terça-feira, 26 de novembro de 2019


RELÂMPAGO
CIFRADO

(CURIOSO TÍTULO;
INTERESSANTE, PORÉM.
ou
QUANDO TEXTO E ATUAÇÃO
QUASE SE BASTAM.)





              O tempo anda bem escasso, para escrever minhas críticas, entretanto, quando gosto de um espetáculo, tento, ao máximo, dar um jeitinho de escrever sobre a peça, nem que seja só um pouco, a fim de que fique registrado o prazer de ter assistido a ela, como é o caso de “RELÂMPAGO CIFRADO, em cartaz no Teatro petra Gold (VER SERVIÇO.).









SINOPSE:

A ação se passa no consultório da MÉDICA A (ANA BEATRIZ NOGUEIRA), profissional reconhecida e respeitada em seu meio, ligada aos valores humanos da medicina e de forte senso ético.

Ela recebe a visita da jovem e talentosa MÉDICA B (ALINNE MORAES), ambiciosa e um tanto cheia de si, que vai em busca de uma carta de recomendação, para ser aceita em uma especialização muito almejada, em Harvard.

A MÉDICA A não recebe a MÉDICA B com simpatia.

Os encontros demoram a ser marcados e são bem difíceis e tumultuados, quando acontecem.

As duas têm visões muito diferentes da profissão, e a discussão ética vai se agravando, até que a revelação de um acontecimento passado muda o rumo da história de ambas.








            GUSTAVO PINHEIRO, autor do texto, não precisou de mais de 60 minutos, para nos contar uma ótima história cheia de mistérios, a qual reserva, ao público, uma grande surpresa, no seu desfecho, um final daqueles que, com o decorrer da trama, as pessoas imaginam que seja um – várias ilações -, entretanto penso que ninguém consegue chegar à surpresa dos minutos finais da peça.

            As duas médicas são de personalidades bem fortes e ambas desejam, incessantemente, se manter incólumes e sair vitoriosas do já referido embate. Para isso, como armas mais poderosas, utilizam a palavra e a ironia, parecendo tripudiar uma sobre a outra, até mesmo a MÉDICA B (ALINE MORAES), que depende tanto, que precisa muito, da aquiescência da MÉDICA A (ANA BEATRIZ NOGUEIRA), embora o procedimento, a atitude de superioridade e, até certo ponto, desdém, de uma em relação à outra, parta mais desta. Tudo o que pode parecer estranho, no relacionamento “belicoso” entre as duas é explicado, quase ao apagar das luzes e o fechamento da cortina.





            Ao receber o convite para assistir à peça, fiquei bastante intrigado acerca do título. E estou até agora. O que significaria, ou poderia ser, um “RELÂMPAGO CIFRADO”? De posse do programa da peça, antes do início do espetáculo, fiquei sabendo que o referido título fora extraído de um trecho do poema “Amor e Seu Tempo”, do livro “As Impurezas do Branco”, de Carlos Drummond de Andrade: “É isto, amor: o ganho não previsto, / O prêmio subterrâneo e coruscante, / Leitura de relâmpago cifrado, / Que, decifrado, nada mais existe.”. Mesmo considerando o contexto, de onde retirei a quadra, não consegui entender. Confesso – e isso pode, e deve, ser uma limitação minha – que não consegui, ainda, compreender, a ligação entre o título e o teor da peça, o que, para o que o espetáculo representou, para mim, pouco importa, uma vez que o que vale é a sua excelente qualidade, quer pelo texto – o enredo, a trama -, quer pela direção, quer pela atuação das duas atrizes que compõem o elenco.





“A peça propõe um jogo delicado, em que o público constrói a história, no mesmo ritmo das duas personagens. É uma peça sobre o tempo, a memória e a empatia.”, afirma o autor, GUSTAVO PINHEIRO. É no detalhe, que também faz parte do “release” da peça, “o público constrói a história, no mesmo ritmo das duas personagens” que reside um dos granes trunfos do espetáculo, se não for o maior de todos, uma vez que, ligados ao palco, transferindo-se para junto das duas atrizes, numa sugerida, implicitamente, e aceita, proposta de intimidade, de aproximação palco/plateia, os espectadores vão imaginando o que possa estar por trás daqueles diálogos, os quais se repetem, em conversas em dias distintos, acabando por se ver diante de um final surpreendente. Gosto muito dessa proposta de texto.





“O que você faria se descobrisse que sua vida foi inventada? Num tempo em que as “fake news” dominam o mundo, o que é verdade e o que é mentira sobre cada um de nós?”. A temática não poderia ser mais atual e instigante. A pergunta, que está no “release” da peça, enviado por STELLA STEPHANY (JSPONTES COMUNICAÇÃO – ASSESSORIA DE IMPRENSA), foi o ponto de partida para que GUSTAVO PINHEIRO bolasse uma história tão interessante, capaz de prender, totalmente, a atenção do público, da primeira à última cena, com diálogos, estes sim, um pouco “cifrados” (Quero me referir a uma linguagem quase cifrada, “sugestiva”, que permite assegurar um segredo.), não, porém, herméticos, cheios de mistério e instigação ao público, um verdadeiro desafio para o espectador, que, ansioso, não vê a hora do desfecho de uma disputa, torcendo por um “final feliz”, representado pela aquiescência de uma das personagens, aceitando escrever uma carta de recomendação para a outra. Tão simples! Não lhes parece? Mas será que é isso mesmo o que vai acontecer? Talvez, sim; talvez, não. Mas algo muito surpreendente, e mais importante, destaca-se sobre essa questão e nos reserva o autor do texto.





            Quem "inventou" a nossa vida? E como é possível "reinventá-la"?  Quem, de nós, tem consciência plena de quem é ou do que é? Quantos podem ter a certeza de que suas vidas não passam de um blefe, de um enredo fictício? E quem exercita, de verdade, a empatia? Quem consegue, inclusive, atingir o altruísmo?

  No já citado “release” da peça, um dos seus diretores, LEONARDO NETTO, faz referência ao fato de a dramaturgia de “RELÂMPAGO CIFRADO” ser considerada uma “peça de ator”, o que vale dizer, no “jargão profissional”, que é uma “obra que tem sua força calcada na construção de seus personagens e na interpretação que os atores farão desses personagens (...)”. Isso, continua ele, acontece “A tal ponto, que se, hipoteticamente, todos os elementos cênicos utilizados, para a finalização do espetáculo, tais como cenografia, figurinos, iluminação, trilha sonora, fossem suprimidos, o espectador continuaria sendo tocado da mesma forma.”. Não vejo por que não concordar com LEONARDO, já que a força dramática de cada uma das duas personagens, assim como a psique, conotação moderna de mente ou ego, de cada uma delas, é extremamente exacerbada, o que leva as duas atrizes a dar tudo de si - o que pode parecer fácil, mas não o é - na composição das MÉDICAS A e B.





Com relação ao trabalho de ANA BEATRIZ NOGUEIRA e ALINE MORAES, só posso dizer que ambas se saem muito bem, em cena, traçando, com perfeição, por meio de pessoais entonações, gestos, olhares e pequenos detalhes, na máscara facial, a personalidade de cada uma das representadas. Vejo-as num equivalente nível de interpretação, o que me leva a fazer um comentário a mais. São duas atrizes bem diferentes, em suas trajetórias profissionais, no que diz respeito aos veículos em que exploram sua arte e seu talento. ANA, apesar de larga experiência na TV e no cinema, é uma atriz de TEATRO, de longa data, sempre com atuações em papéis marcantes. Atualmente, no mesmo Teatro Petra Gold, aos sábados e domingos, às 17h, faz “dobradinha” com um ótimo monólogo, “Um Dia a Menos”, adaptada do conto homônimo de Clarice Lispector, também com direção de LEONARDO NETTO. Isso lhe confere muita segurança em cena.







ALINE, por questões que desconheço, e que não vêm ao caso, dedicou-se mais à TV, mídia em que acumula mais de uma dezena de novelas e o mesmo número em participações em séries, minisséries e outros programas, e ao cinema, tendo atuado, também, em mais de uma dezena de filmes. Por esse motivo, sua presença se tornou rara, nos palcos, limitando-se, até o atual trabalho, a apenas duas peças, às quais assisti. Sua estreia, no TEATRO, aconteceu com “Dhrama - O Incrível Diálogo entre Krishna e Arjuna”, em 2007, com direção de João Falcão, na qual interpretava, num gesto de profunda coragem, para uma incipiente atriz de TEATRO, nada menos que o deus hindu Krishna, no Espaço SESC Copacabana. A outra incursão se deu em 2012, na peça “Dorotéia”, um clássico de Nélson Rodrigues, no Teatro Poeira, na qual interpretava a protagonista, sob direção de João Fonseca. Já no trabalho de estreia, revelou que também entendia bastante de “pisar nas tábuas”, o que ratificou na segunda e, agora, reforça isso, na peça em tela.







Um “passarinho”, muito próximo à atriz e envolvido na montagem, me confidenciou algo, e eu, que não jurei guardar segredo, agora, não em tom de “fofoca” (Risos.), reporto-me àquela revelação. É a de que ALINE ainda se sente insegura, no palco, sempre querendo saber, ao final de cada sessão, como foi a sua atuação do dia, o que, a meu juízo e no de várias pessoas com as quais conversei, após a sessão a que assisti, gente de TEATRO e outras pessoas, apenas espectadores, não deveria ser motivo de preocupação, uma vez que, como já disse, acima, seu trabalho é muito bom, parecendo já ser uma grande “habituée” dos palcos. Com a maior sinceridade, pois não teria motivo para mentir ou falar bem, só para agradar, é o meu pensamento, a minha avaliação. O tomar conhecimento desse detalhe só fez com que eu ampliasse a minha admiração pela profissional. Essa sua atitude, desnecessária, por outro lado, é digna de louvor, pois é sinal de uma preocupação em melhorar – e isso é muito salutar e digno, uma prova de respeito ao público.







A direção da peça é feita a quatro mãos, por LEONARDO NETTO e CLARISSE DERZIÉ LUZ, ambos atores, ótimos, por sinal, os quais, por esse motivo, já levam alguma vantagem em relação a quem não o é. Não sei o que pensam os outros, mas é uma teoria minha, que defendo até hoje. Um bom diretor de TEATRO, via de regra, não necessariamente, é um ator, e, quase sempre, bom. Ambos demonstram ter mergulhado, profundamente, nas intenções do autor e, contando com o talento das duas atrizes, chegaram a uma perfeita construção das duas personagens, ambas fixadas em seus objetivos e pensamentos, num trabalho que vai sendo conduzido para a “explosão final”, sem deixar pistas para o espectador descobrir até onde leva a estrada.





Já mostrei, nesta crítica - e volto a reproduzi-lo - um pensamento de LEONARDO NETTO, quanto ao fato de “RELÂMPAGO CIFRADO” ser uma “peça de ator”: “A tal ponto, que se, hipoteticamente, todos os elementos cênicos utilizados, para a finalização do espetáculo, tais como cenografia, figurinos, iluminação, trilha sonora, fossem suprimidos, o espectador continuaria sendo tocado da mesma forma.”. E ele continuou: “O embate entre duas médicas, de gerações diferentes, que ocorre no consultório de uma delas, pode prescindir de tudo, menos das atuações de ANA BEATRIZ NOGUEIRA e ALINE MORAES. São elas que vão mobilizar o espectador, utilizando, para isso, as palavras escritas por GUSTAVO PINHEIRO. Tudo mais é secundário e estará a serviço das duas, para ajudá-las nessa tarefa primordial.”. Também já disse eu que concordo com o diretor, entretanto não posso negar que, aqui, os citados elementos cênicos agregam valores positivos à montagem, principalmente dois. Um deles seria o simples e interessante cenário, de ANDRÉ SANCHES, muito original e sugestivo, com relação ao teor da peça, reproduzindo o consultório da MÉDICA A, modernamente decorado e no qual se veem várias ampulhetas, de diversos tamanhos, que ela ganha de presente de seus clientes, algumas estilizadas, servindo de apoio a mesas e bancos. Esses objetos têm um significado muito importante na peça. O outro seria a trilha sonora original, especialmente composta por LEILA PINHEIRO, que são inserções de suaves melodias, ao piano, intercalando os encontros entre as duas personagens, sugerindo a passagem do tempo.

Mas não podem ser desprezados os figurinos, de CARLA GARAN e o desenho de luz, de AURÉLIO DE SIMONI.







FICHA TÉCNICA:

Texto: Gustavo Pinheiro
Direção: Leonardo Netto e Clarisse Derzié Luz

Elenco: Ana Beatriz Nogueira e Aline Moraes

Cenário: André Sanches
Figurinos: Carla Garan
Desenho de Luz: Aurélio de Simoni
Trilha Sonora Original: Leila Pinheiro
“Design” Gráfico: Roberta de Freitas
Mídias Sociais: Rafael Teixeira
Fotos Estúdio: Lúcio Luna
Fotos de Cena: Guga Melgar
Elaboração de Projeto: Maria Inês Vale
Produção: Ana Beatriz Nogueira e Maria Inês Vale
Idealização: Ana Beatriz Nogueira e Thiago Franco
Realização: Trocadilhos 1000 Produções Artísticas
Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação – João Pontes e Stella Stephany










SERVIÇO:

Temporada: De 08 de novembro a 22 de dezembro de 2019.
Local: Teatro Petra Gold / Sala Marília Pêra.
Endereço: Rua Conde de Bernadotte, 26 – Leblon – Rio de Janeiro.
Tel: (21) 2529-7700.
Dias e Horários: 6ª feira e sábado, às 20h; domingo, às 19h.
Valor dos Ingressos: 6ª feira = R$70,00; sábado e domingo = R$80,00 (Meia entrada, para quem, legalmente, faz jus ao benefício.).
Horário de Funcionamento da Bilheteria: Diariamente, das 14h às 20h.
Vendas pela internet: www.sympla.com.br
Capacidade: 411 espectadores.
Duração: 60 minutos.
Classificação Indicativa: 14 anos.
Gênero: Drama.








"RELÂMPAGO CIFRADO" é um espetáculo que gratifica o espectador, por meio de um belo trabalho de interpretação, calcado num texto que pode ser apontado como um dos melhores do consagrado dramaturgo GUSTAVO PINHEIRO e, também, dos que mais se destacaram, até o presente momento, na programação teatral carioca, em 2019, motivos mais que suficientes para que a peça seja, por mim, recomendada, com muita ênfase.





E VAMOS AO TEATRO!!!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI!!!

RESISTAMOS!!!

COMPARTILHEM ESTE TEXTO,
PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!



CENSURA NUNCA MAIS!!!






(FOTOS: LÚCIO LUNA - estúdio -
e
GUGA MELGAR - de cena.)















           































































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