INCÊNDIOS - NEM
TODA A ÁGUA DE TODOS OS OCEANOS HÁ DE APAGAR.
Cartaz da peça - foto DP
(As fotos que ilustram esta matéria foram feitas pela divulgação da
peça – DP -, por Marisa Sá – MS – e pelo grande fotógrafo e amigo Léo ladeira –
LL.)
Estreou
ontem, 20 de setembro de 2013 (esta data
entrará para a História do TEATRO BRASILEIRO), para o grande público, o que
está parecendo ser o grande acontecimento teatral do ano, no Rio de Janeiro e
no Brasil: INCÊNDIOS (já encenada em
quinze países), peça do dramaturgo, ator e diretor libanês, radicado no Canadá,
com passagem por Paris, WAJDI MOUAWAD,
com direção de ADERBAL FREIRE-FILHO
e grande elenco, capitaneado por MARIETA
SEVERO.
Rodinha, antes da abertura da cortina. MERDA! - foto DP
O TEATRO precisa, sempre, de sangue novo,
de alguém que acredite nos seus sonhos e que não meça esforços por vê-los
concretizados. Aplaudo, de pé e
efusivamente, nomes como o de PABLO
SANÁBIO, por exemplo, e tantos outros jovens atores, diretores e
produtores, que vêm renovando o panorama teatral carioca, com coragem e
criatividade, mas, principalmente, acrescento, aos meus aplausos, um forte
grito de “BRAVO!” a dois “meninos”,
que se tornaram “homens” por conta de sua ousadia e paixão pelo TEATRO, como empreendedores. Refiro-me a ARLINDO LOPES e a FELIPE DE
CAROLIS.
Arlindo, por conseguir todos os afagos
de uma Glória Menezes, para o seu tão sonhado, lindo e bem-sucedido ENSINA-ME A VIVER, que durou cinco anos
de triplo sucesso (público, crítica e bilheteria) e Felipe, que marcou um golaço, ao tocar aquele canto especial no coração de Marieta Severo, toque este sem o qual
ela não se deixaria mobilizar por abraçar o sonho daquele jovem, recém-entrado
nos vinte anos.
E não é coincidência
o fato de os dois encantadores e grandiosos projetos terem sido abençoados pela
grande produtora Maria Siman, que
não é Midas, pois este transformava em ouro tudo aquilo em que tocava; Maria,
quando toca, é porque sente que ali já está, escondido, em estado bruto, o ouro
que ela vai ajudar a purificar. Foi o
que viu, há alguns anos, em Arlindo
e, mais recentemente, em Felipe.
Marieta Severo, Luciano Marcelo e Maria Siman - foto LL
A minha paixão
por INCÊNDIOS começou há bastante
tempo, desde que o idealizador do projeto, FELIPE
DE CAROLIS, me falou dele, com paixão maior ainda, sem fornecer maiores
detalhes a respeito do texto, pelo que, hoje, lhe sou muitíssimo grato. Explico: nos dez ou quinze minutos finais da
peça, ocorre uma grande revelação, que, se previamente sabida, causaria o mesmo
sentimento vivenciado por uma criança, ao flagrar o pai, sem ao menos uma
fantasia barata de Papai Noel, colocando, sorrateiramente, o presente de Natal
no sapatinho.
Queria muito
ter assistido a, pelo menos, um ensaio da peça, pois a minha ansiedade era
enorme, e só fazia crescer, a cada vez que o assunto vinha à tona, mas,
felizmente, não levei a efeito tal propósito, porque seria quebrado o tão
celebrado encanto, o mistério da surpresa, guardada, de forma genial, pelo
autor, para o desfecho da trama.
Acompanhei a
gestação a distância, por mensagens trocadas com Felipe (Facebook ),
por longos telefonemas, por raros encontros com ele e por um diálogo relâmpago,
com Aderbal Freire-Filho, num casual e rápido encontro, num fim de tarde, princípio de
noite, no SESC Casa da Gávea, com o testemunho da querida Vera Fajardo.
Cena da peça - foto DP
Cena da peça - foto DP
Quase não pude
encontrar o Felipe, pessoalmente, para conversar sobre esse grande projeto,
porque, nos últimos dois anos, ele respirou INCÊNDIOS, 25 horas por dia.
Não poderia, então, ser diferente o resultado deste parto: um dos bebês mais
lindos e saudáveis que já vi nascer, em toda a minha vida, num palco.
Assim,
consegui suportar o tempo trabalhando de bandido contra mim, até que, com muita
expectativa, o dia 14 de setembro de 2013 chegou e fui levado ao Teatro Poeira,
a uma sessão especial, para convidados.
Nunca partira, antes, para uma estreia com tanta ansiedade. Ao mesmo tempo, cercava-me o fantasma de uma
frustração. E se não fosse o que eu
esperava? Às vezes, excesso de
expectativa não é bom. Excesso de
expectativa chama-se “ansiedade”.
Mas não foi o que aconteceu com relação a INCÊNDIOS. Muito pelo contrário, o que vi, no simpático palco do Teatro Poeira (obrigado, Marieta Severo e Andrea Beltrão), foi muito mais do que eu já esperava. Superou, em proporções gigantescas, todas as minhas melhores expectativas.
Mas não foi o que aconteceu com relação a INCÊNDIOS. Muito pelo contrário, o que vi, no simpático palco do Teatro Poeira (obrigado, Marieta Severo e Andrea Beltrão), foi muito mais do que eu já esperava. Superou, em proporções gigantescas, todas as minhas melhores expectativas.
A
primeira agradável surpresa já vem ao encontro do espectador, quando este
recebe o programa da peça, uma verdadeira obra de arte. Impressiona, não só pelas grandes proporções,
mas também pela qualidade do material utilizado na sua confecção e, acima de
tudo, pelo conteúdo. Um bom programa de TEATRO não pode apenas se limitar a
apresentar a ficha técnica do espetáculo, fazer pequenos agradecimentos,
mostrar algumas fotos dos atores e de cenas, e outros tipos de ilustrações, e
poucos textos, limitados a pequenos e superficiais depoimentos, como é hábito se
ver, deste ou daquele elemento da equipe.
O programa de INCÊNDIOS, marca registrada das
produções de Maria Siman (os de ENSINA-ME
A VIVER e EDUKATORS são outras
duas joias), prima por tudo o que já foi relacionado e traz, ainda, artigos
profundos sobre detalhes do texto, do espetáculo em si, da produção, do autor,
além de lindas fotos e um texto brilhante do grande jornalista e professor de
Relações Internacionais, Renato Galeno, sobre a Guerra Civil do Líbano e sua
consequências, o que auxilia bastante o espectador a mergulhar no universo do
autor e a compreender melhor a proposta do texto e do espetáculo. Também são antológicos os comentários de
Aderbal sobre os OBJETOS DE CENA. Lindo!
Marieta Severo, com o livro que traz o texto da peça - foto LL
São 120
minutos de uma aula de tudo: de dramaturgia, de interpretação, de direção, de
cenografia, de figurino, de luz, de trilha sonora, de História, de
Humanidade...
Aqui, passo a
fazer uma sinopse, bem sintetizada, mesmo, da peça, resguardando, omitindo os
detalhes que poderiam embotar a surpresa final.
Hão de perceber, os pacientes amigos que me dão a honra desta leitura,
que se pode admitir estar diante de um texto com visíveis características de
uma tragédia grega, com roupas e adereços contemporâneos, porém:
Trata-se da história de Nawal, uma mulher misteriosa, que sempre se mostrou
distante e pouco carinhosa com os filhos gêmeos, Simon e Jeanne. Ela passa seus últimos anos em voluntário exílio no
Ocidente, onde morre. No dia da morte da mãe, após
esta ter ficado muda por cinco anos, no entanto, eles descobrem o possível
motivo desse distanciamento. Entre
alguns desconfortáveis últimos pedidos, a mulher, por meio de um tabelião,
entrega duas cartas aos jovens e pede que elas sejam levadas aos
destinatários. Uma é para o pai, que
eles sempre pensaram que estivesse morto, e a outra é para um irmão, de cuja
existência eles eles nem sabiam.
Simon prefere fixar-se numa possível
carreira de boxer e ignorar estes novos fatos da sua vida, mas Jeanne decide
respeitar o desejo da mãe e parte para o Oriente Médio. Nessa busca pelo pai e pelo irmão, porém, ela
e, posteriormente, o irmão descobrem quem era a verdadeira Nawal, uma mulher
excepcional, com a vida marcada pela guerra, pela desgraça e pelo ódio.
“É a história de três
destinos que buscam suas origens, em uma tentativa de solucionar a equação de
suas existências”, resumiu Mouawad na apresentação da primeira montagem da
peça.
‘’INCÊNDIOS” não é, propriamente, uma peça sobre a guerra, mas
sobre promessas que não são cumpridas, sobre tentativas desesperadas de consolo,
sobre maneiras de se permanecer humano em um contexto desumano”, resumiu o
autor após receber o Prêmio Molière pelo texto.
Público ovaciona, de pé, o final do espetáculo - foto LL
Pequenas, e
sinceras, considerações sobre cada uma das peças do tabuleiro em que se joga INCÊNDIOS:
O ELENCO: (Muito deixará de ser dito
sobre os trabalhos anteriores dos atores, do diretor e dos demais profissionais
envolvidos no projeto, uma vez que o programa da peça já o faz, e de forma
impecável):
MARIETA SEVERO: Nawal (dos 14 aos 65
anos). Não serei eu a gastar tempo desnecessário
para dizer o óbvio sobre ela. É uma
atriz digna dos mais elevados patamares no universo teatral, em termos de
Brasil e fora das nossas fronteiras, sem nenhum exagero. Aqui, Marieta
encarna Nawal, que bem poderia se chamar Zuzu Angel (a cuja memória ela dedica
o espetáculo), Maria, Clarice, Aurora, Glória, Zefa, qualquer uma dos milhares
de mulheres brasileiras que, assim como também os homens, sofreram nos porões
da ditadura militar, e de outras mulheres, que, ainda hoje, sofrem sob uma
ditadura civil, travestida de democracia.
Sua personagem fala português e pode ser encontrada nas filas dos
ônibus, nos supermercados ou em qualquer lugar de alguma metrópole ou cidade do
interior deste Brasil.
A Nawal de Marieta foi nascendo de toda uma
vivência de mulher que teve de abandonar o país, numa época em que era perigoso
falar, reclamar, protestar contra o regime de exceção imposto pelos militares. Pela boca da personagem, Marieta provoca, naqueles que conhecem o horror da ditadura militar,
um sentimento de resgate da necessidade de se impor contra as arbitrariedades e
crimes praticados pela força da opressão.
A vingança de Nawal é a nossa vingança; o grito de Nawal é o nosso
grito; as lágrimas de Nawal são as nossas lágrimas; o sentimento de Nawal é o
nosso sentimento.
Marieta Severo é muito mais que uma
atriz; é uma profissional que, por conhecer o verdadeiro papel social do ator,
sabe utilizar todos os veículos de comunicação para servir de porta-voz dos
nossos anseios. Numa época conturbada,
como a que presenciamos, Nawal representa a mulher que não aceita ser somente
uma mera coadjuvante passiva, contadora de uma história; ela é mais uma
representante daquelas que lutam pela valorização da dignidade feminina. Mais que isto: é o retrato da resistência às
atrocidades que vêm sendo cometidas, há séculos, contra as mulheres, e que não
encontram mais eco nos dias de hoje.
É uma
personagem de dificílima construção e que poucas atrizes, como ela, estão aptas
a sustentar em cena, principalmente com a perfeição como está representada no
palco do Teatro Poeira.
Sua maneira de
representar cativa e, ao mesmo tempo, provoca o espectador, desde sua primeira
aparição em cena, e mostra toda a riqueza e força de uma personagem que, em
princípio, provoca um certo sentimento no público, mais tarde modificado,
quando se percebe que, mais uma vez, “os meios justificam os fins” (ou será o
contrário?) (Evoé, Maquiavel!)
É um trabalho
que ficará, para sempre, na galeria dos grandes personagens do TEATRO
BRASILEIRO e que se juntará a tantos outros já vividos pela grande Marieta Severo. Nota máxima!
Aprovada com medalha de ouro (cacoete do professor).
FELIPE DE CAROLIS: Quando o vi, pela
primeira vez, aos 19 anos, na pele do frágil, ingênuo, atormentado e humilhado
Ernst, em O
DESPERTAR DA PRIMAVERA, reconheci nele um talento
que começava a brotar e que tinha tudo para crescer, desde que lhe dessem campo
para isso. Não foi preciso, pois ele
mesmo o buscou. Desde que travou
conhecimento com Simon, seu personagem nesta peça, Felipe se apaixonou por ele, e por toda a história, e decidiu que
teria de fazê-lo. E não esperou que o
convidassem; comprou os direitos da peça, em transação direta com os detentores
dos direitos autorais, em Paris, e tratou de procurar parcerias para montar o
espetáculo. Quanta determinação e quanto
talento!
É difícil, às
vezes, estabelecer uma diferença entre protagonista e coadjuvante. Na minha modesta visão, Nawal e os dois
filhos gêmeos, Simon e Jeanne, formam o trio de protagonistas da trama. Felipe,
o nosso doce e querido Fil, no papel
de Simon, demonstra um amadurecimento profissional impressionante, fruto de
muito trabalho e dedicação; obstinação, mesmo.
Adormeceu o menino e nasceu o HOMEM. Após seu trabalho em O
DESPERTAR DA
PRIMAVERA, pode-se dizer que INCÊNDIOS
é um divisor de águas, o de maior relevância, em sua carreira, que ainda cheira
a azedo de uma golfada de bebê, visto que, entre as duas, salvo melhor juízo,
apenas teve uma atuação meio relâmpago, no elenco de BEATLES NUM CÉU DE DIAMANTES, no encerramento de uma longa carreira
de sucesso, de cinco anos, daquele musical, merecidíssimo, diga-se
passagem.
Felipe e seu Simon sabem dosar momentos
de maior intensidade com outros de menos exigência física e dramática. É bela a sua figura em cena; é emocionante a
sua atuação; é brilhante a sua trajetória, se levados em consideração alguns
obstáculos, de ordem particular (saúde), que esse grande artista soube
transpor, para chegar a um "incendiário".
Aprovado, com a nota máxima, em todas as disciplinas, e numa, em
especial: a nossa grande amizade.
Felipe de Carolis (meu orgulho) - foto LL
KELI FREITAS: Uma agradabilíssima
surpresa. Conheço vários trabalhos dela,
como atriz, no teatro, no cinema e na TV, e como assistente de direção, mas sempre
a vi em trabalhos de menor expressão (não de menor importância), porém nunca
envolvida num projeto do porte de INCÊNDIOS.
Merece todo o
respeito de quem conhece, de perto, as dificuldades para se fazer TEATRO no Brasil, ela que foi agregada
ao elenco em pleno desenvolvimento do processo, há pouco mais de um mês antes da
estreia, em substituição a outra atriz, que precisou abandonar o elenco. Keli
foi muito corajosa, ao aceitar o convite e o grande desafio de dar vida a
Jeanne, papel muito difícil e igualmente importante no enredo.
Ela dá um
brilho especial à sua personagem, a gêmea de Simon, e representa um contraponto
às atitudes e pensamentos mais radicais e extremos do irmão. É ótima a química entre os dois jovens e
talentosos atores, numa cumplicidade que nos encanta e que faz fortalecer, um
no outro, a obrigação de fazer cumprir o desejo da mãe.
Jeanne parece
ver a atitude de Nawal (NÃO POSSO DIZER,
PARA NÃO QUEBRAR O ENCANTO), como uma falta de alternativa e, talvez, por
também ser mulher, sabe que, no fundo, seria capaz de fazer o mesmo.
Linda presença
em cena. Preenche , plenamente, todo
o espaço que lhe é conferido na trama.
Também aprovada, sem qualquer comentário negativo (antes, com todos os
elogios), em todas as disciplinas. Grande atriz da nova safra.
KELZY ECARD: Meu Deus! Que atriz!
Como eu sou fã do trabalho dessa profissional! Acompanho sua carreira, há muitos anos (acho
que jamais deixei de ver um trabalho dela), e, a cada novo trabalho seu, digo a
mim mesmo: FOI O MELHOR TRABALHO DELA
ATÉ HOJE. DIFÍCIL SE SUPERAR! E não é que não aprendo?! Vivo a queimar a língua, a cada novo
personagem criado por Kelzy. Quando o elenco de INCÊNDIOS estava sendo formado, e eu ia conhecendo, um a um, cada
novo integrante, tão logo soube que ela havia sido convidada, pensei: LÁ VAI A KELZY ME FAZER QUEBRAR A CARA MAIS
UMA VEZ. Só que, desta vez, ela me
quebrou por inteiro. Sua Sawda é incrível,
fantástica, digna de todos os elogios. É
forte, guerreira, amiga, um porto seguro para sua fiel confidente Nawal, embora
tenha sido esta a responsável por seu crescimento como mulher, como ser
humano.
Kelzy é uma atriz de TEATRO.
Desconhecida do grande público, é, porém, unanimidade entre seus pares e
os frequentadores dos teatros: uma atriz com “A maiúsculo”. Investe todas
as fichas em cada personagem ao qual dá vida e isso faz dela, sem a menor sombra
de dúvidas, uma das melhores atrizes brasileiras. Nem pensar em ficar em recuperação. Passou direto, com prêmio
de aluna modelo.
MÁRCIO VITO: Outro grande ator, que já
carrega, em seu currículo, uma gama enorme de grandes papéis. Muito oportuna a seu escalação para o elenco,
e ele corresponde, plenamente, a todas as expectativas, no papel de Hermile
Lebel, o tabelião, que tem uma tarefa muito importante na trama, a ser
conferida por quem me honra com a leitura destes comentários. Seu personagem, por meio de alguns vícios de
linguagem ou repetições de frases feitas, confere, em determinadas cenas, um
toque de leve humor ao denso texto, o que é muito bom, para evitar que haja
algum mal súbito (acabo de revelar a minha idade) na plateia (só para
descontrair um pouco). Seu personagem
ajuda no fio condutor da história e é, também, bastante importante na
trama. Márcio merece o mesmo destino dos demais alunos da classe:
aprovação sem restrições.
Márcio Vito - foto LL
ISAAC BERNAT: Admiro seu trabalho faz
tempo. Grande ator, de muitos recursos
técnicos, e excelente diretor. Por
coincidência, no Teatro Poeirinha, o simpático lugar contíguo ao Poeira, está
em cartaz um delicioso espetáculo sob sua direção: CALANGO DEU – OS CAUSOS DE DONA ZANINHA. Isaac
se desdobra, com perfeição, em sete personagens, sendo
um deles o responsável pelo golpe que leva o espectador ao nocaute emocional,
no quase fechar das cortinas. Firme e
competente, como sempre, em todos os personagens. Nem pensar em recuperação. Também passa direto. Igualmente, com louvor.
Isaac Bernat - foto LL
FABIANNA DE MELLO E SOUZA: Excelente
atriz, ótima em todos os cinco papéis que faz na peça. Dona de uma personalidade forte, como atriz,
e de uma comovente presença em
cena. Sua formação na
área teatral extrapola o único ato de representar, o que lhe confere um jeito
todo especial e ótimo de explorar seus personagens e o espaço cênico. Também vai cursar a série subsequente, no
próximo ano.
Fabiana de Mello e Souza - foto LL
JÚLIO MACHADO: Não conhecia o trabalho
deste ator. Era o único do elenco que se
apresentava, para mim, como uma incógnita.
Um detalhe, porém, não me causava grande apreensão: Jamais Aderbal
Freire-Filho convidaria, para o elenco de um espetáculo sob sua assinatura,
alguém incapaz de mostrar serviço. Mas
faltava conferir. Conferi. Ótimo ator, perfeitamente entrosado com os companheiros
de cena, dá conta, na medida exata, de cada um dos personagens que representa
na trama. Sabe fazer uso muito bem da
expressão corporal e, por meio deste recurso, diz, por vezes, muito mais que o
conteúdo significativo das palavras.
Agradou-me muito a sua atuação. Quase ia esquecendo: Aprovado, sem qualquer recuperação.
DIREÇÃO: ADERBAL FREIRE-FILHO – Mais um desafio, cumprido, na carreira de um
dos melhores diretores de TEATRO do
Brasil. Desafio diferente de tantos
outros encarados por ele, como o de adaptar, para o teatro, obras narrativas de
tanta beleza e complexidade, como O
PÚLCARO BÚLGARO; MOBY DICK; SOROCO, SUA MÃE, SUA FILHA; ou de
adaptar obras de outras mídias para o palco; ou de escrever para o TEATRO, como a recente, e fantástica, JACINTA, estrelada pela magnífica Andrea Beltrão, fechando temporada em São Paulo , depois de
meses de sucesso no mesmo Teatro Poeira.
Desta vez, Aderbal tinha em mãos uma peça; não, um
belíssimo e complexo texto, com cenas as mais variadas possíveis, passados em
diversos espaços, o que, numa versão cinematográfica (existe a do filme INCÊNDIOS), não e problema. Difícil é fazer tudo isso acontecer num
palco, sem intervalos de atos, sem “black-outs”, para as necessárias trocas de
cenários. Pois bem, ele conseguiu um
excelente efeito, fazendo uso, unicamente de sua criatividade, imaginação,
inteligência e profundo bom gosto estético.
Na condução da
forma de atuar e de construir os personagens, soube extrair de cada ator/atriz
o máximo do rendimento técnico de cada um, com o grande mérito de não permitir
(o que seria muito fácil acontecer) que algum deles atingisse o desagradável nível
da pieguice. Não há exageros nem carências
de emoção em cada cena. Lá está, firme,
o dedo do competentíssimo Aderbal.
Aderbal Freire-Filho e Marieta Severo - foto LL
CENÁRIO (e OBJETOS DE CENA), de Fernando
Mello da Costa - simples e suficiente.
Três paredões, de telas de arame, malha larga, sobrepostas, com portas
laterais, que vão do chão ao teto.
Causam um sentimento meio claustrofóbico, para os que sofrem de tal mal,
ou, no mínimo, provocam um inicial, e bendito, mal-estar aos espectadores, pois
limitam, geográfica e propositadamente, o local em que se passam cenas nos mais
diferentes espaços, inclusive externos.
Muito interessante. No chão, à esquerda,
uma bicicleta deitada, quase no proscênio, se é que se pode falar deste no
Teatro Poeira.
Pelas portas,
elementos de cena, como mesas, cadeiras, baldes e outros são introduzidos e
postos em seus devidos lugares, de acordo com a exigência de cada cena. Tudo parcimoniosamente, apenas para sugerir
espaços, o que se trona um excelente exercício de imaginação e criatividade
para o espectador. O mínimo possível de
peças para o máximo possível de ação e emoção.
Recurso fantástico, mérito da ação conjunta de diretor e cenógrafo.
FIGURINOS: Antônio Medeiros, competente como sempre, um dos melhores
profissionais do ramo, na TV e no teatro (vários trabalhos premiados e com
alguns excelentes nos últimos anos), assina os figurinos. São ótimos, funcionais e - um detalhe
importante - parecem ser meio atemporais e não revelar, de forma muito explícita,
detalhes do espaço geográfico em que se passa a trama. Nota-se, perfeitamente, que a ação pode ser
passada, em determinadas cenas, numa urbe qualquer e, na maioria das vezes, num
interior, que, pode nos reportar a uma aldeia oriental, ou de algum país
europeu, ou, até mesmo, a uma vila do interior brasileiro. Não creio que eu tenha “viajado” muito nestes
comentários, mas assim me pareceram os figurinos de Medeiros. Compõem, na medida
certa, todos os personagens. Seja terno,
seja um traje típico local, a elegância e a sobriedade são a tônica dos
figurinos.
TRILHA SONORA: Tato Taborda – perfeita, para sublinhar as ações.
LUZ: Luiz Paulo Nenen – no tom exato do espetáculo. Cresce e diminui, a cada exigência
dramática. Valoriza o que deve ser
valorizado. Excelente, como todos os
seus trabalhos.
DIREÇÃO DE MOVIMENTO: Márcia Rubin – uma das mais
requisitadas profissionais do ramo, nos últimos tempos. Mais um excelente trabalho de Márcia.
Uma bela colaboração para a montagem.
Excelente simbiose entre ela e o diretor do espetáculo.
VISAGISMO: Lu de Morais – bom trabalho na composição dos diversos personagens.
DIREÇÃO DE PRODUÇÃO: Maria Siman (Primeira Página Produções:
Luciano Marcelo, Paula Sales, Bruna Ayres, Joana D’aguiar) – Maria Siman não poderia estar fora
deste projeto. O requinte e todos os
cuidados nesta produção levam a marca da Primeira Página Produções. Sem maiores comentários: Maria Siman é uma das maiores produtoras de TEATRO deste país.
Em que pesem a
grandeza do elenco, da maior qualidade, uma primorosa direção e todos os demais
elementos de apoio para a montagem, a grande estrela deste espetáculo é o
texto, de Wadji Mouawad, capaz de
levar o espectador mais insensível ao auge da emoção. Faz parte de uma quadrilogia do autor (LITORAL, anterior a INCÊNDIOS, e mais duas outras peças a
serem escritas – ou já foram?), cujos direitos de encenação, no Brasil, (das outras
três), segundo consta, já foram adquiridos por Aderbal Freire-Filho. A ser
verdade, tomara que o Teatro Poeira passe a ser a residência fixa, no Brasil,
do consagrado dramaturgo libanês. Seja
bem-vindo, Wadji Mouawad! E tomara que o Google Tradutor não me tenha
traído nem me colocado numa saia justa:
نرحب Wadji معوض!
FICHA
TÉCNICA:
Texto: Wajdi Mouawad
Tradução: Angela Leite Lopes
Direção: Aderbal Freire-Filho
Assistente de Direção: Fernando Philbert
Direção de Movimento: Márcia Rubin
Direção de Movimento: Márcia Rubin
Elenco: Marieta Severo, Felipe de Carolis, Keli Freitas, Márcio Vito, Kelzy Ecard, Fabianna de Mello e Souza,
Júlio Machado e Isaac Bernat
Cenografia: Fernando Mello da Costa
Iluminação: Luiz Paulo Nenen
Figurinos: Antonio Medeiros
Trilha Sonora: Tato Taborda
Direção de Produção: Maria Siman
Produção Executiva: Luciano Marcelo
Produtores: Felipe de Carolis, Maria
Siman e Marieta Severo
Produtor Associado: Pablo Sanábio
Idealização do Projeto: Felipe de Carolis
Realização: Emerge, Primeira Página
Produções e Teatro Poeira
Aplausos e agradecimentos - foto DP
SERVIÇO:
Teatro Poeira:
Rua São João Batista, 104 – Botafogo. Tel: 2537-8053
Temporada: de 20
de setembro a 22 de dezembro. Quintas,
sextas e sábados, às 21h. Domingos, às 19h
Ingressos a R$
70,00 (qui) e R$ 90,00 (sex a dom)
Duração: 120
minutos
Classificação
etária: 14 anos
Lotação: 120
lugares
FLAGRANTES DE ILUSTRES PRESENÇAS NA ESTREIA PARA CONVIDADOS:
Charles Fricks, Renata Mizhari, Rodrigo Pandolfo e Malu Rodrigues - foto MS
Andrea Beltrão, recuperando-se de um acidente em cena - relaxamento após a tensão do espetáculo - foto LL
Maria Siman e Renata Sorrah - foto LL
Relembrando O DESPERTAR DA PRIMAVERA: Letícia Colin, Felipe de Carolis e Mariah Viamonte - foto LL
Suzana Nascimento (CALANGO DEU, no Poeirinha) foto LL
Dudu Sandroni, preparando-se para voltar à cena, para a nossa alegria - foto LL
Rememorando belíssima cena de O DESPERTAR DA PRIMAVERA - Felipe de Carolis e Thiago Amaral - foto LL
Duas grandes gerações de atores: Gracindo Júnior e Felipe de Carolis - foto LL
Marieta Severo e Andrea Beltrão: mais que duas grandes atrizes, amigas e sócias - foto LL
Pablo Sanábio e Solange Badin - foto LL
Maria Siman, Maria Padilha e Ary Coslov
Letícia Isnard, com Luciano Marcelo e Isaac Bernat
Isaac Bernat e Maria Clara Gueiros
Andrea Beltrão, Fabianna de Mello e Souza e Débora Colker
Felipe de Carolis e Malu Valle - foto LL
Maravilhosa e completíssima sua critica sobre INCÊNDIOS,vou reler várias vezes! Gilberto Bartholo você é um gênio!
ResponderExcluirDepois de ter assistido ao espetáculo foi que li que a atriz Marieta Severo, no seu trabalho de criação da personagem teria ido buscar as "marias" torturadas física e emocionalmente nos obscuros ANOS DE CHUMBO no Brasil. Mas eu, durante o espetáculo tracei esse paralelo. Não foi nada racional, nem vício profissional de historiadora, mas foi em minha emoção, na memória histórica, aí talvez entre o lado profissional, pois não vivi como adulta esse período. O tempo todo minhas angústias, minha dor, minhas lágrimas(muitas) remetiam a esse lugar em mim. Incrível ler depois sobre esse processo criativo. Agora porque falo isso? Para que ninguém pense que tem que conhecer sobre o Líbano e sua complexa história para assistir esse espetáculo. É, como já disse Gilberto, o próprio autor, diretor, atores, enfim, todos que se deparam com o texto; ele é basicamente sobre relações humanas. Que texto!
ResponderExcluirNão, nada de fazer análise do texto, foi só um UFA, para tentar tomar , retomar o fôlego.
Gilberto concordo em gênero, número e grau com tudo que de forma muito apaixonada você disse aqui. Saímos do teatro sem conseguir nem ao menos trocar comentários sobre o que tínhamos acabado de ver. Demora mesmo para a respiração se fazer serena, a emoção se recolocar no prumo, para que as palavras encontrem seus lugares nas frases, as frases nos parágrafos...
Só vou ser obrigada a discordar de seu texto em um ponto. Também sou professora, sei o que representa para um aluno "passar direto, com louvor". Como pode esquecer do resultado final do Júlio Machado? Pois que ele saiba, também passou com sobra de média!!!!Eu garanto!
Brincadeirinha só para desanuviar...
Parabéns Gilberto, belíssimo trabalho. Eu bem sei que é um árduo mas prazeroso trabalho.
Ok, Gilberto vi que a avaliação do Júlio Machado está completa. Foi aprovadíssimo!
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