segunda-feira, 17 de março de 2025

 

“INSIGNIFICÂNCIA”

ou

(DO QUE É CAPAZ UMA COMÉDIA NOTA DEZ.)





       Numa FICHA TÉCNICA, um dos detalhes que mais pesam, para que eu decida assistir a um espetáculo teatral é o elenco. É muito difícil um grupo de grandes atores e atrizes não garantir a qualidade de um espetáculo. Isso só ocorre quando, por uma única, ou dupla, infelicidade, o texto e/ou a direção seja(m) grande(s) desastre(s), o que não ocorre, de modo algum, em “INSIGNIFICÂNCIA”, comédia que marcou, com muito sucesso, uma temporada teatral na capital paulista, de ambos os lados, público e crítica especializada, e, agora, aporta no Teatro Adolpho Bloch, no Rio de Janeiro. É o início de uma planejada turnê nacional, que será bem recebida em qualquer praça deste país.


 

         Muito pelo contrário, tanto o texto quanto a direção também são dois outros motivos para que esta montagem receba todos os meus vigorosos aplausos. Com relação a VICTOR GARCIA PETALTA, que dirige a peça, não poderia esperar menos. Seu trabalho sempre valoriza qualquer texto, e não foi diferente aqui. É uma direção muito consciente, apoiada em muita pesquisa e aprendizagem, a serviço de um estupendo elenco. PERALTA sempre foi um outro elemento capaz de me levar ao TEATRO sem me importar com o restante da FICHA TÉCNICA.






         No que diz respeito ao texto, confesso que, apesar de saber da existência de TERRY JOHNSON, não me lembrava de ter assistido à encenação de qualquer texto de sua lavra; não conhecia nenhuma de suas obras, se não sou traído pela memória. JOHNSON é um dramaturgo e diretor britânico, ainda vivo, com 69 anos, que escreve para TEATRO, cinema e televisão. Trabalhou como ator, de 1971 a 1975, e tem atuado como dramaturgo desde o início dos anos 1980, com trabalhos montados ao redor do mundo, tendo ganhado inúmeros prêmios no chamado British Theatre. A peça aqui comentada, que discute as consequências da fama, ganhou uma versão cinematográfica e participou do “Festival de Cinema de Cannes, em 1985.



 




 

SINOPSE:

Em um hotel, na Nova Iorque de 1953, passa-se o hipotético encontro entre quatro famosas lendas norte-americanas: a estrela de cinema Marilyn Monroe (AMANDA ACOSTA); Albert Einsten, cientista, criador da Teoria da Relatividade (que levou à criação da Bomba H e, consequentemente, à Bomba Atômica, interpretado por CASSIO SCAPIN); Joe DiMaggio, renomado jogador de beisebolmarido de Marylin (MARCOS VERAS); e o infame senador Joe McCarthy (NORIVAL RIZZO).

Trata-se de um insólito e ficcional encontro que poderia acontecer hoje, trocando-se os personagens originais por seus pares na atualidade, vivendo o universo em ebulição do mundo de hoje. Quem poderiam ser eles?

 





Sem citar nomes, poderíamos dizer que a estrela de cinema, hoje, poderia ser uma “influencer”, para os “idioters”, uma “ex-BBB” ou outra “insignificância", para uns e “mito” para outros; o atleta de beisebol “tupiniquim” seria um jogador de futebol, desses que frequentam os noticiários, geralmente por motivos não muito elogiáveis, com milhões de seguidores e sem muita noção, ou nenhuma. E mais: o senador poderia fazer parte do Congresso Brasileiro, “dizendo e fazendo o mesmo que o escroque do texto de Johnson”, como ocorre de ordinário. “O único que, se estivesse ainda entre nós, estaria trazendo contribuições à sociedade seria o cientista.”



 

Para viver esse enredo, foram – muito bem – escolhidos quatro grandes nomes da representação: CÁSSIO SCAPIN, AMANDA ACOSTA, MARCOS VERAS e NORIVAL RIZZO. CÁSSIO é o Professor, como sempre é chamado, embora o público logo o identifique como Albert Einstein. AMANDA é a atriz; Marilyn Monroe, no caso. A propósito, já aproveito aqui para tecer o devido elogio ao trabalho de visagismo, ou seja, de caracterização, muito perfeito, a cargo de CLAUDINEI HIDALGO e de FELICIANO SAN ROMAN, este com suas perucas perfeitas em acabamento. VERAS é um jogador de beisebol, Joe DiMaggio, marido da atriz. E RIZZO é um senador da República norte-americana, que tem uma fixação por perseguir e destruir comunistas. A escolha desse brilhante quarteto de atores é um dos grandes e incontáveis acertos desta montagem.




 

Todos os personagens são protagonistas e circulam bem entre os momentos em que têm todos os focos convergindo para si – cada um - ou quando sustentam, como “escadas” e com muita generosidade, o protagonismo de outrem. Cada personalidade é vivida por gente que já ocupa o “Olimpo dos atores”, todos muito profissionais, aplicados ao ofício de representar, o que eu já sabia, conceito que acabei ratificando, após conversar, com o diretor da peça, sobre essa digital de cada um. Todos mergulharam na vida de seus personagens, para que eles fossem representados com o máximo de verdade possível.




 

O potencial de todos repousa sobre um altíssimo patamar, mas quero fazer um comentário especial acerca de CASSIO SCAPIN e AMANDA ACOSTA. É sobre o aspecto camaleônico que os dois carregam num palco. É incrível como saem de um personagem e entram em outro, na montagem seguinte, com uma postura e um visual tão próprios do novo personagem. Já vi o CÁSSIO como Santos Dummont, Odorico Paraguaçu e, agora, como Einstein, só considerando suas mais recentes criações. Já AMANDA se despede de uma magistral Bibi Ferreira, para ser Carmen Miranda e, logo dois, pular para Marilyn Monroe. Os dois e mais VERAS e RIZZO dominam o drama e a COMÉDIA com total facilidade e propriedade. Neste espetáculo, em especial, nenhuma fala é dita com o desejo explícito de fazer rir, em primeiro lugar, contudo a maneira “séria” como cada uma é dita, associada a expressões faciais e entonações especiais, carregadas de ironia e deboche, levam o púbico a rir e, até mesmo, gargalhar. As falas são ditas com um certo toque de cinismo a toda prova, ou coisa próxima a isso, da parte dos quatro personagens.  





 

Confesso que não esperava tanto do texto e fiquei bastante grato ao autor e, também, ao trabalho de tradução de GREGÓRIO DUVIVIER. Apesar de não conhecer o original, quem é de TEATRO consegue perceber quando uma tradução é bem feita. Segundo a já referida conversa que tive com o diretor, o texto é uma tradução fiel, “ipsis litteris”, do original, incluindo duas expressões que soam como “cacos” e que arrancam gargalhadas do público, mas não o são. Sem dúvida, embora escrita em 1982, sabemos se tratar de um texto que se aplica à época atual e a qualquer outra que ainda venha. É atemporal e a trama pode ocorrer em qualquer parte do planeta; é universal, pois, uma vez que destaca, como já disse, uma das questões mais discutidas na mídia contemporânea: as consequências da fama, tanto na vida pessoal de renomadas celebridades, em relação às concessões necessárias para alcançá-la ou preservá-la, quanto à sua exploração para objetivos políticos (Vide os Estados Unidos de hoje.).




 

O autor se vale de figuras que simbolizam alguns dos maiores fenômenos de popularidade do século XX, para nos fazer refletir sobre as maneiras de lidar com a fama (ou com a perda dela), o que pode ser percebido pela rejeição, por parte do cientista; a aceitação hesitante, personificada no mito sexual que Marilyn continua a representar; e a decepção, quando a fama se dissipa, refletida no personagem do jogador. “E quanto disso não vemos, quase todos os dias ocorrer com ídolos e ‘celebridades’”?



 

Politicamente falando, o fictício encontro acontece – 1953 - em meio ao vigor do “macarthismo”, regime em que ocorreu a chamada “caça às bruxas”, na prática de acusar alguém de subversão ou de traição, sob a pecha de “comunista”. “Durante o macarthismo, milhares de americanos foram acusados de serem comunistas ou simpatizantes e tornaram-se objetos de agressivas investigações e de inquéritos abertos pelo governo ou por indústrias privadas. O principal alvo das suspeitas foram funcionários públicos, trabalhadores da indústria do entretenimento, educadores e sindicalistas.”. Como se pode ver, isso guarda muita relação com o pensamento da atual oposição brasileira, que já foi governo, na legislatura anterior à atual. E tudo se deu tendo, como pano de fundo, a “Guerra Fria”, ações capitaneadas pelo vil senador Joseph McCarthy.




 

        Merecem elogios a econômica, porém plena, cenografia, de CHRIS AIZNER, com destaque para um gigantesco painel de “led”, ao fundo (10,0m x 4,0m) que produz imagens indescritíveis de uma megalópole como Nova Iorque; os admiráveis e bem cortados e costurados figurinos, muito sóbrios e elegantes, de FÁBIO NAMATAME; e a impecável iluminação, de BETO BRUEL.





 

 

FICHA TÉCNICA:

Texto: Terry Johnson
Tradução: Gregório Duvivier

Direção: Victor Garcia Peralta
Assistência de Direção: André Acioli

Elenco: Cassio Scapin, Amanda Acosta, Marcos Veras e Norival Rizzo

Cenário: Chris Aizner
Figurinos: Fábio Namatame
Iluminação: Beto Bruel 
Visagista: Claudinei Hidalgo
Perucas: Atelier San Roman  

Direção de Imagem: André Grynwask e Pri Argoud (Um Cafofo)
Música Original: Marcelo Pellegrini
“Designer” Gráfico: Peu Fulgencio
Consultoria de Movimento: Vivien Buckup
Fotos de Estúdio: Jairo Goldflus
Fotos de Cena: João Caldas
Produção de Objetos: Jorge Luiz Alves
Pesquisa e Consultoria Histórica: João Victor Silva

Produção Musical: Surdina 
Assistência e Programação de Luz: Pajeú Oliveira
Operação de Luz: Melissa Oliveira
Painel de Led e Gerenciamento de Vídeo: On Projeções
Diretor de Palco: Jones de Souza
Contrarregra: Eduardo Portella
Camareira: Luciana Galvão
Vestido Atriz: Juliano Queiroz
Alfaiate: Agenor Domingos
Assistência de Maquiagem: David Lenk 

Cenotecnia: Casa Malagueta 
Equipe de Cenotecnia: Alício Silva, Giorgia Massetani, Cleiton Willy, Demi Araújo, Igor B. Gomes, Mariana Maschietto, Shampzss e Danndhara Shoyama

Produção Executiva: Swan Prado
Assistência de Produção: Adriana Souza
Assistência de “Designer” Gráfico: Daniela Souza
Assessoria de Imprensa: Vicente Negrão Assessoria
Captação, Criação de Conteúdo e Mídias Sociais: GaTú Filmes
Anúncios “On-line”: Lead Performance
Assessoria Jurídica: Martha Macruz 

Gestão Financeira: Vanessa Velloni

Produção: Rodrigo Velloni
Realização: Velloni Produções Artísticas


 


 


SERVIÇO:

Temporada: De 14 de março a 06 de abril de 2025.

Local: Teatro Adolpho Bloch (antigo Teatro Manchete).

Endereço: Rua do Russel, nº 804, Glória, Rio de Janeiro.

Estacionamento no local.

Capacidade: 359 lugares.

Acessibilidade.

Dias e Horários: 6ª feira e sábado, às 20h; domingo, às 18h.

Abertura da casa 60 minutos antes do início do espetáculo.

Valor dos ingressos: Plateia A: R$ 130 / R$ 65 (meia-entrada); Plateia B: R$ 40 / R$ 20 (meia-entrada) (72 lugares) – Consultar possibilidades de desconto.

Classificação Indicativa: 16 Anos.
Duração: 100minutos.

Gênero: COMÉDIA.


 





         Assisti à peça numa sessão especial, para convidados. É muito comum, nessas ocasiões, a plateia se manifestar em longos aplausos e gritos de “BRAVO!”, muitas vezes, por corporativismo ou para “ficar bem na fita”. Há quase sessenta anos, entre os palcos e as plateias, aprendi a diferençar a bajulação do aplauso sincero, em reconhecimento à qualidade de um espetáculo. E é assim que descrevo a reação de uma plateia lotada, ao final do espetáculo. Uma plateia agradecida pelo presente que recebeu. E nem poderia ser de outra forma, motivo que me leva a RECOMENDAR O ESPETÁCULO.







 

 

 

FOTOS: JAIRO GOLDFLUS (estúdio)

e
JOÃO CALDAS (cena).

 

 

 

É preciso ir ao TEATRO, ocupar todas as salas de espetáculo, visto que a arte educa e constrói, sempre; e salva. Faz-se necessário resistir sempre mais. Compartilhem esta crítica, para que, juntos, possamos divulgar o que há de melhor no TEATRO brasileiro.




























































































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