terem garantido o seu direito de ser um ente ativo e
participante, na sociedade de que fazem parte. Não é pelo fato de ser cega, ou
“deficiente visual”, como querem os “politicamente corretos”, com os quais não
concordo*, que ela não pode ter direito a uma vida como a de qualquer
outra pessoa. Ela se impõe, para conquistar seus direitos, sua vez e voz, e
provar que é capaz de fazer tudo, e consegue, porque acredita na força e na
perseverança do ser humano, assim como faz de tudo para conquistar a confiança
dos que a cercam.
Parênteses:
(*O preconceito e a discriminação não estão no vocábulo, mas,
sim, na intenção como ele é empregado, dentro de um contexto e embalado por uma
entonação, quando de forma oral. “Saia daqui, sua cega!” é bem diferente
de “Aquela menina nasceu cega”.) “Você não passa de um negro!”
não tem nada a ver com “O negro foi trazido da África, para ser
escravo no Brasil.”.).
Também
estão presentes nas ações mudas e reações idem.
#prontofalei
Só o teor da sinopse já bastaria, para que o espetáculo aqui
analisado merecesse todo o meu carinho e admiração. Mas, além disso, percebemos
uma série de fatores positivos, que fazem com que esta produção seja de excelente
qualidade, motivo de minha recomendação.
A vida da menina cega é feita de desafios, no dia a dia,
dos quais ela não foge e consegue, sempre, superá-los, porque acredita em si
mesma, crê em que nada pode anular um ser humano, quando este não se deixa
abater e quer provar sua condição de cidadão.
O fato de a protagonista ser cega é apenas o
pontapé inicial para que vários temas sejam abordados na peça, como a
questão da inclusão social – talvez o mais importante de todos, por
abarcar vários outros -, o empoderamento feminino – mais a igualdade de
direitos e deveres entre homens e mulheres - e a questão do “bullying”
– tão nefasto e que pode gerar consequências as mais desastrosas, incluindo
suicídio.
Extraído do “release”, enviado por SHEILA
GOMES (ASSESSORIA DE IMPRENSA), “BELINHA encara desafios, para se
impor com uma limitação física e num universo dominado pelos meninos. No fundo,
o texto (...) fala mesmo é de gente.”. “As relações humanas
sempre serão uma pauta atual, e é disso que a peça fala: de construirmos um
mundo, onde as pessoas se relacionem melhor. E quando falo em ‘pessoas’ falo de
todos os tipos.”, explica MOLINA.”. E com muita propriedade.
A
peça foi escrita em 2010, “quando DIEGO ainda fazia parte
da ONG Escola de Gente – Comunicação em Inclusão, e se utilizou de anos de
capacitação sobre conceitos de diversidade, para realizar o desejo de escrever
uma peça infantojuvenil que unisse inclusão e acessibilidade. Criou o texto
justamente para tratar do assunto ‘deficiência’ diretamente com a criança e
seus pais, porque, ‘apesar de pessoas com deficiência sempre terem existido (e
sempre existirão), a inclusão é uma palavra extremamente contemporânea, ainda
bastante complicada para a maioria das pessoas’, observa MOLINA”.
E
por que falar dessas questões agora? Porque, apesar de alguns avanços, nos
últimos anos, ainda se faz necessário, e muito, chamar a atenção das pessoas e
das ditas “autoridades”, em todas as esferas, para os empecilhos que ainda
existem, quando o assunto é a inclusão, envolvendo o direito a uma
educação de qualidade e à adequados métodos de mobilidade urbana, por exemplo,
e, mesmo, para denunciar a falta ou carência disso e exigir respeito a quem necessita
de uma atenção especial, no sentido de mais amplo, e adequada.
Com
relação ao vocábulo “especial”, achei muito adequado o questionamento
sobre seu emprego, quando é referente a pessoas que apresentam algum tipo de
deficiência. “Especial” por quê? Não há nada de “especial” nelas,
a não ser que sejam pessoas, seres humanos, de índole, caráter especial, que se
se sobreponham à média das outras. Ninguém é “especial” porque não é “normal”,
outra grande aberração e impropriedade. O que é ser “normal”? É ter nascido
com todos os órgãos e membros do corpo humano no lugar e funcionando
corretamente? É ter perfeita saúde mental? É agir como todo mundo age? É ser
dotado dos cinco sentidos: visão, tato, olfato, paladar e audição? “De
perto, ninguém é normal.”, já dizia o grande poeta, compositor
e intérprete Caetano Veloso.
Gostei
muito da simplicidade como o texto se apresenta, o que o faz chegar a
qualquer espectador, sem lhe exigir muito para a compreensão das mensagens nele
inseridas. Os diálogos, por meio de uma linguagem leve, direta e, por vezes,
apelando para o bom humor, são bem consistentes e claros.
A
direção, numa prova de grande competência, soube pôr em pratica uma
proposta simples, dado o problema da falta de recursos financeiros, além de,
muito corretamente – o que está ligado ao texto – não deixar que o espetáculo
pendesse para o lado da pieguice (Ou pieguismo; ambos os vocábulos existem na
língua portuguesa.).
Os
cinco atores também fogem ao clichê, já, há muito, fora de moda, de
adultos que representam crianças idiotizadas. O quinteto, ou melhor, o
quarteto, visto que a personagem MESTRA não é uma criança, representa de
modo que todos percebam, e entendam, que, no palco, há três meninos e uma
menina, sem aquelas bobagens de adultos infantilizados. O grupo apresenta um
bom rendimento, com um ligeiro destaque para MONIQUE VAILLÉ, pelo fato
de representar uma menina cega. Sabemos todos que não é fácil representar um
cego, com naturalidade. Por esse motivo, inclusive, alguns atores preferem
utilizar, em cena, óculos escuros, na composição do(a) personagem, para
lhes facilitar o trabalho, recurso para o qual MONIQUE não apelou.
Se
não há dinheiro, patrocínios e afins, o jeito é correr para a criatividade, sem
perder o bom gosto e procurando atingir a perfeição. Sendo assim, o cenário
(DIEGO MOLINA e PATRÍCIA MUNIZ), se resume a placas de EVA (Etil
Vinil Acetato, uma borracha não-tóxica, que pode ser, e é, aplicada em
diversas atividades artesanais.), coloridas, as quais se juntam, para formar um
tatame e para cobrir o fundo do palco. Solução prática, barata e que funciona
muito bem. Os figurinos (PATRÍCIA MUNIZ, também responsável pelos adereços.)
são muito simples e, como a cenografia, atendem, perfeitamente, à
posposta da peça, adequados à montagem: roupas de treinamento,
numa academia. A iluminação, criada por ANDERSON RATTO, não
precisa ser “especial” e também se adéqua ao conjunto. PEDRO NÊGO assina
uma trilha sonora que se encaixa, corretamente, na proposta da direção,
assim como o visagismo (DIEGO NARDES). Os atores põem em
prática posições e golpes de kung fu, graças às instruções, totalmente
indispensáveis, de um profissional da área, RENAM NASCIMENTO.
FICHA TÉCNICA:
Texto: Diego Molina
Supervisão de Texto: Bosco Brasil
Direção: Carolina Godinho e Diego
Molina
Elenco (por ordem alfabética): Fábio Nunes (Pedroca), Janaína Brasil (Mestra), Jorge Neves (Alcione, mas gosta de ser chamado de Yoshi), Monique Vaillé (Belinha) e Victor Albuquerque (Cláudio)
Figurinos e Adereços: Patrícia Muniz
Cenografia: Diego Molina e Patrícia
Muniz
Iluminação: Anderson Ratto
Trilha Sonora: Pedro Nêgo
Visagismo: Diego Nardes
Assistente de Visagismo: Lucas Souza
Programação Visual e Ilustrações:
Marcelo Martinez – Laboratório Secreto
Fotografias: Bruno Coqueiro
Instrutor de Kung Fu: Renan
Nascimento
Intérpretes de Libras: JDL Traduções
- Acessibilidade na Comunicação – Davi de Jesus e Jadson Abraão
Audiodescrição: Nara Monteiro
Assessoria de Imprensa: Sheila Gomes
Direção de Produção: Janaína Brasil
Produção: Carolina Godinho, Diego
Molina, Janaína Brasil e Monique Vaillé
Coprodução: Arte Nova e 2BB2
Produções Artísticas
SERVIÇO:
Temporada: De 06 a 28 de julho de
2019.
Local: Teatro Ipanema.
Endereço: Rua Prudente de Morais, 824
– Ipanema – Rio de Janeiro.
Dias e Horários: Sábados e domingos,
às 16h.
Valor dos Ingressos: R$30,00
(inteira) e R$15,00 (meia entrada).
Tempo de Duração: 50 minutos.
Classificação Indicativa: Livre (Mais
indicado para a faixa entre 9 e 13 anos.).
Gênero: Teatro Infantojuvenil.
OBSERVAÇÃO: Haverá sessões com
acessibilidade na comunicação (audiodescrição e intérpretes de libras) nos dias
21 (domingo) e 29 (sábado) de julho e em outras datas, a confirmar.
Três detalhes me chamaram bastante a atenção, na peça.
Um deles é a orientação para que não devamos superproteger as pessoas que
apresentam deficiências, para que elas não se sintam diminuídas ou excluídas e
para que tenham a oportunidade de mostrar que são capazes de levar uma vida o
mais próximo possível do modo como todos vivem. Outro aspecto é que, em hipótese
alguma, devemos ou podemos apontar um dedo para outrem, uma vez que, como todos
sabemos, quando isso ocorre, os outros quatro apontam para nós. Um dos personagens,
que, a princípio, praticava “bullying” contra BELINHA, tinha
uma perna mais curta que a outra (Só a MESTRA sabia e, sem querer,
deixou escapar.), o que era possível corrigir, com o uso, disfarçado, de uma
palmilha ou um salto, para a ocultação do “defeito”. Alguns podem ser
disfarçados, ou, até mesmo, escondidos; a cegueira não. O terceiro, ligado ao anterior é o fato de quem pratica "bullying" não gostar, quando ele se torna a vítima. ALCIONE odiava seu nome, por ser unissex, e só aceitava ser chamado de YOSHI, embora "zoasse" os outros.
Gostaria de deixar registrado um relato que me fez a assessora
de imprensa, SHEILA GOMES, depois da peça, em conversa
informal. Assisti ao espetáculo no seu segundo dia em cartaz. Disse-me
ela que, no dia anterior, o da estreia, havia, na plateia, por uma incrível
coincidência, uma menininha de nove anos, chamada BELINHA, cega também, que,
após o espetáculo, estava radiante com a experiência de ter “assistido”
à peça, com o auxílio da audiodescrição, e confessou uma
identificação total com a personagem, falando de todos os percalços que
passa na vida real, como os que viu encenados. Acrescentou que convidaria seus
amiguinhos para o espetáculo. Achei muito lindo e emocionante esse
relato. E isso prova a importância desta peça, que deveria ser mostrada,
sob um patrocínio oficial, governamental, a crianças deste país continental, sejam
as que apresentam necessidades especiais, sejam as que não apresentam qualquer
tipo de “diferença”.
Também é muito importante saber que, em determinados dias
(VER SERVIÇO.), há a presença de profissionais para atuar como intérpretes
de libras ou fazendo audiodescrição. “Afinal, não basta falar
de inclusão. É preciso incluir. Assim, crianças e adultos com deficiência
auditiva e visual vão poder assistir ao espetáculo”, diz o já
citado “release”.
Já deu para desconfiar que adorei o espetáculo e o recomendo
a todos: crianças, adolescentes e adultos?
(Foto: Gilberto Bartholo.)
(Foto: Gilberto Bartholo.)
E VAMOS AO TEATRO!!!
OCUPEMOS
TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI!!!
RESISTAMOS!!!
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TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!
(FOTOS: BRUNO
COQUEIRO.)
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