ELIS, A MUSICAL - SE ELVIS NÃO MORREU, MUITO MENOS ELIS REGINA.
É em vida que se
deve prestar homenagens aos grandes talentos, mas, como tal prática não é muito
frequente, no Brasil, que, pelo menos, após a sua morte, um gênio seja
reverenciado como merece. É o que se
pode ver no palco do Teatro Oi Casa Grande, no espetáculo ELIS, A MUSICAL.
Muito original o título, já que alguns dos maiores músicos brasileiros sempre afirmaram que a voz de ELIS era mais um instrumento musical no meio de uma orquestra.
Muito original o título, já que alguns dos maiores músicos brasileiros sempre afirmaram que a voz de ELIS era mais um instrumento musical no meio de uma orquestra.
Trata-se
de um lindo e merecido tributo que se presta à maior cantora, de todos os tempos,
da Música Popular Brasileira: ELIS REGINA, falecida em 19 de janeiro de 1982,
precocemente, aos 37 anos de idade.
Morreu jovem, entretanto nos deixou uma bagagem musical imensa e de
excelente qualidade, o que nos conforta.
O
espetáculo, que estreou no dia 8 de novembro e que promete ficar em cena até o
carnaval(creio que vai além, pois tem tudo para isso), foi escrito a quatro mãos,
por NÉLSON MOTTA e PATRÍCIA ANDRADE, e está dividido em dois atos. O primeiro, mais longo, atém-se ao
desabrochar da grande intérprete, ainda em Porto Alegre , sua
terra natal, à sua vinda para o Rio de Janeiro e ao conturbado casamento com o
jornalista e compositor Ronaldo Bôscoli.
O segundo, mais dinâmico e “colorido”, retrata aquela que foi, talvez, a
sua melhor fase de criação artística, tempo que durou seu casamento com o pianista
César Camargo Mariano, o qual foi o responsável por uma bela guinada na
carreira da cantora.
Não
vale a pena, aqui, falar da personalidade de ELIS, muito bem retratada, por sinal, no
texto enxuto e excelente, de Nélson e Patrícia.
O propósito deste texto é comentar o espetáculo, certamente, um dos
melhores deste ano.
É uma montagem grandiosa, digna dos maiores elogios, mas o centro de todas as
atenções se volta para a interpretação de LAILA GARIN, que vive a personagem
ELIS REGINA, com uma intensidade fantástica, uma entrega total, num trabalho de
mais de três meses de preparação. LAILA,
infelizmente, ainda pouco conhecida pelo grande público, além de excelente
atriz, é dona de uma belíssima voz. Sua trajetória artística
é linda e foi construída com muita garra e suor. Acompanho sua carreira há muito tempo e já a
vi em espetáculos que não tiveram grande destaque, entretanto, nos seus dois
últimos trabalho, SARAU DAS PUTAS (direção de Ivan Sugahara) e GONZAGÃO, A
LENDA (texto e direção de João Falcão), LAILA era ovacionada e já dava
sinal, ali, de que mais uma grande atriz marcava seu território. Igual reação ela arrancava da plateia durante a grande temporada de EU TE AMO MESMO ASSIM, texto de Jô Abdu e também direção de João Falcão, ao lado de Oswaldo Mil.
Fisicamente, ela não tem a menor semelhança com ELIS, entretanto, graças a um belíssimo
trabalho de visagismo, do craque BETO CARRAMANHOS, e de muita pesquisa, quanto
aos trejeitos da cantora, o público “vê” a "Pimentinha" em cena. É impressionante o magnetismo que LAILA
exerce sobre a plateia, que não se cansa de aplaudi-la, repetidas vezes, em cena aberta. Dizer que ela está perfeita no papel ainda é
muito pouco.
Laila Garin, num dos seus momentos ELIS
Laila, colhendo o que plantou
A
direção, como estreante no TEATRO, é de DENNIS CARVALHO, que começou com o pé
direito, fruto de sua grande experiência como ator e diretor de novelas
de TV. Um único senão que faço ao
seu trabalho diz respeito a uma cena em que LAILA e mais um ator descem à plateia e
cruzam toda a extensão à frente do palco, num diálogo que poderia ser executado na própria boca de cena. Mas é apenas um detalhe, que não chega a comprometer o espetáculo. Certamente, DENNIS e outros que já dirigiram espetáculos no Oi Casa Grande não têm conhecimento de que o público que ocupa o
balcão daquele teatro não consegue enxergar absolutamente nada do que
se passa na plateia; não tem a visão nem da primeira fileira da parte inferior do teatro, o que compromete as chamadas "cenas de plateia".
No
elenco, além de LAILA, é óbvio, merecem destaques:
FELIPE
CAMARGO – Uma grande surpresa para mim.
Interpreta, com correção, Ronaldo Bôscoli e dá o seu recado,
satisfatoriamente, nos momentos em que tem de cantar. Creio ter sido sua primeira experiência em
musicais.
CLÁUDIO
LINS – Este já é um craque nesse tipo de espetáculo. Coleciona, em seu currículo, grandes sucessos,
o mais recente deles MÍLTON NASCIMENTO – NADA SERÁ COMO ANTES, da imbatível dupla Charles Möller
e Cláudio Botelho. CLÁUDIO LINS dá vida a
César Camargo Mariano, segundo marido cantora, e, praticamente, só atua no segundo ato, da mesma forma
como FELIPE, no primeiro. Além de sua
bela figura, é um bom ator e magnífico cantor.
Acho que não poderiam ter escalado melhor ator/cantor para ao
papel de César.
Um abraço no querido e talentoso ex-aluno
Cláudio Lins
CAIKE
LUNA – Divide-se nos papéis de Miele e Paulo Francis, mas é quando interpreta
este que a plateia mais se manifesta, em função de sua excelente imitação do
polêmico jornalista.
ÍCARO
SILVA – Destaca-se no famoso “pout-pourri” com ELIS, interpretando o cantor
Jair Rodrigues. Faz um belo
trabalho, ele, que, além de bom ator, também canta bem, tendo sido um
dos destaques do musical ROCK IN RIO. Além de Jair, ÍCARO “se vira nos trinta”, ou quase isso, já que interpreta, como
os demais atores, vários personagens.
Fico muito feliz por ver sua ascensão profissional.
Ícaro Silva
DANILO
TIMM – Na pele do bailarino norte-americano, que fixou raízes no Brasil, Lennie
Dale, sua interpretação para a canção O Pato já valeria boa parte do preço do
ingresso. DANILO é ótimo ator, canta
excepcionalmente bem e tem um domínio de corpo invejável, que o faz marcar
presença em todas as coreografias dos musicais em que atua. Além de tudo isso, ainda é um dos mais
requisitados preparadores de elenco, quando o assunto é voz, cantar.
PETER
BOOS – Outra agradável surpresa.
Trata-se de um grande ator. Sou grande admirador de seu trabalho faz tempo, mas sempre o vi em textos muito densos ou em “comédias comedidas”. Não imaginava que ele guardava um grande
potencial para musical. Além de
vários personagens masculinos, Peter tem a sua oportunidade de solo, no espetáculo, no papel
do inesquecível cartunista Henfil, que interpreta muito bem. É comovente a cena da reconciliação entre
ELIS e Henfil.
Peter Boos
LETÍCIA MEDELLA – Mais uma boa surpresa. Seu
trabalho como atriz já me é bastante familiar e muito me agrada, contudo ela também
canta; e bem. Além do papel da mãe de
ELIS, Dona Ercy, faz vários papéis femininos.
THIAGO
MARINHO – Jovem ator, que também canta bem, vem se firmando nessa área,
musicais, desde O DESPERTAR DA PRIMAVERA, mais um dos grandes trabalhos da "grife" Möller & Botelho.
Já era hora de ser melhor aproveitado em cena, e isso ele encontra em ELIS.
Deram-lhe a oportunidade e o rapaz está sabendo defendê-la. Vive Nélson Motta, que foi muito presente e
importante na vida de ELIS, e outros (vários) personagens masculinos. Por orientação da direção ou por iniciativa
própria, é muito interessante o comportamento de Thiago em cena, quando sua participação nas cenas é de coadjuvante. Ele "contracena muito bem consigo mesmo" e, em silêncio, com outros atores, sabendo tirar
partido disso.
Thiago Marinho
Além
desses, compõem o elenco: RAFAEL DE CASTRO (o empresário Marcos Lázaro), RICARDO VIEIRA (Seu
Romeu, pai de Elis, e personagens masculinos), LEO DINIZ (Tom Jobim e
personagens masculinos), GUILHERME LOGULLO (Pierre Barough e personagens
masculinos), ALESSANDRO BRANDÃO (Carlos Imperial e personagens masculinos),
LINCOLN TORNADO (personagens masculinos), CACAU DE SÁ (personagens femininos),
MAÍRA CHARKEN (personagens femininos), LILIAN MENEZES (personagens femininos) e
LEO WAGNER (Swing e personagens masculinos).
A
banda é formada por nove músicos da melhor qualidade: Cláudia Elizeu (pianista
regente e teclado), Herberth Souza (piano e teclado), Leo Fantini (violino),
Thais Ferreira (violoncelo), Levi Chaves (saxofone, flauta e clarinete),
Marcos Belchior (trompete e flugelhorn), Marcos Amorim (guitarra e violão),
Matias Correa (baixo acústico e elétrico) e Naílson Simões (bateria e
percussão). Parece uma orquestra de trinta
elementos.
A direção musical e os arranjos
são de DÉLIA FISCHER, veterana e premiadíssima nessa área, à qual vem se
dedicando nos últimos anos, embora também se ocupe de sua carreira solo,
como musicista, compositora e cantora.
Alguns arranjos se aproximam dos originais, todavia DÉLIA criou
roupagens novas e bem diferentes das originais para determinadas canções, o que
só fez valorizá-las, ao mesmo tempo que atendem a especiais cenas e propostas
do musical. Contar com essa profissional na
direção musical e nos arranjos de um espetáculo é meio caminho para o acerto
total.
Délia Fischer - amizade antiga
A coreografia e a direção de
movimentos são de ALONSO BARROS. O
público que gosta de musicais e que vem acompanhando os maiores sucessos do
gênero, nos últimos tempos, consegue melhor associar o nome deste estupendo profissional
a trabalhos como O DESPERTAR DA PRIMAVERA, GYPSY, AS BRUXAS DE EASTWICK, O MÁGICO DE OZ, HAIR, UM
VIOLINISTA NO TELHADO, COMO VENCER NA VIDA SEM FAZER FORÇA (leia-se sempre: Möller & Botelho), além de tantos outros musicais. ALONSO é o tipo do profissional que, concluído
um trabalho, leva seus amigos, admiradores e o público em geral a se perguntar:
o que o ALONSO vai aprontar na próxima?
Há, entretanto, dentro da cabeça desse homem, uma usina de boas ideias, um potencial criativo tão
grande, que podemos ter certeza de que, “na próxima", ele irá nos surpreender e
emocionar mais ainda. Assim tem sido ao longo dos últimos
anos. Aqui, ele nos leva, mais uma
vez, a momentos de delírio, diante dos passos criados para enriquecer muitas
cenas da peça. A coreografia que abre o
espetáculo já é uma amostra do que vai acontecer nas quase três horas de
espetáculo. São todas muito criativas e
diversificadas, as coreografias, porém é numa determinada, em que GUILHERME LOGULLO dança com um
manequim, que o coreógrafo leva a plateia à loucura.
Mais ainda quando, sem que ninguém espere, surge, em cena, um segundo
bailarino (DANILO TIMM), com um manequim idêntico ao primeiro e, então, os dois executam os
mesmos passos, numa sincronia perfeita.
Essa coreografia foi, segundo o próprio ALONSO, baseada num desenho animado
da Disney (Pateta), o que não lhe tira, de modo algum, o brilho da criatividade. Para mim, um dos pontos mais marcantes do
espetáculo é a coreografia de ALONSO BARROS.
Saí em estado de graça por conta dos números de dança e não paro de
repetir isso.
Cláudio Lins e Alonso Barros - o gênio das coreografias
A direção de arte e cenografia é
de MARCOS FLASKMAN. Bem interessante e
atende às necessidades do texto, que exige várias locações. O que seria de fácil resolução no cinema
torna-se um desafio para o cenógrafo, mas ele e sua equipe sabem dar conta
de seu trabalho, como também sabem dar trabalho ao pessoal que "rala" nas
coxias, em função das inúmeras entradas e saídas de módulos, móveis e objetos de
cena, trabalho esse coordenado por quem já tem bastante experiência nessa
faina, o grande coordenador técnico TUTO GONÇALVES, que comanda um exército de profissionais, ainda um pouco "atrapalhados" com tanta faina, em nada comprometendo, porém, a peça.
Os figurinos são da sempre competente MARÍLIA CARNEIRO. Interessantes, marcando, muito bem, as diferentes fases da vida de ELIS e obedecendo, corretamente, às tendências de cada época. Discretos e afins, de acordo com o texto. MARÍLIA foi muito criativa no segundo ato, cuja proposta é mostrar uma nova ELIS, “produzida” por César Camargo Mariano.
O visagismo é assinado por um mestre: BETO CARRAMANHOS. Quando soube que LAILA havia sido escolhida para protagonizar o espetáculo e que, em seu teste, ela procurou não imitar ELIS (ao contrário, mostrou seu grande potencial de cantora com sua própria personalidade), comemorei, solitário, a escolha, na certeza de que o diretor havia acertado na mosca. Ao mesmo tempo, perguntava-me se, no espetáculo, não haveria a necessidade de a atriz ser fisicamente parecida com ELIS. Como já disse, ambas, ELIS e LAILA, não têm a menor semelhança física. Não me parece, contudo, que o diretor tenha dedicado tanta importância a esse “detalhe”, mas colocou LAILA nas mãos de um mago, um profissional que cria as mais fantásticas caracterizações que já vi, em minha vida, no TEATRO. A que mais me havia marcado, até então, fora a transformação de Cláudia Netto,
O desenho de som é de CARLOS ESTEVES. Este é um dos trabalhos mais
importantes num musical, principalmente quando é de grande envergadura e numa casa de espetáculos do porte de um Oi Casa Grande. O
trabalho dele funciona muito bem.
Nos créditos, há a citação de um videografismo e criação de imagens, a cargo de RICO VILAROUCA, RENATO VILAROUCA e MARCOS FLASKMAN. Trabalho bem interessante e agregador ao belo visual do espetáculo.
A preparação vocal foi feita por FELIPE HABIB, um jovem profissional de grande competência e dedicação ao universo dos musicais, já tendo atuado em montagens de grande sucesso, como, ROCK IN RIO e TIM MAIA – VALE TUDO, O MUSICAL, apenas para citar os dois últimos. Tarefa árdua é preparar, vocalmente, um elenco numeroso, mas FELIPE soube fazê-lo de forma perfeita. O resultado pode ser conferido em cena.
O diretor assistente é HENRIQUE SAUER.
A responsável pelo "casting" é MARCELA ALTBERG. Se errar na escolha, pode
comprometer o espetáculo, mas, se essa função cabe a MARCELA, a probabilidade
de erro é ínfima. Belo trabalho.
A realização é da Aventura Entretenimentos, desta vez associada a uma outra empresa: Buenos Dias. Parabéns!
Merece destaque o belíssimo programa do espetáculo, em forma de um vinil, tanto pela plasticidade quanto pelas informações lá presentes.
Programa da peça
Eu AMO Elis. Lembro dos espetáculos dela que assisti, delirando. Foi emocionante "ver" Elis de novo no palco! IMPRESSIONANTE! Além da genial Laila Garin, meu outro destaque vai Danilo Timm. Ah...tem também... e também...e mais ...
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