terça-feira, 14 de novembro de 2017

O FILHO DO PRESIDENTE


(UM BOM ESPETÁCULO,
EM QUE O  
ESPAÇO GEOGRÁFICO
E O TEMPO
PODERIAM SER
“AQUI” E “AGORA”.)








            Quando li o “release” da peça “O FILHO DO PRESIDENTE” (VER SERVIÇO), enviado por BIANCA SENNA (assessoria de imprensa), fiquei me questionando se valeria a pena assistir ao espetáculo, uma vez que estava com a agenda superlotada e a sinopse da peça me parecia não acrescentar muito, uma vez que o texto trata de uma temática, aparentemente, distante da nossa realidade. Durou pouco essa rasa e pueril dedução.

            Tendo conseguido um ajuste na agenda, encontrei a data de 11 de novembro, sábado passado, para assistir ao espetáculo, que cumpre uma curtíssima temporada, de apenas três semanas (esta é a última), com uma expectativa que não era muito grande, confesso, com toda sinceridade. Não pelos envolvidos no projeto, alguns dos quais eu já conhecia – seus trabalhos – de longa data, mas por causa do enredo. Não me interessava muito. O texto era o grande óbice. Puro “pré-conceito”, se eu não o conhecia ainda.

            E não é que eu estava redondamente enganado?! O texto, independentemente dos demais bons elementos desta montagem, sobre os quais falarei adiante, é o melhor da peça.

            Assim como os personagens são democratas, também poderiam ser republicanos ou pertencer a qualquer arremedo de partido político brasileiro. O que se vê, no texto, poderia – a pode – ser aplicado à realidade brasileira, porque tudo o que é nele tratado faz parte de um filme que todos nós já conhecemos e do qual não gostamos, porque é em preto e branco e o “mocinho” morre no final: homofobia e fundamentalismo religioso, duas chagas que parecem não se fechar, em qualquer parte do mundo, incluindo esta “nação” tupiniquim.



 


 







SINOPSE:

Ambientada na sede do Partido Democrata, num hotel, no sul dos EUA, a trama transcorre, em tempo real, na noite da apuração dos votos para presidente da nação mais poderosa do mundo.

JOHN, o pai (ANSELMO VASCONCELOS) é forte candidato a vencer as eleições presidenciais, porém um drama familiar se instaura, quando fotos polêmicas do filho, também JOHN (FELIPE CABRAL), “gay” assumido e aceito pela família, são divulgadas na internet, numa festa, na faculdade: ele, vestido de Maomé, e MATT (HUGO LOBO), seu melhor amigo, de Pastor Bob, um pastor evangélico, homofobicamente radical (o pleonasmo é proposital), que seria aliado do futuro presidente.
 
A partir desse momento, o filho fica sob crescente pressão do pai e da mãe, JESSICA (INGRA LYBERATO), e de dois assessores do partido – o judeu MARC (RODRIGO CANDELOT) e TRACY (VANESSA PASCALE) – para que ele faça um pedido público de desculpas.

Enquanto os assessores do partido e seus pais entram e saem do quarto onde JOHN está com MATT, o amigo que estava vestido de Pastor Bob, na foto, a fragilidade e as mágoas dessa relação familiar vão sendo reveladas.
  
















            A peça foi escrita pelo dramaturgo norte-americano CHRISTOPHER SHINN autor de 12 peças, incluindo “Now or Later”, o título original da peça aqui analisada, indicada ao prêmio “Evening Standard Theatre Award for Best Play”. É o primeiro texto do premiado dramaturgo encenado no Brasil.
           
Escrita em 2008, a peça foi traduzida por JOÃO POLESSA DANTAS, um grande conhecedor do ofício, e a montagem é uma idealização de FELIPE CABRAL, que adquiriu os direitos de encenação, no Brasil, e partiu, junto a amigos, para uma tremenda batalha, que é montar um espetáculo teatral, nos dias de hoje, sem contar com patrocínios.

     O texto é muito contundente e mostra, disseca, a fundo, dois aspectos, homofobia e fundamentalismo religioso, capazes de abalar, inclusive, a relação entre o novo presidente americano eleito e seu filho, ambos tão distantes em suas ideologias e comportamentos.

A peça pode ser considerada “um drama político e familiar, com doses de humor, que traz à tona temas como liberdade de expressão, sexualidade, privacidade, fundamentalismo religioso e a luta pelos direitos da comunidade LGBT, na véspera de uma eleição presidencial americana”.

Diz o autor do texto que “começou a pensar nessa peça durante o início das eleições de 2008, quando Hillary Clinton e Barack Obama tiveram que responder às perguntas sobre o casamento ‘gay’”.

“Na época, eles não apoiavam o casamento ‘gay’. Tentei imaginar como se sentiria um filho ‘gay’ de um deles, ao ouvi-los dizer isso. Ao mesmo tempo, depois do 11 de setembro, as questões da liberdade de expressão e o relacionamento do liberalismo com o fundamentalismo religioso estavam no ar. Comecei a pensar sobre como essas questões se relacionavam umas com as outras. Logo depois, pensei numa história sobre um candidato presidencial que é contra o casamento ‘gay’ e é cauteloso em relação ao antagonismo do mundo Islâmico, e o seu filho, homossexual, é um defensor convicto da liberdade de expressão”, é o que diz CHRISTOPHER SHINN.

O espetáculo é de uma excelente qualidade dramatúrgica, reunindo elementos da maior contemporaneidade, os positivos e os negativos (mais estes), como a questão dos evangélicos fanáticos, dos muçulmanos perseguidos, da causa “gay”, de uma eleição presidencial, de um vídeo que viraliza”...

Diz o diretor da peça, MARCUS FAUSTINI: “Tem muito rancor e ressentimento nessa família. O filho tentou se matar quando era bem jovem. Os pais sempre colocavam a agenda política na frente de tudo”.






            Sobrepõe-se, a qualquer tema que seja tratado na peça, a questão do relacionamento pai / filho, o que interessa a qualquer pessoa, em qualquer parte do planeta. É bem provável que isso seja o que mais incomoda a sensibiliza o espectador. A questão partidária e a eleição, em si, acabam ficando em segundo plano.

            Por total falta de tempo, em função do acúmulo de trabalho e na véspera de uma viagem, querendo que estas linhas sejam publicadas antes do encerramento da temporada, vou fazer, muito a contragosto, uma análise mais superficial da peça, chamando, porém, a atenção para o fato de que ela merecia um tratamento mais aprofundado, como o que dou a outros espetáculos sobre os quais escrevo, uma vez que só me proponho a escrever sobre os espetáculos que me agradam, como este.

            Interessei-me muito pela carpintaria dramatúrgica: os diálogos, as pausas, o texto das entrelinhas...

            Da mesma forma, achei bem interessante a direção, de MARCUS FAUSTINI, sobretudo no que diz respeito ao ritmo empreendido à peça, registrado na movimentação dos atores e nas constantes entradas e saídas destes. Sempre uma surpresa para o espectador.

          O elenco se comporta uniformemente, com um destaque maior, como não poderia deixar de ser, para o protagonista, FELIPE CABRAL, que participa de todas as cenas. Cônscios da importância de suas participações na trama, cada um dos demais atores e atrizes cumpre corretamente suas funções, valorizando o personagem coadjuvante.






         O personagem de ANSELMO VASCONCELOS só perde a linha numa única cena, num embate com o filho, mantendo a pose do candidato “praticamente eleito”, sabedor de que, por conta de uma ação impensada, ou ingênua, do rapaz, caminha sobre o afiado fio de uma gigantesca adaga.

            INGRA LYBERATO, nas suas poucas aparições, como a futura primeira-dama, mantém uma postura elegante e compatível com sua função.

         RODRIGO CANDELOT, HUGO LOBO e VANESSA PASCALLE também concedem dignidade a seus personagens.

            Simples e ajustado, provavelmente como pede, em rubrica, o autor da peça, o cenário, de FERNANDO MELLO DA COSTA, é bastante correto e bonito, reproduzindo uma confortável suíte presidencial, com uma enorme cama, um confortável sofá, de quatro lugares, e um “puff”, também de grandes proporções. Completam a ambientação uma ampla sacada, ao fundo, para a qual se abrem algumas portas, e ainda, como decoração, símbolos norte-americanos: faixas de pano, nas cores vermelha, branca e azul, sem que faltasse a águia, símbolo nacional dois EUA.

             Os figurinos, de CAROL LOBATO, são impecáveis, em todos os aspectos.

        AURÉLIO DE SIMONI contribui, para a riqueza e beleza do espetáculo, com uma bela iluminação, que valoriza detalhes do cenário.  
             
       









FICHA TÉCNICA:

Texto: Christopher Shinn
Tradução: João Polessa Dantas
Direção: Marcus Vinícius Faustini
Assistente de Direção: Júlia Stockler.

Elenco: Anselmo Vasconcellos, Felipe Cabral, Ingra Lyberato, Hugo Lobo,
Rodrigo Candelot e Vanessa Pascale.

Cenografia: Fernando Mello da Costa
Iluminação: Aurélio de Simoni
Figurino: Carol Lobato
"Design": Guilherme Telles e Bruno Garcia
Comunicação: Gabriel Wasserman
Assessoria de Imprensa: Paula Catunda, Bianca Senna e Catharina Rocha
Coordenação de Relacionamento: Agatha Santos
Coordenação de Produção: Carol Bandeira
Assistência de Produção: Menna Barreto, Paulo Dary, Dyogo Botelho e Flávia Fialho
Assistência de Financeiro: Karina Cordeiro
Diretor Financeiro: Rodrigo Wodraschka
Direção de Produção: Miguel Colker
Patrocínio: Caixa Econômica Federal e Governo Federal


















SERVIÇO:

Temporada: De 02 a 19 de novembro de 2017
Local: CAIXA Cultural Rio de Janeiro - Teatro da CAIXA Nelson Rodrigues
Endereço: Avenida República do Chile, 230, Centro – Rio de Janeiro 
(Metrô e VLT: Estação Carioca)
(Entrada pela Avenida República do Paraguai)
Informações: (21) 3509-9600 / (21) 3980-3815
Dias e Horários: De 5ª feira a domingo, às 19h
Duração: 80 min.
Valor dos Ingressos: Plateia: R$40,00 (inteira) e R$20,00 (meia entrada); Balcão: R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia entrada). 
Além dos casos previstos em lei, clientes CAIXA pagam meia.
Lotação: 400 lugares (mais 08, para cadeirantes) 
Horário de Funcionamento da Bilheteria: De 3ª feira a domingo, das 13h às 20h
Classificação Indicativa: 16 anos
Acesso para pessoas com deficiência.











             Um espetáculo como "O FILHO DO PRESIDENTE" não é para ficar apenas três semanas em cartaz.

           Oxalá a direção de produção (MIGUEL COLKER) consiga uma nova pauta, provavelmente, para 2018, para que muto mais pessoas, que apreciam o bom TEATRO, possam conhecer esta excelente montagem!





















 (FOTOS: LEO AVERSA – divulgação –
e
ZECA VIEIRA - cena.)














































































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