ESTES
FANTASMAS!
(FANTASMAS DO BEM,
QUE NÃO ASSUSTAM;
ANTES, DIVERTEM MUITO.)
Graças
ao empenho de três amigos, os talentosos SERGIO
MÓDENA, GUSTAVO WABNER e ERIKA RIBA, que fundaram a TRUPE FABULOSA, temos o privilégio de
nos deliciar, no momento, com mais um texto
do grande dramaturgo napolitano EDUARDO
DE FILIPPO (1900 – 1984): “ESTES FANTASMAS!”, em cartaz do Teatro SESC Ginástico (VER SERVIÇO.).
O
espetáculo faz parte de uma trilogia do
autor, projeto da TRUPE,
iniciada, em 2013, com a encenação
de “A ARTE DA COMÉDIA”, um dos
melhores espetáculos da temporada daquele ano, sucesso total de público e de
crítica, que ficou em cartaz, no Rio de
Janeiro, por quase um ano, além de ter viajado por outras praças e de ter
recebido vários prêmios e indicações. “ESTES
FANTASMAS!” é o segundo espetáculo da trilogia
e já promete o sucesso anterior.
A
peça, segundo o “release”, enviado
pela assessoria de imprensa (ALESSANDRA
COSTA – DUETO COMUNICAÇÃO), “traça um paralelo entre ficção e realidade,
num cômico jogo cênico, que revela a angústia do homem diante de sua
decadência”.
O TEATRO de DE FILIPPO, que, além de dramaturgo, também exerceu as funções
de ator, diretor e empresário, é
atualíssimo. Os temas batem à nossa porta. As críticas que ele fazia, em sua
época, são pertinentes à sociedade atual, às diversas classes sociais e,
também, como não poderia deixar de ser, atinge os políticos.
“A Arte da Comédia”, escrita em 1968, por exemplo, já retratava a
triste realidade em que está mergulhada a cultura brasileira, atualmente, com
ênfase para o TEATRO. A prova disso
está na sinopse daquela peça, que
nada mais é do que “o dono de uma
companhia de TEATRO passa por dificuldades financeiras e decide recorrer ao
prefeito da pequena cidade, para pedir ajuda. Mas as coisas não saem como ele
esperava”.
O diretor, falido e abalado, não
logrou êxito, ao recorrer a uma ajuda municipal. Tendo-lhe sido
negada a salvação de sua companhia, o pobre homem, ao ser expulso do gabinete,
toma conhecimento de uma lista de “personalidades”, as quais aguardam ser
recebidas pelo prefeito, naquela mesma tarde. Arquiteta, então, um engenhoso
plano, proposto à autoridade, que consistia em infiltrar, entre que
participariam das audiências, sem que aquele soubesse quem eram, alguns atores
de seu grupo, a fim de que o prefeito e seus auxiliares diferenciassem o que é
realidade e o que é ficção. A
peça também critica os costumes hipócritas da sociedade e as
artimanhas do jogo de poder entre os governantes.
Querem
algo mais atual que isso?! Se não fosse
a determinação e a resistência da classe
teatral brasileira, provavelmente, os teatros
estariam, hoje, todos fechados, se dependesse das ditas “autoridades” governamentais,
principalmente no município do Rio de
Janeiro, entregue, infelizmente, nas mãos de um “administrador” que pouca,
ou nenhuma, importância dedica às artes e que, determinadamente, nega-se a
cumprir o que foi acordado na administração anterior (PAGA O FORMENTO, PREFEITO!!!).
"ESTES FANTASMAS!”, texto escrito em 1945 e estreado em 1946, no período pós-guerra, é a peça
preferida de DE FILIPPO, “uma
comédia, ao mesmo tempo, divertida e amarga, já que expressa um profundo
desencanto do autor em relação ao mundo e introduz o 'fantástico' no cotidiano
dos personagens. Baseia-se em dois núcleos temáticos: a comunicação difícil, com
a falta de solidariedade entre os vivos, e a fragilidade do homem, predisposto
a crer em tudo aquilo que deseja, às vezes, entregando-se à compreensão dos
mortos. Para PASQUALE LOJACONO (THELMO FERNANDES), o protagonista, a realidade
se tornou tão insuportável (pois ela já anuncia sua degradação moral e
financeira), que só lhe resta crer, cegamente, num plano espiritual, como forma
de salvação” (retirado do “release”,
com ínfimas edições).
SINOPSE:
PASQUALE (THELMO FERNANDES) muda-se com sua esposa, MARIA (ANA VELLOSO), para um antigo
casarão, que, há anos, é tido como mal assombrado (repleto de histórias da
tradição medieval napolitana).
Mas o que se sucede é uma
série de acontecimentos que nada têm a ver com seres do outro mundo.
No entanto, ele prefere
acreditar que tudo o que ali acontece é obra do além, salva a si mesmo de sua
iminente tragédia, porque se permite acreditar que o amante de sua mulher é um
"fantasma", que assombra sua nova casa e que lhe dá dinheiro, de modo “benevolente”.
O auge da ironia ocorre
quando PASQUALE convida o “fantasma”
para permanecer em sua casa e, também, quando ele aceita seu dinheiro, pois é a
única forma de adquirir pequenas coisas para sua mulher, que tanto ama.
A
peça acabou por se tornar um dos maiores sucessos da carreira do dramaturgo e vem sendo encenada, com
sucesso, desde sua primeira apresentação até os dias atuais, pelo mundo a fora.
EDUARDO DE FILIPPO é, de direito e de
fato, reconhecido como um dos maiores artistas italianos, conquanto, no Brasil, ainda estejamos lhe devendo o
merecimento a que faz jus. Muitas de suas peças, aqui representadas, como “Filomena Marturano” e “Sábado, Domingo e Segunda”, além de “A Arte da Comédia, já citada, foram
grandes sucessos e merecem novas montagens (Qual
será a terceira da trilogia pensada pela TRUPE FABULOSA?). O nome de DE FILIPPO, contudo, ainda não foi
colocado no mesmo patamar ocupado por seu patrício Dario Fo, a quem o igualo, entre nós. A propósito, FO e outros grandes dramaturgos
italianos modernos beberam bastante na fonte de DE FILIPPO, assim como este assimilou muito do TEATRO de Luigi Pirandello
e Carlo Goldoni.
Ainda
retirado do “release”, “A
peça é um exemplo brilhante da capacidade do dramaturgo italiano em unir teatro
popular com uma visão socialmente engajada do mundo. Aqui, o trânsito entre
ficção e realidade produz não só um poderoso e divertido jogo teatral, mas
revela, também, a angústia do homem perante sua própria decadência. Para ele,
resta apenas a fé cega num universo fantasmagórico, que mascara o assombroso
mundo que o cerca”.
Brincando
com a realidade cotidiana, palpável, e a do além, imaginada, o autor faz com
que o espectador saia do Teatro com
dois grandes ensinamentos. O primeiro prega que “o Homem não deve, jamais, ser
refém de convicções pré-determinadas”. O outro é que, também, “não
é apenas mérito enxergar o mundo tal como ele é, mas, principalmente, uma
obrigação moral”.
Pode-se,
com toda certeza e ênfase, afirmar que o TEATRO
de DE FILIPPO é universal e, de
certa forma, atemporal.
“ESTES FANTASMAS!” é daquelas comédias
de que sentimos falta e que nos fazem sair do Teatro leves e felizes, pela extrema qualidade do texto, tão bem traduzido, adaptado e dirigido por SERGIO MÓDENA, com um elenco
invejável e apoiado em elementos
técnicos de alto nível.
Deixei
o Teatro SESC Ginástico sem a menor restrição
à peça; ao contrário, vejo, nela, uma das melhores encenações deste ano.
MÓDENA é um dos nossos melhores encenadores, com tantos sucessos
emplacados, sempre ousado e se renovando, via de regra, com mais de um
espetáculo em cartaz. Sua direção é
brilhante, demonstrando conhecer as entrelinhas do pensamento de DE FILIPPO e explorando, com total
domínio, o potencial do material humano com o qual trabalha. Achei muito
interessantes todas as soluções encontradas pela direção, para reunir, num palco, tudo o que é possível e
necessário àquilo que se pode chamar de uma boa
montagem teatral.
É
impressionante o grau de homogeneidade do elenco,
todos afinadíssimos e com oportunidade de mostrar seu talento, individual e em
equipe.
Como
em “A Arte da Comédia”, THELMO FERNANDES é um dos grandes nomes
em cena. Não por sua função de protagonista;
mais por seu imenso potencial, tanto para a comédia como para o drama. Seu PASQUALE é hilário. Todas as suas cenas
são muito engraçadas e ganham destaque aquelas em que ele, por orientação de RAFAELE, o porteiro, é obrigado a fazer muitas aparições,
nas mais de sessenta sacadas do imóvel, para ser visto pelos vizinhos, a fim de
que estes deixassem de pensar que o prédio era mal-assombrado. Os presumíveis “diálogos”, em que só ele fala, com os
vizinhos dos prédios vizinhos são divertidíssimos.
GUSTAVO WABNER também está excelente,
no papel de ALFREDO, o amante de MARIA, mulher de PASQUALE. Ele é um rico almofadinha, um homem casado e com filhos,
que, literalmente, “sai do armário”; ou melhor, “de UM armário”. Ele quer convencer a amante a abandonar seu marido,
para viver com ele.
ALEXANDRE LINO, que é mais visto em papéis
dramáticos, sempre com ótimas atuações, aqui, nos mostra o seu lado cômico, na
pele do porteiro RAFAELE,
valorizando, extremamente, um personagem que parece de menor coadjuvância, mas
que tem uma grande importância na arquitetura do texto.
ANA VELLOSO brilha nos três papéis que
representa, totalmente diferente uma personagem da outra. Suas trocas de roupa
são tão rápidas e o visagismo, de GUILHERME
CAMILO, é tão bom, que algumas pessoas não percebem se tratar de uma mesma
atriz, nos três papéis.
CELSO ANDRÉ se apresenta numa excelente
composição, uma das melhores, dentre todos os seus trabalhos a que tive o
prazer de assistir.
RODRIGO SALVADORETTI é aquele ator que
pode ser chamado de “ator em papel
coadjuvante de luxo”, uma vez que tem uma participação pequena, na trama,
entretanto atua de forma correta, principalmente quando interpreta o FILHO, com tiques nervosos e outras
peculiaridades.
E o que dizer
de STELA FREITAS, uma das nossas
damas do TEATRO? STELA (ARMIDA) tem uma pequena participação na peça; na verdade, atua em
uma única cena. Isso, porém, não diminui sua importância; muito ao contrário,
sua aparição é um acontecimento. Ela rouba, totalmente, a cena, sem se esforçar
para isso, levando a plateia a aplaudi-la em cena aberta. Esse feito não se vê
todos os dias; é algo só conseguido por quem respira talento por todos os
poros. Será, para sempre, lembrada, por tal participação, a despeito de tantos
personagens marcantes que representou em sua longa trajetória no TEATRO.
Também dignos
de elogios são o cenário, de DORIS ROLLEMBERG; os sóbrios e bem
talhados figurinos, de MAURO LEITE, e a ótima iluminação, de TOMÁS RIBAS, o que já se tornou um lugar-comum, quando falo de seus
trabalhos.
MARCELO ALONSO NEVES, responsável pela direção musical, para não ficar de fora
dos merecidos elogios, preparou uma ótima trilha
sonora, com canções originais, especialmente escritas para a peça, as quais sublinham as cenas, com mais propriedade aquelas em que os fatores
medo, desconfiança e suspense se fazem presentes.
FICHA TÉCNICA:
Texto:
Eduardo De Filippo
Tradução,
Adaptação e Direção: Sergio Módena
Assistência
de Direção: Gustavo Wabner
Elenco:
Thelmo Fernandes (Pasquale Lojacono), Gustavo Wabner (Alfredo), Alexandre Lino
(Rafaele e Avô), Ana Velloso (Maria, Carmela e Filha), Celso André (Gastone) e
Rodrigo Savadoretti (Carregador e Filho)
Atriz
convidada: Stela Freitas (Armida)
Cenografia:
Doris Rollemberg
Figurinos:
Mauro Leite
Iluminação:
Tomás Ribas
Direção
Musical: Marcelo Alonso Neves
Adereços:
Derô Martín
Visagismo:
Guilherme Camilo
Programação
Visual: Gustavo Wabner
Assessoria
de Imprensa e Mídias Sociais: Alessandra Costa e Michelli Toledo – Duetto
Comunicação
Fotografia:
Desirée Do Valle
Assistente
de Fotografia: Alan Fonseca
Vídeos:
Chamon Audiovisual
Cenotécnico:
Humberto Silva Junior e Equipe
Montagem
de Cenário: Beto de Almeida
Alfaiate:
Joaquim Cardoso
Costureiro:
Jorge Luiz Pereira
Operador
de Som: Kléber Corrêa
Operadores
de Luz: Rita Sérgio e Adeílson Moreira
Contrarregra:
Rodrigo Bispo
Camareiraa:
Cycy Kalpakian e Daise Sant’anna
Gestão
do Projeto: Renata Leite – Rinoceronte Entretenimento
Assistente
Financeiro: Angélica Neves – Rinoceronte Entretenimento
Produção
Executiva: Alice Cavalcante, Ana Velloso e Vera Novello
Direção
de Produção: Alice Cavalcante e Ana Velloso
Co-Produção:
Trupe Fabulosa, Sábios Projetos e Lúdico Produções
SERVIÇO:
Temporada:
De 06 a
30 de julho de 2017.
Local:
Teatro Sesc Ginástico.
Endereço:
Avenida Graça Aranha, 187 - Centro – Rio de Janeiro.
Telefone:
(21) 2279-4027
Dias
e Horários: De 5ª feira a sábado, às 19h; aos domingos, às 18h.
Valor
dos Ingressos: R$6,00 (associados do Sesc), R$12,00 (jovens até 21 anos, estudantes
e maiores de 60 anos) e R$25,00 (inteira).
Horário
de Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a domingo, das 13h às 20h.
Capacidade:
513 lugares.
Gênero:
Comédia Dramática.
Duração:
90 minutos.
Classificação
Etária: 12 anos.
“ESTES FANTASMAS!” estava fazendo
falta, no panorama teatral do Rio de Janeiro, um pouco carente, nos últimos
tempos, de boas comédias, bem montadas, com estilo e bom gosto.
Para
finalizar, um pouco do pensamento do autor
do texto, para reflexão: “Não sei quando minhas comédias morrerão e
não me interessa. O que importa é que tenham nascido vivas; porque o TEATRO
morre, quando se limita a contar acontecimentos. Somente as consequências
desses acontecimentos podem ser narradas em um TEATRO VIVO.” (EDUARDO DE FILIPPO)
(FOTOS: DESIRÉE DO VALLE.)
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