sábado, 27 de setembro de 2014


UMA RELAÇÃO PORNOGRÁFICA
 
 
 
(“MONOTONIA” EXCITANTE.)
 
 
 
 
 
PHILIPPE BLASBAND, um iraniano, nascido em 1964, é um escritor, roteirista e cineasta, que mora em Bruxelas e escreve em francês.  No Brasil, não é muito conhecido, mesmo por aqueles que, como eu, respiram TEATRO.  Mas é dele o bom texto da peça que está em cartaz, no Teatro I do Centro Cultural Banco do Brasil, a que assisti e que me causou uma excelente impressão: UMA RELAÇÃO PORNOGRÁFICA.
Certamente, um título provocativo, como esse, será responsável por atrair pessoas à procura de algo picante , literalmente pornográfico, as quais sairão do teatro decepcionadas, a não ser que o seu conceito e definição para os dois vocábulos (picante, pornográfico) sejam diferentes dos que a eles são atribuídos. 
A tradução seguiu à risca o original : Une Liaison Pornographique.
Os dicionários de língua portuguesa, em sua quase totalidade, manifestam-se de formas diferentes, quanto ao adjetivo pornográfico:
  • Há os que ligam o termo a tudo o que se relaciona a devassidão sexual, obscenidade, licensiciosidade, indecância, imoralidade.... 
  • Um até diz que é a descrição ou representação de coisas consideradas obscenas, geralmente de caráter sexual”. 
  • Diz um outro: “Qualquer conteúdo que possui cenas ou imagens obscenas ou de apelo sexual.”
  • De forma totalmente exagerada e distorcida, um dicionarista afirma: “Estudo ou descrição da prostituição”.  É o mesmo que acrescenta ao verbete: “Qualquer coisa (livro, revista, filme etc.) de caráter sexual, com intenção de provocar excitação ou satisfação sexual das pessoas, quase sempre de maneira obscena, chula.
     
    Prefiro, e entendo melhor, o que diz a Wikipédia: qualquer expressão humana que desperta pensamentos sexuais.”
     
     
     
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     Guilherme Leme Garcia e Ana Beatriz Nogueira estrelam o texto de Philippe Blasband
     
     
     
               Pois bem!  E o que temos em cena, no palco do CCBB?
     
               Não há nada de devasso, imoral, obsceno, indecente, prostituição...  Há um apelo sexual, sim, que, até, poderá provocar excitação ou satisfação sexual na plateia.  Não foi o meu caso e creio que nem o de ninguém que lá estava naquela sessão.  E nem nas que já aconteceram ou acontecerão, a não ser que as pessoas não consigam atingir a proposta do espetáculo, que é apresentar um conflito, para que possam ser discutidos temas, como a solidão, o individualismo e a dificuldade de criar laços, desafiando, de forma crescente, preconceitos e valores do ser humano.
     
     
     
  
SINOPSE:
 
Um casal, ELE – anônimo (GUILHERME LEME GARCIA) e ELA – também anônima (ANA BEATRIZ NOGUEIRA), se conhece por meio de um “site” de relacionamento, encontra-se em um café e vai para um hotel. 
Eles passam a se encontrar toda semana, sempre no mesmo hotel.
Nenhum dos dois sabe nada da vida do outro; apenas sabem que querem realizar suas fantasias sexuais.
Nesses encontros, não falam de suas vidas íntimas, trabalho, endereços e nem mesmo de seu nomes.
Mas, com o passar do tempo, eles percebem uma inesperada afinidade, trazendo novas indagações a respeito dessa relação, ainda que o casal tente negar, ou lute para impedir, um inevitável envolvimento romântico.  Os sentimentos vão se tornando, aos poucos, complexos e envolventes.
 
 
 
Para o casal, não existe um passado nem lhe interessa o que vai acontecer no futuro.  O importante, o que tem sentido, e vale a pena, é viver o presente.  Anônimos, podem ser batizados com os nomes de quaisquer pessoas que assistem à peça.  Ou cada espectador pode subir ao palco e assumir seus desejos reprimidos, projetando-se nos personagens.
Para o diretor do espetáculo, VICTOR GARCIA PERALTA, a peça fala do medo que as pessoas têm de se entregar num relacionamento.  Começa como uma brincadeira, mas, no final, eles se envolvem.  Relacionamento requer trabalho, especialmente quando o auge da paixão passa, e muitos ainda fogem deste envolvimento”.
Antes de ser encenada, pela primeira vez, na Espanha, partindo para outras montagens, em vários outros países, sempre com sucesso garantido, UMA RELAÇÃO PORNOGRÁFICA foi levada às telas, em 1999, também com enorme sucesso de público e crítica.
 
 Os dois vão ter que lidar com a dificuldade da relação que se aprofunda


 
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FICHA TÉCNICA (com alguns comentários):
Autor: PHILIPPE BLASBAND – Bom texto, que começa simples e vai ganhando corpo, com o desenrolar do envolvimento entre o casal.  É construído de modo a levar o espectador a se tornar cúmplice naquela relação.  Apresenta algumas pitadas de um humor superficial, leve.  Desenrola-se por meio de diálogos e de solilóquios ou “conversas, algumas um pouco longas, com a plateia”.  Engana-se, porém, quem pensar que esse formato possa tornar o espetáculo monótono, enfadonho.  Isso não ocorre.  Ninguém consegue ficar desatento nem desinteressado durante os 75 minutos de texto e ação.
Tradução: LIANE LAZOSKI
Elenco: GUILHERME LEME GARCIA e ANA BEATRIZ NOGUEIRA – Os dois tarimbados atores parecem ter servido de inspiração ao autor do texto, tal é a maneira natural e correta como vestem as cores dos personagens.  GUILHERME e ANA exploram, com maestria, todos os detalhes das personalidades de ELE e ELA e valorizam determinadas discussões e situações, com uma perfeita modulação da voz, detalhe que enriquece suas atuações.
 


Ana Beatriz Nogueira e Guilerme Leme Garcia.
 


Direção: VICTOR GARCIA PERALTA – VICTOR optou por uma direção a mais discreta possível, sem grandes firulas, sem grandes movimentações, sem gestos largos, mas extraindo, dos atores, o máximo de emoção.  Fixou-se mais nos sentimentos e no que as palavras possam expressar que nos gestos e nas marcações, numa movimentação farta em cena.  Acreditou nas possibilidades dos atores, e acertou.  A princípio, o espectador pode achar que “a peça será chata”, o que, nem de perto, é uma verdade.
Assistente de Direção: PEDRO OSÓRIO
Iluminação: MANECO QUINDERÉ – Mais um grande acerto do MANECO.
Iluminador assistente: RUSSINHO MAFRA
Cenário: VICTOR GARCIA PERALTA e GUILHERME LEME GARCIA – Apenas duas cadeiras giratórias em cena.  Não precisa de mais nada.
Figurino: ANA BEATRIZ NOGUEIRA e GUILHERME LEME GARCIA – Justos.
Trilha Sonora: MARCELLO H – Excelente, como costumam ser todas as trilhas assinadas por ele.
Fotografia: MARCELO CORRÊA
Programação visual: ROBERTA DE FREITAS
Visagismo: ADRIANA ALVES
Operadora de som: GISA PITHAN
Vídeo release: FÁBIO NAGEL
Assessoria de imprensa: BIANCA SENNA
Produtora Executiva: SILVIA REZENDE
Direção de Produção: SÉRGIO SABOYA e SÍLVIA REZENDE
 


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SERVIÇO:
Local: Centro Cultural Banco do Brasil (Rua Primeiro de Março, 660 – Centro -  Rio de Janeiro)      Teatro I
Temporada: 19 de setembro a 19 de outubro
Horários: de quarta-feira a domingo, às 19h.
Duração: 75 min.
 
           

           Para encerrar esta resenha, lembrei-me de uma canção, de Caetano Veloso, chamada TÁ COMBINADO, que se encaixa, perfeitamente, nesta peça.

 
TÁ COMBINADO
(Caetano Veloso)
Então, tá combinado, é quase nada,

é tudo somente sexo e amizade.

Não tem nenhum engano nem mistério,

é tudo só brincadeira e verdade.

Podemos ver o mundo juntos,
sermos dois e sermos muitos,
nos sabermos sós, sem estarmos sós.

Abrirmos a cabeça,

para que, afinal, floresça

o mais que humano em nós.

Então, tá tudo dito e é tão bonito
e eu acredito num claro futuro

de música, ternura e aventura

pro equilibrista em cima do muro.
Mas e se o amor pra nós chegar,
de nós, de algum lugar,
com todo o seu tenebroso esplendor?
Mas e se o amor já está,
Se, há muito tempo, que chegou

e só nos enganou?

Então, não fale nada, apague a estrada

que seu caminhar já desenhou,

porque toda razão, toda palavra

vale nada, quando chega o amor...
 
 
 

 
 (FOTOS: MARCELO CORRÊA)
 
 

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