sexta-feira, 11 de março de 2016


FATAL
 
 
 
(A VEZ DA “VOZ”
DO / NO AMOR-PAIXÃO.)
 
 
 
 
 
 
            No “meu” Gênesis, Deus disse: “HAJA AMOR”!
E o AMOR se fez.
E disse, depois: “HAJA A PALAVRA”!
E a PALAVRA se fez.
E completou: “QUE A PALAVRA TRADUZA O AMOR”! E a PALAVRA, ela apenas, pode, com toda a sua força, traduzir o AMOR e tudo o que ele representa na vida e na perpetuação do ser humano.
 
É só conferir, no Teatro OI Futuro Flamengo, o que está dito acima, presente na peça “FATAL”, uma coletânea de três textos inéditos, curtos, em extensão, e profundos, em verdades e emoções, representados por DEBORA LAMM e PAULO VERLINGS, escritos por três dos mais representativos dramaturgos brasileiros da atualidade, aqui, na ordem em que os textos são representados: PEDRO KOSOVSKI (“MONSTROS”), MARCIA ZANELATTO (“TRISTÃO E ISOLDA PEEP SHOW”) e JÔ BILAC (“KAMA-SUTRA SECRETO”).
 
 
 
 
 
 
 
SINOPSE:
 
São três histórias de amor, inspiradas em mitos e lendas.
 
O amor em três tempos.
 
Uma trilogia sobre a paixão, criada a partir de mitos e lendas.
 
Os dramaturgos PEDRO KOSOVSKI, MARCIA ZANELATTO e JÔ BILAC criaram três textos, livremente inspirados nas histórias de EROS E PSIQUÊ, TRISTÃO E ISOLDA e KAMA E RATI, respectivamente, na ordem em que são apresentadas.
 
Em cena, DEBORA LAMM e PAULO VERLINGS formam um casal, que conta, em três atos, sem intervalos, os encontros amorosos desses mitos e a fatalidade (daí o titulo do espetáculo) a que levam tais encontros.
 
Filho de pai indiano, JÔ BILAC mergulhou na própria ancestralidade e inspirou-se na história de KAMA, o deus do amor hindu, e RATI, a deusa da paixão e dos prazeres eróticos, para escrever “KAMA-SUTRA SECRETO”, título de seu texto.
 
MARCIA ZANELATTO apresenta “TRISTÃO E ISOLDA – PEEP SHOW”, uma genial adaptação do clássico universal “Tristão e Isolda”, lenda, de origem celta, sobre o amor trágico de um jovem casal, unido por uma paixão fatal.
 
Em “MONSTROS”, que inicia a peça, PEDRO KOSOVSKI, de forma bastante ousada e criativa, teve, como ponto de partida, os encontros, às escuras, de Eros e Psiquê, num “dark room” mitológico. Em vez de um espaço tradicionalmente reservado para atividades sexuais, aqui ele se destina aos percalços da paixão.
 
 
 
 
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Debora Lamm e Paulo Verlings.
 
 
            Com o propósito de continuar desenvolvendo projetos que reunissem fragmentos de variações sobre uma mesma temática, novos olhares sobre um mesmo tema, como já fizera em “RockAntígona” e “Trágica.3”, nos quais as tragédias gregas eram o pano de fundo, o diretor GUILHERME LEME GARCIA resolveu, com esta montagem, investir na “paixão”, explorar novos olhares sobre o amor e suas consequências.
 
GUI escolheu os três autores, tão distintos, entre si, nos seus estilos, sugeriu-lhes as histórias e ficou na expectativa de que, individualmente, sob uma ótica particular, cada um desenvolvesse as três propostas, os três mitos, com ênfase na palavra.
 
A palavra que tem força.
A palavra que subverte.
A palavra que atiça e acalma.
A palavra que explica, que define, que provoca, que encanta, pela sonoridade, e eleva ou destrói, pela intenção.
 
            O processo de criação dos textos foi bastante solitário, cada um dramaturgo, distante do outro, embora trabalhando no (e para o) coletivo, criando, mas sem tomar conhecimento do trabalho do companheiro de ofício. Mas os três sabiam, por orientação do diretor, que a mola mestra do espetáculo seria a “paixão” e que a ferramenta que a levaria ao público estaria no som, na “palavra falada”, um espetáculo em que a força visceral estaria nela, e não nos movimentos. Um espetáculo para os ouvidos, e não para os olhos.  O ato de interpretar, de passar uma mensagem ao público ficaria por conta da força persuasiva dos vocábulos e não no gestual, na movimentação corporal. E assim se fez “FATAL”.
 
 
 
A paixão nas sombras ou à sombra da paixão.
 
 
Tanto é fato que, do ponto de vista de movimento cênico, pode-se dizer que quase nada existe, uma vez que os atores atuam sentados, à exceção da primeira história, em que estão de pé, porém quase estáticos, limitando as expressões físicas, no decorrer de todo o espetáculo, à cabeça e, raramente, às mãos, da forma mais suave e discreta possível. O resto é som, o resto é voz, o “resto” é a palavra.
 
            Não se trata de um espetáculo “comum”, que vá ser do agrado da massa, daqueles que têm uma outra visão do que seja um espetáculo teatral, na sua concepção clássica, tradicional. Mas tem de ser visto por todos os que amam o bom TEATRO. É uma peça que exige muito, em primeiro lugar, do intelecto, da atenção, da concentração do espectador, para compreender a semântica contida no que é dito. Em segundo lugar, o esforço intelectual do espectador volta-se para juntar essas palavras e formar o quebra-cabeça que elas vão nos proporcionando montar, para que nos aproximemos, o máximo possível, das sensações vivenciadas pelo três casais de protagonistas e da fatalidade que vivem, em suas relações.
 
            Para a direção, que, é certo, conhecia bem cada um dos “provocados”, os que assinam os textos, deve ter sido um trabalho muito interessante, no sentido de criar um espetáculo que, a despeito do caráter heterogêneo das fontes dos três textos, não permitisse que o produto final se transformasse num falso todo, fragmentado, em três partes: aqui, termina uma; agora, iniciamos outra; e mais esta, para finalizar. O tom de uniformidade, de um todo indivisível, reunindo histórias de épocas diferentes, ocorridas em culturas diferentes, forma um uníssono genialmente alcançado, graças ao brilhante trabalho de direção, de GUILHERME, e às magistrais interpretações de dois jovens artistas, dos melhores de sua geração: DEBORA e PAULO.
 
            Ainda sobre o trabalho de direção, é oportuno dizer que GUI ignorou, completamente, e com muita propriedade, o que possa ser considerado contenção e sugou, dos atores, toda a seiva arrebatadora, num profundo processo de interpretação, e não se preocupou em economizar as explosões de sentimentos, em refrear a carga emotiva que brota do casal de intérpretes. E o resultado é um brilhante espetáculo, de mexer com as emoções do espectador e levá-lo ao êxtase da paixão - da sua ou concentrada, simplesmente, na dos personagens.
 
            Os três textos são excepcionais.
 
A ideia de PEDRO KOSOVSKI, de trazer um casal da mitologia grega, cuja história é uma alegoria à alma humana, purificada por paixões e desgraças, para o interior de uma moderna “dark room” é genial e tem bem a “cara” desse grande dramaturgo, à frente de seu tempo.
 
Ele não nos permitiu “ver”, por ter preferido um “dark room”, porém nos deu a oportunidade de “sentir”, estimulou a nossa imaginação. E como estimulou!!!
 
No princípio, tudo às escuras e com muita fumaça, pode parecer que o espetáculo será monótono, mas basta se ligar no diálogo e se entregar aos estímulos provocados pelas palavras, que tudo vir festa.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MARCIA ZANELATTO foi de uma felicidade ímpar, apresentando, num novo código, moderno e extremamente ousado, na forma e na linguagem, a história de um casal, Tristão e Isolda, uma lenda medieval, de origem céltica, certamente, uma das mais belas histórias de amor da literatura universal, cujas primeiras versões escritas datam do século X. No palco, o que se percebe é a grandiosidade de uma história, traduzida em formato bem minimalista e recheada de um erotismo gostoso, estimulante e instigante, mexendo com os hormônios da plateia. (Bem, é melhor parar por aqui...).
 
Creio ser oportuno explicar, a quem não sabe, o que seja um “PEEP SHOW”, também conhecido como “PEEP BOX”. Trata-se de uma "caixa de surpresas" ou rare show” ("espetáculo raro"), surgido no século XV, na Europa. Consiste numa caixa de madeira, com um buraco ou vários buracos. O interior da caixa era decorado, para se parecer com cenas teatrais (cenários). O espetáculo era acompanhado por uma recitação dramatizada, explicando o que estava acontecendo em seu interior.
 
MARCIA nos reserva “buracos”, para que enxerguemos, ainda que meio na penumbra, o interior dessa caixa, fazendo, de nós, “voyaeurs” privilegiados.
 
 
 
 
 
 
JÔ BILAC abusou do direito de acertar, ao se concentrar na história de Kama e Rati. “Kama, é a divindade indiana do desejo. Eternamente jovem (Porque o desejo flerta mais com os jovens - eu acrescento.), é considerado o mais bonito, dentre os 330 milhões de deuses do panteão hindu. No ocidente, o termo sânscrito chegou com o clássico KAMA SUTRA. A obra, escrita entre os séculos III e V, é uma espécie de manual técnico para o aumento do prazer sexual. Por isso, Kama também é, muitas vezes, visto como o deus do desejo erótico.
 
Logo ao nascer, Kama, cupido, deu uma flechada em seu pai, Brahma, e o fez apaixonar-se pela própria filha (Saraswati). Irritado, Brahma o amaldiçoou e disse que, um dia, Kama seria reduzido a cinzas, por uma de suas vítimas. Pouco convencido disso, o cupido indiano continuou aprontando e acertou o mestre Shiva, em plena meditação. Irado, a divindade lançou um relâmpago sobre Kama, cumprindo a profecia de Brahma. Sem Kama, o desejo extinguiu-se e homens e mulheres passaram a se ignorar uns aos outros.
 
Rati, deusa da paixão e esposa de Kama, pediu, então, a Shiva que trouxesse seu marido de volta ao mundo da existência. A divindade consentiu, mas Kama, depois disso, se tornou invisível. Por isso, acredita-se que ele paira acima dos amantes e faz com que se abracem, sem ser notado. Mais “FATAL” do que isso é impossível!
 
 
 
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            DEBORA LAMM e PAULO VERLINGS, ainda que pertencentes a companhias diferentes, já fizeram alguns trabalhos juntos e desenvolvem, em cena, uma química, uma cumplicidade, poucas vezes verificada entre dois grandes artistas. Completamente desprezada qualquer possibilidade ou intenção de prevalência de egos, os dois, da forma mais humilde e generosa possível, se doam, fundo, na troca de emoções, valorizando o que já é ótimo em cada um dos três textos. São dois dos meus prediletos intérpretes, tanto na comédia quanto no drama, dos melhores atores da atualidade, sempre saindo de um espetáculo e ingressando em outro, superando-se, a cada trabalho.
 
Há de se ressaltar que, além de brilhar nas três personagens, DÉBORA está linda em cena, uma beleza interior, que explode no seu olhar, que contagia o público. Trata-se de uma das atrizes de maior carisma e rápida comunicação com a plateia que já tive a oportunidade de ver atuando. Sua versatilidade, nas três narrativas, é surpreendente, assim como a capacidade de decorar trechos dificílimos, nas três histórias, como, por exemplo, uma sequência, na segunda, em que tem de dizer, na ordem correta, evidentemente, 135 formas verbais, dissílabas, paroxítonas, no modo imperativo, loucura saudável da cabeça de MARCIA ZANELATTO. Também ocorre essa “insanidade”, no início da última história, quando a atriz tem de dizer uma sequência de nomes indianos, ao citar quem deu origem a quem, ou quem descende de quem. Um trabalho hercúleo, de competência e dedicação.
 
PAULO VERLINGS também não dá, ao crítico, a menor chance de lhe tecer um único comentário negativo, com relação ao seu trabalho, em “FATAL”. Para dizer a verdade, no seu “pior” trabalho, como ator, sempre esteve ótimo. Aqui, ele exercitou, incansavelmente, a técnica de dizer e a arte de convencer, sempre com o predomínio da palavra. Mesmo em certas cenas, em que o “foco” está mais voltado para DEBORA, dá vontade de aplaudir o trabalho do PAULO, em cena aberta, o que não é recomendado, para não atrapalhar sua atuação. Assim como DEBORA, ele sabe fazer, nesta peça, com que o gestual perca para a força do texto. Para um ator, acostumado a representar, utilizando, como ferramentas de trabalho, a voz e do corpo, o ficar “engessado”, intencionalmente, por indicação do diretor, deve ser até desconfortável. Permanecer sentado, o tempo todo, reprimindo a movimentação natural que acompanha as palavras. Imprime, aos três textos, certas entonações e inflexões dignas de aplausos.    
 
            Para completar a correção e a beleza do espetáculo, é preciso registrar o trabalho, em parceria, de AURORA DOS CAMPOS, na cenografia, e TOMÁS RIBAS, na excelente iluminação, aqui chamado, muito propriamente, o conjunto, de “instalação cênica”.
 
            Acompanham os acertos, nesta montagem, o figurino, de MARCELO OLINTO, e a trilha sonora de um craque no assunto, MARCELLO H, sempre presente nas montagens de GUILHERME LEME GARCIA.
 
“FATAL” é daqueles espetáculos ditos “não-populares”, porém considerado um magnífico trabalho teatral, no que concerne a uma nova estética para se contar histórias e que recomendo muito.  
 
 
 
 
 
 
 
 
FICHA TÉCNICA: 

Dramaturgia: Jô Bilac, Marcia Zanelatto e Pedro Kosovski
 
Elenco: Debora Lamm e Paulo Verlings
 
Concepção e Direção: Guilherme Leme Garcia
Assistente de Direção:
Charles Asevedo
Instalação Cênica:
Aurora dos Campos (Cenografia) e Tomás Ribas (Iluminação)
Figurino: Marcelo Olinto
Trilha Sonora: Marcello H.
Assistente de Trilha Sonora: Braulio Giordano
Colaboração Artística: Vera Holtz
Projeto Gráfico:
Alexandre de Castro
Fotos: Zô Guimarães
Assistente de Produção:
Pyetro Ribeiro
Produção Executiva: Maria Albergaria
Direção de Produção:
Sérgio Saboya
Assessoria de Imprensa: Bianca Senna e Paula Catunda
 
 
 
 
 
 
 
 
                       SERVIÇO:

Temporada: De 19 de fevereiro a 10 de abril de 2016.
Local: Oi Futuro Flamengo (Rua Dois de Dezembro, 63 – Flamengo) – Rio de Janeiro.
Informações: (21) 3131-3060.
Dias e Horários: De 5ª Feira a domingo, às 20h.
Capacidade: 63 lugares.
Duração: 60 minutos.
Classificação Etária: 14 anos.
Gênero: Drama.
Valor dos Ingressos: R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia-entrada).
Horários da Bilheteria: De 3ª feira a 6ª feira, das 14h às 20h. Sábados, domingos e feriados, das 13h às 20h.
Ingressos à venda, também, pelo “site” www.ingressorapido.com.br ou pelo telefone 4003-2330.
 
 
 
 
O diretor Guilherme Leme Garcia.
Paulo Verlings, Marcia Zanelatto, Jô Bilac, Debora Lamm, Guilherme Leme Garcia e Pedro Kosovski.
 
 
 
 
 
(FOTOS: ZÔ GUIMARÃES.)
 
 
 

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