“A CONSTRUÇÃO”
ou
(DESCONSTRUIR
PARA CONSTRUIR.)
Todos os que me dão a honra de suas
leituras sabem que só escrevo sobre um espetáculo teatral quando ele me agrada,
acrescenta-me valores. Sabem, também, que, se, por qualquer motivo, eu não
tiver condições de escrever sobre a peça, enquanto ela ainda está em cartaz,
faço questão, mesmo assim, de registrar as minhas boas impressões sobre ela. É
o caso de “A CONSTRUÇÃO, que esteve em cartaz, até o último dia 02
de novembro (2025), na Sala Multiuso do SESC Copacabana.
Foi uma pena que a temporada tenha sido tão curta e exibida num pequeno espaço
físico, que comportava poucos espectadores.
SINOPSE:
Em cena, o narrador-protagonista, interpretado por MARCELO
OLINTO, é um animal mamífero, um texugo, que se dedica,
obsessivamente, à criação e manutenção de sua toca subterrânea, um refúgio
seguro criado para sua proteção.
Cercado por uma atmosfera claustrofóbica, o
personagem oscila entre o orgulho de seu trabalho e o medo paranoico de
ter a sua toca invadida por inimigos, sejam reais ou imaginários.
Ao
encenar a história desse animal, envolvido na construção de sua
moradia-fortaleza, a obra aborda, metaforicamente, os sentimentos que
acompanham o ser humano durante toda a sua vida: a necessidade de um teto
e o medo da morte.
Seis
meses antes de sua morte, FRANZ KAFKA (1883-1924), escritor boêmio de língua alemã, autor de romances e contos, considerado, pelos críticos, como um dos
escritores mais influentes do século XX, escreveu uma novela,
chamada “A CONSTRUÇÃO”, que ficou incompleta, publicada, postumamente, em 1931. Pelas mãos do premiado
dramaturgo PEDRO EMANUEL, a obra, por meio de uma adaptação dramatúrgica, ganhou uma
montagem teatral, sob a direção de BETO BROWN, trazendo MARCELO
OLINTO na interpretação do solo, numa realização
de FLÁVIA PORTELA, do “Estúdio F”.
O
monólogo é um corajoso projeto, bastante ousado, nada
convencional, que deu certo e agrada aos espectadores de todos os tipos e
desperta neles um interesse incondicional, da primeira à última cena, pelo
conjunto da obra, a soma de todos os elementos que entram na montagem da peça.
Ainda
que obra original já contabilize um século de escrita, ela é universal e
atemporal, trazendo temas caros a qualquer criatura humana, em qualquer ponto
do planeta Terra, embora, na dramaturgia, o protagonista seja um animal
irracional.
Trata-se
de uma narrativa que propõe
fundadas reflexões sobre a luta pela sobrevivência em um ambiente hostil, como
era a Europa, na época em que foi escrita a novela de KAFKA, momento em que o continente europeu assistia à ascensão do fascismo. Infelizmente,
nos dias de hoje, um século depois, o mundo constata, perplexo, a repetição da História, não somente no Velho Continente, mas também em países da América
do Sul, incluindo o Brasil, da Ásia e da África.
Durante cerca de 60 minutos, tempo que dura a encenação,
vi-me, vez por outra, trazendo toda aquela narrativa para o Brasil
de 2019 a 2022, período pelo qual nenhum cidadão, REALMENTE,
de bem mereceu passar. E, o que é pior: não parou por lá. Conquanto tenhamos,
hoje, um governo federal progressista, voltado para o bem-estar do povo
brasileiro, comprometido, verdadeiramente, em honrar as instituições e,
principalmente, a Constituição Brasileira, ainda sentimos a força
e a opressão de uma extrema- direita, exercida pelo que há de pior na política.
Derrotamos um “mito” pífio, mas não conseguimos, ainda, nos
livrar dos que o seguem, da forma mais violenta e cruel possível.
Esta
montagem é uma soma de acertos. O texto é, de certa forma, um pouco
rebuscado, hermético, necessitando de bastante atenção e concentração do espectador.
Interessantíssima é a adaptação dramatúrgica, feita, com muito
cuidado e precisão, por PEDRO EMANUEL. A plasticidade é de
uma justeza ímpar, representado por uma sombria cenografia,
curiosíssima e criativa, assinada por TECA
FICHINSKI, que ajuda a construir a necessária
atmosfera desejada pelo texto. Criado por MARCELO
OLINTO, em parceria com o estilista ALMIR FRANÇA, o figurino
é um exótico terno preto, com textura que remete a um animal, “comme il
fault”. A equipe de criação conta, ainda, com a direção
de movimento da coreógrafa LAVÍNIA BIZZOTTO, que
qualifico como um OBRA-PRIMA, a trilha sonora original, de Mario Olinto, e a iluminação veio da premiada ADRIANA
ORTIZ, outro elemento da maior importância para criar uma atmosfera lúgubre e misteriosa.
Aplaudo
tudo, com o maior empenho, contudo a “cereja do bolo” não é outra,
senão o preciosíssimo trabalho de interpretação de MARCELO OLINTO.
Não consigo, e não aceito, deixar de vê-lo nas listas de indicados a prêmios de
MELHOR ATOR, relacionado à temporada de TEATRO de 2025,
no Rio de Janeiro. É muito comovente e perfeito o seu trabalho. Sua
postura corporal, entonações e máscaras faciais são marcantes e corretíssimas.
Deixei o Teatro “com a água lavada e enxaguada”, “de queixo
caído”, com a “performance” de OLINTO.
Infelizmente,
na FICHA TÉCNICA, não consta o nome do(a) artista responsável pelo fantástico
visagismo da peça. Meus aplausos a quem o tenha criado!
FICHA TÉCNICA:
Idealização: Marcelo Olinto
Texto
Original: Franz Kafka
Adaptação
Dramatúrgica: Pedro Emanuel
Direção: Beto
Brown
Atuação: Marcelo
Olinto
Direção
de Movimento e Preparação Corporal: Lavinia Bizzotto
Cenografia: Teca Fichinski
Figurino: Almir França e Marcelo Olinto
Iluminação: Adriana
Ortiz
Composição
“A Construção – Suíte Sinfônica”: Mario Olinto
Ateliê de Costura: Empório Almir França
Estúdio: Mega
Produção Executiva: Flávia Portela (Estúdio F)
Assessoria de Imprensa: Catharina Rocha e Paula Catunda
Fotografia: Nil Caniné
Mídias Sociais: Rafael Teixeira
“Design” Gráfico: Maria Cristina dos Santos
Intérprete em Libras: Davi Vasconcelos
Audiodescrição: Locução - Sérgio Nostra | Estúdio - Heleno Hauer
Filmagem e Edição de Vídeo: Bruna Baitelli
Produção: Beto
Brown, Flávia Portela (Estúdio F), Marcelo Olinto e Sérgio Nostra
Realização: Estúdio F
Durante a escrita desta merecidíssima
crítica, fui informado de que – QUE BOM! – o espetáculo, em
função do sucesso de público, ganhará uma segunda temporada, ainda que bem
curta, na “Sede da Cia dos Atores”, também no Rio de Janeiro. Será uma nova oportunidade
para quem não conseguiu assistir a este excelente espetáculo no SESC
Copacabana. Segue-se o SERVIÇO da nova temporada:
SERVIÇO:
Temporada:
De 07 a 16 de novembro de 2025.
Local:
Sede da Cia dos Atores.
Endereço:
Rua Manuel Carneiro, nº 12 – Escadaria Selarón – Lapa – Rio de Janeiro.
Dias
e Horários: De 6ª feira a domingo, às 20h.
Valor
dos Ingressos: R$ 20 (meia-entrada) e R$ 40 (inteira) no “site” da
Sympla (com cobrança de taxa de serviço) ou na bilheteria do Teatro (sem
cobrança de taxa de serviço), uma hora antes do início da sessão.
Classificação
Etária: 14 anos.
Duração:
60 minutos.
Gênero:
Monólogo Dramático.
“A CONSTRUÇÃO” é, indubitavelmente,
um dos melhores solos que vêm passando pela temporada teatral carioca, em 2025,
motivo que me leva a RECOMENDÁ-LO, COM TODO O
MEU EMPENHO.
FOTOS: NIL CANINÉ.
É preciso ir ao TEATRO, ocupar todas as salas de espetáculo,
visto que a arte educa e constrói, sempre; e salva. Faz-se necessário resistir sempre
mais. Compartilhem esta crítica, para que, juntos, possamos divulgar o que há
de melhor no TEATRO BRASILEIRO!

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