“AS AVENTURAS
DE QUITAPENA”
ou
(UM SHOW DE
DELICADEZA.)
ou
(“EU SOU DA
AMÉRICA DO
SUL
E SEI VOCÊS
NÃO VÃO SABER”,
O QUE POUCO
ME IMPORTA.)
Idealizado, escrito,
montado
e executado
por PATY LOPES, dramaturga, produtora
cultural e crítica teatral, o espetáculo “AS AVENTURAS DE QUITAPENA”, título “estranho” e que, por
isso mesmo, nos chama a atenção, segue em cartaz, em todos os sábados do mês de
fevereiro, no Teatro dos Correios Léa Garcia. Uma
experiência única para o público infantil, “AS
AVENTURAS DE QUITAPENA” é uma obra inspirada na lenda maia, de oralidade
indígena, das bonecas Quitapenas, Quitapesares ou Chamulitas,
conhecidas
por aliviar preocupações, do que tanto somos todos carentes.
Trata-se de um espetáculo infantil interativo,
que une lenda maia e técnicas circenses, uma montagem originalíssima, que vai
além de ser lúdica e, ainda que voltada, principalmente, para os miúdos, também
encanta os adultos: um espetáculo para a família. A peça oferece uma narrativa
envolvente, que incentiva as crianças a expressarem seus sentimentos, de forma
alegre, natural, espontânea. Esse é um dos principais diferenciais da peça: a
participação direta e efusiva dos mini espectadores, totalmente conquistados
pelo que vem do palco.
Não me canso der dizer que abomino as
montagens que subestimam a inteligência dos petizes. “Teatro infantil não é imbecil!”,
como dizia o premiado e saudoso diretor santista, Paulo Lara, com quem tive
a oportunidade de trabalhar, como ator, e aprendi muito do pouco que sei sobre TEATRO,
mormente o infantil. Não se pode esquecer de que a criança de hoje será um
espectador em potencial, quando adulto, se ela for acostumada, desde a mais
tenra idade, a assistir a espetáculos que sejam de excelência, pensados,
milimetricamente, para atingi-las e lhes aguçar a inteligência e a
sensibilidade, como se dá no espetáculo aqui analisado.
E como PATY
LOPES se deixou envolver pelo carisma da QUITAPENA, a ponto de desejar dividir, com outrem, tudo o que
aprendeu sobre ela, com a atriz Rosana Reategui? Para PATY, Rosana “é
uma das maiores representantes do teatro latino no Brasil, se não for a maior”,
opinião que também é minha. “Rosana me apresentou o quadro do uruguaio
Torres Garcia, no qual o mapa da América Latina se encontra de cabeça para
baixo, mostrando que temos um norte, e não podemos perpetuar a ideia de nos
colocarem onde o mundo quer que estejamos, temos muita cultura de oralidade dos
povos originários dos países latinos; aliás, o mapa servirá como bússola para
outra aventura”, afirma a idealizadora do espetáculo. Por que nosso
continente está com a cabeça para baixo?! Não! De jeito algum! Se aquele era o
sentimento, a visão, do artista, não é a minha aprovação que ele terá. A cabeça
da América
do Sul está no seu devido lugar, muito longe do “complexo de vira-lata”,
cunhado, em 1958, por Nelson Rodrigues.
Considerando a segunda metade das palavras
de PATY, julgo importantíssima e
oportuníssima esta montagem, no momento em que somos, a cada dia, surpreendidos
com atitudes de um ser ignóbil, levado por sua incomensurável megalomania
doentia e total “nonsense, no que se refere a respeito aos seres humanos, ações
praticadas por um recém-governante do hemisfério norte, eleito para governar um
país, o mais poderoso do mundo, mas que age como se fosse um “imperador,
primeiro e único, do planeta Terra”. Estamos aqui para marcar
território e firmar/afirmar nossa importância cultural para todo o planeta Terra;
queiram ou não, ainda que desejem nos impor uma inferioridade que não nos cabe.
O
Brasil e a América do Sul somos protagonistas, sim, e não vamos abrir
mão disso, da nossa soberania.
Não faz muito tempo que PATY LOPES, já na idade adulta, descobriu, no TEATRO, a sua razão de
viver e passou a mergulhar, profundamente, nele, quer como dramaturga, quer como crítica
teatral. Aposto mais no primeiro
fazer, no qual consigo enxergá-la mais produtiva e à vontade, embora tenha
muito chão ainda a percorrer, sempre mergulhando em ricas pesquisas, a fim de
dar forma a seus textos e dramaturgias. Não bastasse isso, PATY não tem medo de investir na sublime arte de representar,
também como empreendedora, quando conta com algum patrocínio ou incentivo, na produção,
ou se tem que arcar com os custos da produção, como acontece em “AS AVENTURAS DE QUITAPENA”. São suas
estas palavras: “No momento, a pauta que nos leva a patrocínios
é outra, necessidade que entendo perfeitamente, mas nem por isso podemos deixar
os projetos engavetados. Temos um mundo para desbravar.”. Assim,
aconteceu este espetáculo, sem nenhum patrocínio, custeado
com recursos próprios.
PATRÍCIA, ou PATY, LOPES, descobriu a lenda das QUITAPENAS,
encantou-se com ela e, generosamente, decidiu compartilhar o seu achado com quem
se propõe a também conhecer a beleza e os mistérios daquela narrativa, conhecer
as bonecas e seus poderes. No palco, ela nos convida a fazer, na sua companhia,
uma viagem aos países latinos, mostrando-nos um pouco da cultura característica
de cada um deles.
SINOPSE:
“AS
AVENTURAS DE QUITAPENA” é um espetáculo infantil interativo, inspirado na
lenda maia de crianças da América Latina. Uma jornada lúdica,
que promove empatia, pertencimento e celebrações culturais.
Durante 45 minutos, duas bonecas QUITAPENAS, representadas pelas atrizes
MARIA DELDUQUE e BELLAS SILVEIRA, convidam as crianças a
uma total diversão e a ouvir as aventuras que elas atravessam, tendo como
companheiras, nessas peripécias, crianças de vários países, abaixo da linha
imaginária do equador, incluindo o Brasil, representadas por bonecos de
pano. Nessa vivência, são exploradas diversas formas de comunicação, como TEATRO
de animação, TEATRO de sombras, música, dança e atividade circense,
incluindo uma performance em perna de pau, executada pela atriz e dançarina BELLAS SILVEIRA, que também assina a direção
de movimento da montagem, proporcionando uma experiência visualmente
cativante, quando, por exemplo, representa o Quetzal, um pássaro que
vive nas
florestas tropicais da América Central e do
Sul, conhecido por suas penas brilhantes, que podem ser verdes,
douradas, vermelhas e azuis, um dos mais bonitos dos países latinos. Na peça,
a ave aparece na forma de um pássaro com mais de dois metros de altura, a atriz
equilibrando-se em cima de um par de pernas de pau. O Quetzal
auxilia uma das QUITAPENAS em uma
das aventuras. Um certo animal que marca outro momento de aventura é a gata Tica,
originária de Cuba, representada apenas por uma belíssima máscara artesanal,
cheia de ricos detalhes decorativos.
Já que mencionei os dois animais, é preciso
nomear o grande artista que criou e construiu todos os adereços de cena, FRANCISCO LEITE, muito atento a
detalhes que dão à montagem um toque de beleza, sensibilidade e delicadeza,
criando um ambiente lúdico, representado por cores e formas, presentes em
objetos típicos dos países latino-americanos. “Parece coisa de maluco, mas as
peças falam comigo o que elas querem”, são palavras do conceituado aderecista.
Todos os objetos de cena, expostos desde o acesso do público ao auditório,
visíveis sob, ainda, uma fraca luz, estimulam a ludicidade, permitindo que as
crianças interajam, diretamente, com a narrativa, expressando suas emoções,
desenvolvendo empatia e, principalmente, o sentimento de pertencimento à América
latina, conhecendo os países e suas culturas.
Tudo aquilo que ocupa o espaço cênico e que
é merecedor de destaque é desvendado por uma bonita e precisa iluminação,
a cargo de AMANDA BARROSO, que
chegou ao apagar das luzes – perdão pelo trocadilho – da produção
e agregou muito valor à peça. A linda cenografia e os figurinos, igualmente
preciosos, também saíram da fértil imaginação de PATY LOPES.
Quanto à atuação, as duas atrizes,
já apresentadas, dão conta de sua função, faltando, talvez, um pouco mais de
carisma, de cumplicidade entre ambas e um pouco mais de aposta na
interatividade com a plateia. Tudo isso, porém, pode ser resolvido, se
considerarmos dois fatores: o fato de terem feito apenas duas apresentações – e o
“pra valer” é muito diferente dos ensaios – e a triste realidade de o
espetáculo, infelizmente, ser apresentado com um intervalo de uma semana entre
uma sessão e outra. Não dá nem “para esquentar”. No que tange à
interatividade com as crianças da plateia, aconselho-as a seguir os preceitos
que regem esse detalhe. Provocar mais se faz necessário e, se a resposta do
provocado for positiva, insistir nele, até com improvisos, e, caso sinta que a
instigação não vai render muito, partir para outra criança. É assim que
funciona bem. Esses comentários, no entanto, não tornam opaco o trabalho a
dupla. A QUITAPENA de BELLAS SILVEIRA se apresenta com um
toque de mais centrada, mais sóbria e crítica das atitudes da outra boneca, a
de MARIA DELDUQUE, mais “soltinha”,
levada, descontraída. Estou falando das personagens, e não das atrizes, e acho
bom esse contraste, anteriormente a mim, descoberto pelo diretor da peça;
funciona muito bem.
Quanto ao texto, considerando o
fato de PATY LOPES ser ainda incipiente
no ofício de escrever para TEATRO, ele satisfaz, todavia senti
faltar um pouco de “liga”, entre uma aventura e outra. Percebi breves “hiatos”,
falta de robustez numa curva dramática, o que acaba
incidindo sobre o ritmo do espetáculo e, talvez, não deixando algumas coisas
importantes muito claras para os mais pequerruchos. Muito do quer a dramaturga deseja comunicar fica meio perdido, no ar, precisando que que alguma coisa textual fosse acrescentada, em forma de palavras, como o apelo para que todos sejam empáticos e valorizem as qualidades do outro. Talvez fosse necessário contar
com alguém de maior experiência em escrever para o palco, no sentido de, por
meio de uma supervisão textual, aparar algumas arestas, as quais, de forma
alguma, desabonam, no geral, o texto da peça.
Conheço, de há muito, o trabalho de TATÁ OLIVEIRA, como ator, porém, salvo
engano, não havia assistido a nenhum espetáculo dirigido por ele. TATÁ faz um bom trabalho de direção,
marcado por bons deslocamentos das atrizes no palco, a exploração da capacidade
de representar de cada uma delas e por uma sóbria e competente participação na FICHA
TÉCNICA. Fará muito bem, se investir mais como “maestro” de outros
espetáculos.
No corpo da montagem, foram introduzidas,
por PATY LOPES, numa deliciosa trilha
sonora, quatro alegres canções do folclore latino, as quais poderiam
ser mais bem exploradas pelas atrizes: “Valicha”, “Monstro de la Laguna”
(CuontaCanticos), “Aca Tá” (CuontaCanticos) e “Soy
Caporal”.
FICHA
TÉCNICA:
Idealização
e Dramaturgia: Paty Lopes
Direção:
Tatá Oliveira
Elenco:
Maria Delduque e Bellas Silveira
Cenografia
e Figurinos: Paty Lopes
Costureira:
Ateliê By Dri
Iluminação:
Amanda Barroso
Trilha Sonora: Paty Lopes
Aderecista:
Francisco Leite
Direção
de Movimento: Bellas Silveira
Direção
de Produção: Júlio Luz (Lamparina Produções)
Assessoria
de Imprensa e Criação das Artes com IA: Álvaro Tallarico
Fotos: Álvaro Talarico e Rodrigo Menezes
“Filmaker”: A4Film
Redes
Sociais:@arteriaingressos
SERVIÇO:
Temporada:
De 01 a 22 de fevereiro de 2025.
Local:
Teatro Correios Léa Garcia.
Endereço:
Rua Visconde de Itaboraí, nº 20, Centro – Rio de Janeiro.
Dias
e Horários: Sábados de fevereiro/2025, às 16 horas.
Valor
dos Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada).
Ingressos
disponíveis na Bilheteria do Teatro ou pela plataforma Imply.
Duração:
45 minutos.
Classificação
Etária: Livre.
Gênero:
TEATRO Infantil.
Somando-se tudo o que expressei
em palavras, o saldo é bastante positivo, e o que ainda carece de algum reparo
não é difícil de ser consertado, para que o espetáculo se torne ainda mais
bonito, poético e importante do que já é, motivo pelo qual EU O
RECOMENDO. E oxalá surjam oportunidades de novas temporadas,
para que as aventuras e poderes das bonecas QUITAPENAS atinjam mais pessoas e possam reforçar o nosso amor pela
cultura latino-americana. E, já que “está na moda” querer mudar os nomes
dos acidentes geográficos, que tal a proposta de retirar o vocábulo “América”,
quando nos referimos à Central e a do Sul? Já está me
incomodando bastante. Contam com o meu voto.
FOTOS: ÁLVARO
TALLARICO
e
RODRIGO MENEZES
GALERIA PARTICULAR:
Compartilhem esta crítica, para que, juntos, possamos divulgar o que há de melhor no TEATRO brasileiro!
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