“(IN)CONFESSÁVEIS – O JOGO DA VERDADE”
ou
“DE COMO SE ESCREVER
UMA CRÍTICA TEATRAL
PARA ALGO QUE
NÃO É TEATRO.”
O que faz um crítico de TEATRO, “viciado” no dito cujo, durante uma pandemia, além de achar que o mundo acabou, que ele, o crítico, morreu e se esqueceu de deitar, porque parece que nada mais faz sentido?
Mas foi só nos primeiros dias. Faz sentido, sim; e muito. Porque VIVER faz todo sentido. Até mesmo em tempos de pandemia, pois, nesse caso, muitas experiências não vivenciadas, antes, nos trazem prazeres, em várias escalas de proporção; outras nos causam um tremendo tédio e, até mesmo, ódio, não direcionado a alguém, especialmente, por ser obrigado a estar vivendo aquele momento de terror. Aliás, a bem da verdade, a partir de um determinado momento, todo o meu potencial de ódio, já que não me chamo Papa Francisco nem nasci Madre Tereza de Calcutá, voltou-se para um DEMÔNIO, de faixa presidencial, cujo nome, falado, ouvido ou, simplesmente, lembrado, me impele a correr até a privada e “jogar cargas ao mar”. Achei mais próprio o eufemismo, para “regurgitar”, “desengolir” ou “descomer” (Não da forma como empregou o verbo “descomer” o genial Ariano Suassuna, em sua obra-prima “O Auto da Compadecida”).
A gente tem a família, o nosso
principal esteio, um ajudando o outro. A gente tem amigos, e reconhece aqueles
que, realmente, o são (Vários já tiveram seus nomes riscados do meu caderno,
como aconselhava Ary Barroso: “Risque meu nome do seu caderno /
Pois não suporto o inferno / Do nosso amor fracassado...”). A gente tem
livros; reli alguns e comprei uns poucos, novos ou em sebos, pela internet. SAIR
DE CASA? NEM PENSAR!
Tirei, do “case”, meu teclado CASIO (Tone Bank Keyboard), que, de há muito, não tinha suas teclas acariciadas ou comprimidas pelos meus dedos e no qual ouso “tirar canções de ouvido”, embora me falte a destreza da mão esquerda. E a gente tem a TV (Um horror, tanto a aberta quanto os canais a cabo, com raríssimas exceções.) e o computador, para nos distrair e tentar fazer com que o tempo cronológico pareça andar num compasso mais rápido, psicologicamente, sendo-nos favorável. E a gente tem as "lives", e a gente tem os cursos (Fiz uns cinco ou seus, todos ótimos.). Pura ilusão!
Como mudei de apartamento no apagar da luzes de 2020 (28 de dezembro), encontrei, na mudança, pastas, que chamo de "um velho baú de recordações", contendo escritos meus, a grande maioria poemas, escritos desde os 15 anos de idade, manuscritos ou datilografados, em folhas de papel amarelado, quase se desfazendo, e resolvi colocar tudo no computador e publicar uma obra por dia, assim como republicar algumas críticas de espetáculos teatrais que me marcaram muito, nos últimos anos. Continuo fazendo-o.
E o TEATRO,
aquele alimento da alma, que me nutria, de segunda-feira a domingo, o oxigênio
que eu respirava (Faltou oxigênio, denotativamente falando, por incompetência e
descaso, em Manaus, e, conotativamente empregado, para mim.), como uma
religião, com até nove espetáculos por semana? Como lidar com essa “abstinência”?
A
princípio, acreditei que seria coisa de duas semanas, como haviam noticiado à
larga. Teatros fechados por duas semanas. O Rio de Janeiro, o Brasil, o mundo...
Parados por um tempo. A Terra deixaria de girar, em torno de seu eixo, por duas
semanas (Menos para os negacionistas, os terraplanistas; os imbecis de plantão,
em suma.) Duas semanas sem chegar nem à varanda, para admirar a natureza da
reserva florestal ao lado do condomínio e a exuberância da Pedra da Gávea,
ainda que a distância.
Aceitei
tudo “numa boa”; até a página cinco. Para ser mais preciso, até
mais ou menos, o décimo dia de confinamento, quando “a ficha caiu”,
graças aos noticiários, nada “leves”, a que eu assistia e que
davam conta de que o diabo era muito mais feio do que se pintava, se é que
alguém pensa nele como sendo um galã da novela das sete; ou se, por conveniência,
(o DESgoverno federal) tentavam esconder a triste realidade, o que, logo, logo,
foi constatado ser verdadeiro (A intenção de “maquiar” as
informações.).
A
partir daquele momento, cheguei à conclusão de que teria de empregar a máxima
do “relaxa e goza”, que dói menos; só no começo; depois a gente
se acostuma. E tivemos, mesmo, de nos acostumar com aquela “trolha”,
porque, ainda ingênuo, previ mais uns dois meses (No máximo, três.) de confinamento
e dor. Mas aconteceu o que não é preciso dizer. No próximo dia 13 de março,
quase daqui a um mês, faz um ano que vivemos a maior pandemia que este arremedo
de país (Só estou falando de Brasil.) já viveu (Tudo começou, oficialmente,
numa fatídica sexta-feira 13, de março de 2020.), mesmo considerando o
flagelo que foi a “gripe espanhola”, nos anos de 1918 e 1919,
com uma estimativa de 35.000 mortes, tendo atingido, até mesmo, o
presidente eleito, Rodrigues Alves, que morreu e não pôde ser empossado.
TEATRO é cultura, sim. Sabiam isso? Muito mais do que se possa pensar. Infelizmente,
o atual “chefe da nação” (?) sobreviveu a uma infecção “fake”,
pelo vírus, “curado” por doses cavalares (Nenhuma relação com o “paciente”.)
de um comprimido “placeboforme”, a “milagrosa”
cloroquina, da qual quero distância.
35.000
mortos;
praticamente, “nada”, seis vezes e meio menos das perto de mais de 235.000
vidas (cerca de 15%), por enquanto, ceifadas, por um invisível vírus; 235.000
famílias enlutadas, por algo que chegou a ser considerado “uma
gripezinha”, que só atinge os “fracos”, “que não
foram atletas, na mocidade”, “maricas”. (Com licença, que
vou ali, vomitar, e já volto!)
Teatros
fechados, milhares de pessoas que vivem dele, para seu sustento, e o de suas
famílias, se reinventando, inventando o que fazer, para ganhar, honestamente, o
seu pão diário. E houve uma luta enorme por uma sobrevivência honesta. Gente vendendo
de um tudo (doces, roupas, bijuterias, objetos particulares, até de grande
valor afetivo; “o diabo a quatro”); menos os rins e a própria mãe. Gente
procurando trabalho fora da sua área; gente pedindo ajuda, publicamente, nas
redes sociais, sem vergonha nem orgulho, por serem probos e não pensarem em
ganhar dinheiro de forma ilícita, como os políticos brasileiros (99,9999999...%);
grupos de ações entre amigos (Participei de alguns.), associações de classe
promovendo campanhas, para socorrer artistas e técnicos “desempregados”
(Aqui, particularmente, no Rio de Janeiro, louvo a atuação da APTR –
Associação dos Produtores de Teatro do Rio de Janeiro, mas sei que ações
semelhantes também ocorreram em outros estados.). “Lives” de
artistas famosos, pedindo doações, para serem encaminhadas a tanta gente
necessitada. Enfim, a classe se uniu, ninguém largou a mão de ninguém, cada um
fez o que pôde – e continua fazendo -, para ajudar os colegas, e estamos todos
sobrevivendo, na esperança, cada vez maior, de que, em breve, se Deus quiser e
os DEUSES DO TEATRO também intercederem por nós, derem uma forcinha,
tudo voltará ao normal; ou quase: espetáculos em cartaz e o público lotando os
Teatros. Porque somos fortes e não desistimos jamais. Resistência, acima de
tudo e de todos!
Do
meio desse pandemônio todo, surgiu a ideia de se fazerem “espetáculos”,
gravados ou diretos, veiculados por plataformas, via “streaming”,
uma ferramenta meio nova, até então, pouco utilizada, pronta a veicular
transmissões tão híbridas quanto enigmáticas, e de se oferecerem ingressos,
pelas plataformas de venda, a preços bem abaixo dos normais, em espetáculos
presenciais ou “on-line”, o que, ABSOLUTAMENTE, NÃO É
TEATRO, mas é algo que veio, a meu juízo, para ficar, no pós-pandemia. Não
para concorrer com o TEATRO presencial, mas para ser um “a mais”,
oferecendo, a quem nunca teve meios de ir a um Teatro de verdade, por falta de
dinheiro ou por questões geográficas, de deslocamento, a oportunidade de ter
contato com algo parecido com a minha ARTE favorita e insubstituível.
Na
verdade, o verdadeiro TEATRO, sem querer, acabou contribuindo para desfazer
certos tabus e transpôs fronteiras, por meio de algo que NÃO É TEATRO,
mas que, para muitos, funciona como se o fosse. E que mal há nisso? Nenhum!
Muito pelo contrário!
Desde
quando começaram as primeiras ofertas, voltei a receber, em minha caixa de “e-mails”,
diariamente, como crítico e jurado de prêmios (E, também, simplesmente, como
amigo dos envolvidos nos projetos.) convites para as mais variadas experiências.
Aceitei, praticamente, a imensa maioria deles. Não pude “comparecer”
a todos os eventos, pois alguns experimentos aconteciam no mesmo horário. Mas
houve dias em que participei de mais de um, chegando até a casa dos cinco (“Festival
de Porto Alegre” e “Virada Cultural de São Paulo”, por
exemplo.) Para muitos, comprei meu ingresso; fiz questão disso. Divulguei, o
quanto pude – e continuarei a fazê-lo -, via Facebook, tudo o que
me enviavam, com a maior boa vontade e respeito, sempre chamando a atenção para
o fato de que NÃO SE TRATAVA DE TEATRO.
A
maioria dos trabalhos era de experiências em que os atores, ou um só (Houve
vários monólogos.) se apresentavam de suas próprias casas, gerenciando, eles
mesmos, sozinhos, as suas transmissões, providenciando cenários, figurinos e
iluminação (O mais difícil de tudo, talvez.), além de operar as câmeras,
entretanto também houve muitos espetáculos, inéditos ou não, apresentados dos
próprios Teatros, ou peças antigas, consagradas e da melhor qualidade, que
foram filmadas, quando estavam em cartaz, e colocadas, gratuitamente – a maioria
- ou não, à disposição do grande público, via internet.
Não
vou perder a piada - infame, por sinal - de dizer que a tecnologia “é uma
faca de dois legumes”, uma vez que aproxima as pessoas e facilita a
comunicação, desde que a tal da internet esteja de bom humor ou que os que
operam a parafernália cibernética não “cochilem”. Travar, não
conseguir fazer a conexão, ficar sem som, o tal do “delay”, faltar
energia elétrica na casa de algum ator... Aconteceu de tudo. Mas tudo bem. Tudo
por uma boa causa.
Voltando
ao ponto positivo de levar o TEATRO às pessoas, ao invés de elas irem
até ele, o edifício onde se realizam os espetáculos, vejo, nisso, um dos
aspectos mais importantes dessa nova linguagem “relacionada ao TEATRO”.
Por várias vezes, fiquei muito emocionado, após as apresentações, durante os "bate-papos", com relatos de pessoas que moram nos mais longínquos recantos do
Brasil, onde não há, praticamente, como acessar a cultura, dizendo se sentirem
muito felizes e agradecidas pela oportunidade de “conhecer o que é TEATRO”.
(Imaginem no dia em que elas, realmente, o conhecerem!), assim como brasileiros
que moram no exterior, em países muito distantes, que, há muito tempo não
tinham contato com a nossa cultura, muitas vezes, residentes em locais com
diferenças marcantes de fusos horários, também se manifestando, favoravelmente,
com relação ao que viram. Isso tem sido muito gratificante. E, se o é para mim,
na cadeira de um espectador, se me emociona bastante, a ponto de me arrancar
lágrimas, como não deve estar batendo em todos os envolvidos nos projetos?!
Confesso,
porém, bastante triste, que, ainda que louve, ao extremo, a boa vontade e o
esforço das pessoas, no sentido da intenção de nos apresentarem ótimas “performances”,
infelizmente, NÃO GOSTEI DA MACIÇA MAIORIA. Para dizer a verdade, de,
pelo menos, uma centena de trabalhos a que assisti (Foram bem mais.), desde que começou a "onda" desses trabalhos até hoje, conto, nos
dedos das duas mãos, o que me agradou. E, talvez sobre(m) dedo(s). E juro que
parti para assistir a tudo com a maior boa vontade este mundo e querendo gostar
muito.
Mas
é algo muito novo e difícil de ser feito mesmo, eu sei. No TEATRO
presencial, a plateia é o termômetro da apresentação. Os atores sentem a troca
de energia, se o público está interessado no que se passa no palco, se estão
gostando ou não da peça. Uma lente de uma câmera, profissional ou de um
telefone celular, não propicia uma troca de olhares, não permite, a quem está
representando, sentir como o seu trabalho está chegando ao receptor. É bem
verdade que essa resposta pode vir, mas só no final, quando há debates e não é
tão difícil, inclusive, se mentir, dizendo que se gostou do que se viu, ou,
durante a apresentação, quando aparece, num dos cantos da tela, a informação de
que “Fulano deixou a sala.”, ou algo parecido, o que me deixa com
a famosa e desagradável sensação de “vergonha do alheio”. Alguns
até voltam; a maioria não, quando o experimento não está agradando. Seria
hipócrita se não dissesse que tive vontade, muitas vezes, de fazer isso, mas
aguentei firme, até o final. Sempre. Quase sempre. Assim fica melhor.
Quando
uma dessas experiências me agradava, mesmo que não fosse tanto, eu fazia uma
postagem, na minha página do Facebook, recomendando aquela “experiência
teatral” (É assim que me refiro a todas, uma vez que não gostei de
nenhuma denominação que propuseram para ela. TEATRO NÃO É!).
Não
me perguntem por que NÃO É TEATRO, porque esta crítica (Será que o que
estou escrevendo é mesmo uma crítica teatral?!), vai se tornar um livro. E dos
mais grossos, por sinal. NÃO É TEATRO! #prontofalei!
Mas
algumas pessoas me cobravam críticas. “Por que você não está escrevendo?”
E a resposta é tão óbvia: EU SOU CRÍTICO DE TEATRO E NÃO POSSO ESCREVER SOBRE
O QUE NÃO É TEATRO. Simples assim! Precisa desenhar? Claro que não! Para
mim, pelo menos.
Só
que, hoje (Aliás, há cinco dias, em doses homeopáticas, porque ando muito
preguiçoso.), estou eu, aqui, sentado, diante de um computador, voltando a
escrever para o meu blogue.
Durante
a pandemia, publiquei, apenas, algumas entrevistas, mas desisti de continuar a
fazê-lo, porque algumas pessoas se comprometeram comigo, aceitaram o meu
convite, enviei-lhes as perguntas, porém não recebi respostas até hoje; nem
satisfação. Não sou de meias palavras e isto é um desabafo e uma
cobrança, sim. Tomara que eles estejam lendo isto! Mas ainda está em tempo
de se redimirem.
E
por que estou escrevendo agora? Por que assisti a algum espetáculo
presencialmente? NEM PENSAR! Já recebi vários convites, para apresentações
presenciais, e deles declinei. Não sou contra a volta das montagens à cena. Muito pelo contrário! Vai
quem quiser, quem se sentir confortável e seguro! EU NÃO VOU. Já disse
isso e só o farei depois de vacinado (Se Deus quiser, a primeira dose será
aplicada no dia 4 de março próximo, daqui a menos de um mês. Se houver vacina, porque calendário existe, porém...), assim mesmo
com o máximo de cuidado, com menos frequência, selecionando muito as peças a
que irei assistir, seguindo todos os protocolos em vigor no momento. Só
voltarei a viver em paz e a me sentir em segurança total, quando a OMS -
não esse FAJUTO Ministério da Saúde do Brasil -, como fez com a
poliomielite, afirmar que o/a (Jamais sei se é masculino ou feminino.) COVID-19/20/21/?
está erradicado no Brasil. De preferência, no planeta.
Mas vou dissertar sobre uma dessas experiências, que reputo como uma das melhores coisas a que assisti durante esta maldita pandemia. Já repeti isso inúmeras vezes, e não me canso de fazê-lo. E tanto o é, que foram sete vezes que me sentei diante da telona do meu computador, talvez o maior monitor que exista no mercado, para participar de algo novo e profundamente fantástico e agradável de ser ver, chamado “(IN)CONFESSÁVEIS – O JOGO DA VERDADE”.
E
por que essa experiência, que NÃO É TEATRO, mereceu que eu me dedicasse
a escrever sobre ela? Das sete vezes, fui convidado em cinco delas
(Quatro, pela produção, e uma, na “Virada Cultural de São Paulo”.) e
paguei para assistir nas duas últimas vezes. Fiz questão. “Duas últimas”
por enquanto, porque acredito que a experiência ainda voltará ao cartaz, no
formato atual ou presencialmente.
Com
toda sinceridade, não era minha intenção me sentar diante de um computador e
dedicar HORAS, do meu precioso tempo, para fazer algo “sem
sentido”: escrever uma crítica de TEATRO para algo que NÃO É
TEATRO. Divulguei todas as apresentações de “(IN)CONFESSÁVEIS”, com
o máximo de detalhes e elogios, do que não me arrependo nem um pouco, como o
fiz, com relação a poucos outros experimentos do gênero, mas não escrevi
nenhuma crítica. E teria ficado só nisso, não fosse o que tomei como um “desafio”,
mais que uma cobrança, do meu querido amigo MARCELO VARZEA, o maior responsável
– é uma grande equipe - por deliciosa e doce “loucura”,
que reúne um grande “bando de loucos” (Nem sei se são
corinthianos.), no "bate-papo" da última apresentação (Tomara que não tenha
sido!), que se deu na penúltima quarta-feira, dia 3 de fevereiro
(2021).
Fiz questão de ter participado de todas as conversas, ao final das apresentações, que duravam muito mais do que o tempo da experiência, em si, e que eram tão boas quanto ela, e, sempre muito reservado, tentava ficar calado, ouvindo o que os outros tinham a dizer, no afã de aprender, mas, em todas as vezes, havia um momento em que o MARCELO me provocava, com perguntas sobre o experimento, às quais eu respondia com o maior prazer, interagindo com outros espectadores e com os artistas que participavam do processo. Faço questão de registrar que, em todas essas minhas intervenções, o crítico não se manifestou, cedendo a vez e a voz a um espectador empolgado e agradecido pelo que havia acabado de assistir. E parece que cada sessão era melhor que a outra.
Vamos
falar um pouco do trabalho, de como surgiu e de sua dinâmica, como ele
funciona. Para isso, vou me apropriar, quase que “ipsis litteris”,
porém com muitos acréscimos meus e modificações, de muitas informações que me
foram encaminhadas por um querido, novo “amigo de infância”, que
faz parte do elenco e trabalhou como um dos responsáveis pela divulgação do
trabalho: RENAN REZENDE, o qual me encaminhou um vasto “release”
do experimento.
O espetáculo “(IN)CONFESSÁVEIS” surgiu do aprofundamento da pesquisa de MARCELO VARZEA, em torno de suas primeiras obras ficcionais, até então, “Silêncio.doc” e “Dolores”. Em agosto de 2020, em meio às consequências da pandemia, para a classe artística, foi inaugurada a primeira turma da oficina “Da Autoficção ao Teatro Narrativo”, sob a responsabilidade de VARZEA, uma parceria entre a Oficina Cultural Oswald de Andrade e a Poiesis, incentivadas pelo Governo do Estado de São Paulo.
“No meio de uma paralisação global, no ápice da desaceleração e desmonte da cultura, consegui, graças à Poiesis e à Oficina Cultural Oswald de Andrade, dar encaminhamento à minha pesquisa diante do binômio verdade/mentira em todos os âmbitos da dramaturgia contemporânea”, comenta VARZEA.
Foram quatro meses de estudos teóricos e diversos exercícios práticos, que permeavam a construção do Teatro Narrativo e que culminaram na criação do espetáculo “(IN)CONFESSÁVEIS” e, consequentemente, da criação do COLETIVO IMPERMANENTE.
Desenvolvido durante a pandemia, o experimento surge num momento de necessidade e urgência de trocas artísticas, como disse MARCELO: “Longe do drama clássico, da interpretação teatral e muito mais ligado às narrativas de autoficção e ‘performance’, encontrei, durante muitas manhãs, um grupo de jovens artistas, presos, em suas casas, com urgência de troca, fala, representatividade, manifesto e pulsão artística”.
O distanciamento social, provocado pela COVID-19, possibilitou a construção de um COLETIVO, composto por artistas de diversas partes do Brasil, que se apresentavam de suas próprias cidades natais ou de outras, como Santa Catarina (Itajaí), Rio Grande do Sul (Porto Alegre), Bahia (Feira de Santana), Minas Gerais, Paraná, Pernambuco (Recife e Jaboatão dos Guararapes), Rio de Janeiro (capital, Angra dos Reis e Paraty), São Paulo (capital, Campinas, Mairiporã e Serra da Cantareira)... Havia gente das mais distantes cidades, em se tratando da quilometragem que separava umas das outras.
Agora,
um pouco sobre MARCELO VARZEA: Ator e diretor carioca, radicado em São
Paulo, desde 1991, VARZEA fez inúmeros trabalhos e passou por diferentes
mídias, como TV, cinema, “streaming” e TEATRO. Transitou
pelos mais variados gêneros, desde grandes musicais, até espetáculos das mais
radicais investigações de linguagens. Em 2018, encenou o solo de sua
autoria “Silencio.doc”, estreando, na dramaturgia, com ótimas
críticas, além de lançar seu texto em livro, editado pela editora Cobogó.
No ano seguinte, foi a vez de “Dolores”, estrelado por Lara
Córdulla, indicada aos prêmios APCA e Aplauso
Brasil, por esse trabalho.
O COLETIVO IMPERMANENTE continuará seu trabalho de pesquisa e aprofundamento no Teatro Narrativo, além de explorar outras vertentes teatrais, a fim de expandir o leque de possibilidades artísticas, dentro do formato já apresentado. E, para tanto, MARCELO VARZEA já iniciou uma segunda turma, de sua oficina/curso, visando, quem sabe, a voos semelhantes ao que estou analisando agora. Ou algo diferente. O tempo o dirá.
Um
pouco sobre a história do nascimento da experiência e sua manutenção até agora:
Após grande sucesso, na primeira temporada, a peça (Eu não a chamaria de
“peça”, mas assim está no já referido “release”.) “on-line”, do “COLETIVO IMPERMANENTE”, reestreou, no dia 19 de janeiro (2021),
com ingressos à venda pelo SYMPLA. 31 atores (Na temporada de
2020, eram 36; 5 deles, GUILHERME GONZALES, VANESSA
MELLO, LUCIANA FERNANDES, VICTOR SANTANA e ÁGATA MATOS,
por motivos diversos, não puderam estar presentes na temporada de 2021.),
divididos em três salas, simultaneamente, fazem as mais diversas confissões ao
público, transmitidas pela plataforma ZOOM.
Os
relatos (textos) podem ser histórias verdadeiras, dos próprios atores, que os contam;
histórias verdadeiras, mas pertencentes a outro integrante do coletivo; ou,
ainda, uma confissão completamente ficcional. Os relatos variam de extensão e
profundidade e transitam entre o cômico e o drama. É o público quem decide
no que acreditar.
Para
a preparação do experimento, os atores escreveram seus textos, os quais eram
apresentados ao diretor (geral), MARCELO VÁRZEA, para discussão e
aceitação, se deveriam ou não entrar no rol dos relatos. E todos os
participantes tinham, no mínimo, dois relatos diferentes, para variar,
nas sessões, num total de mais de 80 “confissões” diferentes.
Cada
sala contava com um/a diretor/a. Os escritos eram todos digitados seguindo
padrões estéticos (tamanho da folha e da fonte, tipo de fonte, espaço entre
linhas, paragrafação) – tudo padronizado -, para que não houvesse qualquer
possibilidade de identificação de seus autores. Ninguém sabia quem havia
redigido cada texto, se eles eram verdadeiros ou ficcionais, se haviam
acontecido com quem os escreveu, ou, até mesmo, um escrevia um relato
vivenciado por uma outra pessoa do grupo, a ele revelado ou do qual ouvira
falar. Tudo muito “secreto”. VARZEA jura, mas eu não
acredito mesmo, que, até hoje, ninguém sabe se os relatos são falsos ou
verdadeiros e quem os vivenciou. Não
escondo o meu desejo de vir a saber isso, um dia, e exercitei muito, também,
esses detalhes, durante as vezes em que me deliciei com a experiência.
Especulações sobre especulações, a partir de inúmeros detalhes; acho que esse
era o grande “barato” do “jogo”. E, não
obrigatoriamente, cada ator ou atriz relatava algo de próprio punho; ou melhor,
de sua lavra ou digitação.
Ao
final da apresentação de cada ator, uma enquete aparece na tela, com uma
pergunta, que deve ser respondida, rapidamente, por cada espectador: “Essa
história é verdadeira ou falsa?”, com as duas opções, é óbvio. Logo em
seguida, aparece uma outra tela, mostrando o percentual de cada resposta. O/a
ator/atriz que tiver o maior percentual de “verdade”, em cada
sala, irá se apresentar novamente, para “disputar” uma segunda
rodada, com os dois mais votados de cada uma das outras duas. Repetem-se,
então, os relatos e acontece uma nova votação, considerando-se apenas as três,
fica-se conhecendo quem atingiu o maior percentual de opiniões como “relato
verdadeiro”, após o que, acontece um delicioso e profícuo "bate-papo" sobre o espetáculo, que não tem hora de acabar, quando os três elencos se
encontram com o diretor geral e o público, em uma única sala do ZOOM.
É
importante frisar que não há a menor importância nessa “disputa”
e o que menos interessa é saber quem se sagra “vencedor”. É uma
mera formalidade do “jogo”. Os espectadores julgam cada relato, como
verdadeiro ou falso, de acordo com critérios particulares, tais como, por
exemplo, o grau de veracidade contido em cada “confissão”, graças
à atuação do ator/atriz, ou o nível de verossimilhança contido em cada história,
dentro da “interpretação” de quem a conta.
A
meu juízo, todos os relatos, por mais bizarros, esdrúxulos, nojentos,
indefensáveis e escatológicos, podem ser verossímeis, o que me fez seguir a
linha da “interpretação” de cada elemento. E o interessante é
que, embora haja mais de oitenta relatos diferentes, não consegui assistir a
todos, mas vi alguns por duas ou três vezes e, numa delas, sentia-o como verdadeiro
e, em outra, como falso, embora relatado pela mesma pessoa.
“O
formato inédito coloca o espectador como o grande árbitro do jogo, realizado ao
vivo, e garante não só uma interação direta com a experiência, mas também cria
um estado de atenção, que prende a plateia do início ao fim.” (Eu não me
levantava nem para ir ao banheiro e reunia, ao meu redor, antes do início da sessão, uma munição de água,
outras bebidas – as que passarinhos não bebem - e alimentos para “beliscos”,
uma vez que a experiência, no total, somando-se os relatos aos “bate-papos”,
já chegou a ultrapassar três horas, as quais passam sem que sintamos o girar
dos ponteiros do relógio.
Os
relatos vão de simples “causos” do dia a dia até tópicos
relevantes para a sociedade. E, como cada ator do COLETIVO, como já foi
dito, trabalha com, pelo menos, duas confissões, isso faz com que as sessões de
“(IN)CONFESSÁVEIS” nunca sejam iguais umas às outras.
“De
fato, um encontro. Trinta e um artistas (Na segunda temporada.),
corpos de vários estados brasileiros, juntos, num ambiente ‘on-line', aceitando
o desafio desse tempo de isolamento social. Me revirei, como artista, nessa
condução de naturezas distintas, e me vi renascido, junto ao parto de ‘(IN)CONFESSÁVEIS’
e do ‘COLETIVO IMPERMANENTE’”, acrescenta MARCELO VARZEA.
Durante a primeira temporada, em dezembro, “(IN)CONFESSÁVEIS” reuniu um público de cerca de 1.200 espectadores, além de ter sido uma das atrações mais vistas na mais recente edição da “Virada Cultural de São Paulo”, com mais de 400 espectadores. (Detalhe: a experiência iniciava à meia-noite.)
A segunda temporada ficou em cartaz entre os dias 19 de janeiro e 03 de fevereiro (2021). Somando-se todas as apresentações, foram cerca de dois mil espectadores que acompanharam mais de 80 histórias “on-line”.
Os “bate-papos”, após as apresentações, reuniam, além da equipe do espetáculo, artistas de diversas áreas, críticos teatrais e o público espontâneo. Dentre as principais perguntas e apontamentos, estavam o processo de criação do espetáculo; os desafios de interpretação; a definição do que seria verdade (além do critério de verdade, escolhido por cada espectador, na hora de votar); e a dúvida se determinada situação aconteceu ou não com o/a ator/atriz que o interpretava.
Agora, chegou o momento da verdade:
analisar, tecnicamente, a experiência. É óbvio que a visão do crítico, a
qual gera sua opinião sobre uma obra teatral encenada num palco,
presencialmente, não pode ser aplicada a um trabalho via outra mídia,
envolvendo distanciamento físico e elementos tecnológicos “alienígenas”,
em relação a um palco. O piso dos locais onde cada relato era feito não era construído
com as tábuas de um palco, e creio que essa “quase metáfora”
já traduz tudo. Mas vou tentar seguir, mais ou menos, um roteiro no qual tenho
por hábito me basear, nas minhas “resenhas”, como alguns preferem
chamar. Acho mais parecido com “testamentos”, de quem deixou
muitos bens a serem distribuídos a muitos herdeiros.
Via de regra, ou quase sempre mesmo, inicio por comentários feitos com relação ao texto. Aqui, no caso, aos textos, todos excepcionalmente bem redigidos, numa linguagem direta, de fácil decodificação, para qualquer tipo de espectador, sem poupar detalhes. Já começa aí o grande mérito do trabalho. Os dramáticos não exageravam nas cores e, por isso mesmo, atingiam seu objetivo de mexer com a emoção do espectador, sem pieguice. Poderia citar vários, mas, certamente, seria traído pela memória. Sem, contudo, absolutamente, desmerecer os demais, destaco os dois apresentados por DANI D’EON e um, que me levou às lágrimas, por duas vezes, no qual RENATA RICCI “lê”, enquanto destrói e queima, uma carta escrita à filha “para, propositalmente, nunca chegar à destinatária”. Ou seria seu arrependimento, por tê-la escrito, e a percepção do sofrimento que iria causar à futura leitora daquela missiva? Alguns, também, envolvendo violência, de todo tipo, contra mulheres são bem marcantes, além de outros temas, considerados "fortes".
Os que tinham por meta “divertir”, ou sejam, os que puxavam para o humor, atingiram seu objetivo, uma vez que eram bem inteligentes e imprevisíveis, como devem ser os textos com essa finalidade. Chamou-me a atenção, no rol destes, um sobre o qual, até agora, me questiono por que consegui assistir ao seu desenrolar até o fim. E o pior, ou melhor: ADOREI! Ri muito, nas duas vezes em que assisti a tal relato. Mas esse questionamento bate sempre numa mesma resposta: foi com a maior certeza, o trabalho do ator ANDRÉ VIÉRI, a quem não conhecia e o qual passei a admirar profundamente.
Jamais me passou pela cabeça que eu, um dia, poderia aplaudir uma cena que gira em torno da escatologia. Jamais tolerei esse tipo de “aberração”, de “deformação psíquica” (Está falando o falso juiz e o psicanalista de botequim.), via qualquer mídia, embora saiba que ela, a escatologia, exista, que o relato é totalmente factível, e que haja muita gente a quem isso apraz. Talvez Freud explique; eu não me atrevo. O texto é tão bizarro, tão patético, tão esdrúxulo, que os absurdos narrados “perdem seu valor escatológico”, por conta da brilhante interpretação, mais que natural, do ANDRÉ, que brinca com o insólito, o repugnante, o asqueroso, o repulsivo, diz seu texto como se estivesse lendo uma passagem bíblica (Será que estou exagerando ou cometendo alguma heresia?).
Um detalhe que merece muito destaque,
neste trabalho, é o fato de que, embora houvesse, em cada sala, um diretor, ou assistente
de direção (BRENDA NADLER, sala 1; VINI HIDEKI, sala 2; e TALITA TILIERI, sala
3.), visto que a direção geral, o aval final estivesse sob a
responsabilidade de MARCELO VARZEA, cabia, a cada ator, sugerir soluções
de direção para seus relatos, interessantíssimas, diga-se de passagem (Algumas
eram um achado.), assim como criavam, todos, seus cenários e figurinos, sem
falar na iluminação, esta sob a criação e o crivo, o acabamento, final de VINI
HIDEKI.
Não sei se tenho algo a mais a
comentar, com relação aos elementos de criação (Penso que não.), mas não
poderia, antes de apresentar a ficha técnica do trabalho, deixar de dizer que todos
os 36 atores/atrizes são profissionais de primeiríssimo gabarito. Conhecia,
superficialmente, o trabalho de alguns, muito poucos, e era amigo de uma meia
dúzia, cujas carreiras acompanho há muito tempo, entretanto, hoje, já me
considero “coleguinha do tempo do CA”, meus “melhores
amigos de infância”, de uma turma de 37 alunos (36 + eu. Ah! 38. O MARCELO
é amigo de longa data.)
FICHA
TÉCNICA:
Dramaturgia
e Direção: Marcelo Varzea
Textos
e Atuação: Coletivo Impermanente
Assistentes
de Direção: Brenda Nadler, Talita Tilieri e Vini Hideki
Direção
de Movimento: Brenda Nadler
Iluminação:
Vini Hideki
Música:
Márcio Guimarães
Design
Gráfico e Social Media: Guilherme Trindade
Produção:
Leonardo Devitto
Assessoria
de Comunicação: Luís Távora e Renan Rezende
Realização:
Mava Produções Artísticas.
Apoio:
Poiesis e Oficina Cultural Oswald de Andrade
ELENCO
(por ordem alfabética; apenas os que participaram só da segunda temporada):
SALA
1: Brenda Nadler, Bruno Rocha, Daniel Pereira, Eduardo Godoy, Gui(lherme) Albuquerque, Lana
Rhodes, Larissa Morais, Letícia Alves, Oscar Fabião, Renan Rezende e Thais
Müller,
SALA
2: Bruna Massarelli, Camila Castro, Dani D’eon, Evelyn Klein, Guilherme
Trindade, Luís Távora, Mariela Lamberti, Pamella Machado, Preto Viana e Vinicius
(Vini) Hideki.
SALA
3: André Viéri, Bruno Suzano, Flávio Cardoso, Gabriel Vicente, Guilherme
Logullo, Matheus Paiva, Philipe Carneiro, Renata Ricci, Talita
Tilieri e Victor Camarote.
E VAMOS AO TEATRO (QUANDO HOUVER
SEGURANÇA.)!!!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS
DE ESPETÁCULO DO BRASIL (QUANDO HOUVER SEGURANÇA.)!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI!!!
RESISTAMOS!!!
COMPARTILHEM ESTE
TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!
Gilberto, não sei como traduzir a minha admiração pelo seu trabalho, você é tremendo com as palavras, me lembra as ondas do mar, em sequências ininterruptas de ondas fortes ou mais mansas. Há movimento em seus textos, consigo te enxergar em suas palavras, sem medo de ser interpretado injustamente segue em sua honestidade, em sua verdade. É lindo de se ver, de se ler. É o verbo que encarna em movimentos as quais chamamos de texto. Parabéns querido, aguardo seu livro. E quanto ao espetáculo, concordo em tudo, na verdade, às vezes eu não conseguia se quer votar, tamanha a façanha dos talentosos atores.
ResponderExcluirFico muito honrado com suas palavras, Paty. Grato.
ExcluirConcordo. Assisti duas vezes e veria mais. Das melhores expressões artísticas que vi na pandemia. Contemporâneo, envolvente e emocionante. Excelentes atores. Soluções inventivas. Luz espetacular. Parabéns a todos envolvidos, especialmente ao sensível, inquieto e inconformado Marcelo Varzea, pela nova forma híbrida, coletiva/individual de fazer teatro que gerou.
ResponderExcluirSó agora, vi seu comentário, Patrícia, pelo qual lhe fico muito grato.
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