segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017


O
TOPO
DA MONTANHA
 

(“I HAVE A DREAM!”.

ou

ESSE SONHO TEM DE SE
TORNAR REALIDADE!)


 

 


 



            Um espetáculo chegou ao Rio de Janeiro e está em cartaz no Teatro SESC Ginástico: “O TOPO DA MONTANHA”.

            Depois de grande sucesso em São Paulo (estreou em 9 de outubro de 2015) e em outras cidades brasileiras, tendo sido visto por mais de 50.000 espectadores, aportou, aqui, incensado pela grande mídia. E COM MUITO MERECIMENTO!!!

Não porque tem dois atores globais no elenco, e sim porque tem dois grandes ATORES, TAÍS ARAÚJO e LÁZARO RAMOS (obedecendo, simplesmente, à ordem alfabética), contando uma história bem escrita, igualmente dirigida e que fala de amor e fraternidade, que trata de liberdade e igualdade, que é um tratado de respeito ao ser humano, de valorização do Homem, independentemente, e acima, de qualquer coisa.

No caso em tela, a temática é o “racismo”, vocábulo feio, sonora e visualmente, e, mais ainda, semanticamente, o que causa maior asco, palavra que jamais poderia ter sido criada nem fazer parte do léxico da língua portuguesa. Mas, infelizmente, o termo teve de ser cunhado, em todas as línguas – é uma lástima - porque foi necessário um substantivo para nomear um dos comportamentos mais abjetos da raça que se diz “humana”.


 

 
 

 
SINOPSE:
 
O nome da peça faz alusão ao último discurso do Reverendo MARTIN LUTHER KING JR. (I’ve Been to the Mountaintop) realizado em Memphis, na Igreja de Mason, no dia 3 de abril de 1968, um dia antes de seu assassinato, cometido na sacada do Hotel Lorraine.
 
É, exatamente, neste cenário, do quarto 306, e na sequência de suas derradeiras palavras públicas, que o reverendo MARTIN LUTHER KING JR. (LÁZARO RAMOS) conhece CAMAE (TAÍS ARAÚJO), a misteriosa e bela camareira, em seu primeiro dia de trabalho no estabelecimento.
 
Repleta de segredos, ela confronta o líder religioso, em clima de suspense e, simultaneamente, debochado e provocador.
 
Desse modo, em perfeito jogo de provocações, faz o reverendo se lembrar de que, como todos, é humano.
 
Por meio do humor e da emoção, faz rir e pensar, com retórica atual, seja para americanos ou brasileiros.
 

 

 

 
 
            Um adjetivo, aplicado à personagem CAMAE, na sinopse acima, justifica o fato de eu ter de ser um tanto cuidadoso, ao analisar este espetáculo, para não tirar a grande surpresa reservada aos que vão assistir à peça, em seus momentos finais. O meu leitor jamais me perdoaria um “spoiler” de grandes proporções, que o desestimulasse a assistir ao espetáculo. Preparem-se para duas grandes revelações, bombásticas: uma sobre CAMAE e outra sobre Deus!

            A peça estreou em Londres, em 2009 e foi conhecer a Broadway, em 2011.

De acordo com o “release”, enviado pela assessoria de imprensa (LAÍS MAURÍLIO LIMA DE SOUZA), A encenação, que conquistou tantos espectadores, relembra que, há quase cinquenta anos, no dia 4 de abril de 1968, o mundo se despedia de MARTIN LUTHER KING JR., o pastor protestante e ativista político, que se tornou ícone, por sua luta pelo amor ao próximo e pelo repúdio à segregação racial norte-americana. Vale lembrar que, somente entre 1883 e 1959, cerca de cinco mil negros foram linchados, nos estados do Sul do país – e é este o momento histórico que a jovem dramaturga KATORI HALL (acréscimo meu: negra, de 35 anos) desconstrói na ficção.

A escrita, diga-se de passagem, faz sentido, mesmo quando comparado os dias de hoje à situação política daqueles tempos. Por exemplo, a frase do espetáculo ‘PAREM A GUERRA DO VIETNÃ E COMECEM A LUTAR CONTRA A POBREZA’, vista sob a ótica do presente, ainda parece possível ser proferida e ressalta as características de um líder, que teve a força de amar aqueles que jamais puderam amá-lo de volta”.

            Segundo depoimentos do ator protagonista e um dos produtores do espetáculo, LÁZARO RAMOS, ao lado de TAÍS, sua esposa, “Este texto me perseguiu, como ator, por dois anos, por meio de pessoas que diziam que eu tinha de fazê-lo, no Brasil. E é contemporâneo, porque é uma história também sobre enfrentar medos. Sobre os trilhos da coragem e do afeto”.

Tenho de concordar com LÁZARO: não só é bastante contemporâneo como também não está restrito às fronteiras norte-americanas. Ele, o texto, é capaz de dizer muito, a todas as pessoas, negras ou não, em todo o mundo. Mexe com a sensibilidade e a emoção de qualquer pessoa que tem afeto, amor, apreço e respeito pelo seu semelhante.

E é TAÍS quem complementa: “Tínhamos muito receio de que o texto fosse americano demais e não tocasse as pessoas. Mas o tempo e uma boa tradução nos convenceram de que as questões do amor e da igualdade são relevantes e próximas a todos nós”.

            O próprio LÁZARO já havia feito uma tradução do original, cujo resultado não lhe agradou. A excelente tradução utilizada é de SÍLVIO JOSÉ ALBUQUERQUE E SILVA, ou, simplesmente SÍLVIO ALBUQUERQUE, o qual conseguiu “dar vida a temas universais e ainda envolventes” num texto, segundo ele, no qual “(KATORI) HALL revela um líder, ao mesmo tempo radical e pragmático, profético e imprevidente, sonhador, sedutor, frágil e, sobretudo, humano”.

            O tradutor, grande admirador e conhecedor da vida e obra de KING, era chefe de gabinete do ex-ministro do STF, Joaquim Barbosa, e entregou uma tradução do texto, que fizera, a LÁZARO RAMOS, quando este fora a Brasília, com a intenção de entrevistar S. Exª, para um programa de TV.
 
 




            Penso que esse seja o grande mérito do texto original e da tradução: mostrar um MARTIN LUTHER KING sob outra ótica, totalmente humanizado, não quase canonizado, como o é, até hoje. Se Jesus, antes de tudo um Homem, também teve suas fraquezas e medos, até na hora da morte, por que não poderia – como, realmente, deve ter acontecido – KING ter passado pelas mesmas sensações e incertezas, em sua pregação?

            Também é importante falar que, a dramaturga não deixou de mencionar, como uma prestação de homenagem, Malcom X, resgatando-lhe o pensamento. Al Hajj Malik Al-Shabazz era seu nome verdadeiro (1925/1965), que também foi um dos maiores defensores do Nacionalismo Negro nos Estados Unidos, tendo fundado a Organização para a Unidade Afro-Americana, de inspiração separatista. Defensor dos direitos dos afro-americanos, ele, que teve o pai brutalmente assassinado, conseguiu mobilizar brancos e negros na conscientização sobre os crimes cometidos contra a população afro-americana.
Para negros e brancos, índios ou amarelos, para todos os que enxergam, no “racismo”, um câncer, que precisa ser extirpado, completamente, de todas as sociedades, a imagem que MARTIN LUTHER KING JR. deixou foi a de um quase santo, entretanto pouco se sabe, ou se fala, do seu lado Homem. KATORI HALL teve a coragem de desconstruir um mito e mostrar um grande herói, sim, que habitava (n)um ser humano.
            Parti para o Teatro Ginástico com uma enorme expectativa. Achava que iria sofrer, certamente, e chorar, talvez muito, com um drama, que mostrasse os últimos dias de vida do grande líder humanista. Fui preparado para usar o lenço, mas não me utilizei dele. Mas a peça não é bem, ou somente, sobre isso. É claro que me emocionei, em determinadas cenas, bastante, entretanto a proposta da autora é chamar o público a uma reflexão, mas, sobretudo, quase o tempo todo, de uma forma leve, regada com bastante humor, por parte da personagem de TAÍS, a qual demonstra, mais uma vez, nos palcos – lugar onde quem se diz artista mostra a que veio de verdade (nada contra quem se recusa a fazer TEATRO) -, uma competência no ofício, já demonstrada em cerca de dez espetáculos teatrais de que já participou, fora seus trabalhos em outras mídias.

Desde sua primeira aparição, há uma empatia muito intensa entre plateia e personagem, principalmente por parte dos que se consideram minoria.  Reforço: por conta da belíssima atuação de TAÍS e da natureza de CAMAE, totalmente desprovida de pudores e autocensuras. A atriz, muito merecidamente, foi indicada a um Prêmio de Teatro, em São Paulo, e deverá sê-lo, também, em nossa cidade. Lamento, profundamente, que LÁZARO também não o tenha sido, uma vez que ambos se equivalem, em rendimento, em cena, pondo em prática uma grande parceria e generosidade entre marido e mulher e colegas do mesmo ofício.
 
 
 



            LÁZARO, como grande ator que é, construiu seu personagem sem a preocupação de imitá-lo, o que, se não acontecesse, poderia desaguar numa caricatura não bem aceita pelo público. Ao contrário, e muito corretamente, atua com total naturalidade e personalidade, como se o nome do personagem fosse outro, mas o que ele representa, na trama, tivesse a ver com aquele sobre o qual se debruçou a dramaturga. Não me parece que o ator tenha observado e estudado a voz e os gestou do personagem, para reproduzi-los, mas, sim, criou uma reprodução “tupiniquim” – NO MELHOR SENTIDO DE "BRASILEIRISMO" – do Pastor.

Como ele mesmo disse, em entrevistas, “uma apropriação nossa, que permitiu compartilhar nosso afeto durante o ensaio. Com isso, entendemos perfeitamente o grande ensinamento deixado por esse homem”.

            A “camareira” (Atenção para o grifo; isso é uma pista.), durante todo o tempo de duração da peça, não se mostra inferior ao grande líder, o que será entendido, ao final da encenação, e, de todas as formas, provoca-o, fazendo-o perceber suas fraquezas, seus vícios, seus acertos e erros, o seu ser na intimidade, num confronto, por vezes, hilário. KING vê-se obrigado a sucumbir à “pressão” imposta por CAMAE.
 
 
 



            Pode faltar tudo ao espetáculo (NÃO FALTA NADA!!!), menos uma “química” entre o casal de atores, já acostumados a dividir o “set”. Tenho a impressão de que, salvo melhor juízo, em TEATRO, é a primeira vez que atuam, ou, pelo menos, que os vejo, juntos, a não ser que a memória esteja me traindo.

            A direção da peça é do próprio LÁZARO RAMOS, entretanto, envolvido em outros projetos, fez um grande acerto, ao convidar FERNANDO PHILBERT, para codirigir o espetáculo com ele. FERNANDO vem assinando, como diretor assistente ou titular, alguns dos melhores mais recentes espetáculos teatrais.

Gostei muito da cenografia, de ANDRÉ CORTEZ, que mostra, por meio de paredes de vidro ou vazadas, o interior do quarto em que estava hospedado KING. É lá que se passa ação; poucas vezes, foge a essa área. A base dessa ótima cenografia é uma estrutura de metal, que se abre, quase ao final da peça.

Esse detalhe final da cenografia é bastante curioso, uma vez que ANDRÉ utiliza o mesmo processo que aplicou em “Gota D’Água [A Seco]”, qual seja o de expansão do cenário. Lá, porém, os movimentos de expansão e contração das paredes se repetia e, a cada cena em que crescia o embate entre os personagens Joana e Jasão, o cenário de fechava, em função de uma situação de perigo, que exigia um “fechamento do círculo”. Em “O TOPO DA MONTANHA”, o movimento é único, apenas o de expansão, no momento em que uma grande revelação é feita, ao final, e quando o protagonista percebe que, apesar do seu sacrifício de morrer, lutando pelos fracos e oprimidos, paradoxalmente, sua morte pode representar uma abertura nas mentes das pessoas e uma esperança de um futuro melhor, não só para os negros, mas para todos os discriminados. O “circulo se expande” e abre as portas para um espaço eterno. Tudo feito por CAMAE, e isso não é só um detalhe. Sem dúvida, um momento de grande inteligência da direção/cenografia.

Mais do que um técnico no assunto, apresento-me como um grande apreciador da iluminação, no TEATRO, e posso dizer que me pareceu muito boa e correta a luz de WALMYR FERREIRA.

Os demais elementos técnicos do espetáculo, como figurinos (TERESA NABUCO), trilha sonora (WLADIMIR PINHEIRO) e desenho de som (LAÉRCIO SALLES) atendem às necessidades do espetáculo, estando dentro do correto e ajustado à montagem.
 
Não posso, também, deixar de mencionar o bom trabalho de videografismo, de RICO e RENATO VILAROUCA.




 


 
FICHA TÉCNICA:
 
Texto: Katori Hall
Tradução: Sílvio Albuquerque
Consultoria Dramatúrgica: Ângelo Flávio
 
Direção: Lázaro Ramos
Codireção: Fernando Philbert
Assistência de Direção: Thiago Gomes.
 
Elenco: Lázaro Ramos e Taís Araújo

Voz Inicial da Mãe de Martin Luther King: Léa Garcia
 
Preparação Vocal: Edi Montecchi
Cenografia: André Cortez
Assistência de Cenografia: Carmem Guerra
Construção do Cenário: Ono Zone Estúdio/ Fernando Bretas e Waldir Rosseti
Iluminação: Walmyr Ferreira
Assistência de Iluminação: Marcos Freire
Figurinos: Teresa Nabuco
Trilha Sonora: Wladimir Pinheiro
Desenho de Som: Laércio Salles
Projeções: Rico Vilarouca e Renato Vilarouca
Fotos de Estúdio: Jorge Bispo
Fotos de Cena: Valmyr Ferreira e Juliana Hilal
Projeto Gráfico: Dorotéia Design, Adriana Campos e Tamy Ponczyk
Revisão: Regina Stocklen
Serviços de Camareira: Solange Carneiro
Contraregragem: Fabiano Motomoto
Operação de Luz: Kadu Moratori
Operação de Som e Projeção: Fernando Castro
Serviços Técnicos de Projeção: Bruno Mattos
Supervisão Técnica de Projeção: Alexandre Bastos - Novamídia
Assistência Técnica e de Produção: Igor Dib
Assistência de Administração: Jandy Vieira
Administração Lei Rouanet: Thiago Oliveira
Produção Executiva e Administração: Viviane Procópio
Administração Geral: André Mello
Direção de Produção: Radamés Bruno
Produção: BR Produtora
Produtores Associados: André MelloLázaro Ramos Taís Araújo
 


 
 

 
 
 

 
 

 
SERVIÇO:
 
Temporada: De 21 de janeiro a 19 de fevereiro de 2017.
Teatro SESC Ginástico (513 lugares)
Endereço: Av. Graça Aranha, 187, Centro – Rio de Janeiro
Tel.: (21) 2279-4027
Dias e Horários: 6ªs feiras e sábados, às 19h; domingos, às 18h
Valor dos Ingressos: R$6,00 (Associados Sesc), R$12,00 (para jovens até 21 anos, estudantes e maiores de 60 anos) e R$25,00 (inteira)
Funcionamento da
Bilheteria: De 3ª feira a domingo, das 13h às 20h
Aceita cartões de débito e crédito.
Os ingressos serão gratuitos para o público inscrito no PCG – Programa de Comprometimento e Gratuidade.
Classificação Etária: 12 anos
Gênero: Comédia Dramática
Duração: 90 minutos
 










            Ainda ni início da temporada teatral de 2017, "O TOPO DA MONTANHA" já se candidata a um dos melhores espetáculos do ano.
 
LÁZARO e TAÍS estão à procura de um novo espaço, para que a peça faça uma segunda temporada no Rio, mas todos sabemos o quanto é difícil e problemático encontrar uma pauta nesta cidade. Só que não é possível que um espetáculo como “O TOPO DA MONTANHA” fique restrito a um público pequeno, numa temporada tão curta!!!

Que os DEUSES DO TEATRO se apiedem (um pouco de tragédia grega não faz mal a ninguém) dos que ficaram frustrados, por não conseguir um ingresso para a peça, já que todos foram vendidos na primeira semana em cartaz, e proporcionem, ao querido, simpático e talentoso casal, a graça de um novo teatro, para uma longa temporada da peça.

 EU TAMBÉM QUERO REVER!!!

Que assim seja! Amém!!!
 
 
 
 
(FOTOS: JORGE BISPO - estúdio - 
e
VALMYR FERREIRA e JULIANA HILAL - cena.)
 
 
 
 


 



 


 







 

 

 

 

 

 



 



 


 





 




 




 










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