quinta-feira, 13 de junho de 2019


PAULO FREIRE –
O ANDARILHO
DA UTOPIA
(UMA LINDA HOMENAGEM
AO VERDADEIRO “PATRONO
DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA”.
ou
UM ESPETÁCULO QUE DEVERIA
SER VISTO POR TODOS OS BRASILEIROS.



            Por motivos diversos, não consegui assistir a uma peça, em sua primeira temporada, no Parque das Ruínas, o que me deixou profundamente triste. Felizmente, ela voltou ao cartaz, no Teatro Glaucio Gill (VER SERVIÇO), e eu pude vivenciar o enorme prazer de ver, em cena, uma bela e justíssima homenagem a um dos mais ilustres brasileiros de todos os tempos, o grande educador PAULO FREIRE, na peça “PAULO FREIRE – O ANDARILHO DA UTOPIA”.

Este é um espetáculo que deveria ser visto por todos os brasileiros – minha utopia -, independentemente de credos ou posicionamentos políticos. Só gente muito imbecil, oca, culturalmente falando, como a cúpula do atual (DES)governo federal, comandada por um cacique amorfo, para não enxergar a importância desse ilustríssimo cidadão brasileiro, que está correndo o risco, até mesmo, de ter cassado, seu título de “Patrono da Educação Brasileira”, que lhe foi outorgado, por total mérito, em 13 de abril de 2012, pela Lei (federal) 12.612/2012.




Trata-se de um espetáculo muito leve, na forma, e profundo, no conteúdo; lírico, poético, até divertido, de uma beleza e pureza indescritíveis, surgido da junção de força de três pessoas, no primeiro momento: RICHARD RIGUETTI (ator), LUIZ ANTÔNIO ROCHA (diretor) e JUNIO SANTOS (dramaturgo). Os três nos apresentam um belíssimo espetáculo, a partir do grande legado “que PAULO FREIRE deixou na mente e nos corações dos brasileiros”, trecho extraído do “release”, enviado por MÁRCIA VILELLA (TARGET ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO).

           A peça é de uma indispensabilidade tal e de uma atualidade impressionantes, se considerarmos os pensamentos do grande educador e muitas de suas frases célebres: “Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, ofendendo a vida, destruindo sonho, inviabilizando o amor. Se a educação, sozinha, não transforma a sociedade, sem ela, tampouco, a sociedade muda". Ainda está no já referido “release”: “Esse foi um dos últimos escritos do mestre PAULO FREIRE, antes de falecer, em 2 de maio de 1997. Assustadoramente atual. Em tempos em que a educação pública corre o risco de ser drasticamente reduzida, lutar pela dignidade humana é fundamental.”.

E continua o excelente “release”: “A peça derrama, no palco, a trajetória e os causos de um dos mais notáveis pensadores da história da educação mundial. O espetáculo propõe uma reflexão, mostrando a sociedade e o planeta em constante mudança, através da ótica freiriana, misturando elementos das linguagens do teatro, do palhaço e do teatro de rua.”. Foi, exatamente, tudo isso o que me pegou, desde a primeira cena, quando o ator entra, pela plateia, cantando, até a última, que é de arrebatar os nossos corações.







SINOPSE:

É no interior de Pernambuco, à sombra de uma mangueira, que a história começa.

Um menino, com um graveto na mão, inicia o seu processo de leitura do mundo.

É submetido à fome, assim como grande parte da população brasileira.

Na fantasia, ele aparece, no espetáculo, como um astronauta, um professor, um brasileiro com sonhos e fome de tudo. 

Na infância e na juventude, outra fome ocupa o seu tempo: as palavras.

E ele as devora, como se elas fossem pedaços de comida.

E essa foi a sua busca, até a eternidade: as palavras.

Através delas, e com elas, percorre territórios, disseminando a sua pedagogia de ensino e revoluciona a educação mundial, movido pelo desejo de liberdade de si e dos outros, de justiça, igualdade, e superação dos obstáculos.








 Considerado um dos pensadores mais notáveis, na história da pedagogia mundial, tendo influenciado o movimento chamado “pedagogia crítica”, e criador do “Método Paulo Freire de Alfabetização”, o homenageado nasceu em Recife (19 de setembro de 1921) e faleceu em São Paulo, de um ataque cardíaco (2 de maio de 1997), aos 75 anos. Além de grande educador, também se destacou como um, igualmente, respeitado filósofo.

“Sua prática didática fundamentava-se na crença de que o educando assimilaria o objeto de estudo, fazendo uso de uma prática dialética com a realidade, em contraposição à, por ele denominada, educação bancária, tecnicista e alienante: o educando criaria sua própria educação, fazendo, ele próprio, o caminho, e não seguindo um já previamente construído; libertando-se de chavões alienantes, o educando seguiria e criaria o rumo do seu aprendizado. Destacou-se por seu trabalho na área da educação popular, voltada tanto para a escolarização como para a formação da consciência política. (...) Foi o brasileiro mais homenageado da história, com pelo menos 35 títulos de 'Doutor Honoris Causa', de universidades da Europa e América, e recebeu diversos galardões, como o prêmio da UNESCO de Educação para a Paz, em 1986. (...) Sua família fazia parte da classe média, mas PAULO FREIRE vivenciou a pobreza e a fome, na infância, durante a depressão de 1929, uma experiência que o levaria a se preocupar com os mais pobres e o ajudaria a construir seu revolucionário método de alfabetização. Por seu empenho em ensinar os mais pobres, PAULO FREIRE tornou-se uma inspiração para gerações de professores, especialmente na América Latina e na África. O talento como escritor o ajudou a conquistar um amplo público de pedagogos, cientistas sociais, teólogos e militantes políticos, quase sempre ligados a partidos de esquerda. (...) A partir de suas primeiras experiências no Rio Grande do Norte, em 1963, quando ensinou 300 adultos (cortadores de cana) a ler e a escrever, em 45 dias, PAULO FREIRE desenvolveu um método inovador de alfabetização, adotado, primeiramente, em Pernambuco. Seu projeto educacional estava vinculado ao nacionalismo desenvolvimentista do governo João Goulart.”. (Extraído da Wikipédia.)

Por suas ideias revolucionárias, em prol dos menos favorecidos pela sorte, FREIRE representava um “perigo”, para os gorilões de plantão, que aplicaram o golpe militar de 1964, “página infeliz da nossa história”, sendo, por isso mesmo, perseguido, acusado de subversão. Pagou muito caro por sua coragem de colocar em prática um trabalho de educação libertadora, que identifica a alfabetização com um processo de libertação. Esteve preso, em 1964, por 72 dias, até ser exilado, pela ditadura militar, para o Chile, onde trabalhou, por cinco anos, no Instituto de Capacitação em Reforma Agrária e escreveu seu principal livro: “Pedagogia do Oprimido”, em 1968. Ainda passou um tempo nos Estados Unidos e na Suíça, período durante o qual prestou consultoria educacional a governos de países pobres, a maioria no continente africano. FREIRE só retornou ao Brasil em 1980, beneficiado pelo decreto da anistia, assinado em 1979






Passemos, agora, a comentar a excelente encenação, assinada por LUIZ ANTÔNIO ROCHA, o qual “propõe uma estrutura narrativa que leva a um lugar de ideias e reflexão”, misturando histórias, canções e formas brincantes, como o circo, principalmente a palhaçaria, o TEATRO tradicional e o TEATRO de rua, criando um ambiente propício a uma constante interação entre ator e público, que dinamiza muito a montagem. “Essa brincadeira que propomos rompe barreiras de tempo e lugar. Nos leva à lua, um lugar de exílio e reflexão. Traz o encanto das palavras encharcadas de significados tão amorosas de PAULO FREIRE e de suas ideias. São ideias mais que nunca atuais, vivas e necessárias diante da realidade que, neste momento, nos envolve." destaca o diretor, cuja proposta de direção aplaudo de pé, por ser inventiva, criativa, utilizando poucos, porém expressivos, recursos.

Segundo JUNIO SANTOS, dramaturgo, que costurou um vasto e rico material de pesquisa, além de sua contribuição pessoal, “Ler a vasta obra de PAULO FREIRE é necessário e prazeroso. Complicado é - entre tantas palavras e textos significativos - extrair o conteúdo da dramaturgia. Por isso, criamos roteiros cenopoéticos, temperados com cantigas, poemas, com cheiros de vida e cheiros de gente, para propagar a esperança que não cansa na voz, no corpo, na força que desejamos imprimir com o espetáculo.”. Se era essa a intenção, além de fazer com que o público se sentisse abraçado pelo universo freiriano, o que é recíproco, por parte do ator, em relação à plateia, o objetivo é plenamente alcançado.

Salvo engano, se a memória já não começa a me trair, não conhecia o trabalho do ator RICHARD RIGUETTI, cuja formação circense – ele é um palhaço -, observada logo nas suas primeiras intervenções, colabora bastante, para a execução do trabalho ora analisado. Aplicando-se muito bem, em relação ao corpo a às máscaras faciais, com domínio de público e um forte carisma, ele interpreta o personagem protagonista, porém, vez por outra, fala como ator ou como um brasileiro comum, admirador da obra do grande educador.

O que o espetáculo tem de pobre, em termos materiais, essa carência dá margem a ideias interessantíssimas, da direção, da cenografia, do figurino e da iluminação.

LUIZ ANTÔNIO ROCHA é muito criativo e utiliza materiais e objetos do dia a dia, para representar o que precisa ser mostrado, certamente, em comunhão com EDUARDO ALBINO, que assina a cenografia e o figurino. Aquela vai sendo incorporada, ao espaço cênico, à medida que as cenas vão se sucedendo, umas às outras. Quando o espectador adentra a plateia, vê apenas um grande círculo de linóleo, na cor “terra’, representando a aridez do sertão nordestino. Num ponto da cena, apenas um bonsai, iluminado por um foco fino de luz, numa alusão à mangueira, sob, e sobre, a qual o menino PAULO passou parte da infância, no quintal de sua casa. Mais lindo, poético e significativo do que tal singularidade?

O figurino se resume a uma bermuda “cargo” e um blusão. O personagem carrega, cruzados, dois embornais, com aplicações de bordados, de dentro dos quais retira objetos, utilizados em cena. Na cabeça, um chapéu de couro, típico dos vaqueiros, andarilhos, nordestinos, sendo que, numa das partes, ora da frente, ora de trás, depois de virado de posição, pelo ator, estão acopladas as lentes dianteiras de um binóculo, numa clara analogia a que o educador enxergava mais do que ninguém, a distância, com uma visão mais acurada e de vanguarda. Um observador à frente de seu tempo. Nos pés, um sapato de “clown”, que identifica a formação profissional do ator.

A iluminação, a cargo de RICARDO LIRA JR., é bem diversificada, enriquece e põe em destaque as intenções da direção, para cada cena, ajudando a criar imagens muito bonitas.









FICHA TÉCNICA:

Dramaturgia: Junio Santos
Direção: Luiz Antônio Rocha
Assistente de Direção – Márcia Rosa

Interpretação: Richard Riguetti

Cenário e Figurino – Eduardo Albini
Direção de Movimento – Michel Robin
Preparação de Ator – Beth Zalcman
Preparadora Corporal – Aline Bernardi
Projeto de Luz – Ricardo Lira Jr.
Assessoria Pedagógica – Josy Dantas
Preparadora Vocal – Jane Celeste
Letras das Músicas – Ray lima e Junio Santos
Fotos: Danton Valério
Realização: Grupo Off-Sina e Espaço Cênico Produções Artísticas


  









SERVIÇO:

Temporada: De 7 de junho a 1º de julho de 2019.
Local: Teatro Glaucio Gill.
Endereço: Praça Cardeal Arcoverde. s/nº - Copacabana – Rio de janeiro.
Telefone; (21) 2332-7904.
Dias e Horários: De 6ª feira a 2ª feira, sempre às 20h.
Valor dos ingressos: R$50,00 (inteira) e R$25,00 (meia entrada).
Capacidade: 150 lugares.
Recomendado para maiores de 12 anos.
Gênero: Ato Cenopoético*


           





(*Cenopoesia se apresenta em forma de linguagem híbrida, propondo um caminhar, que dialoga pluralidade de expressão e de linguagem, provocando o pensar e o sentido da ação coletiva, o encontro dos sujeitos de corpo inteiro, o ser com arte como ser de vida, de sonho, de afeto, de atitude poética frente à realidade. A obra cenopoética resulta de processo de criação democrático e aberto, retomando a natureza humana da arte, na qual todos somos capazes de viver e de fazer arte. Esse caminhar em chãos de diversidades faz com que sua prática transite em trilhas transcênicas e plurais, preocupando-se com o decorrer do processo criativo, e não com o produto final da obra. É uma manifestação do diverso, resultante da profusão dos repertórios humanos, em que suas combinações são geradas a partir da mistura de linguagens, do cruzamento entre saberes, da interseção entre liberdade criativa e postura política, no entrelaçamento entre cuidado e afeto. Enquanto obra aberta, a cenopoesia vem se apresentando como um fenômeno sociocultural interlocutor da criatividade individual e coletiva, expressa através da arte, por meio de diálogo autônomo, afetivo e interdependente entre várias linguagens, saberes e experiências, como modo de, poeticamente, sintetizar as contradições sociais e de possibilitar leitura crítica do mundo, na perspectiva de conhecer, de refletir e de intervir sobre a realidade. Sem textos preconcebidos, pré-moldados, a cenopoesia acode a um pretexto; e, no contexto, o texto surge (em atos) e se constrói; concretiza-se e age em suas curvas, urnas, químicas, diferentes sabenças, expressões, temperaturas. Da percepção alquímica à intervenção, à vivência, o desafio, de repente, torna o que seria espetáculo um ato de resistência, em linguagem híbrida e leve, reconstituindo-se como síntese dialógica no tempo de ser de cada um que se presenteia com esse cenoato, que tem finalidade e, talvez não tenha fim.”) (JOSI DANTAS, RAY LIMA e JUNIO SANTOS).

Da privilegiada poltrona que me ofereceram, na primeira fila, pude observar, durante todo o tempo que durou a encenação, como a plateia se sentia emocionada e feliz com o que via e ouvia, assim como eu, que, em alguns instantes, senti a visão meio turva, comprometida, por lágrimas que eu teimava em não liberar.

            Recomendo, com empenho, o espetáculo, terminando esta apreciação crítica com uma frase de PAULO FREIRE, para reflexão: "Eu não posso ser, se os outros não são.".





E VAMOS AO TEATRO!!!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI!!!

RESISTAMOS!!!

COMPARTILHEM ESTE TEXTO, PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR 
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!


(FOTOS: DANTON VALÉRIO.)


























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