quarta-feira, 11 de outubro de 2017


A HISTÓRIA DAS HISTÓRIAS

(NEM OITO, NEM OITENTA;

“NO PONTO”.)



 

 


            Regra geral, de cada dez espetáculos infantis que são montados, no Rio de Janeiro, com todo respeito a todos os envolvidos nos projetos, já que são boas as intenções, infelizmente, a realidade se traduz, numa média, em um excelente, dois bons, dois razoáveis e cinco ruins ou muito ruins, aos quais eu não levaria meus netos, para que eles não ficassem traumatizados e desistissem do TEATRO. E olha que precisamos formar muitos espectadores!!!

            Ultimamente, como jurado do Prêmio Botequim Cultural, que abraça o TEATRO INFANTOJUVENIL, em sete categorias, tenho ido, com muita frequência, a peças destinadas a crianças e adolescentes e o que tenho percebido é que os espetáculos podem ser divididos em três categorias, que eu criei, para classificá-los e denominá-los: “bobinhos”, “no ponto” e “eruditos”.

            Vamos a cada um deles:

Os “bobinhos” são aqueles muito ruins, que utilizam fórmulas mais do que ultrapassadas, sem nenhuma criatividade e inteligência, tratando as crianças como se deficientes mentais fossem. Muita gente os chama de “caça-níqueis”. Não chego a tal agressividade, mas penso que deveriam ser proibidos, pelo desserviço prestado ao TEATRO.

Para fugir a esse tipo de “trash”, muitas pessoas que trabalham com TEATRO INFANTOJUVENIL, para não cometer tais desastres, pulam para o outro extremo. Vão do 8 ao 80. Isso vem ocorrendo bastante, nos últimos tempos. Produzem espetáculos que estão muito acima do nível de compreensão e de interesse do público a que deveriam se destinar. São os “eruditos”, que se valem de temas “pesados”, mal desenvolvidos, utilizando um vocabulário muito além do acessível ao público-alvo, herméticos, longos, por vezes, tornando-se, por isso “chatos”, embora possam até ser de boa qualidade plástica. “Chatos”, para as crianças/adolescentes e seus pais.

            Os chamados “no ponto” são aqueles produzidos, visando a atingir filhos e pais. Sim, porque é preciso que os pais também sintam prazer em assistir à peça e fiquem felizes, vendo seus filhos reagindo, favoravelmente, àquilo que estão vendo. São os espetáculos que não são “chão” nem “céu”. São os que podem ser entendidos por todos, cujas mensagens são assimiladas, fácil e prazerosamente, por qualquer idade.

            “A HISTÒRIA DAS HISTÓRIAS” é um dos melhores “no ponto" a que assisti este ano, pelo fato de a montagem “misturar TEATRO físico, música, poesia e palhaçaria, em uma narrativa lúdica, sobre a necessidade humana de se comunicar e recriar a própria vida, através de histórias”.

 
 
 
 
 
 
 
 

 
SINOPSE:
           
Para narrar essa aventura, entram em cena os intrépidos e atrapalhados contadores de histórias, os jovens MAROSA (ALINE MAROSA) e CAZU (CAIO PASSOS), assistentes da incrível DOUTORA RIVÂNIA MAGNUS AUTOREUM, uma mistura de anjo, fada, guerreira e professora, que já leu todos os livros (“os que foram escritos e os que ainda nem foram escritos”), em uma volta ao mundo em 80 páginas.  
 
Os três fazem parte de uma caravana milenar e tradicional de contadores longínquos, que já visitaram todos os lugares do mundo, os de “verdade verdadeira e os de verdade imaginada”, como Xanadu, Pasárgada e o Triângulo das Bermudas.
 
Personagens que todos juram ter saído das páginas de um livro fantástico, cheio de aventuras e histórias universais. São criaturas que rompem o tempo e o espaço, feitos de pura poesia.
 
 
 
 
As peripécias têm início quando os dois, como de praxe, abrem as apresentações com muita alegria e música. Mas, nesse dia, o inesperado acontece e a MESTRA RIVÂNIA, pela primeira vez, não aparece, para contar suas histórias incríveis, e, assim, seus fiéis aprendizes se veem com uma grande e importante missão nas mãos: encontrar RIVÂNIA e continuar compartilhando o amor pelos livros, através de suas histórias.
 
Para isso, recorrem ao Livro Secreto para Situações de Emergência, que, para espanto deles, está com as páginas em branco. A única saída que eles encontram é usar a imaginação, a memória afetiva e a influência de histórias universais, para contar, viver e, até, recriar suas próprias histórias, assumindo, dessa forma, o protagonismo de suas vidas.
 
A partir daí, os contadores interagem com o público, através da metalinguagem, para dividir suas inseguranças, lembranças, emoções, desejos, dores, alegrias, aventuras e travessuras.
 


 





 
 


 

O espetáculo é “leve, lindo e solto”, poético e muito divertido, valorizando o jogo cênico, a empatia com a plateia, o diálogo dos olhares – umas das principais técnicas da palhaçaria – e o “misè-en-scene” que vem do teatro de rua. 

A peça conta, ainda, com recursos cênicos, como máscara, bonecos e outras formas animadas, que são uma espécie de marca registrada dos trabalhos de FLÁVIA LOPES, que, há 20 anos, exerce suas pesquisas na linguagem em Teatro Animação, Palhaçaria, Bufonaria e Comicidade e que põe tudo isso em prática num excelente trabalho de direção, inventivo, explorando, ao máximo, o grande talento da dupla de atores/palhaços, ambos dos melhores que já vi nas minhas incursões pelo TEATRO INFANTOJUVENIL. (Extraído do “release”, com adaptações e opiniões pessoais.)

Se, em qualquer tipo ou gênero de TEATRO, o texto é a espinha dorsal do espetáculo, quando se trata de uma peça voltada para o público infantojuvenil, ele deve ser claro, inteligível, descomplicado e interessante. Todas essas qualidades estão presentes na dramaturgia dessa “...HISTÓRIA...”.

Em geral, trabalhos dramatúrgicos, surgidos de propostas de criação coletiva, costumam deixar alguns “furos”, o que não ocorre aqui, graças a uma grande cumplicidade que parece existir entre os três que escreveram o texto: a diretora e a dupla de atores. Esse pontapé inicial para a produção deste espetáculo é, sem dúvida, responsável, em boa parte, pelo seu sucesso. Os três formam um grupo teatral que tem tudo para emplacar tantos outros sucessos, o Grupo “Os Sanzussô – Povo de Teatro”.

Povinho para entender da coisa!!!

Povinho inteligente e criativo!!!


 

            Peço licença, para transcrever o pensamento de FLÁVIA LOPES, uma das autoras e diretora da peça, o que ajudará o leitor a mergulhar no enredo e a se interessar mais por assistir a esta montagem: Acredito que o TEATRO precisa falar sobre aquilo que nos move, intriga e incomoda. No momento, quero falar sobre a imaginação e como é importante criar, contar e ouvir histórias. Através deste trabalho, falo, sem falar, em como a imaginação é uma ferramenta de transformação de humanos mais humanizados. Acredito que a falta de empatia tem gerado danos profundos nas grandes e pequenas histórias sociais. E é por isso que acredito que a imaginação é o caminho para transformar realidades, transmutar a dor e  recriar sua própria história”.

Ainda, segundo o “release”, “A montagem traz uma curiosidade: o nome “Rivânia” é uma homenagem à pequena Rivânia, que, numa recente enchente, na cidade de São José da Coroa Grande, em Pernambuco, ao ver sua casa inundada, salvou o que tinha de mais importante: seus livros e cadernos da escola”.

E continua FLÁVIA: “Meu coração ficou apertado, pela situação da menina, e, ao mesmo tempo, se encheu de esperança e desejos de uma vida melhor e mais justa. É impossível não ficar mexida, já que sou professora da rede pública do município e do estado do Rio. Dou aulas para grupos que vivem em situações desfavorecidas. Em cada um dos meus alunos, reconheço uma menina Rivânia”.

Além da excelência do texto, da ótima direção e da interpretação, irrepreensível, da dupla ALINE MOROSA e CAIO PASSOS, ganham relevo, no espetáculo, o cenário, os figurinos, a iluminação, a trilha sonora, o visagismo e a direção de movimento.





 


Tudo começa com o palco nu. Após o que seria uma espécie de prólogo, os atores vão trazendo, para o espaço cênico, os objetos que irão compor o cenário (CARLOS ALBERTO NUNES): o palco se transforma num pequeno picadeiro, com um tapete redondo, ao centro, duas malas antigas, uma maior e outra menor, e mais alguns objetos de cena, como máscaras e instrumentos musicais. Sempre me agrada essa ideia de utilizar o elemento surpresa, na construção do cenário. Cada saída e entrada, de/em cena, de cada personagem aguça a curiosidade do espectador, de qualquer idade, ávido por saber o que ele/ela trará para a construção do cenário. Todos ficam muito atentos a isso. Do teto, a partir de um determinado momento, pendem livros, sustentados por fios.

Os figurinos, também de NUNES, são lindos e interessantíssimos, os quais, combinados ao correto trabalho de visagismo, de MONA MAGALHÃES, geram dois tipos muito curiosos, engraçados e carismáticos, com destaque para as duas cabeças, os dois tipos de cabelo, sendo que o penteado de CAIO é uma atração à parte, oculto, durante um tempo, por um estranho chapéu, que só será entendido, quando o personagem o retira da cabeça. Uma engraçada surpresa para o público.

No conjunto cenário/figurinos, merecem uma boa menção os bonecos e adereços (CARLOS ALBERTO NUNES, ARLETE RUA e CARLA COSTA) e as máscaras (FLÁVIA LOPES, MARISE NOGUERA e IGOR BERNARDO).
 
 
 
 
 



ANA LUISA MOLINARI DE SIMONI, há muito, deixou de ser assistente de iluminação e a filha do mestre Aurélio e assumiu, de vez, o seu papel de grande “profissional da luz”. Aqui, ela, com a assistência de JOÃO GIOIA. sabe explorar os tons e intensidades que deverão pôr em relevo o que existe para ser visto e admirado.

O espetáculo, por exigência, precisa de uma boa trilha sonora. A que embala algumas das cenas da peça é inspirada na cultura popular brasileira e suas influências, executada, de forma mecânica e, também, ao vivo, pelos atores, que, além dos instrumentos musicais (ukulele, flauta transversa, sopros, pandeiro, chocalho e percussão), usam o próprio corpo para a sonoplastia. É um trabalho que deve ser bem observado e admirado. A direção musical é assinada por KARINA NEVES

            Pensei em não falar mais do talento de ALINE e CAIO, em cena, entretanto não poderia deixar de fazer menção ao excelente trabalho corporal da dupla, fator importantíssimo, nesta montagem. Eles sabem como falar com o corpo e com as expressões faciais.

 


 

 

 
FICHA TÉCNICA:
 
Dramaturgia: Aline Marosa, Caio Passos e Flávia Lopes
Direção: Flávia Lopes
 
Atuação: Aline Marosa e Caio Passos
 
Colaboração Dramatúrgica: Carlos Alberto Nunes e Marcos Guimarães
Direção Musical: Karina Neves
Assistente de Direção Musical: Jonas Correa
Cenógrafo e Figurinista: Carlos Alberto Nunes
Cenógrafa e Figurinista Assistente: Arlete Rua
Confecção de Figurinos: Carla Costa
Bonecos e Adereços: Carlos Alberto Nunes, Arlete Rua e Carla Costa
Máscaras: Flávia Lopes, Marise Nogueira e Igor Bernardo.
Iluminação: Ana Luzia Molinari de Simoni
Assistente de Iluminação: João Gioia
Visagismo: Mona Magalhães
Gravação, Mixagem, Violão e Percussão: Pedro Carneiro
Bombardino e Trombone: Jonas Correa
Letra das Músicas: Aline Marosa, Caio Passos e Flávia Lopes
Preparação Vocal: Verônica Machado
Instrutora de Yoga: Nina Kriguer
Assessoria de Imprensa: Lyvia Rodrigues (Aquela que Divulga)
Design Gráfico: Leo Dutra (Rangabuana Design)
Fotos: Rodrigo Menezes                                               
Direção de Produção: Pagu Produções Culturais
Coordenação de Produção: Bárbara Galvão, Carolina Bellardi, Fernanda Pascoal
Produção Executiva: Juliana Soares
 

 
 
 
 


 




SERVIÇO:
 
Temporada: De 07 a 29 de outubro de 2017.
Local: Sesc Tijuca (Teatro I).
Endereço: Rua Barão de Mesquita, 539 – Tijuca – Rio de Janeiro.
Telefone: (21) 3238-2139.
Dias e Horários: Sábado e domingo, às 16h.
Valor do Ingresso: R$10,00 (inteira) e R$5,00 (meia entrada).
Além dos casos previstos em lei, associados SESC pagam meia entrada.
Para crianças e adolescentes com idade até 16 anos, a entrada é GRATUITA.
Duração: 60 minutos.
Capacidade: 228 lugares.
Classificação Etária: Livre.
 



 



 

            Tudo funciona bem, neste espetáculo, que não me deixou nenhum motivo para alguma crítica negativa.

            O trabalho de palhaçaria, quando bem feito, me emociona muito. Eu me emocionei.

            O fato de o texto fazer referências a obras e personagens do universo infantojuvenil também me trouxe boas lembranças. Eu me emocionei.

            Algumas resoluções de direção me marcaram bastante (podem parecer bobagens, mas, para mim, não o são), como o Livro Secreto das Possibilidades sair de uma velha mala iluminada por dentro, de um viajante das minhas memórias, e as ilustrações, que vão sendo apresentadas, durante uma história, contada por MAROSA, passarem, uma a uma, dentro de uma maleta, o que me lembrou um velho livro/brinquedo que ganhei na infância e, infelizmente, não sei que destino mereceu. Eu me emocionei.        

É tão bom, e raro, assistir a uma peça infantojuvenil de qualidade, no Rio de Janeiro! “A HISTÓRIA DAS HISTÓRIAS” é uma delícia de espetáculo! Diversão garantida, para os pequenos e toda a família.

E fica uma grande lição, aprendida na peça: "SE NÃO TEMOS UMA HISTÓRIA PARA CONTAR, PODEMOS SER AUTORES DA NOSSA PRÓPRIA HISTÓRIA".

 
 

 

(FOTOS: RODRIGO MENEZES.)
 
 
 
 
 
GALERIA PARTICULAR:
FOTOS: GILBERTO BARTHOLO.)






 

 
 
 
 
 






















 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
 
 

 
 
 

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