“PALAVRAS DE
MULHER”
ou
(QUANDO A
LITERATURA E O TEATRO SE ABRAÇAM POR UMA BOA CAUSA.)
Estreou anteontem,
para uma curtíssima temporada (Que novidade!!!), infelizmente, um
espetáculo que reúne, num afetuoso abraço, duas das mais importantes
ferramentas para disseminar cultura: A literatrura e o TEATRO. Falo da peça “PALAVRAS DE MULHER”, que pode ser
vista, somente até o dia 21 deste mês (janeiro / 2024), no Teatro
Candido Mendes.
Atendendo
ao duplo convite, de SERGIO FONTA,
diretor da peça, e DEBORAH GOI,
assessora de imprensa (Bradart Comunicação & Marketing), abri uma exceção, que
espero não mais repetir, e fui àquele Teatro, em Ipanema.
Os motivos que me levaram, já há algum tempo, a deixar de ir ao Candido
Mendes foram muito bem pensados e nasceram de uma profunda observação
pessoal, porém prefiro não os tornar públicos, mas, se os curiosos quiserem
conhecê-los, existe, para isso, o privado, nas redes sociais.
A peça se passa em uma “biblioteca no Paraíso”,
a “Biblioteca
das Bibliotecas”.
A ação transcorre durante um encontro entre quatro
mulheres, já falecidas, obviamente, promovido por uma delas.
Durante o colóquio, o quarteto conversa,
despreocupadamente, sobre suas vidas e obras, propondo-se não só a difundir a
literatura brasileira, como estimular a leitura, destacando, ainda, questões
femininas, presentes em nossa sociedade e que, até hoje, vêm sendo pauta de
muitos debates.
O espetáculo leva a plateia a revisitar as vidas e obras de quatro grandes personalidades femininas e icônicas da literatura brasileira: Carmen da Silva (STELLA MARIA RODRIGUES), Clarice Lispector (LAURA PROENÇA), Eneida de Moraes (IZABELLA BICALHO) e Hilda Hilst (HELGA NEMETIK).
Carmen
da Silva (1919 – 1985) foi uma psicanalista, jornalista e escritora brasileira, uma das precursoras
do feminismo no país, já tendo sido definida como “um
dos símbolos da modernização da imprensa e da sociedade brasileira
contemporânea”. Nos anos 1940, viveu no Uruguai e na Argentina,
onde iniciou sua carreira de escritora e jornalista, publicando seu primeiro
livro. Nos anos 1960 radicou-se no Rio de Janeiro e consolidou seu
talento como escritora, colaborando com jornais e revistas. Durante 22
anos ininterruptos, entre 1963 e 1984, redigiu a coluna "A
Arte de Ser Mulher", na revista "Claudia", da Editora Abril. A coluna antecipou
alguns dos debates que seriam, depois, encampados pelo discurso feminista por aqui, como o uso
da pílula anticoncepcional, a inserção da mulher no mercado de trabalho e o divórcio, entre outros. Em seus
escritos, Carmen contava a história de mulheres que, antes mesmo da
existência de movimentos feministas organizados no Brasil contemporâneo,
apresentavam os contrastes e desigualdades para os dois sexos. Seus textos
proporcionaram novas formas de pensar e interpretar a condição feminina em nosso
país. Sobre ela, na ocasião de sua morte, aos 65 anos de idade,
manifestou-se a, também, grande escritora e guerreira na luta pelos direitos
das mulheres, Marina Colasanti: “Carmen da Silva morre muito jovem para todos nós. Pra onde quer que ela
esteja indo, o pessoal de lá que se cuide, porque ela vai balançar o coreto.”. (As informações bibliográficas das quatro
escritoras foram encontradas na Wikipédia, com adaptações.)
Das quatro, creio que Clarice
Lispector (1920 – 1977) seja a que mais dispensa apresentações, visto ser
uma das maiores escritoras em língua portuguesa, a meu juízo, a despeito de ter
nascido na Ucrânia, embora se dissesse, com muito orgulho, brasileira e
pernambucana. Por causa da Guerra Civil Russa, se viu obrigada a emigrar, em decorrência da
perseguição a judeus, à época, a qual resultou em diversos extermínios em
massa. A futura escritora chegou ao Brasil, ainda pequena, em 1922,
com seus pais e duas irmãs e dizia não ter nenhuma ligação com a Ucrânia
– “Naquela terra, eu, literalmente, nunca
pisei: fui carregada de colo” - e que sua verdadeira pátria era
o nosso país. Clarice foi escritora e jornalista, autora de romances, contos e ensaios, considerada uma das
escritoras brasileiras mais importantes do século XX. Sua obra está repleta
de cenas cotidianas simples e tramas psicológicas, considerando-se, como uma de
suas principais características, a epifania de personagens
comuns em momentos do cotidiano. Algumas
de suas mais importantes obras – alguns títulos se tornaram “best
sellers” e leitura obrigatória nos banco escolares – são “Perto do Coração Selvagem”, “Uma
aprendizagem ou O livro dos Prazeres”, “Água Viva”, “Laços de Família”, “A Paixão Segundo G.H.”, “AS Hora da Estrela” e “Um Sopro de Vida”.
Eneida
de Moraes (1904 – 1971), ou, simplesmente, Eneida, como preferia ser chamada e conhecida, foi
uma jornalista, escritora, militante política e pesquisadora brasileira. Eneida
é sempre descrita, em relatos de amigos e parentes, como uma mulher
forte, viva, corajosa, audaciosa e inteligente. Foi filiada
ao Partido
Comunista do Brasil (PCB), declaradamente, marxista, liderou greves e
manifestações contra o sistema capitalista e as opressões do governo
brasileiro. Envolveu-se, diretamente, nas revoluções de 1932 e 1935,
o que resultou em 11 prisões durante o Estado Novo, além de torturas, clandestinidade
e exílio. Na prisão, conheceu Olga Benário e Graciliano Ramos, que a
imortalizou em “Memórias do Cárcere”, um dos seus principais livros. Atuou
como jornalista profissional em periódicos partidários e da grande imprensa,
nas funções de repórter e de cronista, entremeando essas atividades com a
publicação de 11 livros e várias traduções.
A quarta personagem é Hilda Hilst (1930 – 2004), poeta, ficcionista, cronista e dramaturga. É considerada, pela
crítica especializada, como uma das maiores escritoras em língua portuguesa
do século XX. Seu trabalho aborda
temas como misticismo, insanidade, erotismo e libertação
sexual feminina. Hilst foi, fortemente, influenciada por James Joyce e Samuel Beckett, e essa influência
aparece em temas e técnicas recorrentes em seus trabalhos, como o fluxo da consciência e realidade
fraturada. Hilda Hilst escreveu por
quase cinquenta anos, tendo sido agraciada com os mais importantes prêmios
literários do Brasil. Assuntos tidos como, socialmente, controversos foram temas abordados pela autora, em suas obras. A
própria escritora, no entanto, confessou, numa entrevista à publicação “Cadernos
de Literatura Brasileira”, que seu trabalho sempre buscou,
essencialmente, retratar a difícil relação entre Deus e o homem.
Feitos
esses comentários, o que se pode esperar de um encontro, ainda que fictício,
entre essas incríveis mulheres, representadas por um quarteto de excelentes
atrizes? Certamente, uma conversa muitíssimo agradável, leve, profícua e
engraçada, já que as quatro personagens tinham um aguçado senso de bom humor,
crítico e irônico, por vezes, em doses diferentes. O TEATRO, para ser bom, precisa de um bom texto, como este, da
escritora, dramaturga e poeta RACHEL
GUTIÉRREZ, entretanto, antes da concepção da dramaturgia, é preciso que
esta seja o desenvolvimento de uma boa ideia. Considero ótima e oportuna a que
levou Dona RACHEL a
escrever esta peça. Aprovei seus diálogos, ágeis e muito bem escritos.
O
texto torna-se mais robusto e, consequentemente, enriquecido por ter recebido
uma magnífica leitura do diretor, SERGIO
FONTA, o qual, com efeito, percebeu que estava diante de um grande desafio,
uma vez que precisava evitar que a peça se tornasse maçante, pelo fato de o
tema, voltado para a literatura, não ser tão popular, infelizmente, neste país,
onde pouco se lê e, menos ainda, os escritores são valorizados, sequer
lembrados. O diretor se ocupou em posicionar as atrizes ocupando todo o espaço
cênico, com excelentes marcações – o espetáculo acabou se tornando muito
dinâmico -, ao mesmo tempo que soube explorar o potencial de cada uma.
É
sempre importante que haja homogeneidade no elenco, independentemente de os “actantes”
representarem protagonistas ou personagens secundários. Aqui, estamos diante de
quatro protagonistas e o trabalho das atrizes é nivelado bem por cima. Todas
têm a oportunidade de destaque, numa cena ou outra, e o fazem de forma
brilhante, sem desperdício de um minuto de atuação. Reparei que não houve uma
preocupação mimética, mas cada personagem foi construída de tal forma, que os
que conheceram Carmen, Clarice, Eneida e Hilda
podem identificar características delas em cada trabalho de interpretação.
Gostei de todas as atuações, entretanto reservo um aplauso mais esticado para STELLA MARIA RODRIGUES e IZABELLA BICALHO. Não sei dos dotes de
cantora de LAURA PROENÇA, mas
conheço muito bem, e admiro muitíssimo, as vozes de STELLA, IZABELLA e HELGA, três estupendas “cantrizes”,
as quais já aplaudi em incontáveis produções do TEATRO MUSICAL. É pena
que a peça não comporte números musicais, ao vivo, no espetáculo! Mas a encenação conta com
uma eclética trilha sonora, assinada pela dramaturga, que agasalha compositores
como Chiquinha
Gonzaga, Déodat de Séverac, Claude Debussy, Gustav Mahler e Olivier
Messiaen.
“PALAVRAS DE MULHER” é uma produção modesta,
em termos de orçamento, contudo tudo é feito com muito cuidado e respeito ao
público. Assim, temos uma cenografia, projeto de DANIELLY RAMOS, cuja simplicidade é
compensada pela criatividade, para representar uma biblioteca. Não entro, aqui,
em detalhes, para não dar “spoiler”. WANDERLEY GOMES reafirma seu talento de figurinista, com peças
elegantes, de muito bom gosto e, intimamente, ligadas às características de
cada uma das quatro personagens. GIL
SANTOS abriu mão de “malabarismos” desnecessários e
criou uma luz que acompanha a simplicidade da proposta, muito ajustada ao
espetáculo, funcionando muito bem.
Foto: Gilberto Bartholo.
Dramaturgia: Rachel Gutiérrez
Direção Artística: Sergio Fonta
Assistência de Direção: Marina Trindade
Elenco: Stella Maria
Rodrigues (Carmen da Silva), Izabella Bicalho (Eneida de Moraes), Helga Nemetik
(Hilda Hilst) e Laura Proença (Clarice Lispector)
Projeto Cenográfico: Danielly Ramos
Figurinos: Wanderley Gomes
Iluminação: Gil Santos
Trilha Sonora: Rachel
Gutiérrez
Aderecista: Regina Gaúcha
Construção de Escada Cenográfica: Skena Cenografia
Visagista: Fernando Ocazione
Maquiagem: Julita Machado
Operador de Luz e Som: Cristiano Teodor
Contrarregras: Alexandre de
Castro e Luisinho Freitas
Sonoplastia: João Paulo Pereira
Acessibilidade: Patrícia Saiago -
Zenith Studios
Assessoria de Imprensa: Deborah Goi - Bradart Comunicação
Gestão de Mídias: Cesar Dominguez - Bradart
Comunicação
Programação Visual: Raquel Maia
Fotógrafos: Renato Mangolin e
Fernando Ferreira
Prestação de Contas: Patricia Castro –
Arte Cultura LTDA.
Direção Executiva: Patricia Castro –
Arte Cultura LTDA.
Produção Executiva: Jenny Mezencio
Realização – Ministério da Cultura
e Arte Cultura LTDA
Patrocínio – ForShip Engenharia
Temporada: De 10 a 21 de janeiro de 2024.
Local: Teatro Candido Mendes.
Endereço: Rua Joana Angélica, nº 63 – Ipanema – Rio
de Janeiro.
Dias e Horários: 10, 11, 16 e 17 às 20h; 13, 14, 20 e 21, às 18h.
Valor do Ingresso: R$ 35 (Inteira) e R$ 17,50
(meia-entrada).
Venda: https://bileto.sympla.com.br/event/90098
Capacidade: 102 lugares.
Acessibilidade: SIM.
Classificação Etária: 14 anos.
Duração: 60 minutos.
Gênero: COMÉDIA.
Nas palavras da dramaturga, “A peça é uma homenagem a quatro
grandes escritoras e um convite à leitura.”. Na visão do diretor, a
montagem visita a questão do empoderamento feminino e nos proporciona a “oportunidade
de mergulhar no universo de quatro escritoras de estirpe e que são, também,
quatro poderosas mulheres, com muito a dizer até hoje”. E eu só faço
acrescentar que o espetáculo merece ser visto e aplaudido pelos que apreciam um
bom trabalho teatral e que ele serve mesmo de incentivo aos que leem pouco,
para que se interessem mais pela literatura.
Com Sergio Fonta, Eva Procter
e outros amigos.
FOTOS: RENATO
MANGOLIN
e
FERNANDO
FERREIRA.
VAMOS AO TEATRO!
OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE
ESPETÁCULO DO BRASIL!
A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE; E SALVA!
RESISTAMOS SEMPRE MAIS!
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JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR O QUE HÁ DE MELHOR NO TEATRO BRASILEIRO!
Que crítica mais linda!
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