segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

 

“SENHORA DOS

AFOGADOS”

ou

(UMA MONTAGEM

QUE VAI FICAR PARA

A HISTÓRIA DO

TEATRO BRASILEIRO.)

 

 

 

      NELSON RODRIGUES é incensado e considerado, por uma incomensurável legião de admiradores, como “o maior dramaturgo brasileiro de todos os tempos”, opinião com a qual, arriscando-me a ser apedrejado, tal como Maria Madalena, não compactuo. Escreveu dezessete peças teatrais, das quais só gosto de seis, e “SENHORA DOS AFOGADOS” é uma delas. Sua obra completa está dividida, segundo critérios do grande e saudoso crítico Sábato Masgaldi, em três grupos, de acordo com suas características, a saber: Peças Psicológicas, Peças Míticas (A peça em tela está inserida nesse escaninho.) e Tragédias Cariocas.





         “SENHORA DOS AFOGADOS” foi escrita em 1947, com base na peça Electra Enlutada”, de Eugene O'Neill (1931), que, por sua vez, adaptara a “Orestíada”, de Ésquilo, trágico da antiga Grécia. Estamos, pois, diante de um drama trágico.

 



 


SINOPSE:

“SENHORA DOS AFOGADOS” é uma peça trágica sobre a família Drummond, mergulhada em segredos, incesto e obsessões, em que o mar, como um personagem, age como palco e força mítica, levando as mulheres da casa a se afogarem, tudo desencadeado por um assassinato de uma prostituta 19 anos antes, explorando temas de culpa, desejo reprimido e a tragédia grega. 

A filha mais velha, Moema (LARA TREMOUROUX), deseja, incestuosa e obsessivamente, o pai, Misael (MARCELO DRUMMOND), um juiz, à beira de uma nomeação, assombrado por segredos que emergem das profundezas da própria história, e afoga as irmãs, mas a culpa e a vingança de um noivo atormentam a família, resultando em mortes e revelando a hipocrisia por trás da fachada de uma família conservadora.

Por amor ao pai, Moema, a filha mais velha de Misael e Dona Eduarda (LEONA CAVALLI), resolveu afogar suas irmãs mais novas, Clarinha (LARISSA SILVA) e Dora (CLARISSE JOHANSSON), no mar, para não dividir a atenção do seu pai com elas.

A trama é cheia de mistérios, e Moema consegue ser a única mulher na vida do seu pai, porém ele morre e ela fica só.


 

 



 

         Após grande sucesso num palco italiano (SESC Pompeia) e de uma vitoriosa primeira temporada no emblemático e “mágico” Teatro Oficina, o espetáculo voltou ao cartaz, na pista deste, numa icônica montagem que há de ficar marcada, na memória de quem ama o bom TEATRO, como um dos melhores espetáculos da temporada de 2025, com lugar conquistado e definido na história do TEATRO brasileiro.





         Estamos diante de uma verdadeira “tragédia grega temperada com dendê”, das boas, que nos mostra “um mergulho denso no inconsciente familiar, uma tragédia brasileira em forma e espírito, marcada por paixões, mortes, desejos incestuosos e pela atmosfera fantasmagórica de uma sociedade à beira do colapso”, dirigida, de forma magistral por MONIQUE GARDENBEREG.





         Até hoje, esta é a terceira montagem da peça a que assisti, todas originalíssimas e cada uma delas com suas características próprias e, igualmente, genial. A primeira, em 2010, dirigida por Ana Kfouri, foi encenada num restaurante de três andares, no cais da Praça XV de Novembro, no Rio de Janeiro, uma montagem itinerante que me deixou boquiaberto, com tanta criatividade e talento de um jovem e quase desconhecido elenco. A segunda foi em 2018, “na visão de Jorge Farjalla”, outra produção que explorava, sobremaneira, o aspecto mítico do texto e, da mesma forma, deveras criativa e desafiadora. A terceira é esta sobre a qual disserto e, de certo, me fez deixar o Teatro “flutuando, nas nuvens”, em total “estado de graça”, com vontade de me beliscar, para ter a certeza de que não estava sonhando.





         Ao assumir a direção do espetáculo, MONIQUE GARDENBERG, consagrada cineasta brasileira, conseguiu captar toda a essência da peça, além de agregar, ao seu trabalho, uma linda e merecida homenagem ao “imortal Zé Celso”, por meio de muitas pinceladas da estética “zecelsiana”, mormente no segundo ato.





         Os Drummond são, aparentemente, uma família perfeita, à beira-mar, mas esconde desejos e segredos sombrios, os quais, entrelaçados, dão o toque de tragédia na trama.  Há 19 anos, o patriarca, Misael (MARCELO DRUMMOND) é acusado de assassinar uma prostituta, crime que assombra a todos e desencadeia os eventos da peça. Embora, no centro da trama, esteja ele, ao seu redor, giram personagens fortíssimas, tomadas por impulsos inconfessáveis, como Moema (LARA TREMOUROUX), a filha intensa e intuitiva, um poço de sensualidade e lascívia, e Dona Eduarda (LEONA CAVALLI), idem, esposa e figura central de uma dinâmica familiar marcada por silêncio, poder e ressentimento.





            O texto parece ter sido escrito para as mulheres, as atrizes, brilharem, e todas não deixam escapar a oportunidade de registrar sua marca indelével nesta produção, das que exercem o protagonismo àquelas que, para provarem que “não existem pequenos papéis”, são profundamente notadas pelo público e, devidamente, aplaudias, como é o caso de CRISTINA MUTARELLI, GIULIA GAM, MICHELE MATALON e LÍGIA CORTÊZ, as quatro vizinhas “observadoras”, um eufemismo para “fofoqueiras sarcásticas”, as quais fazem as vezes do coro das tragédias gregas e que são formidáveis em suas falas e seus silêncios expressivos, estes, por vezes, até mais expressivos que aquelas.





  O trio feminino que divide o protagonismo da peça é formado por REGINA BRAGA (Dona Marianinha, a avó), LEONA CAVALLI (Dona Eduarda, a mãe) e LARA TREMOUROUX (Moema, a filha mais velha), cada qual mais exuberante e incisiva em suas interpretações. REGINA e LEONA, duas velhas conhecidas, de grandes trabalhos anteriores, me proporcionaram momentos de intensa emoção em suas “performances”, mormente LEONA, numa participação maior, embora a personagem de REGINA me pareça ter encontrado, na consagrada intérprete, o “cavalo” ideal, para “ganhar vida”. São duas atrizes intensas e muito cônscias de como deve se comportar uma excelente atriz em cena. Causou-me, entretanto, um prazer indescritível e uma gratíssima surpresa ver LARA TREMOUROUX, interpretando a filha incestuosa. Essa estupenda jovem atriz se comporta como uma veterana das tábuas, despertando-me o desejo de aplaudi-la em cena aberta, mais de uma vez, o que só não fiz para não quebrar o ritmo e a dramaticidade das cenas.





  No naipe masculino, a despeito da ótima atuação de MARCELO DRUMMOND, como o “chefe de família”, destaco, com muito prazer e assertivamente, dois jovens grandes atores, cujos trabalhos eu não conhecia e que me agradaram sobremaneira. Refiro-me a KAEL STUDART (Paulo, o único filho homem da família Drummond) e RODERICK HIMEROS, no papel do Noivo de Moema e filho da prostituta assassinada. Ambos me convenceram, com suas interpretações, e já me provocaram o desejo de revê-los em novas produções.





  Os elementos de criação, neste espetáculo, atendem, totalmente, às necessidades e geniais ideias da direção. Aplaudo a cenografia, assinada por MARÍLIA PIRAJU, cujo nome, na FICHA TÉCNICA, aparece, pomposa e merecidamente, como “Arquitetura Cênica”, ressaltando a felicíssima ideia de ter utilizado, no segundo ato, o gigantesco painel que fez parte da cenografia da inesquecível peça “O Rei da Vela”, em sua montagem mais recente, de 2017. Da mesma forma, parabenizo CÁSSIO BRASIL pelo sensacionais figurinos, predominantemente sóbrios e escuros, no primeiro atoe, e coloridos e criativos, seguindo da estética “carnavália” de Zé Celso.





   Três artistas de criação, que, a meu juízo se viram, diante de dois desafios, são Wagner Pinto e Sarah Salgado, que souberam, com maestria, iluminar cada cena, num espaço cênico “diferente”, e Camila Fonseca, a qual assumiu a difícil tarefa de criar um “desenho de som” que pudesse levar, com perfeição e clareza audível, tudo o que era falado e cantado aos ouvidos de todos os espectadores, quaisquer que fossem suas posições naquele “tempo sagrado”.





    Como tudo, na peça, é superlativo, não posso omitir o belíssimo trabalho de SONIA USHIYAMA SOUTO, responsável pelo visagismo; FELIPE BOTELHO, que assina uma ótima direção musical; e os músicos CARLOS EDUARDO SAMUEL, FELIPE BOTELHO e PEDRO GONGOM MANESCO, que também contribuem para o bom funcionamento do espetáculo, fazendo parte da banda que atua acompanhando os atores.





    Não poderia negar o reconhecimento ao trabalho de todos os técnicos e funcionários do Teatro Oficina, os quais garantem aquele fazer teatral, bem como os responsáveis pela produção. Particularmente, agradeço a duas pessoas: TATI ROMMEL (direção de produção), pela gentileza e fidalguia como me recebeu no Teatro, inclusive facultando-me a primazia de ter sido o primeiro a adentrar aquele espaço, cerca de 40 minutos antes do início da peça, permitindo-me, entre os atores, assistir a uma passagem de som e acertos técnicos, e ADRIANA MONTEIRO, a assessora de imprensa da peça e do Teatro, que me fez o gentil convite para assistir à peça.





    Sim, quase que me esqueço de mencionar dois outros nomes: os de IGOR MAROTTI DUMONT e CIÇA LUCCHESIN, na direção de vídeo, responsáveis pelas imagens que são exibidas, em gravação ou em tempo real, sendo que, para que estas existam, é fantástico o trabalho de IGOR, o qual, operando, habilmente, uma câmera, não mede esforços para captar os melhores ângulos das cenas, durante todo o espetáculo.





   Destacando o acerto total de MONIQUE GARDENBERG, como diretora desta estupenda montagem, transcrevo um trecho extraído de um formidável “release” que me foi enviado pela assessoria de imprensa: Nesta encenação, o espaço cênico é atravessado por elementos audiovisuais, trilha original e ambientações sensoriais. Um coro de ‘putas do cais’, evoca Zé Celso, reforça o clima onírico e alucinatório da narrativa. Ambientada em uma casa à beira-mar, onde o oceano é mais que cenário — é extensão simbólica da psique familiar — a peça propõe um mergulho nos limites entre realidade e delírio, desejo e culpa. A casa, impregnada de sal, luto e memória, torna-se um organismo vivo: respira com as marés, ecoa as vozes silenciadas, e revela as camadas subterrâneas de uma família dilacerada. (...) Um espetáculo que convida o público a encarar seus próprios abismos.”.

 





 

FICHA TÉCNICA:

Texto: Nelson Rodrigues

 Direção: Monique Gardenberg

 

Elenco: FAMÍLIA DRUMMOND: Misael Drummond = Marcelo Drummond, Dona Marianinha = Regina Braga, Dona Eduarda = Leona Cavalli, Moema = Lara Tremouroux, Paulo = Kael Studart, Dora = Clarisse Johansson, Clarinha - Larissa Silva; VIZINHAS: Cristina Mutarelli, Giulia Gam, Michele Matalon e Lígia Cortêz; CAIS: Noivo = Roderick Himeros, Mãe do Noivo = Sylvia Prado, Dona = Vick Nefertiti, Vendedor de Pentes = Marcelo Dalourzi e Sabiá = Alexandre Paz; MULHERES DA VIDA: Danielle Rosa, Kelly Campêllo, Mariana de Moraes, Selma Paiva e Zizi Yndio do Brasil; MICHÊS: Tony Reis e Victor Rosa

 

Banda: Carlos Eduardo Samuel, Felipe Botelho e Pedro Gongom Manesco

 

Direção de Vídeo: Igor Marotti Dumont e Ciça Lucchesi

Arquitetura Cênica: Marília Piraju

Figurino: Cássio Brasil

Visagismo: Sonia Ushiyama Souto

Desenho de Luz: Wagner Pinto e Sarah Salgado 

Direção Musical: Felipe Botelho

Direção de Cena: Elisete Jeremias e Rafael Bicudo

Desenho e Operação de Som: Camila Fonseca

Adereços e Objetos: Abmael Henrique

Máscaras Vizinhas: Ricardo Costa

Direção de Produção: Tati Rommel

Produção: Ana Sette e Filipe Fonseca

Produção Executiva: Anderson Puchetti

Assistência de Direção: Maria Borba 

2ª Assistência de Direção: Anderson Moreira Sales, Giovanna Parra e Vinícius Tardite

Câmera ao Vivo: Igor Marotti Dumont

Operação de Vídeo: Diego Avarte 

"Storyboard": Renato Blaschi

Produção de Luz: Carina Tavares

Operação de Luz: Victoria Pedrosa e Pedro Felizes

Assistente de Som: Clevinho Ferreira

Microfonista: Julia Ávila e Nick Guaraná

Técnico de Palco: Guira Bará

Assistencia de Produção: Sofia Rommel

Assistente de Figurino: Danni Tocci

Estagiárias de Figurino: Ana Flávia Manfredini e Mariana Rosim

Assistente de Visagismo: Érica Gabi

Camareira: Cida Melo

Assistente de Camareira: Dan Salas

Cenotécnicos: Cássio Omae, Bruno Ramon, Brenda Stephanie, Cléber Martins, Deoclécio Alexandre, João Tadeu e Rivaldo Trevor

Contrarregas Areia: Alex Augusto e Diego Monte 

Identidade Visual e Programa: Igor Marotti Dumont

Fotografias Programa: Igor Marotti e Roseane Moura

Assessoria de Imprensa: Adriana Monteiro

Fotos: Pedro Martins, Paula Caldas, Laura Carvalho, João Maria, Guilherme Gnipper e Antônio Simas Barbosa 

Coordenação Acervo Oficina: Elisete Jeremias

Guardiã Figurinos / Acervo Oficina: Cida Melo

Arquivo Acervo Oficina: Thais Sandri

Apoio Cultural: Salão 1838 Estados Unidos, Cantina e Pizzaria Piolin, Rancho Nordestino, Nou Restaurante e Restaurante Plantaria

Realização: Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona

 

 

 

 










 

 

SERVIÇO:

Temporada: De 17 de outubro e 21 de dezembro de 2025.

Local: Teatro Oficina.

Endereço: Rua Jaceguai, nº 520 - Bela Vista – São Paulo.

Dias e Horários: 6ª feira e sábado, às 20h; domingo, às 18h.

SESSÃO EXTRA: 23 de dezembro, às 14h30min (Celebração à eternidade de Luis Antônio Martinez Corrêa).

Valor dos Ingressos: Inteira: R$ 120; Meia-Entrada: R$ 60.

Morador do Bixiga: R$ 50 (Compra presencial, na bilheteria, mediante comprovante de endereço em próprio nome; um ingresso por comprovante).

Vendas “on-line”: Plataforma Sympla (com taxa de serviço) ou na Bilheteria do Teatro (sem taxa de conveniência). 

*A bilheteria do Teatro abre com uma hora de antecedência ao espetáculo.

**Sujeito à lotação da casa.

***O Teatro não dispõe de estacionamento nas proximidades.

****Os lugares não são numerados. O ingresso ao Teatro será feito mediante a ordem de chegada.

****Acessibilidade. 

Duração: 150 minutos, com intervalo.

Classificação Indicativa: 16 anos.

Informações à imprensa: Ofício das Letras - Adriana Monteiro (11) 99481-7953
adriana@oficiodasletras.com.br

Gênero: Drama.


 

 



 

         Mesmo tendo sido escrita em 1947, a peça foi considerada bastante “polêmica”, interditada pela famigerada censura e só foi encenada, pela primeira vez, em 1954, tendo sido considerada um “teatro desagradável”, “por perturbar o público com seus temas”. Creio que, até hoje, ainda é um pouco isso. 





            Depois de não sei quantos anos, voltei a pisar o chão do Teatro Oficina, a primeira vez após a trágica passagem do Zé Celso. Foi indescritível a minha alegria e emoção. No primeiro pé que coloquei naquele espaço, fui acometido por uma pequena taquicardia e meus olhos ficaram marejados. Agradeço aos DEUSES DO TEATRO, pela oportunidade de voltar àquele TEMPLO SAGRADO. VIVA ZÉ CELSO!!! ZÉ CELSO VIVE!!!



“SENHORA DOS AFOGADOS” é uma celebração dionisíaca, um espetáculo que convida o público a encarar seus próprios abismos e é um trabalho tão bem executado, que o RECOMENDO, COM TODO O VIGOR DA MINHA ALMA, aguardando sua vinda para o Rio de Janeiro, o que parece que vai acontecer, talvez após o carnaval, segundo apurei no local. É claro que irei rever mais de uma vez!!!





OBSERVAÇÕES: Porquanto, oficialmente, o final da atual temporada esteja marcado para o próximo dia 21 de dezembro, na verdade, haverá mais algumas sessões ainda este ano: sessão dupla, no dia 23, em memória de Luís Antônio Martinez Corrêa, irmão de Zé Celso, e voltará ao cartaz, no mesmo Teatro Oficina, em janeiro de 2016, após as festas de final de ano, nos dias 16, 18 30 e 31 de janeiro e 01, 06, 07, 08 e 09 de fevereiro, sempre às 20 horas.

 






FOTOS: PEDRO MARTINS, PAULA CALDAS, LAURA CARVALHO, JOÃO MARIA, GUILHERME GNIPPER e ANTÔNIO SIMAS BARBOSA.

 

 

 

 

 

É preciso ir ao TEATRO, ocupar todas as salas de espetáculo, visto que a arte educa e constrói, sempre; e salva. Faz-se necessário resistir sempre mais. Compartilhem esta crítica, para que, juntos, possamos divulgar o que há de melhor no TEATRO BRASILEIRO!

 

 
















































































































































































































































































































































































































































































































































































































































































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