segunda-feira, 12 de maio de 2025

 

“PAIXÃO VIVA”

ou

(UMA CRÍTICA

TEATRAL SOBRE

ALGO QUE

“NÃO É TEATRO”.)

ou

(UMA “MASTERCLASS”

DE TEATRO)

ou

(UMA BELA E COMOVENTE RADIOGRAFIA

DA ALMA DE

UMA ARTISTA.)

 



Um dos motivos que está me afastando, cada vez mais, dos teatros, no Rio de Janeiro, é o deslocamento até eles, exigindo-me um esforço hercúleo. Não consigo aceitar o fato de levar quase duas horas, 1h50min, exatamente, para chegar a um teatro que fica a 31km da minha casa. O trânsito é infernal, os motoqueiros são infernais, a luta por uma vaga para o meu carro é infernal, o meu desgaste, físico e emocional, é infernal... Tudo é infernal. É preciso muito amor ao TEATRO e vontade de assistir aos espetáculos, para justificar o fato de eu, ainda, não ter decidido a não ir mais. Mas, para tudo, há um limite, e o meu já está dando as caras.



       O preâmbulo é para mostrar em que contexto cheguei, no dia 08 de maio de 2025, ao Teatro Poeirinha, a simpática casa de espetáculos de Botafogo, para assistir ao solo “PAIXÃO VIVA”, interpretado pela magnífica ÍTALA NANDI, um verdadeiro monumento da arte de representar, seja no TEATRO, seja no cinema, seja, mais esporadicamente, na televisão.



Voltando ao preâmbulo, posso retornar a casa muito aborrecido, por ter assistido a um espetáculo que não merecia o meu enorme sacrifício para assistir a ele, o que, infelizmente, vem ocorrendo com uma boa frequência, ou muito feliz e recompensado, quando tudo vale a pena, quando a qualidade da peça não é pequena, plagiando o maior poeta em língua portuguesa, Fernando Pessoa. Felizmente, “PAIXÃO VIVA” me fez deixar o Poeirinha “com a alma lavada e enxaguada” (E viva Odorico Paraguaçu! E viva Dias Gomes!).



       Antes de entrar nos comentários sobre o que me foi dado ver, preciso justificar os três subtítulos que criei. O primeiro se justifica pelo fato de eu não ter considerado o espetáculo uma “peça de TEATRO”, mas, sim, uma grande e deliciosa conversa em que a atriz se manifesta falando e o público responde com uma total atenção a tudo o que é dito, o que pode caracterizar uma grande “masterclass”, como ne expressei no segundo subtítulo. Isso dito, chegamos ao terceiro, que é, exatamente, como senti os 90 minutos, que parecem 9, de total interesse pelo que ia ouvindo.



 

SINOPSE:

Ícone da cultura brasileira, com trajetória marcante, tanto no cinema como no TEATRO e na televisão, a atriz ÍTALA NANDI, de 82 anos, ocupa o Teatro Poeirinha, com o solo performático “PAIXÃO VIVA”, com o qual dá início às comemorações dos seus 65 anos de carreira.

Escrito a quatro mãos por ÍTALA e o cineasta EVALDO MOCARZEL, que também a dirige, o monólogo revisita importantes momentos da história pessoal e profissional da premiada artista gaúcha.

 



Ao final da sessão, fiz questão de cumprimentar ÍTALA, de cujo trabalho sou, e sempre fui, um fã incondicional, e de lhe dizer que hoje, aos 75 anos de idade, relembro as vezes em que tive de falsificar a carteirinha de estudante (Quem não, por uma “boa causa”?) ou “passar a conversa” nos porteiros dos teatros (Mas nunca os subornei; nem com um bombom “Sonho de Valsa”, que a gente comprava nas bombonieres dos teatros. Momento descontração!”), para poder assistir aos espetáculos do Teatro Oficina, nos quais ela reinava, como a principal atriz da Companhia. Sim, ÍTALA NANDI sempre foi a principal figura feminina, no início do Teatro Oficina, muito ativa na sua fundação, ao lado de Zé Celso Martinez Corrêa, Renato Borghi e Fernando Peixoto, e esteve presente na primeira e antológica montagem de “O Rei da Vela”, a que assisti, e foi musa do cinema nacional por quase duas décadas, protagonista do primeiro nu de uma mulher no TEATRO brasileiro — no espetáculo “Na Selva das Cidades”, em 1969 — (A que também assisti.) e intérprete de memoráveis personagens no palco e na TV. Coleciona grandes momentos em longas-metragens emblemáticos das filmografias de Joaquim Pedro de Andrade (“O Homem do Pau Brasil”), Ruy Guerra (“Os Deuses e os Mortos”), Anna Muylaert (“O Clube das Mulheres de Negócios”) e Arnaldo Jabor (“Pindorama”), entre outros.



ÍTALA NANDI nasceu em Caxias do Sul (RS), em 1942, e se tornou atriz aos 17 anos, ainda em sua cidade natal. Ostenta o título de “Notório Saber em Artes Cênicas”, pela UFRJ, e já atuou em mais de 20 filmes, 20 telenovelas e 30 peças de teatro, nas últimas seis décadas. É detentora de inúmeros prêmios, tanto nas tábuas como na telona, nacionais e internacionais. Também é uma das responsáveis pela criação do “Festival de Cinema do Paraná”. Na telinha, participou de três grandes novelas da TV brasileira: “O Direito de Amar”, “Que Rei Sou Eu?” e “Pantanal”. Já lançou quatro livros, entre eles, os celebrados “Teatro Oficina, Onde a Arte Não Dormia (Editora Nova Fronteira) e “Milagres” (Editora Pimenta Malagueta), de contos. Incansável, é diretora do Espaço Nandi, uma escola de formação de atores, no Rio de Janeiro, administrado por seu filho.



Quando alguém se dispõe a falar de uma mulher à frente do seu tempo, no Brasil, que teve a coragem de “dar a cara a tapa”, de se expor, em defesa dos direitos da mulher e da liberdade feminina, o primeiro nome que surge é o de Leila Diniz, muito justo, diga-se de passagem, contudo não penso duas vezes para dizer que ÍTALA, contemporânea de Leila, tem que estar dividindo o primeiro lugar do pódio com esta, por tudo de arrojado e corajoso que fez, tendo que enfrentar cruéis adversários. Com relação à nudez, no palco, são palavras suas: “Fico nua, para defender minhas ideias. Sou uma mulher livre. Vivo de arte, desde que me entendo por gente. Sejamos realistas, queiramos o impossível! Esse é meu lema. Nunca tive preconceitos, sou fiel a mim e tenho o coração voltado para o amor.”. E eu acrescento que o “nu artístico” nunca foi e jamais será considerado feio ou pornográfico.



O espetáculo “PAIXÃO VIVA”, cujo título jamais poderia ser outro, foi concebido, inicialmente, para uma apresentação “on-line”, durante a pandemia de COVID-19, via Sesc SP, porém cresceu, tomou corpo, e também pode ser chamado de documentário cênico, nos palcos.



O que vemos num espaço cênico, no decorrer de 90 minutos, que não sentimos passar e nos deixa com um gostinho de “quero mais”, quando as luzes se apagam, é uma mulher / atriz, de forma livre e despudorada, revisitando personagens que já interpretou, “conversando” com caros amigos, quase todos falecidos, por meio de diálogos imaginários; são pessoas que influenciaram, profundamente, sua vida e arte, sem fronteiras definidas. Nesse caminhar, ÍTALA transita entre passado, presente e futuro. “Em seu corpo, cenas são projetadas e também, em primeiro plano, um diálogo com o espectador.”, conta EVALDO MOCARZEL, diretor deste trabalho.



Desta vez, não vou me deter em comentários acerca da cenografia, na FICHA TÉCNICA sob a rubrica direção de arte (FERNANDO SCARPA), do figurino (ANA RUCKERT) e da luz (GABRIEL LAGOAS), por um único motivo: embora reconheça a importância do papel de cada um desses elementos estruturais para uma montagem, como não considero o espetáculo uma peça teatral, penso que, se ÍTALA se apresentasse ao público com um simples “Boa noite!” e se sentasse numa cadeira comum, vestindo o que bem lhe aprouvesse e sob um único facho de luz de serviço, a emoção passada seria a mesma, se bem que as projeções que acompanham a narrativa (MAURICIO SOUZA) sejam muito interessantes e agregam valor a esta “performance”, a este “bate-papo”. Esses elementos existem para justificar a rubrica de “monólogo”, um gênero teatral.



         Embora deva existir um texto – no mínimo, um roteiro –, acompanha(N)do (as / pelas) projeções, não parece nada decorado, tais são a espontaneidade e a vibração da atriz, a cada nova informação, permeada por emoção e um sentimento de agradecimento a cada um dos amigos com quem ela trabalhou e dividiu seus momentos de sucesso e de fracasso, até mesmo, muitíssimo mais aqueles que estes. ÍTALA é doce, ao falar; é gentil, ao agradecer; é verdadeira, ao se despir de todo e qualquer preconceito; é uma beleza, conservada a sete chaves e com muito vigor e disposição física.



         Por não aparecer muito na televisão, trabalhando nela de forma meio bissexta, nos últimos anos, dedicando-se mais às aulas de seu curso de TEATRO, muita gente nem conhece ÍTALA NANDI, o que é um absurdo, completamente injustificável, mas que, em se tratando de Brasil, um país que cultua, excessivamente, o que vem de fora e tem memória curta para os talentos nacionais, nem é tanto de se estranhar, infelizmente. Pois eu digo que as gerações mais novas, principalmente os estudantes de TEATRO e os atores mais jovens TÊM A OBRIGAÇÃO de conhecer o trabalho de ÍTALA NANDI, no Teatro Poeirinha, e, a partir daí, incomodar o “Tio GOOGLE”, para saber quem é essa mulher, essa grande artista brasileira.  


 

 

FICHA TÉCNICA:

Texto: Ítala Nandi e Evaldo Mocarzel

Direção: Evaldo Mocarzel

Assistência de Direção: Guilherme Scarpa

 

Interpretação: Ítala Nandi

 

Direção de Arte: Fernando Scarpa

Figurino: Anna Ruckert

Iluminação: Gabriel Lagoas

Produção: Dobbs Scarpa

Projeções e Edição de Imagens ao Vivo: Mauricio Souza

Fotos: Felipe O’Neill e Guilherme Scarpa

Realização: Evaldo Mocarzel, Ítala Nandi, Fábio Dobbs e Guilherme Scarpa

Assessoria de Imprensa: Dobbs Scarpa


 





SERVIÇO:

Temporada: De 1º de maio a 29 de junho de 2025.

Local: Teatro Poeirinha.

Endereço: Rua São João Baptista, nº 104, Botafogo, Rio de Janeiro.

Dias e Horários: De 5ª feira a sábado, às 20h; domingo, às 19h.

Valor dos Ingressos: R$ 120 (inteira) e R$ 60 (meia-entrada).

Ingressos: Plataforma SYMPLA ou na Bilheteria do Teatro.

Duração: 90 minutos.

Indicação Etária: 14 anos.

CONTATOS: Fábio Dobbs (21) 99442-0753 e Guilherme Scarpa (21) 99653-1772

dobbs.scarpa@gmail.com

Gênero: Monólogo.  


           


 


     Para encerrar, volto ao primeiro parágrafo, para dizer que, sob aquelas condições, quando o espetáculo não corresponde às minhas expectativas, volto para casa maldizendo a hora em que decidi ver aquela peça, todavia, quando ele supera, até em muito, o que eu esperava encontrar, como é o caso de “PAIXÃO VIVA”, eu volto para casa mais leve e procuro esquecer todo o sacrifício que passei, para me deleitar com uma grande apresentação.

 

 

 


FOTOS: FELIPE O”NEILL

e

GUILHERME SCARPA

 

 

 

 

GALERIA PARTICULAR

(Foto: Evaldo Mocarzel)

 


Com Ítala Nandi.


 

É preciso ir ao TEATRO, ocupar todas as salas de espetáculo, visto que a arte educa e constrói, sempre; e salva. Faz-se necessário resistir sempre mais. Compartilhem esta crítica, para que, juntos, possamos divulgar o que há de melhor no TEATRO brasileiro! 






















































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