terça-feira, 29 de abril de 2025

 

“VALSA Nº 6”

ou

(EXERCÍCIO AVANÇADO, 

DE VOZ E CORPO,

PARA UMA ATRIZ.)

ou

(DECIFRA-ME,

SE ÉS CAPAZ!)

 


         Quando gosto de um espetáculo, mas, por algum(ns) motivo(s) só posso assistir a ele no final da temporada, até mesmo no último dia, como é o caso da peça aqui comentada, assumo, comigo mesmo, o compromisso de escrever sobre a montagem, sempre na esperança de que ela possa voltar ao cartaz ou, somente, para fazer o registro do quanto ela me agradou. É o que estou fazendo com “VALSA Nº 6”, o único monólogo de NELSON RODRIGUES, escrito em 1951, a 10ª peça, de suas 17, a qual faz parte do seu grupo de obras denominado de “peças psicológicas”, ao lado de “A Mulher sem Pecado”; “Vestido de Noiva”, seu maior sucesso; “Viúva, porém Honesta” e “Anti-Nelson Rodrigues”.


 

 A peça não teve o alcance popular nem NELSON conseguiu sucesso financeiro, permanecendo “apenas” quatro meses em cartaz. Sabendo da duração da primeira temporada da peça e que ela não foi bem recebida pelo público, temos até vontade de rir, visto que conseguir uma pauta de 1 mês, atualmente, com 12 apresentações, depois de ter ensaiado por meses até, pode ser considerado um grande trabalho dos “Deuses do Teatro”.


 

  Apesar da reação negativa do público, VALSA Nº 6” foi considerada, pelos críticos, à época de seu lançamento, uma grande peça e vem sendo montada inúmeras vezes ao longo dos anos. Já assisti a umas três ou quatro diferentes produções desse texto e afirmo, peremptoriamente, que esta última, sob a direção de CLÁUDIO TORRES GONZAGA, interpretada por LUIZA THIRÉ é, de longe, a melhor montagem, das que conferi.



 

SINOPSE

Trata-se de um monólogo que tem, como personagem, a solitária Sônia, uma menina assassinada aos quinze anos de idade, a qual luta contra si mesma, para, entre um delírio e outro, conseguir montar o quebra-cabeça de suas memórias.

Uma menina, que foi assassinada aos quinze anos, tenta, em um monólogo de sessenta minutos, lembrar-se de tudo o que lhe aconteceu, antes de ter sido apunhalada pelas costas por alguém que lhe pedia que tocasse, ao piano, a Valsa Número 6, de Chopin.


 




  Não sendo eu, sabidamente, “tiete” do dramaturgo, não me agrada o texto, embora eu reconheça nele um magnífico exercício para uma atriz provar que “tem garrafas vazias para vender” (Entreguei a idade. Nem sei se o Tio GOOGLE responde a esta. Momento descontração.) Pela SINOPSE supra, parece ser bem simples entender a narrativa, entretanto acredito que esteja aí o maior motivo de não ter agradado aos espectadores. O estado de desequilíbrio emocional da personagem pode levar, facilmente, quem assiste à peça a se embrenhar nos labirintos da memória da protagonista, não conseguindo acompanhar suas “viagens”. No meu caso, especialmente, acrescento que tenho plena certeza de que a estupenda qualidade do trabalho da atriz me levou a me fixar na sua interpretação, pouco me importando o texto.


 

  A presente montagem é das coisas mais lindas e expressivas a que venho assistindo nos últimos tempos. Apesar de ser uma produção mais para o simples, ela reúne alguns elementos que, facilmente, podem ser indicados a prêmios, caso os seus respectivos jurados tenham se dignado a assistir à peça. No caso, eu indicaria o fabuloso trabalho de direção, de CLÁUDIO TORRES GONZAGA, o de interpretação, de LUISA THIRÉ e uma indicação especial, que abrangesse cenografia e figurino.


 

Numa pesquisa que realizei, descobri que o autor do texto decidiu fazer uma peça barata e, ao mesmo tempo, atrativa, para a estreia de Dulce Rodrigues, a sua irmã caçula, como atriz. A essa, eu não assisti, por ter apenas 2 anos de idade, à época.


 

  A ideia de montar este espetáculo surgiu da vontade de LUISA de interpretar um monólogo e uma personagem de NELSON. Estava resolvida a questão. Aproveitando-se do fato de que, em 2012, se comemorava o centenário de nascimento do dramaturgo, a atriz, idealizadora do projeto, cercou-se de grande profissionais e ergueu o espetáculo, que já ganhou vários prêmios, fez muitas temporadas no Brasil e até no exterior: Cabo Verde, Lisboa, Porto e Madri. Assisti a ele em 2012, quando ainda não existia este blogue, que só ganhou vida no ano seguinte; não escrevi, portanto, sobre a peça naquele ano e o faço agora com o maior prazer.



 

            O texto, de propósito, quero crer, é uma grande incógnita. É a narrativa de uma memória em que tempo e espaço se deslocam, constantemente, para se contar a angústia de uma garota de quinze anos”, a qual recorre a obscuras lembranças, sem ter certeza delas. Até sua morte se dá por um suposto assassinato. Teria ou não acontecido? “Na busca incessante por saber quem é e onde está, a personagem dá vida e voz a outras figuras que formam o universo do seu subconsciente: os pais, o médico da família, as criadas da casa, o homem por quem é apaixonada e as comadres da vizinhança”.


 

           Que o TEATRO é a arte do coletivo, todos sabemos, mas cada artista que entra num projeto teatral pode, mas não deve, executar a sua parte, sem dividir com os colegas sua experiência, entretanto o melhor é que todos os elementos de criação vão surgindo dentro de uma sala de ensaio, os artistas trabalhando em uníssono. Assistindo a esta peça, temos a certeza de que ela foi erguida com os tijolinhos de todos e, simultaneamente. Penso que muito, ou tudo, da esplêndida direção de TORRES se fez em cima de dois elementos, que, aqui, se fundem num só, como uma instalação. Falo da estupenda cenografia, de SÉRGIO MARIMBA, e do fantástico figurino, de TEKA FICHINSKI. Acrescente-se a esses dois elementos a divina iluminação, assinada por LUIZ PAULO NENÉN. Ainda sobra espaço para que sejam lembradas a ótima trilha sonora (TOMAS GONZAGA) e o criativo trabalho de direção de movimento (KIKA FREIRE).



 

          Já vi e aplaudi LUISA THIRÉ em inúmeros trabalhos, contudo é neste que lhe reconheço mais o talento, “de família”, correndo naquelas veias artísticas. São quatro gerações de excelentes atores e atrizes, começando por Dona Tônia Carrero, avó de LUISA, e terminando, até agora, em Vitor Thiré, seu filho. A atriz explora, ao maior limite, seu potencial de voz, de máscaras faciais e domínio do corpo, numa inesquecível composição de personagens.



 

FICHA TÉCNICA:

Idealização: Luisa Thiré

Texto: Nelson Rodrigues

Direção: Cláudio Torres Gonzaga

Assistência de Direção: Diogo Villa Maior

 

Interpretação: Luisa Thiré

 

Cenário: Sérgio Marimba

Figurino: Teca Fichinski

Iluminação: Luiz Paulo Nenén

Trilha Sonora: Tomas Gonzaga

Direção de Movimento: Kika Freire

Programação Visual e Fotos: Victor Hugo Cecatto

Assistência de Produção: Gabriela Kujawski

Produção e Realização: Luisa Thiré


 

 



         “VALSA Nº 6” é daqueles espetáculos que merecem ser vistos mais de uma vez, para que se possa aplaudir bastante o diálogo direção/interpretação.

 

 

 

 

FOTOS: VICTOR HUGO CACATTO

 

 

É preciso ir ao TEATRO, ocupar todas as salas de espetáculo, visto que a arte educa e constrói, sempre; e salva. Faz-se necessário resistir sempre mais. Compartilhem esta crítica, para que, juntos, possamos divulgar o que há de melhor no TEATRO brasileiro! 








































Um comentário: