quarta-feira, 6 de outubro de 2021

“AS MENINAS VELHAS”

ou

“VELHO É O

TEU PASASADO!”

ou

(UM PACTO DE

AMIZADE ETERNA.)




 


        Já repeti, nas minhas críticas, algumas vezes, os versos do poeta (compositor) Billy Blanco: “O que dá pra rir dá pra chorar, / Questão só de peso e medida.”. Ao escrever, já há algum tempo, a peça “AS MENINAS VELHAS”, CLAUDIO TOVAR, cujo nome dispensa apresentações, parece, mesmo que inconscientemente, estar pondo em prática, em seu texto, o pensamento de Billy, uma vez que, embora apresentada como uma COMÉDIA, gênero do qual gosto imensamente e sempre procuro escrever com todas as maiúsculas, quando bem escrita, escola que jamais considerei uma “arte menor”, também apresenta breves momentos de uma certa seriedade. Quando estamos rindo de uma fala, já na expectativa da próxima risada, o dramaturgo nos apresenta algo sério, que nos toca, provoca uma reflexão, que nos abre a memória para fatos e pessoas que muito representam, ou representaram, em nossas vidas. Duvido de que algum espectador não se lembre, em algum momento, de, pelo menos, uma das “velhas” com a qual cruzou, em sua vida, ainda que não possam elas ser “meninas”!



        Quem tem medo da velhice? Não vou apresentar estatísticas, porque não as tenho, mas sabemos – cada um de nós sabe onde o sapato nos aperta – que é a maioria dos habitantes de um planeta, REDONDO, chamado Terra. A grande maioria das pessoas, creio eu, teme o fim da vida, o murchar da flor. Vejam bem: refiro-me à “velhice”, não à “morte”. São dois “departamentos” diferentes. Esta não me interessa tanto, neste momento. O que me congestiona a mente, o que me povoa a cabeça de inspiração, para escrever sobre uma montagem de TEATRO, agora, é a “velhice”, tema principal da peça em tela. Na verdade, é o “saber envelhecer” ou, como dizia o poeta Carlos Drummond de Andrade, “saber outornizar-se com dignidade”.



    O grande problema não é ela, a “velhice”, mas todos os contratempos, todas as dificuldades, todas as limitações, todos os arrependimentos e muitas outras coisas que ela carrega consigo e que, na grande maioria das vezes, incomodam muito qualquer pessoa e, em alguns casos, chegam a “transformar alguém em algo”, um ser humano achando que já não vale mais a pena viver, que ficou órfão do respeito e da consideração de outros semelhantes, principalmente os mais jovens.



        É, exatamente, isso que o texto de TOVAR, encenado, no palco do Teatro Prudential, no Rio de Janeiro, procura neutralizar, com uma mensagem linda, de esperança e fé - utópica, talvez, mas ainda não se paga para sonhar. Dirão alguns que estou me comportando “polyyannescamente” (Adoro criar neologismos, herança de minhas intermináveis, constantes e deliciosas leituras de João Guimarães Rosa (VIVA Rosa!), sem a menor pretensão, é claro, de chegar à unha de seu dedo mínimo do pé esquerdo.), o que não representa nenhum problema para mim. Ai de cada um de nós, se não tivéssemos uma porção Polyyanna, reservada, lá no fundo, para não chegarmos ao desespero, às vezes! Não vou dizer que não tenho medo da velhice, até porque já sou um velho, ou melhor, um idoso, de 72 anos, sem o viço físico da juventude, mas procurando ser cada vez mais jovem. por dentro, alterando a ordem dos algarismos para 27, com relação ao meu comportamento, até onde me permitem as minhas condições atuais. Não me sinto um “velho”, como na acepção geral das pessoas, aquele estereótipo, representado, nas placas de identificação, em banheiros, transportes públicos ou outros quaisquer lugares, pelo desenho de um homem curvado, apoiado a uma bengala. Estou utilizando, vez por outra, uma, por conta de sequelas, "herança" de três cirurgias, uma no fêmur e duas na coluna vertebral. Não sou de ferro. Não fosse isso, não a usaria. Vale a pena dizer que está em curso um projeto, para que tal ícone seja modificado, por pressão de vários idosos, o que pouco me importa ou incomoda.



        Pensei muito se deveria fazê-lo, relutei bastante, mas não posso deixar de recomendar, a todos, jovens e velhos, que leiam uma OBRA-PRIMA, em forma de crônica, do grande Drummond (VIVA Carlos Drummond de Andrade!!!): “Fala, Amendoeira!”, uma aula de resignação e de aprendizado, quanto a saber envelhecer e, mais ainda, ser feliz na velhice. É sério mesmo: TODOS DEVERIAM LER, E ENTENDER, ESSA CRÔNICA. E já que estamos no momento “recomendações”, atrelo, à sua leitura, o convite para que ouçam a canção “Moço Velho”, que o poeta, compositor e cantor Sílvio César imortalizou, numa belíssima interpretação de Roberto Carlos (Estou ouvindo-a agora, arrepiado, dos pés à cabeça.).



      “AS MENINAS VELHAS” é uma peça que conta com a direção de TADEU AGUIAR, trazendo as atrizes LUCINHA LINS, BARBARA BRUNO, NADIA NARDINI e DIVINA VALÉRIA, contando a história de quatro mulheres sessentonas, de espírito libertário, seus desejos, projetos e a amizade de uma vida inteira. Querem ideia melhor que essa?



        Com cerca de dez minutos, após a abertura da cortina, pensei, cá com os meus zíperes (A gente procura ser moderno, até nos ditos populares.), que fora convidado, pela querida STELLA STEPHANY, assessora de imprensa da peça, e pelo queridíssimo amigo CLAUDIO TOVAR, um multiartista que muito admiro, de priscas eras (“priscas eras” – Viram como entrego a idade?), só para me divertir e rir bastante. Isso aconteceu? Sim! Mas não foi só isso que me fez aplaudir, de pé, na primeira fila, a montagem.



     O título da peça traduz tudo o que as quatro personagens procuram passar ao público e contém duas palavras que se distanciam, no significado, representadas pela junção de um substantivo, “MENINAS”, e um adjetivo, “VELHAS”. Eles se referem às personagens por dois vieses: o adjetivo se reporta à condição física delas, às marcas indeléveis que o tempo, implacável, estampou em seus rostos e corpos; o substantivo, de certa forma com um cunho de adjetivo, faz referência ao frescor de seus interiores, à cabeça das quatro protagonistas, ao seu modo de pensar.


 

A meu juízo, ser jovem, hoje, tem muito mais vantagens sobre a minha época de juventude, embora, além dos bônus, haja, também, os ônus. Por outro lado, também sou obrigado a reconhecer que ser velho, nos dias atuais, apesar de muitos inevitáveis preconceitos e da falta, ainda, de um respeito e reconhecimento, por parte de muitos, principalmente dos governos, nas três esferas, é algo que está anos-luz à frente do que era a velhice, na minha infância, quando eu, ao ouvir falar que alguém estava completando cinquenta anos, por exemplo – não precisava mais que isso -, me perguntava como aquela pessoa pôde ter chegado a tal longevidade, achando o fato um prodígio, e que eu não chegaria a tanto. Aquilo era “ser velho”, o que, para mim, soava como algo muito negativo. Penso muito diferente hoje. Ledo engano! (Outra vez, deixei escapar os meus 72, num “corpicho” de 71, com uma cabeça de... Deixa isso para lá! Eu próprio faço a minha cabeça.).  



Apelando para o “release” da peça, “o que faz, hoje, pessoas, na faixa dos sessenta anos em diante, permanecerem com uma cabeça jovem e disposição física, capaz de acompanhar qualquer pessoa de vinte? O que faz essas pessoas, como falou Aldir Blanc (SALVE O GRANDE POETA!!! MIL VEZES, SALVE!!! – adendo meu), na sua música “Cinquenta anos”, insistirem na juventude? O que faz a velhice não chegar, apesar de os cabelos embranquecerem e a pele mostrar sinais da passagem do tempo? Será que, para essas pessoas, ele, o Tempo, não conta mais? Que magia é essa que acontece com os nossos “idosos”?”. 



As respostas para tais questionamentos podem ser encontradas em “AS MENINAS VELHAS”. E é muito fácil responder a elas e entender as respostas. 

“A peça trata dos “novos 60”, ou seja, da nova forma de viver a fase madura da vida – com produtividade, alegria, desejos e projetos a realizar.” E, muito curiosamente, “Não à toa que o autor, o diretor e as quatro atrizes têm mais de 60 anos e são donos, felizes, do ‘lugar de fala’ nessa narrativa.”. 




O que constatamos, hoje, sem muito esforço, é que estamos diante de um novo conceito de “velhice”, graças às descobertas da Ciência (VIVA A CIÊNCIA E OS CIENTISTAS!!!), aos avanços da medicina, a um incentivo da mídia, visando a novos consumidores e, principalmente, à conscientização, que parte da própria pessoa idosa, de que ela é capaz, se não de tudo, pelo menos, de muito mais do que achava que poderia ser e fazer. As academias de ginástica estão cheias de idosos, ávidos, não para se mostrarem “atletas” ou “gostosas”, de manter sua saúde em dia.



 Já de algum tempo – e isso só faz avançar, graças a Deus – “percebemos o nascimento de uma nova velhice, mais conectada aos desejos e repleta de opções e novos usos do tempo. Gente que chegou a uma idade madura mais feliz que a de seus pais, muitos ainda fechados em suas casas e aposentados de suas alegrias. O ‘velho’ de hoje é o resultado de uma vida plena, ativa e feita de escolhas, por isso mais feliz – por vezes, desfrutando de mais tempo livre, ‘filhos criados’ e liberdade para viver a vida da forma que considerar satisfatória. (É assim que me sinto: PLENO. Meu mantra é “CARPE DIEM!”) O ‘velho’ de hoje surfa com o neto, malha, namora e navega na rede. Faz planos, tem amigos e, apesar – e até por isso – de o tempo de vida à frente ser menor do que o tempo para trás, vive intensamente e persegue novos sonhos e desejos. (Continuo me identificando. Em quase tudo). Fiz questão de “roubar”, do “release”, essa parte, porque a considero extremamente interessante e verdadeira. No fundo, no fundo, a proposta maior do espetáculo é “uma abordagem do ‘amadurecer’ de forma leve e muito divertida”, mas também é importante realçar a valorização das verdadeiras amizades, até um reencontro num outro plano. 



Não poderia deixar de dizer que, pelo fato de se propor a escrever uma COMÉDIA, TOVAR abusou, um pouco, das tintas, em certos detalhes, creio eu que, muito intencionalmente, com o desejo de exagerar; de propósito, repito, para nos mostrar uma realidade de hoje, porém, de certa forma, meio "bizarra". Assim, ele nos apresenta as quatro “velhas” fumando maconha e tomando chá alucinógeno, de cogumelos: um toque de total inverossimilhança, para nos fazer rir. E o consegue; muito.   

De um certo tempo para cá, começou-se a tratar esse nicho da sociedade como as pessoas da “terceira idade”, o que desagradava a muita gente. Para que não soasse como “pejorativo”, para que ninguém se ofendesse, inventaram a tal da “melhor idade”. “A emenda saiu pior que o soneto”. Não há melhor ou pior idade; há idades, para serem, todas elas, vividas em todo o seu esplendor, como vigor e alegria. 



Na peça, as atrizes iniciam a ação na casa dos sessenta anos e vão envelhecendo, aos poucos, juntas, sempre fazendo planos e não deixando que uma ou outra esmoreça. Elas discutem, há muitas picuinhas em jogo, mas sempre uma delas propõe um novo plano, uma nova ideia, que serve como uma mola propulsora, para novos voos, novas aventuras; uma forma de esticar a vida. Em nada, a não ser fisicamente, lembram os velhos de antigamente; no caso, as "velhas". Uma correção: o figurino as faz destoar da imagem das senhoras idosas do meu tempo. Mas, sobre esse lindo e importante elemento de uma montagem teatral, falarei adiante.



 

 

SINOPSE:

 

CORINA (NADIA NARDINI), ZULEIKA (LUCINHA LINS), NORMA (BARBARA BRUNO) e EDITH (DIVINA VALERIA) são quatro amigas da vida inteira, que se encontram, todos os dias, na casa de uma ou de outra, ou no banco da praça vizinha.  

 

Dependendo do dia, há jogatina ou lanche coletivo. Geralmente, as quatro alternam humores, prevalecendo, porém, uma invejável alegria de viver, e estão, sempre, cheias de planos para o futuro; até comemorações de aniversários acontecem.

 

Nesses encontros, as “meninas”, na faixa dos sessenta anos, discutem a vida e compartilham alegrias e tristezas, e os problemas são resolvidos da melhor maneira possível, juntas. Falam sobre nascimentos e mortes, casamentos, separações, problemas de moradia, doenças, coisas do dia a dia...

 

Como as estações do ano, a existência das quatro amigas vai se modificando, conforme o tempo vai passando, e se transformando, até que chegam ao momento final da vida, e o ciclo das estações se fecha (Não deixem de ler - INSISTO - a já citada e recomendada crônica de Carlos Drummond de Andrade: “Fala, Amendoeira!”. As quatro amigas estão vivendo o seu outono, até a chegada do inverno.).

 

Mas, para elas, tudo é transitório, uma transformação para outro estágio, onde continuarão sua jornada.

 

 



O texto, de CLAUDIO TOVAR, parece, a princípio, “bobinho”, despretensioso – não vou negar -, não muito importante, feito, apenas, para divertir (Se fosse só essa a intenção, já seria grande valor e teria valido a pena o deslocamento, de cerca de trinta quilômetros, de casa até o Teatro.), contudo, apesar de as teclas de seu computador se voltarem mais para o humor, cáustico, em muitas das vezes, também abrem espaço para frases que nos levam a pensar na profundeza que a combinação de suas palavras nos faz atingir, uma vez que tocam no nosso coração. É a parte séria do texto, dita, muitas vezes, de forma engraçada, como piadas. As personagens riem de si próprias, de suas mazelas, de suas loucuras, de suas inconsequências, antes que o façam por elas.







Exemplos disso? Vários. EDITH (Para ZULEIKA, que se considerava uma grande atriz, com um figurino da personagem Julieta, de Shakespeare, uma adolescente: Outra coisa, ZULEIKA: você está ridícula, com esse figurino de Julieta. Esse papel não é mais para você há muito tempo.





E ZULEIKA, defendendo-se: Minha querida, as atrizes não têm idade e eu sou uma atriz! Posso fazer Ofélia ou Lady MacBeth, qualquer papel e convencer um teatro inteiro. Uma questão de talento. Portanto, amanhã eu brigo com você, EDITH; hoje não! Hoje, eu estou alegre, feliz, maravilhosa e linda, como sempre! Amanhã, eu me aborreço; hoje não!

E quando ZULEIKA conta às amigas que encontrou um antigo amor?  ZULEIKA: (choramingando) Ah! Gente, vocês não sabem de nada... (...) Levei um susto. Era ele mesmo. Juro, achei ele lindo, do mesmo jeito. Evidente que ele está mais velho. Mas, pra mim, está igual. Minhas pernas tremeram, e não foi por causa de Parkinson, não; foi de emoção. Ele deve ter me achado mais velha também, claro, mas me olhou de um jeito... Ah! Gente, se aquilo nos olhos dele não era tesão, amor, o que era?



     Agora, me digam se não é para gargalhar muito, quando NORMA interroga a amiga, querendo saber detalhes sobre o “grande achado”, o “pretendente”? NORMA: Mas como é o nome dele? O que faz? Mora onde? Quais são os remédios que ele toma? Alguma doença grave: arteriosclerose, Alzeheimer, Parkinson? Alguma operação? Infarto? Quantos “stents”?

O texto é uma delícia, daqueles que prendem o espectador durante todo o espetáculo, sem “barrigas”, e é valorizado pelas ótimas interpretações do quarteto de grandes atrizes. Além de assinar a dramaturgia da peça, CLAUDIO TOVAR também atua em outras posições, neste jogo, as quais serão apreciadas adiante. 



  O que se pode dizer de um elenco que reúne quatro grandes atrizes, com uma bagagem e um currículo invejáveis? Apenas isto: que todas mostram a que foram, quando subiram naquele palco. Quando penso em destacar o trabalho de alguma delas, percebo que todas têm as suas cenas, seus momentos de maior brilho. Assim, a partida termina empatada, mas não por 0 X 0, e sim por um festival de gols.

 Para não ferir suscetibilidades e considerando que o protagonismo foi dividido em quatro quartos, farei uso da ordem alfabética, iniciando os trabalhos por BARBARA BRUNO, que traz consigo um DNA “poderoso”, não fosse ela filha de nada menos que Paulo Goulart e Nicete Bruno, com dezenas de grandes sucessos, como atriz, diretora e produtora. BARBARA interpreta a personagem NORMA, que nos causa a impressão de ser a mais “descolada” de todas, talvez por não conseguir domar sua língua e viver, despudoradamente, a dizer palavrões, à la Dercy Gonçalves. (VIVA DONA DERCY!!!) Houve um momento em que cheguei até a achar que se tratava de uma proposital e merecida homenagem à grande e inesquecível Dercy. BÁRBARA / NORMA, essa entidade, é hilária naquilo que diz e que faz. Para mim, sempre foi, é e continuará sendo um grande privilégio e um imenso prazer assistir a algum trabalho em que o nome de BARBARA BRUNO esteja presente na ficha técnica.



Na sequência, vem DIVINA VALÉRIA, meio afastada da função de atriz, nos palcos brasileiros, pelo fato de, também como cantora, vir dedicando boa parte de seu tempo a tal atividade artística e por se apresentar em dezenas de outros países. Com quase seis décadas de carreira, uma vez que estreou aos 18 anos, considero-a uma ótima “performer” e, se não estou equivocado, pelo que já me penitencio, caso esteja, quando, ainda adolescente, tomei conhecimento dela, como artista, assinava apenas VALÉRIA, a cujo nome foi incorporado o DIVINA, muito bem justificado. DIVINA VAÉRIA faz parte da primeira geração de artistas “trans” do Brasil, ao lado das inesquecíveis e talentosas Rogéria, Jane de Castro (já falecidas), Eloína e de outros nomes, ícones, como artistas LGBTQI+, tendo merecido a honra de ter sido pintada por Di Cavalcanti. Recentemente, durante a pandemia, apresentou, no formato “on-line”, um recital, acompanhada, apenas, por um pianista, cujo “set list” era composto, na sua grande maioria, por canções “de fossa”, dos grandes compositores brasileiros. Assisti e gostei muito. Na peça, ela é EDITH, a mais “sofisticada e afetada” das quatro, eu diria, muito bem resolvida na personagem.



 NADIA NARDINI é o próximo nome do elenco a ser enfocado. Artista bastante premiada, como atriz, bailarina, diretora e coreógrafa, iniciou-se, nas atividades artísticas, na mais tenra idade, aos quatro anos, na dança. Por ter tido grandes mestres, como Enid Sauer, Vilma Vernon, Marly Tavares, Lennie Dale, Jojo Smith, Ron Forella, Luigi e Priscila Teixeira, todos do maior conceito na dança, e por seu inquestionável talento próprio, desenvolveu uma bela carreira, no Brasil e no exterior. Paralelamente à dança, investiu na atividade de atriz, voltando-se, principalmente, para os musicais, tendo sido lapidada por grandes nomes do TEATRO, como José Wilker, Tania Nardini (sua irmã) e Luiz Fernando Lobo (interpretação), e Agnes Moço, Leo Wagner, Pepe Castro Neves, Beto Serrador e Jorge Maya, na parte concernente à voz e ao canto. Em “AS VELHAS MENINAS”, coube-lhe a personagem CORINA, a falsa pudica, “super religiosa”, que se enrubesce, com os palavrões de NORMA, que vive recriminando as outras, apontando-lhes o dedo, esquecendo-se de que, enquanto as acusa, três outros se voltam para ela mesma. Também faz parte da “panela” e nos brinda com ótimos momentos que podem ser considerados solo. Um detalhe que arranca muitos risos da plateia é o fato de, a cada nova entrada em cena, a personagem se apresentar, sempre, com alguma lesão física, por conta de suas trapalhadas: ora uma perna quebrada, apoiada numa bengala; ora um braço deslocado, numa tipoia...



 Chegou a vez de concluir estes comentários, sobre as atrizes, falando de LUCINHA LINS, “last, but not least”. Às vezes, fico me perguntando como uma lindíssima mocinha, que iniciou sua carreira, bem jovenzinha, gravando centenas de “jingles”, para o rádio, por conta de sua belíssima e afinadíssima voz, e fazendo comerciais para a TV, no que lhe favoreciam a beleza invejável e a extrema simpatia, pôde ter-se tornado uma excelente atriz? A resposta vem logo, na ponta da língua: à custa de muito estudo, dedicação e profissionalismo. Essa é LUCINHA LINS, que, antes de se tornar minha amiga (Isso não interfere, em nada, nesta minha apreciação crítica.), eu aplaudi, muito, no “MPB SHELL”, de 1981, no Maracanãzinho (Que saudade dos festivais de música!), com a linda canção “Purpurina”, composta por Jerônimo Jardim, que ela cantou sob a mais violenta vaia, quando voltou, como vencedora, (E eu quase apanhei, por fazer parte da meia dúzia dos que a aplaudiam efusivamente – a massa exigia o prêmio maior para “Planeta Água”, uma, também, bela canção, de Guilherme Arantes. Risos.), ocasião em que, também, ganhou o prêmio de Melhor Intérprete. Como atriz, eu a conheci, por intermédio do filho, CLAUDIO LINS. Era ela, ainda, incipiente e um pouco insipiente no palco, entretanto, logo, começou a mostrar serviço, destacando-se no TEATRO, no cinema e na TV, tendo conquistado alguns prêmios. Se, quando LUCINHA era jovem, houvesse a profusão de musicais que vêm sendo montados, a partir dos últimos vinte e poucos anos, no Brasil, certamente, ela seria presença obrigatória neles, porque é uma atriz de TEATRO – para dramas ou comédias -, porém tem que ser considerada uma grande cantriz (atriz de musicais). Sua ZULEIKA, na peça, é uma personagem linda, também, por dentro. Desliza, quase flutuando, pelo palco, suave, meio etérea, ela que se julgava a melhor das atrizes, fato que gera dois dos momentos mais lindos e emocionantes da montagem.



O primeiro é quando, TOVAR resolve fazer uma homenagem à grande diva Bibi Ferreira, utilizando-se da personagem de LUCINHA. Ela, num dos seus momentos de devaneio, a caminho da demência ou da loucura, assim se manifesta: 

ZULEIKA: Eu vou fazer a Bibi!

EDITH: Zuleika! Que idéia... Mas, olha, eu acho que a Bibi é uma personagem muito complexa... Muito cheia de nuances... Sei lá...

ZULEIKA: Sei tudo sobre Bibi. Acompanho Bibi Ferreira, desde “My Fair Lady”. Depois, “Hello Dolly”, “Gota d’Água”, “O Homem de La Mancha”, “Piaf”. Meninas, eu posso afirmar que, na ausência de Bibi Ferreira, eu sou Bibi Ferreira! Portanto, não vou nem fazer testes...

EDITH: Tipo da personagem que Marília Pêra adoraria pegar... (VIVA MARÍLIA!!! – adendo meu.)

ZULEIKA: Sim, eu sei. Mas é minha, essa personagem é minha! Quem, para interpretar uma grande atriz, se não outra grande atriz? Finalmente, o papel que esperei a vida inteira! Meu Deus, como não pensei nisso antes?

        (Rubrica do dramaturgo: ENTRA A MÚSICA E A VOZ DE BIBI FERREIRA, CANTANDO “I COULD HAVE DANCED ALL NIGHT”. ZULEIKA FAZ (dublando/cantado sobreposta à voz de BIBI) O NÚMERO EM QUE ELISA DOOLITLE VAI DORMIR, ENQUANTO AS AMIGAS, FAZENDO O PAPEL DAS CRIADAS, VÃO SAINDO DE CENA.) 



        O outro grande momento de emoção, muito mais para a classe artística, é quando EDITH, não conseguindo mais cuidar de ZULEIKA, que, àquela altura. já atingira um alto grau de demência, mal de Alzeheimer, ou algo do gênero, consegue, para a amiga, uma vaga no Retiro dos Artistas. Para mim, será, sempre, RETIRO DOS ARTISTAS.). Só quem, como eu, graças a Deus, conhece aquele lugar pode avaliar a sua importância, no amparo aos que já não brilham mais, sob os refletores, e não têm condições de sustento, sem a ajuda daquela instituição filantrópica, que vive de doações de terceiros. (VAMOS VISITAR O RETIRO DOS ARTISTAS, QUANDO ACABAR A PANDEMIA, MINHA GENTE!!! E, MESMO AGORA, VAMOS FAZER NOSSAS DOAÇÕES PARA ELES!!!).  



        As amigas não sabem como dar a notícia a ZULEIKA, mas conseguem fazê-lo, descrevendo, para ela, as maravilhas do lugar – TUDO VERDADEIRO - e despertar nela o interesse em ir se juntar a outros colegas de classe, “aposentados”.

EDITH: Foi tudo ótimo, existe uma vaga, sim, uma casinha só para ela. Acho que podemos preparar a mudança para a próxima semana. Ah! NORMA, estou me sentindo péssima, colocar a ZULEIKA no “Retiro dos Artistas”...

NORMA: Mas o que tem de mais? É o que a gente pode fazer, EDITH. Eu já estou segurando a CORINA, sozinha; todas as despesas, remédios, médicos... Eu só tenho o dinheiro da aposentadoria do INSS, que, você sabe, é aquela merda. E ela está cada dia pior. (...) 

EDITH: (...) Que coisa, NORMA! Ainda bem que a gente era um pouco mais careta que elas, porque sobrou pra nós, minha amiga. Você ficou com a CORINA e eu, com a ZULEIKA. Que também está doidinha! Agora, fala textos de peças, o dia inteiro, inventa figurinos, maquiagens... Voltou a ser a grande atriz que nunca foi.

(...) 

EDITH: Bom, está tudo certo, nós podemos fazer a mudança quando quisermos. O negócio é falar com ela... Será que ela vai aceitar?

NORMA: EDITH, ela vai ter que aceitar! Tem alguma outra solução? Ela vai ser feliz, tem tanta gente da idade dela... Artistas. Vai falar de teatro, representar, sei lá... 

EDITH: Além disso, ela não tem mais muita noção de onde está. Tanto faz Copacabana, o Retiro dos Artistas ou o Palácio de Buckinghan.

(...) 

EDITH (para ZULEIKA): Isso, deite-se! Coloque a cabeça na minha perna! Feche os olhos! Descanse! ZULEIKA, eu fui lá.

ZULEIKA: É bom... Lá? 

EDITH: Muito! Um jardim enorme na frente, muitas mangueiras... As casinhas são lindas, muitos artistas, gente conhecida... E o melhor você não sabe: Um teatro! 

ZULEIKA: Tem um teatro lá, não tem? Vou fazer uma peça, um musical. Vou ouriçar aquela porra daquele lugar!

NORMA: Ih! Tem gente à beça, fazendo teatro lá, você vai adorar! 

ZULEIKA: (inventando, na hora) Um musical... baseado na vida da Bibi Ferreira.

NORMA: Mentira!

ZULEIKA: Você sabia que eu tenho um timbre parecidíssimo com o da Bibi? 

EDITH: Que engraçado! Nunca reparei... 

ZULEIKA: Canto no mesmo tom, inclusive. 

EDITH: Que é um tom dificílimo. 

ZULEIKA: Você acha que eu não poderia fazer? 

EDITH: O quê? A peça? Não sei, acho que não. Dirigir também? 

ZULEIKA: Mas eu sei! Como não sei?!

E eu chorei...



        E passemos a falar da boa direção, de TADEU AGUIAR, que, além de um ótimo ator, vem, ultimamente, se dedicando mais às direções, tendo sido os seus dois mais recentes trabalhos, como diretor, grandes sucessos, de público e de crítica, conquistando uma quantidade inumerável de prêmios: “Bibi - Uma Vida Em Musical” (2018) e “A Cor Púrpura” (2019), esta com temporada interrompida, pela pandemia de COVID-19, mas que volta aos palcos, em São Paulo, em novembro próximo, retornando, depois, ao Rio, onde estreou.



    TADEU, de posse de um texto pelo "digerido" por ele, não procurou partir para “pirotecnias” e se manteve numa direção discreta, preocupado em orientar as atrizes, para que nada que tivesse que ser dito ficasse oculto, tarefa que não deve ter sido difícil, para ele, considerando-se o seu talento e experiência no ramo e o material humano de que dispunha, e soube explorar, de cada uma das quatro, os melhores detalhes marcantes nas características de cada personagem. Fez um sóbrio e ótimo trabalho, muito proficiente, contando, como sempre, na assistência de direção, com sua “fiel escudeira”, FLÁVIA RINALDI, e suas mãos trabalharam de forma irretocável, de acordo com sua cabeça. 



        Por já ter me alongado em demasia, farei breves comentários sobre os demais artistas de criação da peça, sem que isso signifique uma menor importância no projeto. Muito pelo contrário. 



    A obra é bastante valorizada pela boa trilha sonora de CLAUDIO LINS, cantor, ator, diretor, produtor e que descobriu o prazer e o talento em / para compor excelentes trilhas, tanto para as suas peças como as de seus colegas. 



        Multiartista e dono de uma sensibilidade a toda prova, além de grande bom gosto e senso estético, CLAUDIO TOVAR também se encarregou dos cenários, dos figurinos e dos adereços. TOVAR é um reconhecido e respeitado artista plástico, no Brasil e no exterior, e já nos brindou com belíssimas exposições de artes plásticas, aqui e além-fronteiras. O TOVAR cenógrafo limitou-se a uma praça, na qual estão apenas dois bancos de jardim, com o solo quase todo coberto de folhas secas (Seria uma alusão ao outono, estação em que as folhas caem e que, na crônica de Drummond, corresponde à velhice? Pareceu-me. E o poeta diz, em “Fala, Amendoeira!”: “Repara que o outono é mais estação da alma que da Natureza”.) Nas laterais e ao fundo, algumas colunas, pintadas, representando árvores estilizadas. Já o TOVAR figurinista é outra história. Seus figurinos, na peça, foram concebidos, com formas e cores bem vivas e “estranhas” (Leia-se: "criativas",) com muitos detalhes e belos acabamentos, de modo a nos mostrar "velhas meninas", em vez de “meninas velhas”. Ele brinca com o lúdico, de uma forma tão linda e agradável de se ver... Todos os figurinos foram confeccionados por DONA NICE TRAMONTIM, a qual, infelizmente, acabou falecendo, vítima da COVID, passando a ser mais um número nas estatísticas, uma das seiscentas mil vítimas de um genocídio,  e não pôde ver suas roupas nos corpos das atrizes. (Muita luz para ela e que sua alma descanse em paz!). Quanto aos adereços, que são muitos, nesta montagem, TOVAR, como bom artista plástico, fzz "mágicas", "cria magia", utilizando-se de todos os tipos de material, até de sucatas, às vezes, para criar verdadeiras obras de arte. São lindos e muito bem confeccionados.



        DANI SANCHEZ brilha, com perdão do trocadilho infame, na criação de um excelente desenho de luz. A direção ganha bastante, contando com a colabortação de DANI, quando produz uma iluminação que valoriza, bastante, determinadas cenas, criando a atmosfera de que elas necessitam. Um belo trabalho plástico! 



        É preciso que se valorizem bastante todos os outros nomes que constam na ficha técnica, como forma de agradecimento e reconhecimento por seus trabalhos, para que um espetáculo da qualidade deste pudesse ter sido levantado.  




 

FICHA TÉCNICA:

 

Texto: Claudio Tovar

Direção: Tadeu Aguiar

Assistência de Direção: Flávia Rinaldi

 

Elenco / Personagem:

Barbara Bruno / Norma

Divina Valéria / Edith

Nadia Nardini / Corina

Lucinha Lins / Zuleika

 

Cenários, Figurinos e Adereços: Claudio Tovar

Iluminação: Dani Sanchez

Trilha Sonora Original: Claudio Lins

Registro de Ações: Calabouço

Projeto Gráfico: Thiago Detofol

Assessoria em mídias sociais: Bia Tovar

Cenotécnico: J. Faria

Costura: Nice Tramontim

Coordenação de Produção: Eduardo Bakr

Produção Executiva: João Lins

Assistência de Produção: Di Calafiori

Produção Geral: Sempre Mais Produções Artísticas Ltda.

Realização: Sempre Mais Produções Artísticas Ltda.

Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação – João Pontes e Stella Stephany


 

 






SERVIÇO:

 

Temporada: de 01 a 31 de outubro/2021

Local: Teatro Prudential

Endereço: Rua do Russel, 804, Glória – Rio de Janeiro (Edifício Manchete)

Telefone: (21) 3553-3557

Dias e Horários: 6ªs feiras e sábados, às 20h; domingos, às 19h.

Gênero: COMÉDIA

Classificação Etária: 16 anos.

Duração:  75 min.

OBSERVAÇÃO: Não haverá espetáculo no dia 22/10, devido ao “show” da banda “FourPlusOne”.


 

 






        Recomendo, com muita alegria, “AS MENINAS VELHAS”, não só como forma de entretenimento, mas, também, como uma aula de como saber envelhecer e cultivar sólidas amizades, para o resto da vida. E das próximas, para quem nisso acredita. Eu acredito e não quero dar “spoiler” do lindo e comovente final da peça. Vão ao Teatro Prudential, para conferir!











(Parte de equipe envolvida no projeto.)

 

 


(FOTOS: OSSE STUDIO 

e

PEDRO IVO.)




GALERIA PARTICULAR:
FOTOS: ANA CLÁUDIA MATOS.)

(Com Claudio Tovar.)

(Com Tadeu Aguiar.)



(Com Claudio Lins.)

(Com Lucinha Lins.)



E VAMOS AO TEATRO,

COM TODOS OS CUIDADOS!!!

 

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO

 DO BRASIL,

COM TODOS OS CUIDADOS!!! 

 

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE!!!

 

RESISTAMOS, SEMPRE MAIS!!! 

 

COMPARTILHEM ESTE TEXTO,

PARA QUE, JUNTOS,

POSSAMOS DIVULGAR

O QUE HÁ DE MELHOR NO

TEATRO BRASILEIRO!!!

 

2 comentários:

  1. Uma crítica maravilhosa. Eu ri à beça com a sua estilística envolvente. Amo seus "neologismos" divertidos. Parabéns, Querido Bartholo!

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