BRIMAS
(QUIBES COM “CARA” DE
SOLIDARIEDADE, GOSTO DE INGENUIDADE E CHEIRO DE AMOR.)
2015 foi um ano de agradáveis surpresas
teatrais, para mim, pelo menos, no Rio de Janeiro. Ano em que conheci pessoas
incríveis e talentosas, além de textos excelentes, principalmente no segundo
semestre.
Numa
noite de 2ª feira, 7 de dezembro,
desloquei-me, do Recreio dos
Bandeirantes ao Leblon; mais
precisamente, fui ao Midrash Centro
Cultural, um local ao qual sempre vou com o maior prazer, para assistir a
uma peça de TEATRO escrita e
interpretada por quem eu não conhecia. Um espetáculo cuja ficha técnica era quase que totalmente desconhecida para mim. Mas,
como amante de TEATRO e jurado de um
Prêmio de TEATRO, aceito todos os
convites que me fazem e, sem o menor preconceito e com o maior prazer e
interesse, assisto a 99,9% das peças para as quais sou convidado. E sempre
aberto a qualquer proposta e com o firme propósito de gostar do que me
proporcionam ver.
Nem
sempre saio com a melhor impressão sobre o que vejo. Em compensação, várias
vezes, terminada a apresentação de uma peça, agradeço aos DEUSES DO TEATRO por aquele momento. Foi exatamente o que
aconteceu, depois de ter assistido a “BRIMAS”,
uma montagem “pequena”, em termos de produção, e GRANDE, em se tratando de
qualidade, a ponto de ter recebido uma indicação, num importante Prêmio de Teatro (não é aquele do qual
sou jurado), na categoria de Melhor
Texto.
Beth Zalcman e Simone Kalil.
Quem
disser que, com simplicidade e um baixo orçamento, não se consegue produzir um
espetáculo teatral de alto nível faça o favor de conferir o contrário, já que a
peça voltou ao cartaz, agora no Teatro
Cândido Mendes, em horário nobre (conferir
SERVIÇO). Assisti, ontem, à reestreia, e redobrei a melhor impressão que
ele já me causara.
A
peça, escrita e interpretada por BETH ZALCMAN e SIMONE
KALIL, torna
possível o
encontro de duas senhoras imigrantes, vindas, uma do Egito e outra do Líbano,
para o Brasil, no início do século XX.
Para
que compreendam melhor o que irão ver em cena, transcrevo um texto, assinado
por BETH e SIMONE, do programa da peça:
“Certos encontros acontecem, quando estamos preparados para eles, para
o aprendizado que irão nos proporcionar. Há dois anos, falamos das ‘Brimas’. Uma
comentou que estava iniciando o projeto de uma peça sobre sua avó e os
libaneses que vieram para o Brasil. A outra arregalou os olhos, porque começara
a escrever a história de sua avó, egípcia, e dos imigrantes judeus, vindos do
Oriente Médio. A junção das duas matriarcas, na mesma peça, foi imediata e,
mais adiante, as surpresas: casaram-se no mesmo ano, tiveram o mesmo número de
filhos, vieram para o Brasil na mesma época, ficaram viúvas cedo, cozinhavam os
mesmos pratos, cantavam as mesmas músicas e tornaram-se referência para suas
famílias. As duas fizeram a vida virar história.
O tempo passou e, por um acaso, se é
que acasos existem, este ano (2015), retomamos o projeto ‘Brimas’. Começamos a
escreve as histórias vividas por nossas avós, que se misturam com a história do
Rio de Janeiro e com tantos outros imigrantes, que aportaram aqui, no início do
século passado... “MUITA
SOLIDARIEDADE, OS QUE CHEGAVAM ERAM ACOLHIDOS, NÃO PRECISAVA SER PARENTE,
BASTAVA SER IMIGRANTE”
(trecho da peça). Rimos, choramos, admiramos, lembramos e sentimos. Escrevemos este
texto, inspiradas na estrutura dos mosaicos do Oriente Médio, que contêm força
e beleza em cada parte e fazem um todo deslumbrante. Cada cena era um mergulho
em cores, cheiros, sabores, risos, sabedoria, cumplicidade, amizade, identidade
e afeto.”
Ester e Marion.
Trata-se
de uma comédia leve, doce, com “cara” de
solidariedade, gosto de ingenuidade e cheiro de amor. O texto é atualíssimo, num momento em que
ganham destaque, nos noticiários, em todas as mídias, questões como a da intolerância religiosa e a da imigração, além de ser um vetor para
provar que, numa verdadeira amizade, não há espaço para preconceitos, de
qualquer ordem.
A
sinopse que me foi enviada pela assessoria de imprensa (Minas de Ideias Comunicação Integrada)
é muito sucinta e não consegue dizer tudo o que a peça pode passar e representar
para cada espectador, mas creio ser suficiente para despertar o interesse por
esta montagem:
SINOPSE:
Duas
senhoras imigrantes, ESTER (BETH ZALCMAN) e MARION (SIMONE KALIL), revivem, com muito humor, suas histórias,
enquanto cozinham quibes para um velório.
O riso, a
saudade da família e as memórias do passado se misturam nessa história, cheia
de emoção e sabedoria.
O texto, escrito a quatro mãos, é baseado em histórias reais, das avós das duas atrizes e
dramaturgas. As personagens são uma judia (ESTER)
e outra católica maronita (MARION).
As atrizes trazem, para o palco, lembranças familiares, que, mesmo sendo de
religiões diferentes, são similares, quanto ao idioma, aos hábitos e aos
costumes.
De acordo com o “release”, “A peça fala sobre o amor à terra em que se
nasce, o orgulho de pertencer à pátria brasileira, que as acolheu como
filhas, a travessia, o ir sempre em frente, a esperança, a memória do que
ficou para trás, a saudade e a expectativa da alegria de dias melhores. Esses
ingredientes representam a saga
de muitos imigrantes”.
A direção é de LUIZ ANTÔNIO ROCHA, que diz, sobre o
espetáculo: "Muito feliz por ter embarcado nessa viagem, nesse projeto lindo e
abençoado! Falamos dos imigrantes, que deixam suas pátrias e cruzam o oceano,
em busca de uma nova pátria. Através do humor, vamos falar dessas travessias”.
Ainda consta, no “release”: “Para a autora e atriz BETH ZALCMAN, falar
de sua avó é falar de identidade construída pelo afeto, pelo cheiro e sabores
da comida, pelos gestos, pela voz, pelas histórias vividas e sentidas. ‘BRIMAS’
é falar da possibilidade de encontros, de paz, independentemente de crenças,
nesse momento contemporâneo de tanta intolerância”.
“A
força dessas matriarcas, nossas avós, representando tantos outros imigrantes,
tantas outras avós, tantas outras mulheres. Essa peça fala do Oriente Médio e
fala do Brasil. Na verdade, ‘BRIMAS’ fala de tudo aquilo que diz respeito ao
que há de mais humano em nós: o amor, a saudade, a família, a fé e a alegria”, completa SIMONE
KALIL.
A dupla de atrizes, desde que
entram em cena até o último momento da peça, constrói um clima de alegria, de
paz, de descontração, apesar de a ação se passar durante um velório. A começar
pelo fato de entrarem em cena, cumprimentando, bem descontraidamente, os que “vieram
para o velório”, oferecendo-lhes quibes de abóbora. “A comida acaba e as duas matriarcas se
empenham em fazer mais tabuleiros de quibe. O público vai descobrindo a cultura
do Oriente Médio e a coragem dessas matriarcas, amigas inseparáveis,
apaixonadas pela vida.”, diz, ainda, o “release”.
A inclusão do texto, na lista de indicados como um dos melhores de 2015, num
importante Prêmio de TEATRO, pode
ter causado surpresa a alguns, mas tenho a certeza de que o que mais deve ter
pesado na indicação foi a sua simplicidade, a ausência dos elementos que
complicam, para o público médio, dificultam a compreensão das intenções do
dramaturgo, infelizmente, presente em tantos textos “cabeça”, que andam por aí,
aplaudidos e reverenciados por uma “intelligentsia” ipanemense e seguido pelos que não podem ficar “por fora
do clima”, “perder a onda”, “dando pinta de ignorantes”, o que não é o meu
caso. “BRIMAS” é TEATRO, o TEATRO de que eu gosto, o TEATRO que o público entende e com o
qual se emociona, a ponto de aplaudi-lo de pé.
No Midrash Centro Cultural, a montagem já era boa, a despeito da falta
de recursos para um espetáculo teatral, em função do espaço acanhado e da ausência
de um suporte técnico, principalmente com relação à iluminação. No Teatro Cândido
Mendes, o espetáculo cresceu muito, em todos os sentidos, já que o TEATRO funciona bem quando todos os elementos
se complementam e ajudam, um ao outro, a valorizar cada detalhe da montagem.
Com relação à luz, por exemplo, esta era um elemento não notado, na primeira
temporada, ainda que levasse a assinatura de AURÉLIO DE SIMONI. Segundo o próprio, com quem conversei – e eu
concordo, plenamente –, neste espetáculo, a luz deve ser a mais simples possível, não há muito que fazer ou
inventar. Nesta encenação, no Teatro Cândido
Mendes, que é um teatro “de verdade”, e não uma sala adaptada para teatro, AURÉLIO continua pondo em prática o seu
pensamento sobre a luz da peça,
entretanto consegue alguns efeitos muito interessantes e dignos de aplausos,
como, por exemplo, quando põe em destaque, umas peças que são fixadas na parede,
pelas atrizes, com uma simples contra-luz.
Essas peças, verdadeiras obras de
arte, pertencem a uma categoria chamada de “cortes
com projeções arquitetônicas”, um trabalho belíssimo, oriundo da
ourivesaria, feito em tabuleiros de alumínio, pelo artista plástico TONINHO LÔBO, que também é responsável
por todos os outros adereços e o cenário,
composto apenas por várias malas de viagem, de diversos tamanhos e modelos,
todas antigas, que guardam grandes surpresas, como uma, a maior de todas, que,
quando aberta, revela uma cozinha, com todos os seus utensílios, principalmente
os que são utilizados no preparo da culinária típica das regiões das
protagonistas.
Ao
fundo, detalhes das peças (cortes com projeções arquitetônicas).
Os figurinos, de CLÁUDIA
GOLDBACH, são adequados às personagens, contrastando-se, em função das duas
personalidades. ESTER, mais
extrovertida, mais “out”, veste uma
roupa estampada, bem colorida, e é coberta por uma grande quantidade de jóias (?)
e bijuterias douradas. MARION, mais
contida, mais “in”, usa um traje
quase típico de sua cultura, um vestido, na altura das canelas, preto, com um
lenço, da mesma cor, amarrado à cabeça, e exibe um único e simples anel, tipo
aliança, num dos dedos.
A direção, de LUIZ ANTÔNIO ROCHA, é simples e bastante competente, correta, na
medida em que o espetáculo é quase “autodirigível”, em função de ter sido
escrito pelas próprias atrizes e pela bagagem emotiva que cada uma traz para a
cena.
Saboreado o delicioso bolo,
reservamos, como sempre, a “cereja” para o final, a fim de que a memória do
sabor não fique esquecida. Uma memória afetiva: a interpretação das atrizes. BETH e SIMONE não representam; elas “são” ESTER e MARION, respectivamente.
As lembranças das duas netas e a memória afiada de ambas as atrizes trazem, das
profundezas à tona, ESTER e MARION. Os diálogos são tão naturais,
que parece verdade o que estamos vendo. O texto flui, de maneira a parecer não
ter sido decorado; vem do coração.
Merecem destaques alguns momentos
em que as duas atrizes, abandonando, temporariamente, as personagens,
dirigem-se ao público e narram, com bastante emoção, alguns detalhes da saga
das duas avós, no Brasil. Não farei comentários acerca disso. Vão conferir “in
loco”!
Dois excelentes trabalhos de duas
atrizes maduras, plenas, para cujas atuações aplausos de pé não bastam. BRAVO!!!
Recomendo o
espetáculo com o maior empenho!!!
FICHA TÉCNICA:
Texto e Atuação: Beth Zalcman e Simone Kalil
Direção: Luiz Antônio Rocha
Assistente de Direção: Valéria Alencar
Cenário e Adereços: Toninho Lôbo
Figurino: Cláudia Goldbach
Iluminação Cênica: Aurélio De Simoni
Programação Visual: Davi Palmeira
Preparação de Elenco: Beth
Zalcman
Assessoria de Imprensa: Minas de Ideias Comunicação Integrada
Elaboração de Projeto: Jenny
Mezzencio
Produção Executiva: Sandro Rabello
Direção de Produção: Beth Zalcman, Simone Kalil e Sandro
Rabello
Realização: Mabruk Produções e Diga Sim Produções
SERVIÇO:
Local: Teatro Cândido Mendes
Endereço: Rua Joana Angélica, 63 – Ipanema – Rio de Janeiro
Telefone: (21) 2267-7295
Temporada: De 2 de janeiro até 01 de fevereiro
Dias e Horários: 6ª feira, sábado e 2ª feira, às 21h; domingo, às 20h
Horário de
Funcionamento da Bilheteria: Aberta,
diariamente, das 14h às 21h
Gênero: Comédia
Duração: 70 minutos
Classificação Etária: 10 anos
Preço: R$ 50,00 (Inteira) (Meia-entrada para quem fizer jus ao benefício.)
Capacidade: 100 Lugares
Assessoria de Imprensa: Minas de
Ideias Comunicação Integrada
(FOTOS OFICIAIS: GUGA MELGAR.)
FOTOS
PARTICULARES (abaixo) : MARISA SÁ)
Cena final, com detalhes do cenário.
Aplausos!
Bravo!
Com Beth Zalcman
Com Simone Kalil.
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