domingo, 22 de setembro de 2013

CESTA BÁSICA DE TEATRO PARA A SEMANA DE 23 A 29 DE SETEMBRO:
 
A FALECIDA - Teatro Maison de France
A PORTA DA FRENTE - Teatro OI Futuro (Flamengo)
COMO É QUE PODE? - Teatro das Artes (última semana)
CONSELHO DE CLASSE - Espaço SESC Copacabana (Mezanino) (estreia)
EDUKATORS - Teatro Ipanema (última semana)
FAVELA - Teatro João Caetano (última semana)
GARAGEM - Estacionamento G3 do Shopping RIO-SUL
INCÊNDIOS - Teatro Poeira
JIM - Teatro do Leblon (Sala Tônia Carrero)
NEM MESMO TODO O OCEANO - Teatro Gláucio Gil (restreia)

O DIA EM QUE RAPTARAM O PAPA - Teatro Clara Nunes (última semana)
O PRÍNCIPE - Espaço SESC Copacabana (Sala Multiuso) (última semana)
O TEMPO E OS CONWAYS - Teatro SESC RIO Casa da Gávea
PARA SEMPRE, ABBA - Teatro Clara Nunes
PARAÍSO AGORA! ou PRATA PALOMARES - Galpão do Espaço Tom Jobim
SEXO, DROGAS E ROCK'N'ROLL - Teatro do Leblon (Sala Marília Pêra) 
SIMPLESMENTE EU, CLARICE LISPECTOR - Teatro Fashion Mall
 
 

 



sábado, 21 de setembro de 2013


INCÊNDIOS   -   NEM TODA A ÁGUA DE TODOS OS OCEANOS HÁ DE APAGAR.
 
Cartaz da peça - foto DP
 
(As fotos que ilustram esta matéria foram feitas pela divulgação da peça – DP -, por Marisa Sá – MS – e pelo grande fotógrafo e amigo Léo ladeira – LL.)

            Estreou ontem, 20 de setembro de 2013 (esta data entrará para a História do TEATRO BRASILEIRO), para o grande público, o que está parecendo ser o grande acontecimento teatral do ano, no Rio de Janeiro e no Brasil: INCÊNDIOS (já encenada em quinze países), peça do dramaturgo, ator e diretor libanês, radicado no Canadá, com passagem por Paris, WAJDI MOUAWAD, com direção de ADERBAL FREIRE-FILHO e grande elenco, capitaneado por MARIETA SEVERO. 

Rodinha, antes da abertura da cortina.  MERDA! - foto DP

O TEATRO precisa, sempre, de sangue novo, de alguém que acredite nos seus sonhos e que não meça esforços por vê-los concretizados.  Aplaudo, de pé e efusivamente, nomes como o de PABLO SANÁBIO, por exemplo, e tantos outros jovens atores, diretores e produtores, que vêm renovando o panorama teatral carioca, com coragem e criatividade, mas, principalmente, acrescento, aos meus aplausos, um forte grito de “BRAVO!” a dois “meninos”, que se tornaram “homens” por conta de sua ousadia e paixão pelo TEATRO, como empreendedores.  Refiro-me a ARLINDO LOPES e a FELIPE DE CAROLIS. 


 Além de Charles Fricks, um dos maiores atores brasileiros, Pablo Sanábio (de camisa verde) - foto LL
 
Arlindo, por conseguir todos os afagos de uma Glória Menezes, para o seu tão sonhado, lindo e bem-sucedido ENSINA-ME A VIVER, que durou cinco anos de triplo sucesso (público, crítica e bilheteria) e Felipe, que marcou um golaço, ao tocar aquele canto especial no coração de Marieta Severo, toque este sem o qual ela não se deixaria mobilizar por abraçar o sonho daquele jovem, recém-entrado nos vinte anos. 
E não é coincidência o fato de os dois encantadores e grandiosos projetos terem sido abençoados pela grande produtora Maria Siman, que não é Midas, pois este transformava em ouro tudo aquilo em que tocava; Maria, quando toca, é porque sente que ali já está, escondido, em estado bruto, o ouro que ela vai ajudar a purificar.  Foi o que viu, há alguns anos, em Arlindo e, mais recentemente, em Felipe.

 


Marieta Severo, Luciano Marcelo e Maria Siman - foto LL   

 
A minha paixão por INCÊNDIOS começou há bastante tempo, desde que o idealizador do projeto, FELIPE DE CAROLIS, me falou dele, com paixão maior ainda, sem fornecer maiores detalhes a respeito do texto, pelo que, hoje, lhe sou muitíssimo grato.  Explico: nos dez ou quinze minutos finais da peça, ocorre uma grande revelação, que, se previamente sabida, causaria o mesmo sentimento vivenciado por uma criança, ao flagrar o pai, sem ao menos uma fantasia barata de Papai Noel, colocando, sorrateiramente, o presente de Natal no sapatinho. 
Queria muito ter assistido a, pelo menos, um ensaio da peça, pois a minha ansiedade era enorme, e só fazia crescer, a cada vez que o assunto vinha à tona, mas, felizmente, não levei a efeito tal propósito, porque seria quebrado o tão celebrado encanto, o mistério da surpresa, guardada, de forma genial, pelo autor, para o desfecho da trama.
Acompanhei a gestação a distância, por mensagens trocadas com Felipe (Facebook), por longos telefonemas, por raros encontros com ele e por um diálogo relâmpago, com Aderbal Freire-Filho, num casual e rápido encontro, num fim de tarde, princípio de noite, no SESC Casa da Gávea, com o testemunho da querida Vera Fajardo.

Cena da peça - foto DP

Cena da peça - foto DP
 
Quase não pude encontrar o Felipe, pessoalmente, para conversar sobre esse grande projeto, porque, nos últimos dois anos, ele respirou INCÊNDIOS, 25 horas por dia.  Não poderia, então, ser diferente o resultado deste parto: um dos bebês mais lindos e saudáveis que já vi nascer, em toda a minha vida, num palco. 
            Assim, consegui suportar o tempo trabalhando de bandido contra mim, até que, com muita expectativa, o dia 14 de setembro de 2013 chegou e fui levado ao Teatro Poeira, a uma sessão especial, para convidados.  Nunca partira, antes, para uma estreia com tanta ansiedade.  Ao mesmo tempo, cercava-me o fantasma de uma frustração.  E se não fosse o que eu esperava?  Às vezes, excesso de expectativa não é bom.  Excesso de expectativa chama-se “ansiedade”. 
           Mas não foi o que aconteceu com relação a INCÊNDIOS.  Muito pelo contrário, o que vi, no simpático palco do Teatro Poeira (obrigado, Marieta Severo e Andrea Beltrão), foi muito mais do que eu já esperava.  Superou, em proporções gigantescas, todas as minhas melhores expectativas.
            A primeira agradável surpresa já vem ao encontro do espectador, quando este recebe o programa da peça, uma verdadeira obra de arte.  Impressiona, não só pelas grandes proporções, mas também pela qualidade do material utilizado na sua confecção e, acima de tudo, pelo conteúdo.  Um bom programa de TEATRO não pode apenas se limitar a apresentar a ficha técnica do espetáculo, fazer pequenos agradecimentos, mostrar algumas fotos dos atores e de cenas, e outros tipos de ilustrações, e poucos textos, limitados a pequenos e superficiais depoimentos, como é hábito se ver, deste ou daquele elemento da equipe. 
O programa de INCÊNDIOS, marca registrada das produções de Maria Siman (os de ENSINA-ME A VIVER e EDUKATORS são outras duas joias), prima por tudo o que já foi relacionado e traz, ainda, artigos profundos sobre detalhes do texto, do espetáculo em si, da produção, do autor, além de lindas fotos e um texto brilhante do grande jornalista e professor de Relações Internacionais, Renato Galeno, sobre a Guerra Civil do Líbano e sua consequências, o que auxilia bastante o espectador a mergulhar no universo do autor e a compreender melhor a proposta do texto e do espetáculo.  Também são antológicos os comentários de Aderbal sobre os OBJETOS DE CENA.  Lindo!

Marieta Severo, com o livro que traz o texto da peça - foto LL
 
São 120 minutos de uma aula de tudo: de dramaturgia, de interpretação, de direção, de cenografia, de figurino, de luz, de trilha sonora, de História, de Humanidade...

Aqui, passo a fazer uma sinopse, bem sintetizada, mesmo, da peça, resguardando, omitindo os detalhes que poderiam embotar a surpresa final.  Hão de perceber, os pacientes amigos que me dão a honra desta leitura, que se pode admitir estar diante de um texto com visíveis características de uma tragédia grega, com roupas e adereços contemporâneos, porém:

Trata-se da história de Nawal, uma mulher misteriosa, que sempre se mostrou distante e pouco carinhosa com os filhos gêmeos, Simon e Jeanne.  Ela passa seus últimos anos em voluntário exílio no Ocidente, onde morre.  No dia da morte da mãe, após esta ter ficado muda por cinco anos, no entanto, eles descobrem o possível motivo desse distanciamento.  Entre alguns desconfortáveis últimos pedidos, a mulher, por meio de um tabelião, entrega duas cartas aos jovens e pede que elas sejam levadas aos destinatários.  Uma é para o pai, que eles sempre pensaram que estivesse morto, e a outra é para um irmão, de cuja existência eles eles nem sabiam.
 Simon prefere fixar-se numa possível carreira de boxer e ignorar estes novos fatos da sua vida, mas Jeanne decide respeitar o desejo da mãe e parte para o Oriente Médio.  Nessa busca pelo pai e pelo irmão, porém, ela e, posteriormente, o irmão descobrem quem era a verdadeira Nawal, uma mulher excepcional, com a vida marcada pela guerra, pela desgraça e pelo ódio.
“É a história de três destinos que buscam suas origens, em uma tentativa de solucionar a equação de suas existências”, resumiu Mouawad na apresentação da primeira montagem da peça.
‘’INCÊNDIOS” não é, propriamente, uma peça sobre a guerra, mas sobre promessas que não são cumpridas, sobre tentativas desesperadas de consolo, sobre maneiras de se permanecer humano em um contexto desumano”, resumiu o autor após receber o Prêmio Molière pelo texto.

Público ovaciona, de pé, o final do espetáculo - foto LL

Pequenas, e sinceras, considerações sobre cada uma das peças do tabuleiro em que se joga INCÊNDIOS:

O ELENCO: (Muito deixará de ser dito sobre os trabalhos anteriores dos atores, do diretor e dos demais profissionais envolvidos no projeto, uma vez que o programa da peça já o faz, e de forma impecável):

MARIETA SEVERO: Nawal (dos 14 aos 65 anos).  Não serei eu a gastar tempo desnecessário para dizer o óbvio sobre ela.  É uma atriz digna dos mais elevados patamares no universo teatral, em termos de Brasil e fora das nossas fronteiras, sem nenhum exagero.  Aqui, Marieta encarna Nawal, que bem poderia se chamar Zuzu Angel (a cuja memória ela dedica o espetáculo), Maria, Clarice, Aurora, Glória, Zefa, qualquer uma dos milhares de mulheres brasileiras que, assim como também os homens, sofreram nos porões da ditadura militar, e de outras mulheres, que, ainda hoje, sofrem sob uma ditadura civil, travestida de democracia.  Sua personagem fala português e pode ser encontrada nas filas dos ônibus, nos supermercados ou em qualquer lugar de alguma metrópole ou cidade do interior deste Brasil.
A Nawal de Marieta foi nascendo de toda uma vivência de mulher que teve de abandonar o país, numa época em que era perigoso falar, reclamar, protestar contra o regime de exceção imposto pelos militares.  Pela boca da personagem, Marieta provoca, naqueles que conhecem o horror da ditadura militar, um sentimento de resgate da necessidade de se impor contra as arbitrariedades e crimes praticados pela força da opressão.  A vingança de Nawal é a nossa vingança; o grito de Nawal é o nosso grito; as lágrimas de Nawal são as nossas lágrimas; o sentimento de Nawal é o nosso sentimento.
Marieta Severo é muito mais que uma atriz; é uma profissional que, por conhecer o verdadeiro papel social do ator, sabe utilizar todos os veículos de comunicação para servir de porta-voz dos nossos anseios.  Numa época conturbada, como a que presenciamos, Nawal representa a mulher que não aceita ser somente uma mera coadjuvante passiva, contadora de uma história; ela é mais uma representante daquelas que lutam pela valorização da dignidade feminina.  Mais que isto: é o retrato da resistência às atrocidades que vêm sendo cometidas, há séculos, contra as mulheres, e que não encontram mais eco nos dias de hoje.
É uma personagem de dificílima construção e que poucas atrizes, como ela, estão aptas a sustentar em cena, principalmente com a perfeição como está representada no palco do Teatro Poeira.
Sua maneira de representar cativa e, ao mesmo tempo, provoca o espectador, desde sua primeira aparição em cena, e mostra toda a riqueza e força de uma personagem que, em princípio, provoca um certo sentimento no público, mais tarde modificado, quando se percebe que, mais uma vez, “os meios justificam os fins” (ou será o contrário?) (Evoé, Maquiavel!)
É um trabalho que ficará, para sempre, na galeria dos grandes personagens do TEATRO BRASILEIRO e que se juntará a tantos outros já vividos pela grande Marieta Severo.  Nota máxima!  Aprovada com medalha de ouro (cacoete do professor).

 Marieta Severo - foto LL

FELIPE DE CAROLIS: Quando o vi, pela primeira vez, aos 19 anos, na pele do frágil, ingênuo, atormentado e humilhado Ernst, em O DESPERTAR DA PRIMAVERA, reconheci nele um talento que começava a brotar e que tinha tudo para crescer, desde que lhe dessem campo para isso.  Não foi preciso, pois ele mesmo o buscou.  Desde que travou conhecimento com Simon, seu personagem nesta peça, Felipe se apaixonou por ele, e por toda a história, e decidiu que teria de fazê-lo.  E não esperou que o convidassem; comprou os direitos da peça, em transação direta com os detentores dos direitos autorais, em Paris, e tratou de procurar parcerias para montar o espetáculo.  Quanta determinação e quanto talento!
É difícil, às vezes, estabelecer uma diferença entre protagonista e coadjuvante.  Na minha modesta visão, Nawal e os dois filhos gêmeos, Simon e Jeanne, formam o trio de protagonistas da trama.  Felipe, o nosso doce e querido Fil, no papel de Simon, demonstra um amadurecimento profissional impressionante, fruto de muito trabalho e dedicação; obstinação, mesmo.  Adormeceu o menino e nasceu o HOMEM.  Após seu trabalho em O DESPERTAR DA PRIMAVERA, pode-se dizer que INCÊNDIOS é um divisor de águas, o de maior relevância, em sua carreira, que ainda cheira a azedo de uma golfada de bebê, visto que, entre as duas, salvo melhor juízo, apenas teve uma atuação meio relâmpago, no elenco de BEATLES NUM CÉU DE DIAMANTES, no encerramento de uma longa carreira de sucesso, de cinco anos, daquele musical, merecidíssimo, diga-se passagem. 
Felipe e seu Simon sabem dosar momentos de maior intensidade com outros de menos exigência física e dramática.  É bela a sua figura em cena; é emocionante a sua atuação; é brilhante a sua trajetória, se levados em consideração alguns obstáculos, de ordem particular (saúde), que esse grande artista soube transpor, para chegar a um "incendiário".  Aprovado, com a nota máxima, em todas as disciplinas, e numa, em especial: a nossa grande amizade.
 
Felipe de Carolis (meu orgulho) - foto LL
 
KELI FREITAS: Uma agradabilíssima surpresa.  Conheço vários trabalhos dela, como atriz, no teatro, no cinema e na TV, e como assistente de direção, mas sempre a vi em trabalhos de menor expressão (não de menor importância), porém nunca envolvida num projeto do porte de INCÊNDIOS. 
Merece todo o respeito de quem conhece, de perto, as dificuldades para se fazer TEATRO no Brasil, ela que foi agregada ao elenco em pleno desenvolvimento do processo, há pouco mais de um mês antes da estreia, em substituição a outra atriz, que precisou abandonar o elenco.  Keli foi muito corajosa, ao aceitar o convite e o grande desafio de dar vida a Jeanne, papel muito difícil e igualmente importante no enredo. 
Ela dá um brilho especial à sua personagem, a gêmea de Simon, e representa um contraponto às atitudes e pensamentos mais radicais e extremos do irmão.  É ótima a química entre os dois jovens e talentosos atores, numa cumplicidade que nos encanta e que faz fortalecer, um no outro, a obrigação de fazer cumprir o desejo da mãe. 
Jeanne parece ver a atitude de Nawal (NÃO POSSO DIZER, PARA NÃO QUEBRAR O ENCANTO), como uma falta de alternativa e, talvez, por também ser mulher, sabe que, no fundo, seria capaz de fazer o mesmo. 
Linda presença em cena.  Preenche, plenamente, todo o espaço que lhe é conferido na trama.  Também aprovada, sem qualquer comentário negativo (antes, com todos os elogios), em todas as disciplinas.  Grande atriz da nova safra.

 Kely Freitas - foto LL

KELZY ECARD: Meu Deus!  Que atriz!  Como eu sou fã do trabalho dessa profissional!  Acompanho sua carreira, há muitos anos (acho que jamais deixei de ver um trabalho dela), e, a cada novo trabalho seu, digo a mim mesmo: FOI O MELHOR TRABALHO DELA ATÉ HOJE.  DIFÍCIL SE SUPERAR!  E não é que não aprendo?!  Vivo a queimar a língua, a cada novo personagem criado por Kelzy.  Quando o elenco de INCÊNDIOS estava sendo formado, e eu ia conhecendo, um a um, cada novo integrante, tão logo soube que ela havia sido convidada, pensei: LÁ VAI A KELZY ME FAZER QUEBRAR A CARA MAIS UMA VEZ.  Só que, desta vez, ela me quebrou por inteiro.  Sua Sawda é incrível, fantástica, digna de todos os elogios.  É forte, guerreira, amiga, um porto seguro para sua fiel confidente Nawal, embora tenha sido esta a responsável por seu crescimento como mulher, como ser humano. 
Kelzy é uma atriz de TEATRO.  Desconhecida do grande público, é, porém, unanimidade entre seus pares e os frequentadores dos teatros: uma atriz com “A maiúsculo”.  Investe todas as fichas em cada personagem ao qual dá vida e isso faz dela, sem a menor sombra de dúvidas, uma das melhores atrizes brasileiras.  Nem pensar em ficar em recuperação.  Passou direto, com prêmio de aluna modelo.

 Kelzy Ecard - foto LL

MÁRCIO VITO: Outro grande ator, que já carrega, em seu currículo, uma gama enorme de grandes papéis.  Muito oportuna a seu escalação para o elenco, e ele corresponde, plenamente, a todas as expectativas, no papel de Hermile Lebel, o tabelião, que tem uma tarefa muito importante na trama, a ser conferida por quem me honra com a leitura destes comentários.  Seu personagem, por meio de alguns vícios de linguagem ou repetições de frases feitas, confere, em determinadas cenas, um toque de leve humor ao denso texto, o que é muito bom, para evitar que haja algum mal súbito (acabo de revelar a minha idade) na plateia (só para descontrair um pouco).  Seu personagem ajuda no fio condutor da história e é, também, bastante importante na trama.  Márcio merece o mesmo destino dos demais alunos da classe: aprovação sem restrições. 

Márcio Vito - foto LL
 
ISAAC BERNAT: Admiro seu trabalho faz tempo.  Grande ator, de muitos recursos técnicos, e excelente diretor.  Por coincidência, no Teatro Poeirinha, o simpático lugar contíguo ao Poeira, está em cartaz um delicioso espetáculo sob sua direção: CALANGO DEU – OS CAUSOS DE DONA ZANINHA.  Isaac se desdobra, com perfeição, em sete personagens, sendo um deles o responsável pelo golpe que leva o espectador ao nocaute emocional, no quase fechar das cortinas.  Firme e competente, como sempre, em todos os personagens.  Nem pensar em recuperação.  Também passa direto.  Igualmente, com louvor.
 
Isaac Bernat - foto LL
 
FABIANNA DE MELLO E SOUZA: Excelente atriz, ótima em todos os cinco papéis que faz na peça.  Dona de uma personalidade forte, como atriz, e de uma comovente presença em cena.  Sua formação na área teatral extrapola o único ato de representar, o que lhe confere um jeito todo especial e ótimo de explorar seus personagens e o espaço cênico.  Também vai cursar a série subsequente, no próximo ano.
 
Fabiana de Mello e Souza - foto LL
 
JÚLIO MACHADO: Não conhecia o trabalho deste ator.  Era o único do elenco que se apresentava, para mim, como uma incógnita.  Um detalhe, porém, não me causava grande apreensão: Jamais Aderbal Freire-Filho convidaria, para o elenco de um espetáculo sob sua assinatura, alguém incapaz de mostrar serviço.  Mas faltava conferir.  Conferi.  Ótimo ator, perfeitamente entrosado com os companheiros de cena, dá conta, na medida exata, de cada um dos personagens que representa na trama.  Sabe fazer uso muito bem da expressão corporal e, por meio deste recurso, diz, por vezes, muito mais que o conteúdo significativo das palavras.  Agradou-me muito a sua atuação.  Quase ia esquecendo: Aprovado, sem qualquer recuperação.
 
 Júlio Machado - prazer em conhecê-lo - foto LL
DIREÇÃO: ADERBAL FREIRE-FILHO – Mais um desafio, cumprido, na carreira de um dos melhores diretores de TEATRO do Brasil.  Desafio diferente de tantos outros encarados por ele, como o de adaptar, para o teatro, obras narrativas de tanta beleza e complexidade, como O PÚLCARO BÚLGARO; MOBY DICK; SOROCO, SUA MÃE, SUA FILHA; ou de adaptar obras de outras mídias para o palco; ou de escrever para o TEATRO, como a recente, e fantástica, JACINTA, estrelada pela magnífica Andrea Beltrão, fechando temporada em São Paulo, depois de meses de sucesso no mesmo Teatro Poeira. 
Desta vez, Aderbal tinha em mãos uma peça; não, um belíssimo e complexo texto, com cenas as mais variadas possíveis, passados em diversos espaços, o que, numa versão cinematográfica (existe a do filme INCÊNDIOS), não e problema.  Difícil é fazer tudo isso acontecer num palco, sem intervalos de atos, sem “black-outs”, para as necessárias trocas de cenários.  Pois bem, ele conseguiu um excelente efeito, fazendo uso, unicamente de sua criatividade, imaginação, inteligência e profundo bom gosto estético. 
Na condução da forma de atuar e de construir os personagens, soube extrair de cada ator/atriz o máximo do rendimento técnico de cada um, com o grande mérito de não permitir (o que seria muito fácil acontecer) que algum deles atingisse o desagradável nível da pieguice.  Não há exageros nem carências de emoção em cada cena.  Lá está, firme, o dedo do competentíssimo Aderbal.

Aderbal Freire-Filho e Marieta Severo - foto LL
  
CENÁRIO (e OBJETOS DE CENA), de Fernando Mello da Costa - simples e suficiente.  Três paredões, de telas de arame, malha larga, sobrepostas, com portas laterais, que vão do chão ao teto.  Causam um sentimento meio claustrofóbico, para os que sofrem de tal mal, ou, no mínimo, provocam um inicial, e bendito, mal-estar aos espectadores, pois limitam, geográfica e propositadamente, o local em que se passam cenas nos mais diferentes espaços, inclusive externos.  Muito interessante.  No chão, à esquerda, uma bicicleta deitada, quase no proscênio, se é que se pode falar deste no Teatro Poeira. 
Pelas portas, elementos de cena, como mesas, cadeiras, baldes e outros são introduzidos e postos em seus devidos lugares, de acordo com a exigência de cada cena.  Tudo parcimoniosamente, apenas para sugerir espaços, o que se trona um excelente exercício de imaginação e criatividade para o espectador.  O mínimo possível de peças para o máximo possível de ação e emoção.  Recurso fantástico, mérito da ação conjunta de diretor e cenógrafo.
 
FIGURINOS: Antônio Medeiros, competente como sempre, um dos melhores profissionais do ramo, na TV e no teatro (vários trabalhos premiados e com alguns excelentes nos últimos anos), assina os figurinos.  São ótimos, funcionais e - um detalhe importante - parecem ser meio atemporais e não revelar, de forma muito explícita, detalhes do espaço geográfico em que se passa a trama.  Nota-se, perfeitamente, que a ação pode ser passada, em determinadas cenas, numa urbe qualquer e, na maioria das vezes, num interior, que, pode nos reportar a uma aldeia oriental, ou de algum país europeu, ou, até mesmo, a uma vila do interior brasileiro.  Não creio que eu tenha “viajado” muito nestes comentários, mas assim me pareceram os figurinos de Medeiros.  Compõem, na medida certa, todos os personagens.  Seja terno, seja um traje típico local, a elegância e a sobriedade são a tônica dos figurinos.
 
TRILHA SONORA: Tato Taborda – perfeita, para sublinhar as ações.

LUZ: Luiz Paulo Nenen – no tom exato do espetáculo.  Cresce e diminui, a cada exigência dramática.  Valoriza o que deve ser valorizado.  Excelente, como todos os seus trabalhos.

DIREÇÃO DE MOVIMENTO: Márcia Rubin – uma das mais requisitadas profissionais do ramo, nos últimos tempos.  Mais um excelente trabalho de Márcia.  Uma bela colaboração para a montagem.  Excelente simbiose entre ela e o diretor do espetáculo.

VISAGISMO: Lu de Morais – bom trabalho na composição dos diversos personagens.

DIREÇÃO DE PRODUÇÃO: Maria Siman (Primeira Página Produções: Luciano Marcelo, Paula Sales, Bruna Ayres, Joana D’aguiar)Maria Siman não poderia estar fora deste projeto.  O requinte e todos os cuidados nesta produção levam a marca da Primeira Página Produções.  Sem maiores comentários: Maria Siman é uma das maiores produtoras de TEATRO deste país.

 Maria Siman e Miguel Pinto Guimarães - foto LL
 
Em que pesem a grandeza do elenco, da maior qualidade, uma primorosa direção e todos os demais elementos de apoio para a montagem, a grande estrela deste espetáculo é o texto, de Wadji Mouawad, capaz de levar o espectador mais insensível ao auge da emoção.  Faz parte de uma quadrilogia do autor (LITORAL, anterior a INCÊNDIOS, e mais duas outras peças a serem escritas – ou já foram?), cujos direitos de encenação, no Brasil, (das outras três), segundo consta, já foram adquiridos por Aderbal Freire-Filho.  A ser verdade, tomara que o Teatro Poeira passe a ser a residência fixa, no Brasil, do consagrado dramaturgo libanês.  Seja bem-vindo, Wadji Mouawad!  E tomara que o Google Tradutor não me tenha traído nem me colocado numa saia justa:

نرحب Wadji معوض!

 

FICHA TÉCNICA:

Texto: Wajdi Mouawad

Tradução: Angela Leite Lopes

Direção: Aderbal Freire-Filho

Assistente de Direção: Fernando Philbert

Direção de Movimento: Márcia Rubin

Elenco: Marieta Severo, Felipe de Carolis, Keli Freitas, Márcio Vito, Kelzy Ecard, Fabianna de Mello e Souza, Júlio Machado e Isaac Bernat

Cenografia: Fernando Mello da Costa

Iluminação: Luiz Paulo Nenen

Figurinos: Antonio Medeiros

Trilha Sonora: Tato Taborda

Direção de Produção: Maria Siman

Produção Executiva: Luciano Marcelo

Produtores: Felipe de Carolis, Maria Siman e Marieta Severo

Produtor Associado: Pablo Sanábio

Idealização do Projeto: Felipe de Carolis

Realização: Emerge, Primeira Página Produções e Teatro Poeira
 



Aplausos e agradecimentos - foto DP

 
SERVIÇO:

Teatro Poeira: Rua São João Batista, 104 – Botafogo. Tel: 2537-8053

Temporada: de 20 de setembro a 22 de dezembro.  Quintas, sextas e sábados, às 21h. Domingos, às 19h

Ingressos a R$ 70,00 (qui) e R$ 90,00 (sex a dom)

Duração: 120 minutos

Classificação etária: 14 anos

Lotação: 120 lugares


FLAGRANTES DE ILUSTRES PRESENÇAS NA ESTREIA PARA CONVIDADOS:
 
Charles Fricks, Renata Mizhari, Rodrigo Pandolfo e Malu Rodrigues - foto MS
 
Andrea Beltrão, recuperando-se de um acidente em cena - relaxamento após a tensão do espetáculo - foto LL
 
Maria Siman e Renata Sorrah - foto LL
 
Relembrando O DESPERTAR DA PRIMAVERA: Letícia Colin, Felipe de Carolis e Mariah Viamonte - foto LL
 
Suzana Nascimento (CALANGO DEU, no Poeirinha) foto LL
 
Dudu Sandroni, preparando-se para voltar à cena, para a nossa alegria - foto LL
 
Rememorando belíssima cena de O DESPERTAR DA PRIMAVERA - Felipe de Carolis e Thiago Amaral - foto LL
 
Duas grandes gerações de atores: Gracindo Júnior e Felipe de Carolis - foto LL
Marieta Severo e Andrea Beltrão: mais que duas grandes atrizes, amigas e sócias - foto LL
 
Pablo Sanábio e Solange Badin - foto LL
 
Maria Siman, Maria Padilha e Ary Coslov
 
Letícia Isnard, com Luciano Marcelo e Isaac Bernat
 
Isaac Bernat e Maria Clara Gueiros
 
Andrea Beltrão, Fabianna de Mello e Souza e Débora Colker
 
Felipe de Carolis e Malu Valle - foto LL
 
Débora Bloch - foto LL
 
 Analu Prestes (ao centro) - amiga e velha companheira de Marieta Severo nos palcos - foto LL

terça-feira, 17 de setembro de 2013


O PRÍNCIPE   -  ESTÁ MAIS PARA “REI”

Cartaz/programa da peça
 
Há exatamente 500 anos, NICOLAU MAQUIAVEL, célebre político e filósofo do Renascimento italiano, escreveu sua obra máxima – O PRÍNCIPE.  Era o marco de fundação do pensamento e da política moderna.

Para comemorar esse quinto centenário de um dos mais importantes e emblemáticos livros da literatura universal, HENRIQUE GUIMARÃES, LEONA CAVALLI e ANA VITÓRIA VIEIRA MONTEIRO se uniram para dar forma à primeira adaptação de O PRÍNCIPE para os palcos, no Brasil, espetáculo em cartaz no Espaço SESC Copacabana (Sala Multiuso) às 6ªs e sábados, às 20h, e, aos domingos, às 18h, infelizmente apenas até o dia 29 deste mês (setembro).

Excelente a sinopse (ligeiramente adaptada) que está no programa da peça:

“O espetáculo (em forma de monólogo – grifo meu) traz Maquiavel, refletindo sobre os princípios que norteiam seu pragmatismo político, não idealista, mas realista.  Vê-se o personagem narrando histórias de grandes comandantes de períodos distintos da História (sob a forma de “conselhos” – outro grifo meu), como fonte de referência e indicação para os líderes imitarem os passos desses antigos príncipes.  Abre-se, desta maneira, uma provocação, para que a plateia se posicione diante dos controversos conceitos maquiavélicos.  A máxima de que os fins justificam os meios torna-se uma  pergunta que Maquiavel traz, para deixar o público  fazer o juízo final.  Provocando a plateia a testar seus limites morais e éticos, a montagem expõe o líder carismático  que era, no exercício retórico de sua argumentação estrategista.  Reconhecemos, nas falas do personagem, ecos das falas de políticos atuais.  Vemos o personagem elaborando o seu raciocínio de maneira muito franca e direta, diante do público, que participa como uma assembleia, a qual confere a oratória de um diplomata...” 

 
Henrique e Leona durante ensaio

Li a obra, no frescor da minha juventude, por volta dos 20 anos, na Faculdade de Letras.  Adorei o livro, mas, com a ainda pouca maturidade de então, não me foi possível captar o máximo do pensamento maquiavélico, muito menos poderia imaginar que tal obra teria sido escrita por um visionário, dentro de uma visão premonitória.  Maquiavel antecipou-se ao século XXI.  Foi por isso que, à medida que o texto saía da boca de Henrique, ou melhor, de Maquiavel, eu ia fazendo as associações com os príncipes do poder de hoje e não me furtava a deixar escapar pequenos sorrisos, que traduziam, mais ou menos, isto: “Já vi esse filme; era preto-e-branco e eu morria no final.  Não quero rever essa fita”.

Fui assistir ao espetáculo, sem muita boa expectativa, mais “para cumprir tabela”, uma vez que, além de respirar teatro, tenho de assistir a um número maior de espetáculos possível, em cartaz no Rio de Janeiro, por conta de  um compromisso.  Confesso que não esperava ver algo tão bom, um espetáculo que prima pela simplicidade, para atingir a magnitude de uma produção “classe A” (Ah!  Os rótulos...).

A adaptação para a linguagem dramática, feita a quatro mãos, por Ana Vitória Vieira Monteiro e o próprio ator, Henrique Guimarães, é excelente.  A narrativa flui muito bem e é de fácil assimilação pelo grande público.  Não deve ter sido fácil selecionar o que de mais relevante merecia ser dito no momento atual.

Com relação ao ator, HENRIQUE GUIMARÃES, que belíssima surpresa!  Fico muito feliz, quando conheço o trabalho de alguém novo no mercado, mas que parece já trazer uma grande bagagem profissional.  Esse é o Henrique.  Dono de uma bela figura e de excelente timbre de voz, além de uma perfeita dicção, ele tem um grande domínio de palco e ocupa todos os espaços exploráveis da cena com inteligência, maestria e uma flexibilidade, por meio de movimentos bruscos, oriundos da capoeira, que são invejáveis.  Aposto muito na carreira desse jovem ator paulista, há pouco tempo no Rio de Janeiro.  Que bom que veio!  Fique para sempre, pois quero vê-lo muito mais, atuando nos palcos cariocas.


Henrique Guimarães (guardem este nome) 

Outra gratíssima surpresa está na direção – a primeira – de LEONA CAVALLI.  Conheço o seu trabalho (muito bom) como atriz, nos palcos, já que não sou muito chegado à telinha, embora nada tenha contra os atores de novelas, mas nem sabia que ela era diretora.  Sim, ela é uma diretora de teatro.  E das boas.  Tomara que invista na carreira, sem abandonar a outra, é claro!

São satisfatórios todos os demais elementos da montagem, como luz (Ricardo Fujii), cenário (Leona Cavalli e Henrique Guimarães) e figurino (Mariana Baffa), entretanto, sem desmerecer qualquer um dos profissionais que atuaram em cada um desses setores, acho que só o ator e um espaço livre já seriam suficientes para o desenvolvimento dessa grande montagem, que adorei ver e que recomendo, enfaticamente, aos que gostam do bom teatro e por um preço inferior ao do cinema.

 
Leona Cavalli (diretora) e Henrique Guimarães (ator)
 
“Príncipe” creio ser pouco; este espetáculo está mais para “REI”!