segunda-feira, 15 de julho de 2024

“A COMUNIDADE

DO ARCO-ÍRIS”

ou

(O QUE PARECE,

MAS NÃO É.)

 

 


           “COMUNIDADE” remonta a “gueto”; “ARCO-ÍRIS” é o símbolo-mor do universo homossexual. A pessoa recebe um convite para assistir a um espetáculo de TEATRO com o título “A COMUNIDADE DO ARCO-ÍRIS” e pensa logo que se trata de mais uma peça abordando a temática LGBTQIAP+ (e todo o restante do alfabeto), certamente, denunciando a homofobia e os crimes contra a comunidade “gay”, no país onde se mata a maior quantidade desses seres humanos no mundo, e outros temas ligados a essa macrotemática. Começa a ler o “release”, enviado por PAULA CATUNDA (Assessoria de imprensa), e acha tudo muito “estranho”, ao ver que se trata de um “espetáculo infantil”. Será que alguém teve a coragem de escrever uma peça sobre esse assunto, tão “sério e forte”, para crianças? E, quando vê que o texto é de CAIO FERNANDO ABREU, que foi um homem “gay” assumido e um dos maiores ativistas e defensores da causa LGBT, no seu tempo, quase “pira”. Aliás, esta obra é a única que o consagrado escritor escreveu para os pequenos. O espetáculo chegou ao Rio depois de uma temporada de sucesso no CCBB de Belo Horizonte. Lendo o referido “release” até o final, aí então, fica tudo esclarecido: “PARECE, MAS NÃO É.”. 

 


Caio Fernando Abreu.

(Foto encontrada na internet.)


 

SINOPSE:

Na trama, brinquedos e seres mágicos decidem viver numa comunidade na floresta, longe do mundo dos humanos, onde não há poluição e nem consumo desenfreado.

A chegada, porém, de três gatos a esse recanto de paz provoca discussões sobre confiança, respeito, amizade e democracia.

 


 

 

    Uma SINOPSE tão “enxuta”, como essa, contém, exatamente, aquilo de que a peça trata, e o fato de ser tão resumida, e dizer tanto, guarda uma estreita relação com o ótimo texto da peça. Poucas vezes vi, em 50 minutos, tempo que considero mais do que justo a uma peça infantil, um espetáculo que consiga ensinar tanto, de forma tão lúdica, ao pequenos, coisas que devem ser aprendidas ainda na primeira infância, como os quatro substantivos abstratos, grifados, que encerram a síntese supra. E o mais importante; deixei o Teatro II, do Centro Cultural Banco do Brasil - Rio de Janeiro (CCBB) com a impressão de que o recado foi dado: as crianças entenderam o que era para ser entendido, a julgar pela participação dos pequenos – A peça não é 100% interativa, mas contém a interação que vem implícita em todos os espetáculos infantis. – e por alguns comentários, entre os miúdos e seus acompanhantes adultos, ouvidos por mim, depois da sessão.


 


           BIANCA BYINTON, uma das atrizes da peça, comenta que não conhecia esse lado do autor “supreendentemente leve, que não perde o sarcasmo em pequenas brincadeiras”. Confesso que eu, que me considero um razoável conhecedor e admirador da obra poética de CAIO, também não o conhecia. Para ela, chama a atenção que, em 1971, ele tenha dado importância à questão ambiental. “Abordagem simples, sem militância, mas no fundo fala o que realmente importa, a insatisfação em relação ao mundo capitalista, ao consumo.”, completa.

 

 

             A montagem conta com a direção de SUZANA SALDANHA e supervisão de direção de GILBERTO GAWRONSKI, com um elenco de oito experientes atores, encabeçado por BIANCA BYINGTON, cujo trabalho sempre apreciei no TEATRO para adultos, mas não a vejo atuando muito no nicho de TEATRO infantil. Aconselho-a, inclusive, a se aventurar mais no ramo. BIANCA interpreta uma Bruxa de Pano, que parece ser uma coisa, mas, depois, se mostra outra, melhor, cercada por RAQUEL KARRO, uma Sereia, cansada da poluição dos mares e rios; TIAGO HERZ, Roque, um roqueiro que quer tocar sua música na tranquilidade da natureza; LUCAS ORADOVSCHI, um Mágico que deseja fazer suas mágicas sem ser criticado; LUCAS POPETA, Gato Simão; ANDRÉ CELANT; um Soldadinho, que não gosta de guerra e tem vocação para jardinagem; RENATO RESTON, Gato Tião; e PATRÍCIA REGINA, Gata Sebastiana, todos muito bem engajados em seus personagens. Há, também, uma Bailarina de caixinha de música, trocada, assim como outros brinquedos, por videogame e outros eletrônicos, que só aparece na forma de uma bonequinha mesmo. Ao comentar, adiante, o trabalho do elenco, só não falarei sobre TIAGO e LUCAS ORADOVSCHI, já que, ambos não participaram da sessão à qual assisti. O primeiro, que já retornará à trupe nesta semana, foi substituído por VITOR NOVELLO; o segundo, por MAKSIN OLIVEIRA“stand-in” do titular do papel. o que se dará até o final deste mês.   

 

 

 


   A julgar pela interessante e desafiadora cenografia, criada pelo artista SÉRGIO MARIMBA, com elementos psicodélicos e estilizados, além de muito colorida, lembrando um lugar idílico, uma espécie de jardim mágico e encantado, o ambiente onde se dão as ações parece estar associado a locais nos quais acontecem festas que remontam a “raves” ou “celebrações hippies”. Muita paz e amor reunidos, tudo junto e misturado. O cenário pode ser visto pelo público ao adentrar a sala de espetáculo, o que já começa a despertar a curiosidade de todos, crianças e adultos. Este componente cênico é composto por uma grande estrutura de ferro flexível, na forma de um cenário interativo, que acaba promovendo um triálogo com a luz e os figurinos.


  

 

        Agora, que acabamos de falar de um elemento diretamente ligado à plasticidade da peça, creio ser pertinente, chamar a atenção para os caprichados figurinos, desenhados por DANIELLY RAMOS, os quais, além de criativos e de muito bom gosto, apresentam-se num belo acabamento, o que atesta a seriedade como a produção do espetáculo encarou esta montagem, coisa pouco comum em peças infantis. Nada parece ter sido feito “a toque de caixa”, de qualquer jeito, porque “é pra criança e qualquer coisa serve; não precisa tanto”. Tudo foi preparado com o maior zelo e respeito aos pequenos, os quais, muitas vezes, por mais esdrúxulo que possa parecer, são relegadas a segundo plano, quando se pensa numa encenação que os tem como público-alvo.

  

 

 

           Esse encontro do belo com o criativo merecia ser muito bem iluminado, para que todos os detalhes pudessem ser percebidos pela plateia. Para isso, “entra em campo” a figura de AURÉLIO DE SIMONI, um dos mais conceituados e experientes iluminadores do Brasil, com uma proposta de iluminação bastante variada, pautada numa extensa paleta de cores, bem alegres e numa intensidade “de festa”, para somar ao espetáculo.

 

 

 

         Criança adora música, e ela está presente na peça, que conta com a direção musical de JOÃO PEDRO BONFÁ e traz composições e supervisão musical de TONY BELLOTO e seu filho, JOÃO MADER. A canção que encerra o espetáculo é daquelas do tipo “chiclete”; deixei o Teatro repetindo o refrão. Isso é muito bom, quando acontece.

 

 

 

          A encenação é bastante dinâmica, como devem ser os espetáculos para crianças, e muito disso é devido a um ótimo trabalho de direção de movimento, a cargo de SUELI GUERRA, uma premiada profissional nesse setor.

 

 

        

           Tenho o hábito de fazer comentários individuais sobre o trabalho de cada um dos atores e atrizes, entretanto mudei de ideia, do início desta escrita até agora, devido ao nivelamento do elenco. Prefiro dizer que, de um modo geral, todos fazem um correto trabalho, o qual, todos sabemos, é diferenciado do trabalho feito para os adultos, quando o alvo são as crianças. Todos atuam com a devida naturalidade, espontaneidade, não se deixando cair na tentação daquele tom “infantiloide” de querer parecer o que não são. Tudo é dito e acontece na textura ideal; de voz e comportamento.  

 

 

 

      Acertaram a mão, no conduzir a direção, SUZANA SALDANHA, na sua assinatura, propriamente dita, e GILBERTO GAWRONSKI, na supervisão de direção. Este, muito propriamente, é da opinião de que “Caio convida as crianças à reflexão sobre convívio e coletividade”, o que é fundamental para se conseguir viver em sociedade. E prossegue: “Não é um texto sobre empoderamento da mulher, nem sobre racismo, gênero ou etnias se colocando. Mas abrange isso tudo. O ‘ARCO-ÍRIS’ de CAIO é uma ode à diversidade. Simboliza um lugar ‘outsider’, alternativo, uma busca pelo utópico, onde todos vivem em harmonia e a diferença é respeitada.”. Só esperamos que essa utopia caminhe, cada vez mais, para se tornar uma desejada realidade.

 

 

 

   Dois aspectos merecem destaque no texto das peça. O primeiro é quão visionário foi o autor, quando, há mais de 40 anos, se fixava num assunto que, hoje, tanto nos incomoda e nos mobiliza. O segundo é perceber, também, o tamanho da coragem do dramaturgo, ao abordar essa temática, numa época de em que vivíamos sobe um regime de exceção, uma ditadura militar, quando falar em “comunidades” poderia ser motivo de prisão ou outras sanções piores. Sob esse aspecto, posso ratificar um pensamento que já tenho há cerca de sessenta anos, o de que a Censura era burra e não conseguia perceber o que era dito por meio de metáforas.  

 

 

 




 

FICHA TÉCNICA:

Texto: Caio Fernando Abreu

Direção: Suzana Saldanha

Supervisão de Direção: Gilberto Gawronski

 

Elenco: Bianca Byington (Bruxa de Pano), “Stand-in” de Bianca Byington: Gisele Fróes; Raquel Karro (Sereia); Tiago Herz (Roque); Lucas Oradovschi (Mágico); Lucas Popeta (Gato Simão); André Celant (Soldadinho); Renato Reston (Gato Tião); e Patricia Regina; (Gata Bastiana)

Participação Especial (em vídeo): Malu Mader

 

Cenário: Sérgio Marimba

Figurinos: Danielly Ramos

Iluminação: Aurélio de Simoni

Direção de Movimento / Coreografia: Sueli Guerra

Assistência de Movimento / Coreografia: Edney d’Conti

Composições e Supervisão Musical: Tony Belloto e João Mader

Direção Musical: João Pedro Bonfá

Programação Visual: Juliana Della Costa

Operação de Luz: Marcelo de Simoni

Operação de Som: João Paulo Pereira

Diretor de Palco: Ney Silveira

Assessoria de Imprensa: Paula Catunda e Catharina Rocha

Fotos: Kika Antunes

Direção de Produção: Jenny Mezencio

Coprodução: Byor Filmes, No Problem Produções, DaGaveta Produções Agojie Filmes

Coordenação Geral e Realização: Flávio Helder e BFV Cultura Esporte



 



 


SERVIÇO:

Temporada: De 06 de julho a 25 de agosto de 2024.

Local: Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) Rio de Janeiro – Teatro II.

Endereço: Rua Primeiro de Março, nº 66 – Centro – Candelária – Rio de Janeiro.

Dias e Horários: Sábados, às 15h; domingos, às 11h e 15h.

Informações: (21) 3808-2020 | ccbbrio@bb.com.br Ingressos:

Valor dos Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada) (Estudantes, maiores de 65 anos e Clientes Ourocard pagam meia-entrada.)    Bilhetes disponíveis na bilheteria do CCBB ou pelo site bb.com.br/cultura .  

Funcionamento da Bilheteria: De quarta-feira a segunda-feira, das 9h às 20h (Fecha às terças-feiras.).   

ATENÇÃO: Aos domingos, das 8h às 9h, horário de atendimento exclusivo para visitação de pessoas com deficiências intelectuais e/ou mentais e seus acompanhantes, conforme determinação legal (Lei Municipal nº 6.278/2017.

Capacidade do Teatro II: 153 lugares.

Classificação Etária: Livre.

Duração: 50 minutos.

Gênero: Teatro Infantil.

 

 

 



 

           Não me furto a RECOMENDAR O ESPETÁCULO, para crianças de todas as idades: as de pouco tempo cronológico de vida e as de vida interior infantil, as “crianças de espírito”.

 

 

 

 

FOTOS: KIKA ANTUNES

 

 

 

 

 

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