“INSIGNIFICÂNCIA”
ou
(DO QUE É
CAPAZ UMA COMÉDIA NOTA DEZ.)
Numa FICHA TÉCNICA, um dos
detalhes que mais pesam, para que eu decida assistir a um espetáculo teatral é o
elenco.
É muito difícil um grupo de grandes atores e atrizes não garantir a qualidade
de um espetáculo. Isso só ocorre quando, por uma única, ou dupla, infelicidade,
o texto
e/ou a direção seja(m) grande(s) desastre(s), o que não ocorre, de
modo algum, em “INSIGNIFICÂNCIA”,
comédia que marcou, com muito sucesso, uma temporada teatral na capital paulista,
de ambos os lados, público e crítica especializada, e, agora, aporta no Teatro
Adolpho Bloch, no Rio de Janeiro. É o início de uma
planejada turnê nacional, que será bem recebida em qualquer praça deste país.
Muito
pelo contrário, tanto o texto quanto a direção também são dois
outros motivos para que esta montagem receba todos os meus vigorosos aplausos.
Com relação a VICTOR GARCIA PETALTA,
que dirige a peça, não poderia esperar menos. Seu trabalho sempre valoriza
qualquer texto, e não foi diferente aqui. É uma direção muito consciente,
apoiada em muita pesquisa e aprendizagem, a serviço de um estupendo elenco. PERALTA sempre foi um outro elemento
capaz de me levar ao TEATRO sem me importar com o restante
da FICHA
TÉCNICA.
No
que diz respeito ao texto, confesso que, apesar de saber da existência de TERRY JOHNSON, não me lembrava de ter
assistido à encenação de qualquer texto de sua lavra; não conhecia nenhuma de
suas obras, se não sou traído pela memória. JOHNSON é um dramaturgo
e diretor britânico, ainda vivo, com 69 anos, que escreve para TEATRO,
cinema e televisão. Trabalhou como ator, de 1971 a 1975, e tem atuado como dramaturgo desde o início dos anos 1980, com trabalhos montados ao
redor do mundo, tendo ganhado inúmeros prêmios no chamado British Theatre. A peça
aqui comentada, que discute as consequências da fama, ganhou uma versão
cinematográfica e participou do “Festival de Cinema de Cannes”, em
1985.
SINOPSE:
Em um hotel, na Nova Iorque de 1953, passa-se o hipotético encontro entre quatro famosas lendas norte-americanas: a estrela de cinema Marilyn Monroe (AMANDA ACOSTA); Albert Einsten, cientista, criador da Teoria da Relatividade (que levou à criação da Bomba H e, consequentemente, à Bomba Atômica, interpretado por CASSIO SCAPIN); Joe DiMaggio, renomado jogador de beisebol e marido de Marylin (MARCOS VERAS); e o infame senador Joe McCarthy (NORIVAL RIZZO).
Trata-se de um insólito
e ficcional encontro que poderia acontecer hoje, trocando-se os personagens
originais por seus pares na atualidade, vivendo o universo em ebulição do mundo
de hoje. Quem poderiam ser eles?
Sem citar nomes, poderíamos dizer que a estrela de cinema, hoje, poderia
ser uma “influencer”, para os “idioters”, uma “ex-BBB” ou outra “insignificância",
para uns e “mito” para outros; o atleta de beisebol “tupiniquim” seria um
jogador de futebol, desses que frequentam os noticiários, geralmente por
motivos não muito elogiáveis, com milhões de seguidores e sem muita noção, ou
nenhuma. E mais: o senador poderia fazer parte do Congresso Brasileiro, “dizendo
e fazendo o mesmo que o escroque do texto de Johnson”, como ocorre de ordinário.
“O
único que, se estivesse ainda entre nós, estaria trazendo contribuições à
sociedade seria o cientista.”
Para viver esse enredo, foram – muito bem – escolhidos
quatro grandes nomes da representação: CÁSSIO
SCAPIN, AMANDA ACOSTA, MARCOS VERAS e NORIVAL RIZZO. CÁSSIO é o
Professor,
como sempre é chamado, embora o público logo o identifique como Albert
Einstein. AMANDA é a atriz;
Marilyn
Monroe, no caso. A propósito, já aproveito aqui para tecer o devido
elogio ao trabalho de visagismo, ou seja, de caracterização,
muito perfeito, a cargo de CLAUDINEI
HIDALGO e de FELICIANO SAN ROMAN,
este com suas perucas perfeitas em acabamento. VERAS é um jogador de beisebol, Joe DiMaggio,
marido da atriz. E RIZZO é um senador da República norte-americana,
que tem uma fixação por perseguir e destruir comunistas. A escolha desse
brilhante quarteto de atores é um dos grandes e incontáveis acertos desta
montagem.
Todos os personagens são protagonistas e circulam bem entre os momentos
em que têm todos os focos convergindo para si – cada um - ou quando sustentam,
como “escadas” e com muita generosidade, o protagonismo de outrem. Cada personalidade é vivida por gente que já ocupa o “Olimpo
dos atores”, todos muito profissionais, aplicados ao ofício de
representar, o que eu já sabia, conceito que acabei ratificando, após
conversar, com o diretor da peça, sobre essa digital de cada um. Todos
mergulharam na vida de seus personagens, para que eles fossem representados com
o máximo de verdade possível.
O potencial de todos repousa sobre um altíssimo patamar, mas quero fazer
um comentário especial acerca de CASSIO
SCAPIN e AMANDA ACOSTA. É sobre
o aspecto camaleônico que os dois carregam num palco. É incrível como saem de
um personagem e entram em outro, na montagem seguinte, com uma postura e um
visual tão próprios do novo personagem. Já vi o CÁSSIO como Santos Dummont, Odorico Paraguaçu e,
agora, como Einstein, só considerando suas mais recentes criações. Já AMANDA se despede de uma magistral Bibi
Ferreira, para ser Carmen Miranda e, logo dois, pular
para Marilyn
Monroe. Os dois e mais VERAS
e RIZZO
dominam o drama e a COMÉDIA com total facilidade e propriedade. Neste espetáculo,
em especial, nenhuma fala é dita com o desejo explícito de fazer rir, em primeiro
lugar, contudo a maneira “séria” como cada uma é dita, associada
a expressões faciais e entonações especiais, carregadas de ironia e deboche,
levam o púbico a rir e, até mesmo, gargalhar. As falas são ditas com um certo
toque de cinismo a toda prova, ou coisa próxima a isso, da parte dos
quatro personagens.
Confesso que não esperava tanto do texto e fiquei bastante grato ao
autor e, também, ao trabalho de tradução de GREGÓRIO DUVIVIER. Apesar de não conhecer o original, quem é de TEATRO
consegue perceber quando uma tradução é bem feita. Segundo a já referida
conversa que tive com o diretor, o texto é uma tradução fiel, “ipsis
litteris”, do original, incluindo duas expressões que soam como “cacos”
e que arrancam gargalhadas do público, mas não o são. Sem dúvida, embora
escrita em 1982, sabemos se tratar de um texto que se aplica à época atual
e a qualquer outra que ainda venha. É atemporal e a trama pode ocorrer em
qualquer parte do planeta; é universal, pois, uma vez que destaca, como já disse,
uma das questões mais discutidas na mídia contemporânea: as consequências da
fama, tanto na vida pessoal de renomadas celebridades, em relação às concessões
necessárias para alcançá-la ou preservá-la, quanto à sua exploração para
objetivos políticos (Vide os Estados Unidos de hoje.).
O autor se vale de figuras que simbolizam alguns dos maiores fenômenos
de popularidade do século XX, para nos fazer refletir sobre as maneiras de lidar com
a fama (ou com a perda dela), o que pode ser percebido pela rejeição, por parte
do cientista; a aceitação hesitante, personificada no mito sexual que Marilyn
continua a representar; e a decepção, quando a fama se dissipa, refletida no
personagem do jogador. “E quanto disso não vemos, quase todos os
dias ocorrer com ídolos e ‘celebridades’”?
Politicamente falando, o fictício encontro acontece – 1953 - em meio ao vigor
do “macarthismo”,
regime em
que ocorreu a chamada “caça às bruxas”, na prática de
acusar alguém de subversão ou de traição, sob a pecha de “comunista”. “Durante
o macarthismo, milhares de americanos foram acusados de serem comunistas ou
simpatizantes e tornaram-se objetos de agressivas investigações e de inquéritos
abertos pelo governo ou por indústrias privadas. O principal alvo das suspeitas
foram funcionários públicos, trabalhadores da indústria do entretenimento, educadores
e sindicalistas.”. Como se pode ver, isso guarda muita relação com o
pensamento da atual oposição brasileira, que já foi governo, na legislatura
anterior à atual. E tudo se deu tendo, como pano de fundo, a “Guerra
Fria”, ações capitaneadas pelo vil senador Joseph
McCarthy.
Merecem elogios a econômica, porém plena,
cenografia,
de CHRIS AIZNER, com destaque para
um gigantesco painel de “led”, ao fundo (10,0m x 4,0m) que produz
imagens indescritíveis de uma megalópole como Nova Iorque; os admiráveis
e bem cortados e costurados figurinos, muito sóbrios e
elegantes, de FÁBIO NAMATAME; e a impecável
iluminação,
de BETO BRUEL.
FICHA TÉCNICA:
Texto: Terry Johnson
Tradução: Gregório Duvivier
Direção: Victor Garcia Peralta
Assistência de Direção: André Acioli
Elenco: Cassio Scapin, Amanda Acosta, Marcos Veras e Norival Rizzo
Cenário: Chris Aizner
Figurinos: Fábio Namatame
Iluminação: Beto Bruel
Visagista: Claudinei Hidalgo
Perucas: Atelier San Roman
Direção de Imagem: André Grynwask e Pri Argoud (Um Cafofo)
Música Original: Marcelo Pellegrini
“Designer” Gráfico: Peu Fulgencio
Consultoria de Movimento: Vivien Buckup
Fotos de Estúdio: Jairo Goldflus
Fotos de Cena: João Caldas
Produção de Objetos: Jorge Luiz Alves
Pesquisa e Consultoria Histórica: João Victor Silva
Produção Musical: Surdina
Assistência e Programação de Luz: Pajeú Oliveira
Operação de Luz: Melissa Oliveira
Painel de Led e Gerenciamento de Vídeo: On Projeções
Diretor de Palco: Jones de Souza
Contrarregra: Eduardo Portella
Camareira: Luciana Galvão
Vestido Atriz: Juliano Queiroz
Alfaiate: Agenor Domingos
Assistência de Maquiagem: David Lenk
Cenotecnia: Casa Malagueta
Equipe de Cenotecnia: Alício Silva, Giorgia Massetani, Cleiton Willy, Demi
Araújo, Igor B. Gomes, Mariana Maschietto, Shampzss e Danndhara Shoyama
Produção Executiva: Swan Prado
Assistência de Produção: Adriana Souza
Assistência de “Designer” Gráfico:
Daniela Souza
Assessoria de Imprensa: Vicente Negrão Assessoria
Captação, Criação de Conteúdo e Mídias Sociais: GaTú Filmes
Anúncios “On-line”: Lead Performance
Assessoria Jurídica: Martha Macruz
Gestão Financeira: Vanessa Velloni
Produção: Rodrigo Velloni
Realização: Velloni Produções Artísticas
SERVIÇO:
Temporada: De 14 de março a 06 de abril de 2025.
Local: Teatro Adolpho Bloch (antigo Teatro Manchete).
Endereço: Rua do Russel, nº 804, Glória, Rio de Janeiro.
Estacionamento no local.
Capacidade: 359 lugares.
Acessibilidade.
Dias e Horários: 6ª feira e sábado, às 20h; domingo, às 18h.
Abertura da casa 60 minutos antes do início do espetáculo.
Valor dos ingressos: Plateia A: R$ 130 / R$ 65 (meia-entrada); Plateia
B: R$ 40 / R$ 20 (meia-entrada) (72 lugares) – Consultar possibilidades de
desconto.
Classificação
Indicativa: 16 Anos.
Duração: 100minutos.
Gênero: COMÉDIA.
Assisti à peça numa sessão especial, para convidados. É muito
comum, nessas ocasiões, a plateia se manifestar em longos aplausos e gritos de “BRAVO!”,
muitas vezes, por corporativismo ou para “ficar bem na fita”. Há quase
sessenta anos, entre os palcos e as plateias, aprendi a diferençar a bajulação
do aplauso sincero, em reconhecimento à qualidade de um espetáculo. E é assim
que descrevo a reação de uma plateia lotada, ao final do espetáculo. Uma
plateia agradecida pelo presente que recebeu. E nem poderia ser de outra forma,
motivo que me leva a RECOMENDAR O
ESPETÁCULO.
FOTOS:
JAIRO GOLDFLUS
(estúdio)
e
JOÃO CALDAS (cena).
É
preciso ir ao TEATRO, ocupar todas as salas de espetáculo, visto que a arte educa e constrói,
sempre; e salva. Faz-se necessário resistir sempre mais. Compartilhem esta crítica, para que,
juntos, possamos divulgar o que há de melhor no TEATRO brasileiro.
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