O CEGO
E
O LOUCO
(QUEM É QUEM?
ou
Para uma curtíssima
temporada, de um mês, apenas, que precisa se multiplicar em outras, por sua incrível excelência,
está em cartaz, na Sala Multiuso do SESC
Copacabana, o espetáculo “O CEGO E O
LOUCO”, que já se credencia a ser apontado como um dos melhores, na atual temporada teatral de 2019.
A
peça, escrita por CLÁUDIA BARRAL, com direção de GUSTAVO WABNER, trazendo ALEXANDRE LINO e DANIEL DIAS DA SILVA, como protagonistas,
e únicos no elenco, apresentou LOTAÇÃO ESGOTADA, com antecedência, nas
três primeiras sessões da temporada. E assim deverá ocorrer até o seu final.
“O CEGO E O LOUCO” é daqueles espetáculos que surgem sem grande alarde,
na mídia, e que não precisam de muito espaço nela, para lotar um Teatro e fazer muita gente se frustrar,
tendo de voltar para casa, sem ter assistido à peça. A divulgação de boca em boca basta para isso.
SINOPSE:
NESTOR (ALEXANDRE LINO) é um pintor, cego, de personalidade muito forte.
Apesar da deficiência, ele
é um homem vigoroso e domina o frágil e taciturno irmão LÁZARO (DANIEL DIAS DA SILVA), o caçula.
Entre eles, estabelece-se
uma dinâmica eventualmente perversa, em que o cuidado fraterno cede lugar ao
rancor desenfreado.
A relação é testada com a
possibilidade da chegada de uma vizinha nova, ao prédio, a quem convidam para
tomar chá. Esse fato interfere no delicado equilíbrio entre os irmãos, que
dividem o mesmo apartamento.
A montagem se concentra nessa noite de espera, uma longa espera,
quando os traumas do passado vêm à tona, embalados por delírios, sonhos e culpas,
caminhando para um final totalmente inesperado, surpreendente e genial.
Um espetáculo
se destaca e cai no gosto do público e da crítica especializada, quando
consegue concentrar vários motivos, como é o deste caso. Ao lado de um precioso e bem escrito texto, temos uma
correta direção, dois esplêndidos atores em cena, uma ambientação, reunindo cenografia e iluminação impecáveis, assim como uma formidável trilha sonora. O que vem além é lucro. Aliás, tudo é
lucro e “luxo”, no sentido conotativo do segundo substantivo.
A LUNÁTICA
COMPANHIA DE TEATRO é a responsável pela apresentação deste espetáculo,
o primeiro de dramaturgia nacional,
das quatro peças em seu currículo.
As anteriores, todas igualmente excelentes, impactantes e provocativas, foram: “O Princípio de Arquimedes” (2017), “Esse Vazio” (2016) e “Matador” (2012). O que há em comum,
entre os quatro textos, é “a
presença de autores contemporâneos perspicazes no exercício de refletir as
questões do mundo onde vivemos”, segundo o “release” da peça, enviado
por LU NABUCO (ASSESSORIA DE IMPRENSA).
A montagem só foi possível
graças a uma parceria entre a TERRITÓRIOS
PRODUÇÕES e a CINETEATRO PRODUÇÕES.
E pensar que um magnífico texto,
como o desta da peça, apesar de premiado, na época em que surgiu, possa ter sido
escrito em 2000 e, só quase duas
décadas depois, esteja ao alcance do público!!! Apesar disso, ele é atualíssimo,
visto que é atemporal, por tratar de relações humanas, mais propriamente das
que existem entre dois irmãos “que moram juntos e dividem, há anos, o
mesmo cotidiano solitário”. “Tão
longe de mim distante”. Tão perto, fisicamente, um do outro, e tão distantes,
por dentro, sem contar a solidão, comum aos dois. Mas que dois? É preciso assistir à peça e não piscar um segundo, sempre atento ao que se ouve e se vê,
para “não voltar algumas casas e se perder”, nesse “jogo” instigante.
O texto é de uma riqueza e de
uma originalidade incomensuráveis. O espectador é conduzido por um caminho
muito claro e objetivo, por uma “linha-guia”, para compreender o dia a dia de
duas pessoas, aparentemente amigas e, como qualquer dupla de irmãos, com suas afinidades
e momentos de instabilidade emocional. Os dois alternam diálogos mais afetivos
com outros ácidos e agressivos, passando a tomar um rumo mais sério a partir do
convite, feito por um dos irmãos, a uma nova vizinha, Lúcia, como achava este ser o seu nome,
para um chá, logo após o jantar dos dois.
Tudo vai sendo conduzido de forma a despertar, no espectador, muitas
possibilidades de um fim para aquela trama, entretanto JAMAIS (Eu disse “JAMAIS”) alguém da plateia poderá imaginar o que irá ver e
saber, o que deixa o público perplexo, levado a aplaudir, freneticamente, a encenação, após seu término. E não sem
motivo.
Penso ser interessante dizer que tudo o que gera esse estado de ânimo, na
plateia, se dá apenas na última cena, em cerca de dois ou três minutos, talvez,
e que não pode ser passado, por meio de palavras de terceiros, a quem ainda não
assistiu à peça. De minha parte, tal
“spoiler” não será revelado, nem nas
conversas com amigos mais íntimos. Seria uma deslealdade, pois lhes tiraria o
agradabilíssimo prazer da surpresa.
Com relação a esse tipo de coisa, qual seja o de ter de segurar o queixo,
para evitar um deslocamento do maxilar, além de conter o choro, eu julgava que
o maior “soco na boca do estômago” com o qual já me atingiram havia acontecido
na obra-prima “Incêndios”, nos cinco
ou seis minutos finais da peça,
aproximadamente, quando se dá uma chocante revelação. Em “O CEGO E O LOUCO”, a intensidade do golpe foi maior. DUVIDO de que alguém, que não conheça o
texto, evidentemente, possa imaginar
um final para a peça como o que irá
ver!!!
Além de tudo isso, CLÁUDIA BARRAL,
de quem, salvo engano ou fraqueza de memória, eu não conhecia algum texto anteriormente, tem um estilo
muito simples, uma maneira bem natural de escrever seus diálogos, ficando tudo
ao alcance de qualquer espectador, até, no máximo, na prateleira do meio. E nem
precisava colocar nada na última, na mais alta. O que tem de ser alcançado, a
qualidade da dramaturgia, fica ao alcance de todos. E ela vai nos envolvendo, com o
desenrolar das conversas, e criando expectativas.
Aplaudo a ótima direção, de GUSTAVO WABNER, que tinha, nas mãos,
uma pedra preciosíssima, em estado bruto (Será?), com a função de lapidá-la,
saindo-se, como em trabalhos anteriores, um ótimo lapidador, além do bom ator
que é. Entra, aqui, aquela teoria, tão discutível, e defendida por muitos, de
que, para ser um bom diretor, é
preciso, antes, ser ator. Isso
acontece bastante, mas não parei para fazer estatísticas. Cada um que chegue à
sua conclusão! Pode não ser, de todo, verdadeira a máxima, contudo que ajuda, lá
isso ajuda. Creio que a grande sensibilidade, que tem de ser inerente a todo
ator, é um “up” no trabalho de um
bom diretor. WABNER soube dosar e equilibrar os momentos de lirismo e de maior tensão do texto, conseguindo manter uma linha
coerente de direção, da primeira à
última cena.
Para falar do trabalho de ALEXANDRE
LINO e DANIEL DIAS DA SILVA, é
preciso que eu me policie, para não ser repetitivo nem me alongar nos
comentários. Falar, realmente, o que penso do rendimento de cada um, da maneira
como ambos se entregaram aos seus personagens,
faria, de mim, um ser prolixo e nada do que eu dissesse iria atingir os que me
leem, como a experiência de ver, na sua frente, a formidável (Nelson Rodrigues adorava esse adjetivo,
e Dona Fernandona também.) atuação
dos dois.
LINO e DANI são dois dos melhores atores de sua geração, o que já provaram
em tantas produções anteriores a esta. Aqui, os talentos se juntam, numa química
perfeita, num equilíbrio de forças, as quais se unem e nunca se opõem. Os dois
procuram atingir a maturidade de seus personagens
de forma natural e sem apagar o brilho do outro companheiro de cena. Um lança,
para que o outro marque o gol. E o jogo termina empatado, com uma goleada.
DANIEL assume, de forma
brilhante, a fraqueza de seu LÁZARO,
a sua submissão, a sua timidez, a sua falta de coragem, tudo, até certo ponto,
questionável, e é, por assim dizer, o detentor da grande surpresa final, a “virada
de mesa”.
E o que dizer de LINO, na difícil
e desafiadora tarefa de representar um deficiente visual? Para um ator (atriz), é, talvez, uma das mais
incríveis experiências. Não é a primeira vez que o ator interpreta um deficiente visual; ele já o fizera, na peça “Asilo Paraíso”, em 2004. Também já
havia sido bem introduzido, no universo dos cegos, quando dirigiu, com muito mérito,
a peça “Volúpia da Cegueira”, de Daniel Porto, em 2016, misturando atores
que enxergavam com outros desprovidos do sentido da visão, sem os identificar,
uma vez que todos os personagens eram
cegos. Aqui, ele não poupa energia e talento, na composição de seu misterioso,
autoritário, debochado e irreverente NESTOR.
A título de curiosidade, e para mexer com a sua, acho pertinente, falar
da origem dos nomes dos personagens,
com a devida parcimônia. Não sei até que ponto foram escolhidos propositalmente,
mas HEITOR significa “aquele que guarda” ou “aquele que retém o inimigo”. A raiz da
palavra quer dizer “possuo, tenho em meu
poder”. Já LÁZARO é “aquele que tem lepra, pústulas, chagas” ou
“aquele que Deus socorreu”. Agora, exercitem-se!
Ambas as atuações são, por demais,
envolventes, emocionantes, impactantes.
Para aguçar, mais ainda, a
curiosidade dos que me leem e que, com certeza, irão, correndo, garantir seus ingressos
para o espetáculo, transcrevo uma declaração
de DANIEL DIAS DA SILVA, retirada do
já citado “release”: “Me
chama a atenção como a peça fala de coisas profundas sobre a vida, sobre o
desejo de romper as barreiras da rotina. Ao mesmo tempo, traz reviravoltas
instigantes, que aprofundam a questão”.
A cenografia, de SÉRGIO
MARIMBA, está em comunhão com a obra. Cada detalhe, na decoração do
apartamento, que também já serviu de atelier, revela traços das personalidades
dos protagonistas, ao mesmo tempo que o todo transmite um quase caos externo, refletindo o interior de HEITOR e LÁZARO. Excelente trabalho!
Também contam ponto, para o sucesso
desta montagem, a ótima iluminação (MANTOVANILUZ), a fantástica e adequada direção musical
(TIBOR FITTEL) – prestem atenção à última canção, “La Llorona”, interpretada pela magnífica (ADORO!!!) banda Beirut,
cuja letra tem a ver com a revelação final -, assim como o bom trabalho de direção de movimento, assinado por SUELI GUERRA, responsável por uma das
cenas mais lindas da peça (NÃO VOU
REVELAR!!!) e os ajustados figurinos, de VICTOR GUEDES.
FICHA TÉCNICA:
Texto:
Cláudia Barral
Direção:
Gustavo Wabner
Elenco:
Alexandre Lino e Daniel Dias da Silva
Cenografia:
Sérgio Marimba
Figurino:
Victor Guedes
Iluminação:
Mantovaniluz
Operação
de Som e Luz: Nina Balbi
Direção
de Movimento: Sueli Guerra
Direção
Musical: Tibor Fittel
Direção
de Palco: Renato Rodolfo
Estagiária
de Direção: Juliana Thiré de Negreiros
Design
Gráfico: Gamba Jr.
Fotos
e Imagens: zero8onze Photo Cine (Aguinaldo Flor / Fernando Cunha Jr.) e Gustavo Wabner
Gravação
Trilha: Musimundi (Klauber Fabre)
Locução
do Rádio: Germana Guilherme
Produção
Executiva: Letícia Reis
Direção
de Produção: Daniel Dias da Silva
Co-Produção:
Cineteatro Produções
Realização:
Territórios Produções Artísticas e Lunática Companhia de Teatro
Assessoria
de Imprensa: Lu Nabuco (Assessoria em Comunicação)
SERVIÇO:
Temporada:
De 04 a 27 de janeiro de 2019.
Local:
SESC Copacabana (Sala Multiuso).
Endereço:
Rua Domingos Ferreira, 160, Copacabana, Rio de Janeiro – RJ.
Dias
e Horários: De 6ª feira a domingo, às 18h.
Valor
dos Ingressos: R$7,50 (associado do Sesc), R$15,00 (meia entrada) e R$ 30,00
(inteira).
Informações:
(21) 2547-0156.
Horário
de Funcionamento da Bilheteria: 2ª feira, das 9h às 16h; de 3ª a 6ª feira, das
9h às 21h; aos sábados, das 13h às 21h; aos domingos, das 13h às 20h.
Classificação
Indicativa: 12 anos.
Duração:
60 minutos.
Lotação:
50 lugares.
Gênero:
Comédia Dramática
“O CEGO E O LOUCO” é o prenúncio de um bom ano teatral, sem dúvida, motivo
pelo qual recomendo, com o maior empenho, o espetáculo, o qual espero rever em outro Teatro, numa segunda temporada.
Que os DEUSES DO TEATRO digam “AMÉM!”!
(FOTOS:
AGUINALDO FLOR,
FERNANDO
CUNHA JR.
e GUSTAVO WABNER.)
e GUSTAVO WABNER.)
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