domingo, 11 de outubro de 2015


 

A NOIVA

DO

CONDUTOR

 

(DIGNA E MERECIDA HOMENAGEM. 

UMA CELEBRAÇÃO!!!)

 


 

 

Somente gênios conseguem viver apenas 26 anos e deixar, de legado, para a cultura de um país, um material tão volumoso e de excelente qualidade. NOEL ROSA (1910 / 1937) foi um desses gênios.

 

Além de cerca de trezentas canções, a maioria sucessos até hoje, gravadas e regravadas pelos maiores nomes da MPB, NOEL também trabalhou, como contratado da extinta Rádio Clube do Brasil, em 1935, com a incumbência de ser o responsável pela discoteca da emissora, escrever esquetes humorísticos (Conversas de Esquina), textos publicitários, além de adaptações e paródias de óperas famosas, prática muito comum nas rádios do Rio de Janeiro, naquela época.

 

A ideia das operetas radiofônicas consistia em se escolher uma música de um compositor conhecido e colocar, nela, uma nova letra, em português, que tratasse de assuntos do cotidiano ou da política da época. Foi o caso, por exemplo, de “O Barbeiro de Niterói”, calcada em “O Barbeiro de Sevilha”. Diferente das demais paródias operísticas, “A NOIVA DO CONDUTOR”, tem enredo e músicas originais, escritos por NOEL ROSA e ARNOLD GLUCKMANN.

 

 

A noiva do condutor-By Janderson Pires-92

 

 

 
SINOPSE:
 
A opereta conta a história de um condutor de bondes, JOAQUIM, interpretado por MARCELO NOGUEIRA, que se faz passar por um bem-sucedido advogado, “com escritório num arranha-céu da Avenida Central, com uma bela vista para a cidade”, a fim de conquistar o coração de sua amada, HELENA, IZABELLA BICALHO.   
 
A história segue com a oposição da família da moça, representada pelo pai, o DR. HENRIQUE, personagem de RODRIGO FAGUNDES, ao referido namoro e as peripécias de JOAQUIM, para conseguir o seu objetivo: casar com sua amada.
 
O severo pai da moça, desconfiado da sinceridade do rapaz, resolve visitá-lo, no tal “escritório”, porém, no dia em que resolve fazê-lo, na companhia da filha, embarcam num bonde e veem JOAQUIM em pleno exercício de sua verdadeira profissão: condutor.
 
Foi aí que “a casa caiu”!!!
 
Um misto de sentimentos envolve a cena: tristeza, descrença e decepção, por parte da mocinha; raiva, humilhação e desgosto, “justificáveis”, da parte do pai; e aflição, consternação e desespero, do rapaz, ao ser desmascarado. 
 

 

 

A noiva do condutor-By Janderson Pires-75

 

 

Apesar de ser uma peça bastante divertida, ingênua até, leve e romântica, no enredo, brasileiríssima, em seu formato, com bastantes pitadas de humor, ou, até, por causa disso, podem ser notadas, claramente, críticas contundentes aos valores morais dos personagens, representantes da sociedade carioca, revelando o apego ao dinheiro e ao “status” social, a maior valorização do “ter” sobre o “ser”, o material prevalecendo sobre os demais valores, a importância dada às “aparências”. Com humor e fina ironia, características fundamentais de toda a sua obra, encontradas, à farta, nas letras de suas canções, NOEL criou uma opereta tipicamente carioca, em que os valores mudam a todo instante, de acordo com a conveniência do momento. A pessoa “vale quanto pesa”; ou melhor, vale, mais ou menos, de acordo com o dinheiro que tem, a fortuna acumulada, não importando, inclusive, de que maneira ele tenha sido construída ou conquistada.

 

 

A noiva do condutor-By Janderson Pires-95

Rodrigo Fagundes, Marcelo Nogueira e Izabella Bicalho.

 

 


Idem.

 

Além de tudo isso, podemos considerar a obra bastante atual, pois, nela, já são constatados problemas e temas que estão presentes no cotidiano hodierno, tais como diferenças e injustiças sociais, preconceitos, conflitos de gerações, hipocrisia... 

 

            Concluída no início de 1936, infelizmente, a opereta não chegou a ir ao ar e permaneceu desconhecida, do grande público, por aproximadamente 50 anos, até que, em 1985, Marília Pêra e Grande Otelo, numa bela iniciativa, gravaram a obra num LP (Sugiro consultas na Internet).

 

 

 


Capa do LP.

 

 

A atual montagem do espetáculo comemora, portanto, duas datas importantes: os 80 anos de sua composição e os 30 anos da célebre gravação de Marília e Otelo. Isso sem falar que, estamos comemorando 450 anos de fundação da cidade do Rio de Janeiro, e ninguém melhor que NOEL ROSA para representar e traduzir o espírito carioca. É merecedora de grande louvor, portanto, a oportuna iniciativa de MARCELO NOGUEIRA e DJALMA THÜRLER, que nos proporcionam o contato com esta obra, quase inédita e de relevado valor histórico.

 

 

A noiva do condutor-By Janderson Pires-107

 



 


 

 

            MARCELO, que foi aluno de DJALMA, durante sua formação, como ator, na Escola de Teatro Martins Pena, anos depois de formado, num contato com o trabalho do antigo professor, na Universidade da Bahia, em Salvador, onde, atualmente, DJALMA desenvolve seu trabalho didático-profissional, encantou-se com a experiência que vivenciou naquela viagem e convidou o mestre para se associar ao projeto.

 

            A ideia de montar a opereta na sua versão original foi logo abandonada, uma vez que o seu tempo de duração ultrapassava, talvez, pouco mais de trinta minutos, o que seria impraticável, em se tratando de uma montagem teatral. Então, surgiu a brilhante ideia de mesclar o texto original, a íntegra da história, com cenas que homenageassem e exaltassem NOEL e sua importantíssima obra, além da utilização de algumas de suas canções, tudo inserido no contexto da obra. O emprego da metalinguagem, no espetáculo, fez com que ele atingisse um tempo de duração excelente, suficiente para os dois objetivos: apresentar uma opereta e homenagear um de seus autores, dos mais importantes para a Música Popular Brasileira.

 

O que é “extra opereta” é de excelente qualidade, uma vez que foram selecionadas algumas das mais representativas canções de NOEL e criados pequenos textos sobre detalhes de sua curta, porém profícua, passagem nesta vida. Ficou ótima, por exemplo, a inclusão de um poema erótico-pornográfico, recitado por MARCELO NOGUEIRA (não por JOAQUIM) e a utilização das canções, para costurar as cenas, mantendo-se, perfeitamente, a unidade do espetáculo. Isso é muito importante num musical, para que não fique evidente o ato de se interromper um texto, uma cena, para a inserção, sem pé nem cabeça, de uma canção.  Aqui, tudo está no seu devido lugar, à hora certa.

 

 


 

 


 



 


 

 

            Da boca do trio de atores, muito bem reforçado por ROBERTO BAHAL, que também colabora nos vocais, podemos ouvir variados ritmos musicais, desde suaves toadas e valsas, até o calor da rumba, passando pela embolada, a marcha, com predominância para o samba, gênero do qual NOEL “foi educado”, vindo a se tornar “bacharel”, o “Poeta da Vila”.

 

            Sobre o texto, não há muito mais a falar. Passemos, então, aos comentários acerca dos demais elementos que contribuem para esta ótima montagem:

 

1) Direção – Djalma Thürler – Competente. Talvez seu maior mérito tenha sido não complicar o que, por natureza, já é bem simples. Assim, notamos, em cena, aquilo que me foi confidenciado por MARCELO NOGUEIRA: o diretor deixou os atores bem livres, à vontade, para entrar e sair do personagem, sem estabelecer os tradicionais clichês para essa prática. O resultado disso é excelente. Permite aos espectadores um salutar exercício de tentar descobrir se “Agora, é o personagem ou é o ator?”. Muito bom isso!!!

 

Também aplaudo sua capacidade de dirigir atores, de modo a gerar uma boa cumplicidade com a plateia, a começar pela ideia de colocar MARCELO NOGUEIRA e RODRIGO FAGUNDES, já caracterizados, ainda fora do teatro, convidando o público a embarcar numa “viagem”. Descontrai e aproxima palco e plateia.  Funciona muito bem! 

 

2) Elenco – MARCELO NOGUEIRA (JOAQUIM), IZABELLA BICALHO (HELENA), RODRIGO FAGUNDES (DR. HENRIQUE) e ROBERTO BAHAL (em participação especial, como PAI DE JOAQUIM). Ótimo amálgama!

 

 


Elenco (da esquerda para a direita): Rodrigo Fagundes,

Marcelo Nogueira, Izabella Bicalho e Roberto Bahal.

 

 

MARCELO, além de bom ator, domina a técnica vocal, já que também tem formação na área. É estudioso, dedicado ao seu ofício, o que lhe rende excelentes atuações em musicais, como a mais recente, quando idealizou e protagonizou o espetáculo “Agnaldo Rayol – a Alma do Brasil”, numa interpretação inesquecível, irretocável, digna de todos os elogios.

 

Mas o foco, no momento, é sobre o personagem JOAQUIM, que MARCELO interpreta com maestria, tanto nos momentos em que prevalece a dramaturgia quanto nos números musicais. É detentor de uma bela e possante voz e de muita sensibilidade para o canto.

 

 

A noiva do condutor-By Janderson Pires-71

Marcelo Nogueira.

 

 

IZABELLA, com longa experiência em musicais, só faz ratificar seu talento incomensurável, que a coloca no rol das melhores “cantrizes” do TEATRO MUSICAL BRASILEIRO. Além de nos brindar com suas perfeitas interpretações musicais, ainda se destaca como atriz, numa perfeita simbiose com MARCELO, principalmente, e com RODRIGO FAGUNDES. 

 

RODRIGO, para mim, e, creio, para todos os espectadores, certamente, é a grande surpresa deste espetáculo. Seu talento, como ator cômico, é inquestionável, tantas vezes demonstrado na TV e nos palcos, que é o que nos interessa. Quando soube que fazia parte do elenco, fiquei curioso para vê-lo cantando. Dúvida cruel: RODRIGO canta? Reúne condições para aguentar uma opereta?  E a resposta é dada no palco: sim. Canta e está habilitado a fazer uma opereta.

 

O ator confessou que aceitara o papel, porém temeroso, uma vez que tinha medo de não corresponder às expectativas da direção, quanto ao quesito canto. Com muita dedicação e contando com o excelente trabalho de GLÓRIA CALVENTE, responsável pelos arranjos e pela direção musical, RODRIGO se empenhou, e mergulhou de cabeça, em aprender a cantar, num trabalho de voz que o levou a um resultado bastante satisfatório, para uma primeira experiência. Incentivo o querido ator a investir no canto. Já demonstrou que leva jeito para a coisa. É só continuar treinando e estudando mais.  Na parte dramática, está excelente, inclusive com seus “cacos”, precisos e muito engraçados.

 

 


 

 

ROBERTO BAHAL é um excelente músico, que, aqui, contribui, esporadicamente, como ator, dando conta do recado. Seu forte mesmo é o piano, embora também se apresente como violonista, maestro, compositor e arranjador. 

 

3) Fazem parte da pequena banda que acompanha os atores, além do piano de ROBERTO BAHAL, ANDREY CRUZ, nos sopros, e NÍLTON VILELA, na percussão, fazendo um som muito agradável aos ouvidos e interagindo com os atores e a plateia.

4) Cenário - JOSÉ DIAS projetou um cenografia que prima pela simplicidade e praticidade, deixando bastante liberdade, no palco, para o deslocamento dos atores. Utiliza poucos recursos cênicos, apenas o suficiente para servir de base à ação dos atores, como cadeiras, que se transformam em pequenas escadas; mesas de bar; e uma cortina, tipo persiana, no fundo, tomando todo o palco. Para ilustrar a cena em que uma canção alude às chamadas festas juninas, é utilizado um cordão, com bandeirinhas coloridas. Mas a grande sensação da cenografia é um bondinho de brinquedo, de controle remoto, circulando por um trilho, que toma toda a borda do palco, movimentando-se num vai e vem constante. O brinquedo foi importado e precisou de três profissionais para fazê-lo mover-se em cena.  E o resultado é bastante interessante.

5) Figurino -  Mais uma vez, rendo elogios aos ótimos figurinos da sempre competente CAROL LOBATO. São simples e funcionais, inseridos na proposta do espetáculo.

 


 

6) Iluminação -  AURÉLIO DE SIMONI é outro que abusa da simplicidade na peça, criando uma luz que, longe de qualquer sofisticação, serve a cada cena de forma sóbria, descomplicada e adequada.

 

7) Direção de Movimento -  A boa direção de movimento leva a assinatura de DUDA MAIA, uma das melhores profissionais do ramo, a julgar por alguns memoráveis trabalhos recentemente. Este só faz engrossar a sua lista de sucessos.

 

8) Direção Musical e Arranjos -  Muito competentes a direção musical e os arranjos, de GLÓRIA CALVENTE, em sua primeira assinatura oficial nesta área.  Começou com o pé direito.

 

 
FICHA TÉCNICA:
 
Texto e Músicas: Noel Rosa e Arnold Gluckmann
Direção: Djalma Thürler
 
Elenco: Izabella Bicalho, Marcelo Nogueira e Rodrigo Fagundes   -   Participação especial, como Pai do Condutor, Roberto Bahal
 
Direção Musical e Arranjos: Glória Calvente
Músicos: Roberto Bahal (piano e violão), Andrey Cruz (sopros) e Nílton Vilela (percussão)
Cenário: José Dias
Iluminação: Aurélio de Simoni
Figurinos: Carol Lobato
Preparação Vocal: Glória Calvente
Realização: Arte Mestra Produções
Direção de Produção e Idealização: Marcelo Nogueira
Produção Executiva: Lúdico Produções
Assessoria de Imprensa: Duetto Comunicação
 

 

 

 


Helena e Joaquim.

 

 

 
SERVIÇO:
 
Local: Centro Cultural dos Correios
Endereço: Rua Visconde de Itaboraí, 20 – Centro – RJ
Telefone: 2253-1580
Temporada: Até 13 de dezembro
Dias e Horários: De quinta-feira a domingo, sempre às 19h
Duração: 1h20min
Classificação: 12 anos
Gênero: Musical
Lotação: 200 lugares
Valor do Ingresso: R$ 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (meia-entrada)
 

 

 


 

 

            O espetáculo é uma múltipla celebração!!! A NOEL ROSA, ao Rio de Janeiro, à música e ao TEATRO MUSICAL BRASILEIRO. 

 

Acima de tudo, é uma celebração à vida!!! E isso é mais do que motivo suficiente para se ir ao teatro.  

 

 

(FOTOS: JANDERSON PIRES)

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