sexta-feira, 23 de outubro de 2015


NORDESTINOS

 

(UM EMOCIONANTE,

E JUSTÍSSIMO,

AUTOTRIBUTO.)

 

 

 


 

 

 

            Segundo o último censo, os brasileiros somos cerca de 205 milhões, sendo que, aproximadamente, 54 milhões são nordestinos. Eles constituem, portanto, mais de um quarto da população brasileira.

 

 


 

           

São tantos “severinos”, de todas as idades e de ambos os sexos, incógnitos, a grande maioria, ordeiros e trabalhadores, que ajudam, e muito, a construir uma nação...

 

            Sofrem, na pele, toda sorte de discriminação. São violentados, nos seus direitos de cidadãos, e explorados, em grande parte. São, injustamente, adjetivados de forma pejorativa, ainda que detentores de um potencial cultural invejável e reconhecido no exterior.

 

 


 

           

E quando um nordestino da melhor estirpe, um vencedor e talentoso artista, um grande empreendedor, como ALEXANDRE LINO, resolve fazer um espetáculo de TEATRO, centrado nos seus pares? O resultado é de excelente qualidade e pode ser conferido, de 5ª feira a sábado, às 19h30min, no Teatro SESI, no Rio de Janeiro.

 

 


Rose Germano, Alexandre Lino, Erlene Melo e Paulo Roque.

 

 

           
SINOPSE:
 
Quatro atores, quatro diferentes histórias, que se ligam, pela origem geográfica e afetiva em comum - o Nordeste brasileiro -, a partir de depoimentos reais, que são a matéria-prima, o manancial de onde emergem vários personagens e suas trajetórias de migrantes de suas terras para as “cidades dos sonhos”.
 
As semelhanças desses quatro personagens começam por seus nomes de batismos, originais e, muitas vezes, constrangedores. ALEXANDRE LINO, por exemplo, é JOSIVÂNIO PIRES. ERLENE também, convenhamos, não é um nome comum. O “ROSE”, na verdade, é uma redução de ROSEMARY. “Salvou-se”, cem por cento, PAULO ROQUE.
 
 Outro ponto em comum, entre os quatro, passa pelo sonho da migração para a região sudeste e culmina com a dor e a delícia de se afirmar, como identidade, num país de tantos e tão belos matizes antropológicos e culturais.
 
Costurando as quatro histórias está o próprio TEATRO, literalmente um palco, onde desfilam o sonho de superação das dificuldades e a busca por poesia.
 

 

 

 


Atores e bonecos: um casamento perfeito.

 

 

A peça é uma deliciosa comédia, cujo texto é inspirado em cartas de pessoas simples, que vivem no Rio de Janeiro e São Paulo. Portanto, retrata histórias reais, de gente humilde, em busca da realização de seus sonhos.

 

Trata-se de um projeto transmídia, que engloba um espetáculo teatral inédito, um livro e um documentário, homenageando o povo nordestino que migrou para o sudeste.

 

O elenco é composto, exclusivamente, por atores nordestinos, que vivem e trabalham no Rio: os pernambucanos ALEXANDRE LINO e ERLENE MELO, o cearense PAULO ROQUE e a paraibana ROSE GERMANO, os quais, utilizando um humor típico, compartilham várias histórias, com um dinamismo particular de quem conta “causos”, num jogo teatral em que os papéis se misturam. A direção é do, também, pernambucano TUCA ANDRADA, que aceitou, de pronto, o convite para dirigir o espetáculo, por total identificação com as histórias a serem contadas, muito próximas à sua própria. São histórias de vitória, de luta.

 

 


 

 

Segundo TUCA, “Uma história de contribuição cultural, que enriquece, mais ainda, a formação de um povo. A dor e o sofrimento fazem parte de qualquer história verdadeira e estão presentes na peça (...) Parto da pergunta: por que um povo tão rico, culturalmente, como o nordestino, muitas vezes, é chamado de atrasado? É um momento propício para falarmos disso tudo, já que tanto ódio, antes camuflado, vem à tona num país que passa por um momento crítico e fundamental para sua história”.

 

O autor do texto, WALTER DAGUERRE, carioca, que, porém, cresceu numa família de pai e mãe migrantes, diz, também, ter tido uma grande empatia com as histórias, que, habilmente, soube costurar, para a peça, uma vez que, segundo ele, cresceu, ouvindo histórias de dificuldades, migrações e recomeços.

 

É bastante interessante o texto do prólogo, assim como é muito pertinente a citação de poetas de cordel, uma marca registrada da cultura nordestina, que, nesta peça, também é lembrada e contemplada. Gosto da importância que o autor dá à discriminação contra os nordestinos, tantas vezes repetida durante a peça. É preciso, mesmo, cutucar, com força, essa feia ferida, para que ela sangre bastante e faça com que todos enxerguem o absurdo nela contido.

 

 


 

 


 

  

O texto final do espetáculo é como um tapete artesanal, feito da costura de estampas lindas e variadas, e com a contribuição de muitas mãos na sua confecção. Um belo trabalho em conjunto.

 

Os depoimentos, colhidos pelas cartas recebidas, são a matéria-prima da dramaturgia, o material de onde nascem os quatro personagens. De diferentes relatos, surgem cenas, imagens, paisagens, nomes, cores, sons e sabores que compõem as quatro histórias que, de muitas formas, se cruzam.

 

Segundo ALEXANDRE LINO, o idealizador do projeto, “Esses fragmentos também vão compor histórias paralelas de parentes, companheiros, amigos e figuras folclóricas, parte integrante do imaginário dos nossos personagens. Essas evocações ampliarão o espaço/tempo da cena, criando dimensões de passados saudosos, realidades paralelas e idealizações de futuro. Há liberdade por diferentes técnicas de encenação, do depoimento documental, teatro de sombras ao teatro de mamulengos. Porque, no espaço lúdico do palco, tudo é permitido! Não há amarras à imaginação e nem às diferentes formas de expressão. Tal liberdade está totalmente em comunhão com o universo, ainda reinante, dos quintais, das feiras, dos jogos de rua, das festas folclóricas e dos brinquedos artesanais, típicos do nordeste brasileiro. E, também, o universo musical nordestino, com seus ritmos, melodias e letras, repletos de luas, zabumbas e triângulos”.

 

 


Teatro de sombras.

 

 


Teatro tradicional e teatro de sobras: outro perfeito casamento.

 

 

Ainda prossegue LINO: “‘NORDESTINOS’ conta a minha história, a dos meus colegas de elenco e de tantas outras pessoas, que buscaram uma cidade do tamanho dos seus sonhos. E, nessa atitude migratória, encontramos um entrelaçar de realidade e ficção, em que não sabemos onde uma começa e o outro termina”.

 

O texto é bom, porque boas são as histórias, contendo muita verdade e força emotiva, tudo muito bem selecionado e reescrito pelas mãos competentes de WALTER DAGUERRE, um consagrado e premiado dramaturgo, que também consegue destaque no cinema. Gosto muito de seus textos de TEATRO “Projeto K”, “Histórias de Amor Líquido”, “Chopin & Sand: Romance Sem Palavras”, “A Mecânica das Borboletas” e “JIM”, principalmente os dois últimos, aos quais se junta agora o texto de “NORDESTINOS”. O destaque, neste texto, vai para a carpintaria utilizada por DAGUERRE no entrelaçar de quatro histórias, reais, enxertadas com detalhes de outras, tudo fluindo, dramaturgicamente, para uma convergência final.

 

 


 

 


 

 

Procurei um sinônimo, na tentativa de fugir ao lugar-comum, mas não encontrei outros adjetivos, para qualificar o elenco: ótimo e afinado. Talvez por estarem contando suas próprias histórias, o quarteto, de excelentes atores, expõe sua alma, deixa extrapolar a emoção e faz tudo isso temperado com um humor leve, digestivo, quase ingênuo, por vezes, no melhor sentido da palavra, proporcionando, ao público, 70 minutos de completa diversão e prazer.

 

 


Alexandre Lino.

 


Rose Germano.

 


Paulo Roque.

 


Erlene Melo.

 

 

Os quatro são protagonistas e cada um é responsável por 25% da qualidade interpretativa. Não há, então, como atribuir maior importância a um ou outro, uma vez que todos têm oportunidade de destaque e sabem aproveitar o seu momento solo.

 

Quero, apenas, destacar o momento em que ALEXANDRE LINO conta a história, real, de um de seus irmãos, ALEXANDRE, que morreu afogado num rio. Por um momento, a plateia contém as gargalhadas e participa daquele momento triste e, ao mesmo tempo, tão poético, em solidariedade ao ator. Vi gente chegando às lágrimas.  Mas isso só ocorre por conta de sua ótima interpretação, convincente e comovente.

 

 


Alexandre Lino.

 

 

Esta é a segunda direção teatral de TUCA ANDRADA, conhecido do público como ótimo ator, com mais de 30 espetáculos de TEATRO, 20 novelas e 15 filmes. Seu trabalho, na condução dos atores, é muito bom, deixando passar a impressão de que lhes tenha dado liberdade de atuação e pontuando com algumas ideias bastante interessantes, como as inserções de atores, interrompendo uma cena, para explicar o significado de alguns regionalismos, assim como na mistura de atores contracenando com bonecos de mamulengo. Também é visível seu dedo nas várias cenas em que os atores saem de seus personagens e assumem suas próprias identidades, e vice-versa.

 

O tema não comportaria ostentação, motivo pelo qual são bem simples, porém bonitos, práticos e objetivos, o cenário e o figurino, de KARLLA DE LUCA.

 

Quanto ao cenário, o palco é tomado por três painéis, que servem para projeções e deixam passar as sombras (teatro de sombras). Neles há aplicações de trabalhos em filé (tipo de renda ou tecido vazado, típico do nordeste brasileiro), nas bordas. Além disso, apenas vários objetos de cenas, miúdos, que, ao mesmo tempo, servem, também, como adereços, e alguns banquinhos.

 

Os figurinos utilizam tecido rústico, adornados com os tradicionais bordados e rendas nordestinos. Um voto de louvor deve ser atribuído à confecção dos bonecos de mamulengo.

 

RENATO MACHADO é o responsável por um correta iluminação, que, além de utilizar a tradicional luz de palco, ainda avança pelo campo das sombras, efeitos obtidos por meio de uma ajustada contra-luz.

 

 


Detalhe da iluminação.

 

 

A direção musical, que também muito me agradou, leva a competente assinatura de ALEXANDRE ELIAS. É boa a trilha sonora e também merecem destaque os sons que os próprios atores produzem em cena.

 

Cada um dos demais profissionais da equipe técnica, envolvidos no projeto, cumpre, de forma satisfatória, a sua parte, para que “NORDESTINOS” se tornasse aquele espetáculo que não foi feito para ser visto apenas uma vez.

 

 

 

 
FICHA TÉCNICA:
 
Argumento e Idealização: Alexandre Lino
Dramaturgia: Walter Daguerre
Direção: Tuca Andrada
 
Elenco:
Alexandre Lino (Lino, Pai de Ida, Josivânio, Zeca, Meu Dedo, Comissário, Compadre, Patrão, Cristo, Amiguinho e Tuinho)
Erlene Melo (Lene, Mãe de Ida, Neguinha, Supervisora, Mãe de Joselito, Atriz, Prima e Alba)
Paulo Roque (Joselito, Namorado de Neguinha, Télson, Seu Ribamar, Motorista do Ônibus, Irmão de Josevânio, Mãe de Ida Idosa e Jamilton)
Rose Germano (Rose, Idalenajara, Mãe de Santo, Mãe de Josivânio, Mãe de Télson, Mãe de Neguinha, Velha do Leblon)
(Stand-in: Natália Régia
 
Direção Musical: Alexandre Elias
Iluminação: Renato Machado
Cenário e Figurinos: Karlla De Luca
Preparação Corporal e Movimento: Paula Feitosa
Assistente de Direção e Dramaturgia: Fabrício Branco
Assessoria de Imprensa: Ney Motta
Design Gráfico: Guilherme Lopes Moura
Fotógrafo: Janderson Pires
Revisora Textual: Yonara Costa
Assessoria Jurídica: André Siqueira
Produção Executiva: Equipe Cineteatro
Direção de Produção: Alexandre Lino
Realização: Cineteatro Produções
 

 

 
SERVIÇO:
 
Temporada: Até 28 de Novembro.
Dias e Horários: De 5ª feira a sábado, às 19h30min.
Local: Teatro Sesi – Av. Graça Aranha nº 1, Centro – Rio de Janeiro.
Telefone: (21)2563-4168).
Horário de Funcionamento da Bilheteria: De 2ª feira a sábado, das 12h às 20h.
Vendas também pelo site www.ingresso.com.
Capacidade de público: 350 lugares.
Ingresso: R$ 30,00 (inteira) R$ 15,00 (meia-entrada).
Classificação Indicativa: 16 anos.
Duração: 70 minutos.
Gênero: Comédia.
 

 

 

 


Com Alexandre Lino, ator e idealizador do projeto.

 


Com Walter Daguerre, autor do texto.

 


Com Tuca Andrada, diretor do espetáculo.

 


Com Daniel Porto, da equipe de produção da peça.

 

 

 

 

 

(FOTOS: JANDERSON PIRES – cena -

e

MARISA SÁ – pessoais.)

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