sexta-feira, 24 de novembro de 2023

 

“ISABEL DAS SANTAS VIRGENS 

E SUA CARTA À RAINHA LOUCA”

ou


(REALIDADE E FICÇÃO

NO MESMO PATAMAR.)



 

É, realmente, uma máxima que se aplica ao TEATRO e é totalmente verdadeira: Não há melhor receita, para se conseguir um espetáculo teatral merecedor de aplausos, do que juntar um bom texto a uma ajustada direção mais uma correta interpretação e, ainda, um eficiente suporte dos elementos de criação. Foi utilizando esses instrumentos que se ergueu o monólogo “ISABEL DAS SANTAS VIRGENS E SUA CARTA À RAINHA LOUCA”, em cartaz no “Espaço Abu”, um pequeno Teatro, num espaço meio alternativo, no Rio de Janeiro. A peça, escrita por ANA BARROSO, responsável pela adaptação do livro de MARIA VALERIA REZENDE, é dirigida por FERNANDO PHILBERT, trazendo a própria ANA BARROSO como intérprete do solo. ANA também é a idealizadora deste belo projeto.

 

 



 

 SINOPSE: 

Convento do Recolhimento da Conceição, Olinda, 1789.

Isabel das Santas Virgens (ANA BARROSO) está enclausurada, acusada de loucura e rebeldia, por lutar pela sua autonomia numa sociedade patriarcal colonial.

Ela escreve uma carta à Rainha Dona Maria I, conhecida como a “Rainha Louca”, com quem se sente irmanada na opressão pelo mundo dos homens.

Tida por muitos como, também, lunática, Isabel relata os destemperos e injustiças praticados pelos homens da Coroa – e por outros tantos – contra mulheres, escravizados e todos que se encontravam em situação de vulnerabilidade.

 

 




         O que nos é dado ver, no “Espaço Abu”, é a ficcionalização da história real de uma mulher corajosa, do final do século XVIII. Através da carta referida na SINOPSE, ela tenta se comunicar com a Rainha Maria I, de Portugal, de quem espera receber clemência e liberdade. Na missiva, Isabel relata os destemperos e injustiças praticados pelos homens de poder contra mulheres, escravizados e todos que se encontravam em situação de vulnerabilidade. Entre perdas e amores proibidos, a saga de Isabel passa por períodos em que assumiu uma identidade masculina, para conseguir viver da única coisa que sabia fazer: ler e escrever, que “não era coisa para mulheres”, à época.




         Não conheço a obra que serviu como “matéria-prima” para o texto adaptado desta peça, mas, sobre este, afirmo se tratar de uma boa dramaturgia, capaz de, facilmente, fazer chegar ao público a mensagem intentada pela escritora MARIA VALERIA REZENDE e a dramaturga ANA BARROSO, ou seja, a saga de uma mulher em busca de sua salvação, com fortes pinceladas, muito intencionais, de um grito feminista contra a tirania do homem dominador. A vivência de Isabel – tanto a real quanto a ficcional – narrada em suas cartas, as quais existem, de fato, mas não endereçadas à rainha, vai ao encontro da realidade da maioria das mulheres da época, chegando, infelizmente, até os dias de hoje, uma vez que a luta feminista ainda se encontra longe do seu fim. Basta um superficial exame das estatísticas sobre feminicídios, mormente no Brasil, e todos os tipos de violência, físicas ou de outra ordem, praticados contra o universo feminino.  




         Valendo-me do excelente “release” a mim enviado por STELLA STEPHANY, Assessoria de Imprensa, informo, para os que me leem, quem foi a protagonista da peça: “Isabel das Santas Virgens foi uma menina branca, filha de portugueses pobres, recém-chegados ao Brasil para trabalhar num engenho de cana de açúcar no Recôncavo Baiano. Com a perda precoce dos pais, é criada entre a senzala e os aposentos da jovem sinhazinha Blandina, filha única do poderoso Senhor do Engenho. Com o passar dos anos, Blandina e Isabel, já crescidas, se apaixonam pelo mesmo homem, o aventureiro Diogo. A sinhazinha acaba se entregando ao ‘pecado da carne’ e é punida, junto a Isabel, com a clausura num convento. Mais adiante, com a morte de Blandina e já em liberdade, Isabel assume uma identidade masculina, para atuar em trabalhos que envolviam a escrita e não lhe eram permitidos, e acaba novamente presa.”.




         As atitudes da personagem, sempre fruto de uma invejável coragem e “ousadia”, nos levam a vê-la como uma precursora do movimento feminista. Sim, Isabel é uma heroína feminista, visto que, “sem recursos ou proteção de quem quer que seja, enfrenta perigos e desafios, munida de suas únicas ferramentas: a inteligência e a capacidade de ler e escrever, adquirida durante a convivência na casa grande”.




         Pelas cartas da personagem, por trás delas, pode-se chegar à percepção de como se deu a colonização brasileira, assim como é possível saber, exatamente, qual era o papel da mulher naquela época, sua situação de fragilidade, de vulnerabilidade, ante a força masculina, e as penalidades a que estava sujeita, quando ousava desafiar o “status quo”. Isabel foi subjugada de todas as formas, porque ousou ir além do que lhe era permitido. “É a história da luta de uma mulher por sua própria sanidade - através das palavras e do exercício de organização mental, é capaz de manter um pouco de si, escrevendo, escrevendo e escrevendo.”. Por tudo isso, dá para afirmar que o texto é atemporal e se encaixa na contemporaneidade brasileira, principalmente, embora ainda haja outros lugares bem piores do que aqui, nesse sentido.




         A FICHA TÉCNICA apresenta, creio que de forma errada, o solo como sendo uma COMÉDIA, apesar de que, em algumas passagens, a personagem faça uso de umas “gotinhas” de humor, bem superficial, com doses de ironia, o que, a meu juízo, não basta para se enxergá-lo como um exemplo do gênero como é descrito na referida FICHA.




         Mais uma vez, FERNANDO PHILBERT executa uma direção discreta e, ao mesmo tempo, bonita, “limpa” e “robusta”, sem o desejo de criar excentricidades sobre um texto que, se fosse lido, simplesmente, por alguém parado num determinado lugar, já seria o suficiente para que a sua mensagem alcançasse o ouvinte. Como se trata de TEATRO, de uma montagem teatral, o que PHILBERT, um dos melhores diretores de TEATRO surgidos nos últimos anos, depois de, na função de assistente de direção, beber muito nas fontes de grandes diretores, como Gilberto Gawronski, Domingos Oliveira e, principalmente, seu grande mestre, o saudoso Aderbal Freire-Filho, fez foi extrair o melhor do potencial de interpretação de ANA BARROSO e se ocupar do traçado de ótimas marcações, levando em conta o acanhado espaço cênico de que dispunha.



Fernando Philbert.


         Adepto do dito popular que diz que “não se deve mexer em time que está ganhando”, o diretor, em, praticamente, todos os trabalhos de direção assinados por ele, conta com dois profissionais de ponta, na cenografia e na iluminação; aquela leva a assinatura de NATÁLIA LANA; esta foi criada por VILMAR OLOS. Os trabalhos desses dois sempre dialogam com perfeição e enriquecem qualquer montagem. E sempre têm que ser desenvolvidos em função de orçamentos e espaços onde as peças estarão em cartaz. Nesta encenação, isso fica muito patente. Como a verba de produção não me parece ter sido “polpuda” e o espaço cênico é bem pequeno e sem muitos recursos técnicos, o jeito é colocar em prática muita criatividade e trabalho, no que os dois artistas sempre se destacam.




         O cenário é simples, porém bonito, prático e atende, perfeitamente, às exigências do texto. Cenário único, contemplado com uma mesa um pouco rústica, muitas folhas de papel de cartas sobre ela; um banco, idem; uma pequena cômoda vertical; e três espécies de tapadeiras, vertendo do teto, nas quais se podem ver alguns escritos (ampliações das cartas). Um belo conjunto de elementos cênicos. O desenho de luz não apresenta nada que mereça um grande destaque, entretanto todas as variações de intensidade e “blackouts” entram nos momentos exatos, para delimitar cenas da protagonista e da atriz, quando esta quebra a quarta parede, em comunicação direta com o público.




         Um elemento, nesta montagem, que me chamou bastante a atenção está afeto à direção musical, do premiado MARCELO ALONSO NEVES, mais propriamente a trilha sonora. Saí do Teatro com a certeza de que havia gostado muito daquela trilha, ainda que não tivesse conseguido identificar o que ouvia. Como não sou de me deixar “ficar no vácuo”, tratei de estabelecer um contato com MARCELO, para que ele me dissesse o que havia usado naquele trabalho. E cheguei à conclusão de que é algo bem eclético. Disse-me ele que criou bases, vários temas, utilizando muitas cordas, às quais agregou colagens de ladainhas, cantos das farinheiras do nordeste e até trechos de músicas cantadas por crianças de tribos da Mauritânia; muitas referências de cantos religiosos.




         LUCIANA CARDOSO é a responsável pelo belo figurino da peça, com destaque para a saia, em várias camadas, com detalhes de bordados e outras técnicas.  




         ANA BARROSO, há 33 anos, vem desenvolvendo um lindo trabalho voltado para o público infantil, ao lado de Mônica Biel, na pele da dupla de “clowns” Lasanha e Ravioli, na BB Companhia. ANA construiu uma sólida carreira, de 40 anos, acumulando experiências vividas com grandes mestres, iniciada no Teatro “O Tablado”, como aluna de Maria Clara Machado, Carlos Wilson Damião e Bernardo Jablonski, entre outros. Neste espetáculo, solitária em cena, a atriz tem a oportunidade de demonstrar seu talento e do que é capaz, em termos de interpretação, com todas as exigências que um monólogo exige. Precisa, nas passagens de voz dela mesma para a personagem, e vice-versa; bastante desenvolta em cena; e passando verdades e emoções, muito me agradou o seu trabalho.   





 FICHA TÉCNICA: 

Da obra de Maria Valéria Rezende 

Adaptação: Ana Barroso

Direção: Fernando Philbert

 

Elenco: Ana Barroso

 

Direção Musical: Marcelo Alonso Neves 

Cenário: Natália Lana 

Iluminação: Vilmar Olos 

Figurino: Luciana Cardoso 

Programação Visual: Raquel Alvarenga 

Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação - João Pontes e Stella Stephany

Fotos: Nil Caniné

Idealização e Realização: Ana Barroso / BB Produções Artísticas 


 

 







 SERVIÇO:

Temporada: De 16 de novembro a 03 de dezembro de 2023.

Local: Espaço Abu. 

Endereço: Avenida Nossa Senhora de Copacabana, nº 249 - Copacabana - Rio de Janeiro.

Telefone: (21)2137-4184.

Dias e Horários: 16, 17, 18, 19 (5ª feira a domingo), 23, 24 de novembro (5ª e 6ª feira), 02 e 03 dez (sábado e dominmgo), sempre às 20h.

Valor dos Ingressos: R$50,00 (inteira) e R$25,00 (meia-entrada)

Vendas “on-line”www.sympla.com.br

Horário de Atendimento na Bilheteria: De 2ª a 6ª feira, a partir das 13h30min, e aos sábados e domingos, a partir das 15h.

Classificação Etária: 12 anos.

Duração: 60 minutos.

Capacidade: 30 espectadores.

Acessibilidade: Sim, na plateia e no banheiro.

Gênero: COMÉDIA (?)

 

 


 



         Quando fui para o “Espaço Abu”, ontem, levava comigo uma boa expectativa, em função dos muitos comentários positivos que me haviam chegado, da parte de quem já havia assistido ao espetáculo. É muito bom ir a um Teatro já com uma grande e boa expectativa e, quando isso acontece ou é superado, como aconteceu depois de ter assistido a “ISABEL DAS SANTAS VIRGENS E SUA CARTA À RAINHA LOUCA”, o prazer é reforçado. Recomendo o espetáculo.

 

 


 

 


FOTOS: NIL CANINÉ

 

 

 

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