sábado, 20 de outubro de 2018


ARIANO –
O CAVALEIRO SERTANEJO


(UMA BELA E JUSTA HOMENAGEM
A UM DOS MAIS ILUSTRES BRASILEIROS.
ou
UMA MANEIRA MUITO DIGNA
DE UMA COMEMORAÇÃO.)






            Raramente, faço o que estou fazendo agora: escrever sobre um espetáculo que já saiu de cartaz. Não tenho a pretensão de achar que os meus escritos sejam capazes de encher os teatros do Rio de Janeiro, durante suas temporadas, por aqueles que me dão a honra de ler as minhas críticas, embora, sem cabotinismo, eu saiba que, querendo ou não, sou um formador de opinião e consigo despertar o interesse de um bom número de pessoas, as quais aceitam as minhas recomendações e vão aos teatros, para conferir sobre aquilo que leem, visto que só escrevo sobre espetáculos que me agradam, como já é sabido dos meus habituais leitores.

       Não é outro, então, o motivo que me impele a escrever, agora, sobre “ARIANO – O CAVALEIRO SERTANEJO”, espetáculo que adorei e que acabou de cumprir sua segunda brilhante temporada, no Teatro Glauce Rocha, no domingo, 14 de outubro de 2018. A primeira se deu no SESC Tijuca, entre 15 de junho e 8 de julho deste mesmo ano. Houve, ainda, apresentações esporádicas, em algumas unidades do SESC, no Rio de Janeiro.




           Durante a primeira temporada, eu estava fora do país e lamentei bastante não ter podido aceitar o convite da produção do espetáculo, entretanto fiquei feliz, quando me disseram que haveria, em outubro, uma segunda temporada, ainda que bastante curta, no Teatro Glauce Rocha, aonde fui, com bastante sacrifício, por estar convalescendo de uma fratura de fêmur, mas com muito prazer e curiosidade, no penúltimo dia da referida temporada. Era a minha oportunidade para matar o meu desejo de ver a peça, sobre a qual só ouvia comentários elogiosos e cuja temática gira em torno de uma das pessoas que mais admiro, neste país, ARIANO SUASSUNA, a quem tive a honra e o privilégio de conhecer e com a qual vivi a primazia de travar uma deliciosa e inesquecível conversa, de cerca de trinta minutos, talvez a mais importante, para mim, de todas as que já tive até hoje, em 2007, quando ele tinha 80 anos. Tenho uma confessa e escancarada admiração, paixão mesmo, por esse gênio, infelizmente, já não presente entre nós, desde 23 de julho de 2014, aos 87 anos. Mas a verdade é que ele ainda está, e sempre estará, presente nas nossas vidas, porque os gênios não morrem; perpetuam-se no imaginário e na cultura de um povo.



   

O espetáculo é MUITO BOM MESMO, superando todas as minhas melhores expectativas.







SINOPSE:

Com autoria e direção de RIBAMAR RIBEIRO, o novo espetáculo de OS CICLOMÁTICOS COMPANHIA DE TEATRO, que completa 22 anos de carreira, homenageia o grande autor ARIANO SUASSUNA.

SEIS CAVALEIROS à procura do lendário autor ARIANO SUASSUNA, invadem, com música e poesia, a fictícia cidade nordestina de ARMORIAL.

Eles contam e cantam sobre a lenda do cavaleiro nordestino, aquele que nasceu, amou, viveu e lutou, usando as armas mais potentes: a pena e a tinta.

O cavaleiro andante, de mistérios e mitos, deixou seu legado e perpetuou suas histórias e foi assim intitulado: ARIANO – O CAVALEIRO SERTANEJO

O espetáculo é uma viagem nas vivências populares: o cancioneiro, o sertanejo, o repente, o forró, o movimento armorial, o mamulengo e toda esta seara de possibilidades existentes no universo nordestino.







RIBAMAR RIBEIRO, que escreveu e dirigiu a peça, foi muito feliz nos dois momentos. Seu texto é muito simples, humano, lindo, divertido e de uma poesia profunda, leve como a alma de ARIANO. O autor entrelaça os diálogos, trocados pelos seis personagens, com pequenas narrativas, que vão marcando a trajetória de vida de um dos mais ilustres brasileiros de todos os tempos. E ainda nos brinda com referências de algumas peças de ARIANO. Como diretor, RIBAMAR conduz o fio da trama com ótimas e simples resoluções, aproveitando o excelente material humano de que dispõe e explorando, ao máximo, os parcos elementos físicos que tem em mãos. Como a ficha técnica do espetáculo não apresenta um nome responsável pela direção de movimento, excelente, por sinal, creio que todas as perfeitas movimentações do atores, em cena, bem como as coreografias, também possam ser creditadas a RIBAMAR.

O elenco é de primeiríssima qualidade. Não consegui enxergar alguém que se destacasse, no sexteto, uma vez que, quando um deles me parecia merecedor de ocupar um patamar acima dos demais, logo, surgia outro nas mesmas condições, e assim sucessivamente, de modo a ocuparem, os seis, o mesmo nível de destaque. São atores que não frequentam as mídias, o que não é motivo para possam que ser considerados excelentes profissionais, artistas completos, na interpretação, canto e dança. São eles, em ordem alfabética: CARLA MEIRELLES, FABÍOLA RODRIGUES, GETÚLIO NASCIMENTO, JÚLIO CÉSAR FERREIRA, NÍVEA NASCIMENTO e RENATO NEVES.




A peça é vendida como uma “comédia musical brasileira”, mas não consigo classificá-la, completamente, como um “musical”, por sua estrutura, naquilo que eu entendo como um “musical”, entretanto é inegável que muito contribui para a beleza e a qualidade do espetáculo a trilha sonora, composta por GETÚLIO NASCIMENTO, o “mentor musical”, digamos assim, da Companhia, contando com a colaboração de FABÍOLA RODRIGUES, na escrita das letras. GETÚLIO também responsável pela preparação para canto, ficando a preparação vocal sob a responsabilidade de JULIANA SANTOS. As canções compostas por GETÚLIO são deliciosas; brejeiras, as letras; envolventes, as melodias; e a gente sai do Teatro com partes delas na cabeça.

O espetáculo é franciscano, o que pode ser percebido logo que entramos na sala de exibição e nos deparamos com um cenário bem simples, de acordo, porém, com a cultural regional nordestina e que funciona muito bem, ao longo de toda a encenação. É assinado por GETÚLIO NASCIMENTO e CACHALOTE MATTOS.




O mesmo se pode dizer, em relação aos figurinos, feitos por ROBERTO DE BIASE, NÍVEA NASCIMENTO e ANDRÉ VITAL. Os dois últimos também confeccionaram os adereços, contando com a parceria de MAURO SOH.

A montagem conta com uma iluminação que não apresenta nenhum destaque, mas já traz consigo, pelo menos, a condição de funcionar corretamente e evidenciar detalhes que merecem estar mais em foco. Quem a assina é MAURO CARVALHO.

Se repararem bem, na ficha técnica, poderão observar que vários nomes aparecem em mais de uma atividade. Na “OS CICLOMÁTICOS COMPANHIA DE TEATRO”, todos “metem a mão na massa”, todos fazem um pouco de tudo. É “um por todos e todos um”. Trata-se de uma companhia que vive, e sobrevive, durante 22 anos, com muito amor e garra coletivos. Isso é muito bonito, edificante e merecedor de nossos aplausos e admiração. “(...) o grupo é formado por profissionais de diversas áreas, como atores, diretores, dramaturgos, cenógrafos, figurinistas, iluminadores e maquiadores. Completando 22 anos de existência, participou de festivais de teatro por todo país, Europa e América do Sul, conquistando diversos prêmios e indicações em todas as categorias. A Companhia desenvolve uma linguagem própria, através da dramaturgia cênica, revisitando autores de expressão mundial, tais como, Federico García Lorca e Sófocles, entre outros. Aposta na contemporaneidade da encenação, da escrita e na individualidade de cada integrante da Companhia, caracterizando a figura do multiartista”.






FICHA TÉCNICA:

Texto e Direção: Ribamar Ribeiro

Elenco: OS CICLOMÁTICOS COMPANHIA DE TEATRO: Carla Meirelles, Fabíola Rodrigues, Getúlio Nascimento, Júlio César Ferreira, Nívea Nascimento e Renato Neves

Músicas: Getúlio Nascimento
Cenografia: Getúlio Nascimento e Cachalote Mattos
Figurinos: André Vital, Nívea Nascimento e Roberto de Biase
Adereços: André Vital, Mauro Soh e Nívea Nascimento
Iluminação e Operação de Luz – Mauro Carvalho
Preparação Vocal: Juliana Santos
Preparação para Canto: Getúlio Nascimento
Sonoplastia: Getúlio Nascimento e Ribamar Ribeiro
Operador de Som – Ribamar Ribeiro
Programação Visual: Nívea Nascimento
Assessoria de Imprensa: Cláudia Bueno
Fotos: Zayra Lisboa
Realização: Os Ciclomáticos Cia. de Teatro







            Por motivos óbvios, esta crítica não vem acompanhada do SERVIÇO.






            Torço para que “ARIANO – O CAVALEIRO SERTANEJO” volte ao cartaz, pois, considerando que as sessões, no Teatro Glauce Rocha, foram, quase todas, com lotação esgotada, ainda há muita gente que deseja se deleitar com este ótimo espetáculo.






E VAMOS AO TEATRO!!!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI!!!

RESISTAMOS!!!

COMPARTILHEM ESTA CRÍTICA, PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!




O elenco e o autor e diretor.




(FOTOS: ZAYRA LISBOA.)

































quarta-feira, 17 de outubro de 2018


CARMEN


(RELEITURAS DE BOM GOSTO ME INTERESSAM.
ou
UM ESPETÁCULO VISCERAL.)



           


            Sinto um prazer especial, quando entro em contato com releituras de obras de arte, se feitas com extremo bom gosto e criatividade, como é o caso do espetáculo teatral “CARMEN”, em cartaz no Teatro Poeira (VER SERVIÇO.). Isso muito me interessa.

          Tendo origem na novela clássica, do historiador, arqueólogo, político e escritor romântico francês PRÓSPER MÉRRIMÉE (Paris, 1803 – Cannes, 1870), “CARMEN”, a história da “cigana que usa seus talentos de dança e canto para enfeitiçar e seduzir vários homens”, já foi transformada numa das mais célebres óperas de todos os tempos, a mais popular no mundo, talvez, composta pelo francês Georges Bizet, à qual não me canso de assistir; em balé, com várias versões, inclusive no emblemático Teatro Bolshoi; em diversos filmes, com destaque, a meu juízo, para o que foi dirigido por Carlos Saura, tendo, como protagonistas, Antonio Gades e Laura Del Sol; novela de televisão; e em peças teatrais, com várias montagens, seguindo a estrutura tradicional do TEATRO ou passando por adaptações, pelas diferentes visões de encenadores, no Brasil e em muitos outros países.




            Agora, somos apresentados a uma nova e arrojada releitura de “CARMEN”, sob as óticas de LUIZ FARINA, na criação dramatúrgica, e NELSON BASKERVILLE, na direção do espetáculo, idealizado pelo casal FLÁVIO TOLEZANI e NATALIA GONSALES, os quais protagonizam a peça, ao lado de VITOR VIEIRA.






            A montagem desembarcou no Rio de Janeiro, vinda de São Paulo, onde cumpriu uma brilhante carreira, com total sucesso de público e de crítica, em três temporadas seguidas, no Teatro Aliança Francesa, no Auditório MASP e no Tucarena.






SINOPSE:

CARMEN (NATALIA GONSALES) e JOSÉ (FLÁVIO TOLEZANI) vivem uma trágica paixão.
Na trama, ele narra o seu amor por ela e o motivo que o levou à prisão.
E ela, através do seu olhar, narra o seu ponto de vista em relação à história.
O espetáculo mistura ação e narração.
CARMEN é uma cigana, cuja beleza quente atrai e seduz os homens.
Aquele que se apresenta como sua presa e vítima, na trama, é o inocente soldado JOSÉ, o qual se torna totalmente obcecado, em sua louca paixão, a ponto de perder a farda, tornando-se seu amante, até o ponto de fazer parte de um bando de contrabandistas, amigos de sua amada.
Em nome da liberdade de amar, a cigana acaba deixando o pobre e iludido amante, trocando-o por um famoso toureiro.
O enfeitiçado e traído é tomado por um acesso de ira e ciúme, e as consequências são as mais trágicas possíveis.   






            Do original, ficou, nesta adaptação dramatúrgica, a ideia central da trama, um drama de amor e ódio, uma relação amoroso fatídica, ambientada na Sevilha do século XIX, mas que, aqui, pela temática e pela adaptação, pode ser considerada atemporal e passível de acontecer em qualquer lugar. LUIZ FARINA permitiu-se uma licença para omitir personagens e concentrar as ações, porém manteve intacto o eixo dramático da trama, num trabalho digno de todos os elogios.

          No formato de ópera, apresentada em quatro atos, o espetáculo dividiu muito as opiniões, quando de sua estreia, em 3 de maio de 1875, na Opéra-Comique de Paris, uma vez que foi considerada como um espetáculo “repugnante e obsceno”, chocando, quase que por completo, a plateia, acostumada a assistir a histórias “edificantes”, com finais felizes, muito distantes daquele espetáculo instigante e “impróprio”, no qual uma cigana, desprovida de qualquer moral, sem a menor sombra de remorso ou piedade, enfeitiçava e levava os homens à perdição. Por outro lado, houve, também, quem aplaudisse, ainda que em minoria, a obra, justificando que o autor da ópera, Bizet, queria pintar homens e mulheres de verdade, alucinados, atormentados pelas paixões, pela loucura”, como publicou, à época, o respeitável jornal Le National, de Paris, opinião embaixo da qual assino, reconhecendo, ainda, em Bizet, a intenção de, o mais deliberadamente possível, romper com os padrões da época.
            O fato é que o caráter transgressor da protagonista teria sido o grande responsável por toda a reação negativa do grande público, o que, aos poucos, foi sendo deixado de lado, tornando-se a ópera o sucesso que é, sempre que encenada, servindo de pontapé inicial para tantas outras explorações da obra, nas mais variadas formas artísticas, como já citado.







            CARMEN é uma personagem quase que totalmente aceita e, até mesmo, respeitada, hoje em dia, por seu empoderamento, pelo fato de representar o protótipo da mulher contemporânea, libertária, independente, digna representante de uma geração feminina que deseja ter vez e voz, numa sociedade explicitamente machista, e viver a vida livremente, mergulhada em fervilhantes paixões. Ela pregava, há quase um século e meio antes do que, felizmente, está acontecendo agora, à custa de muita luta, a liberação feminina, com frases emblemáticas, como “O amor é um pássaro rebelde que ninguém pode aprisionar...”; “[o amor] não adianta chamá-lo, pois ele só vem quando quer.”; “... e, quando pensa tê-lo aprisionado, ele se vai."; “O meu coração é livre como um pássaro!”; “Não tenho medo de nada. Carmen nunca cederá! Nasceu livre e livre morrerá!”. CARMEN é uma mulher que não teme a morte, fascinada pelo risco e capaz de prever o seu próprio e trágico destino.






            Interpretar CARMEN é um grande desafio, para qualquer atriz, das incipientes às mais tarimbadas. É preciso ter um bom estofo, para encarar a personagem, o que, para NATALIA GONSALES, não representa nenhum problema maior, uma vez que a atriz, de grande gabarito, entregou-se, de corpo e alma, a este trabalho, resultando numa belíssima e convincente atuação. NATALIA transpira sensualidade, por todos os poros, assim como, embora de pequena compleição física, do tipo “mignon”, cresce, no palco, agiganta-se e ocupa todos os espaços por onde transita, com muita garra e determinação. Sem falar no seu ótimo desempenho nas coreografias, uma vez que se iniciou, nas artes, pela dança. É um deleite vê-la atuando, com tanto desembaraço e amor à arte de representar!





            JOSÉ, um cabo do Exército, é um homem de boa índole, honesto e decente, que põe tudo a perder, não por sua própria culpa, mas porque “a carne é fraca”, e a alma idem, e ele se deixa enfeitiçar pelos encantos perigosos de CARMEN, cai na sua teia, tornando-se um fora da lei contumaz. No fundo, não passa de um pobre coitado, de uma grande vítima da desgraça em que se vê envolvido.

        FLÁVIO TOLEZANI, excelente “physique du role”, para representar o personagem, comporta-se com total correção, deixando bem à mostra o caráter de JOSÉ, principalmente nos seus momentos de desespero, de tormento. A sua fraqueza interior, por total dedicação àquele “amor bandido”, contrasta com seu porte físico. Acho esse detalhe muito interessante, na relação ator/personagem. Um corpo tão forte abriga uma alma tão frágil. Por conta disso, o personagem vai ao fundo do poço, chafurda na lama, da mesma forma como, em seus momentos de glória, desfruta, com grande saciedade e vigor, do corpo insaciável da amante.






            Junta-se aos talentos de NATALIA e FLÁVIO o ator VITOR VIEIRA, o terceiro vértice do triângulo amoroso, que lê pela mesma cartilha do casal e faz, também, um excelente trabalho de interpretação.







        Considero primorosa a direção de NELSON BASKERVILLE, por cujo trabalho, como diretor, já havia me apaixonado, desde quando assisti à sua montagem de “Luis Antonio – Gabriela”, espetáculo tão premiado, o qual vi três vezes, e mais o faria, se tivesse tido oportunidade. NELSON se utiliza, mais ou menos, nesta montagem, da mesma estética explorada em “Luis Antonio - Gabriela”, com elementos muito próximos aos daquele trabalho. Assina uma direção arrojada, moderna, tirando partido, ao máximo, de todos os elementos de que dispõe no palco, como o cenário e a iluminação, por exemplo, que merecem uma análise especial.



   


            Ouvi, sim, alguns comentários desabonadores, acerca do espetáculo, os quais respeito, porém dos quais discordo totalmente. Quem criticou, negativamente, a peça, em conversas particulares comigo, antes de eu ter assistido a ela, apontava dois motivos para rechaçá-la: o fato de já ter sido montada e remontada “n” vezes e, também, por não aceitar uma desconstrução de um espetáculo clássico. Não vejo o menor problema com relação às duas “justificativas”. O que é bom é eterno, os clássicos serão, sempre, clássicos, vistam as roupas que vestirem, e as histórias só mudam de espaço, tempo e personagens, mas quase todas continuam sempre atuais, em função da própria essência do ser humano, o qual não evolui como deveria. Quanto ao aspecto de reler o que alguém escreveu para outrem ler, vejo nisso um grande mérito, desde que não se descaracterize a obra.



            O centro da trama, infelizmente, se repete todos os dias, sob os mais diversos disfarces ou variações. Vale a pena reproduzir algumas palavras de NELSON BASKERVILLE, sobre o espetáculo, que podem abrir a mente de quem não o viu com bons olhos (foi uma minoria, felizmente) e auxiliar os que ainda assistirão a ele a compreender o porquê desta encenação e os objetivos do diretor, plenamente alcançados, com o que concordo totalmente: “O ponto de vista que nos interessa é o de CARMEN, a mulher assassinada, dentro de uma sociedade que pouco mudou de comportamento, ao longo dos séculos, que aceitou, brandamente, crimes famosos, cometidos contra mulheres, como os de Doca Street, Lindomar Castilho e, mais recentemente, o de Bruno, o goleiro. Crimes, muitas vezes, justificados, pela população, pelo comportamento lascivo das vítimas, como se isso não fosse aceito em situações invertidas relativas ao comportamento masculino. O homem pode. A mulher não. Nesta encenação, CARMEN morre, não porque seu comportamento justifique qualquer tipo de punição, mas porque JOSÉ é um homem, como tantos outros, doente, como a sociedade que o criou”. Considero muito lúcido esse depoimento.






           Extraído do “release” da peça, enviado por DOUGLAS PICCHETTI (POMBO CORREIO ASSESSORIA DE IMPRENSA), acho que vale a pena este registro: Procurar imagens disponíveisNa atual encenação, elementos clássicos, como a dança flamenca, os costumes ciganos, a tauromaquia (arte de tourear), entre outros, são ressignificados, ao som de guitarras distorcidas, microfones e coreografias, para que não reste dúvida de que estamos repetindo histórias tristes de amor, de paixões destruidoras”. E eu acrescento que tudo isso, aliado a outros fatores, faz com que o público, muito próximo à ação, se deixe transportar para o palco e sinta toda a emoção e a energia que de lá avança em sua direção.
Uma das ideias do projeto é resgatar os principais personagens, os quais, paulatinamente, passando de releitura a releitura, foram perdendo um pouco da sua essência original, criada por MÉRIMÉE, como o exemplo de CARMEN, que, de uma “figura esquiva e inconstante”, passou a um exemplo de “femme fatale”. Essa ideia serve “para que o público volte a se intrigar e querer decifrá-los”. A montagem conta com uma leitura desconstruída, em que se permite que “a construção cênica explore a cultura cigana, numa linguagem contemporânea”. Assim, vemos, no palco, uma fusão de linguagens artísticas: o TEATRO, a dança e a música.




            Há dois elementos técnicos, numa montagem teatral, que, quando dialogam bem, valorizam qualquer espetáculo e seus destaques são observados, com facilidade, pelo público. São eles o cenário e a luz, aqui exaltados por todas as pessoas com as quais tive a oportunidade de conversar sobre a peça. A mim, encantaram-me ambos e se completam perfeitamente. Cenografia e iluminação são assinados por uma única grande profissional, MARISA BENTIVEGNA, que se ocupou em imprimir interessantes metáforas no cenário, tão expressivo e difícil de ser descrito, em detalhes, e de uma serventia incrível à estética da direção. Cada detalhe do criativo cenário, cada cena são postos em evidência com a utilização de uma luz adequada a cada situação; mais vibrante, nos momentos de maior tensão; mais calma, nas cenas mais “calientes” e passionais. Não me canso de admirar e exaltar esse trabalho conjunto.






            A música original, de MARCELO PELLEGRINI, é de suma importância nesta encenação, criando estímulos para as situações e sensações que se deseja passar ao público. Ajuda a criar os ambientes próprios a cada cena, funciona quase como um quarto personagem.          

   Reconhecimento também merecem FERNANDA BUENO e ANDI EL CANIJO, respectivamente, responsáveis pela fantástica direção de movimento e coreografias, aquela, e pelo treinamento na dança flamenca, este.
           
         LEOPOLDO PACHECO e CAROL BADRA, que assinam os figurinos, optaram por manter as marcas dos trajes típicos espanhóis, sem, porém, repetir o que estamos acostumados a ver por aí, com o acréscimo de detalhes hodiernos e fora do universo original do enredo. Um acerto, acrescento.  






FICHA TÉCNICA:


Criação Dramatúrgica: Luíz Farina
Direção: Nelson Baskerville
Assistente de Direção: Janaína Suaudeau

Elenco: Natalia Gonsales, Flávio Tolezani e Vitor Vieira

Direção de Movimento e Coreografia: Fernanda Bueno
Flamenco: Andi El Canijo
Música Original: Marcelo Pellegrini
Cenário e Iluminação: Marisa Bentivegna
Figurino: Leopoldo Pacheco e Carol Badra
Designer Gráfico: Murilo Thaveira
Fotografia: Ronaldo Gutierrez
Técnico de Luz: Walace Furtado
Técnica de Som: Caio Nogueira e Joana Guimarães
Técnico de Palco: Daniel Benevides
Produção Executiva: Joana D´Aguiar
Realização: Bem Casado Produções Artísticas
Idealização: Natalia Gonsales e Flávio Tolezani












SERVIÇO:

Temporada: De 13 de setembro a 28 de outubro de 2018.
Local: Teatro Poeira.
Endereço: Rua São João Batista, 104, Botafogo - Rio de Janeiro – RJ.
Telefone: (21) 2537-8053.
Dias e Horários:  Às quintas-feiras, sextas-feiras e sábados, às 21h; aos domingos, às 19h.
Valor dos Ingressos: R$ 60,00 (inteira) e R$ 30,00 (meia-entrada).
Horário de Funcionamento da Bilheteria: De terça-feira a sábado, das 15h às 21h; domingo, das 15h às 19h.
Classificação Etária: 14 anos.
Duração: 70 minutos.
Capacidade: 150 lugares.
Gênero: Drama.

teatropoeira@teatropoeira.com.br
www.teatropoeira.com.br








            Que sempre surjam muitas novas releituras de grandes clássicos da literatura, no TEATRO, com a mesma qualidade deste grande espetáculo, que eu recomendo, com o maior empenho, e que procurarei rever, se me for possível, para me deliciar com uma ótima produção teatral.

Parabenizo, FLÁVIO TOLEZANI e NATALIA GONZALES, pela idealização desta montagem, assim como a todos os envolvidos neste arrojado e encantador projeto.








E VAMOS AO TEATRO!!!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI!!!

RESISTAMOS!!!

COMPARTILHEM ESTA CRÍTICA, PARA QUE, JUNTOS,
POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!











(FOTOS: RONALDO GUTIERREZ.)



GALERIA PARTICULAR:
(FOTOS: JOÃO PEDRO BARTHOLO.)


Com Natalia Gonsales.



Com Flávio Tolezani.