segunda-feira, 18 de setembro de 2023

 

“O HOMEM QUE

ENGOLIU UM CHIP”

ou

(NOS SUBTERRÂNEOS

DA LOUCURA,

A “LUCIDEZ” DE UM ESQUIZOFRÊNICO.)


 


         Enquanto eu começo a escrever esta crítica, sobre um espetáculo a que assisti no final da tarde do último sábado (16 de setembro de 2023), o ator MANOEL MADEIRA deve estar aguardando o final deste domingo, para a última apresentação da peça, em sua meteórica segunda temporada, de apenas duas semanas, no Teatro Ruth de Souza, que fica dentro do Parque Glória Maria, antigo Parque das Ruínas, no aprazível bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro. Antes, a montagem fez uma primeira temporada, na Sala Rogério Cardoso, dentro da Casa de Cultura Laura Alvim.



         “O HOMEM QUE ENGOLIU UM CHIP”, título que julgo muito interessante, foi escrito por RAMON NUNES MELLO, numa adaptação, para o palco, do livro “Todos os Cachorros São Azuis”, um romance autoficcional, escrito por RODRIGO DE SOUZA LEÃO, dirigido por ADRIANO GARIB e interpretado por MANOEL MADEIRA, como já mencionado.




 

SINOPSE: 

“O HOMEM QUE ENGOLIU UM CHIP” conta a história de um poeta que sofre de esquizofrenia.

Um relato comovente, ao mesmo tempo auto irônico, sobre sua internação num hospício, suas memórias e reflexões.


 


 


A economia de palavras, na SINOPSE supra, não significa, absolutamente, “preguiça”, por parte da assessoria de imprensa da peça; é que quem o redigiu conseguiu condensar, em poucas palavras, tudo o que, realmente, se passa no espaço cênico, durante 60 minutos.



O fato de a peça não estar mais em cartaz e a total falta de tempo, na qual me encontro mergulhado no momento, depois de quase um mês fora do país, seriam motivos mais que justificáveis para que eu não escrevesse sobra ela, independentemente de ter gostado ou não da montagem. Ocorreu que fiquei com muita vontade de registrar as minhas impressões sobre “O HOMEM QUE ENGOLIU UM CHIP”, principalmente depois de ter, eu mesmo, lido sobre o poeta, escritor e artista plástico carioca RODRIGO DE SOUZA LEÃO e de ter obtido muitas informações sobre ele, diretamente com MANOEL MADEIRA.


Rodrigo de Souza leão.

(Foto: fonte desconhecida.)


RAMON NUNES MELLO, responsável pela dramaturgia da peça, conheceu RODRIGO em 2008, quando, após a leitura de “Todos os Cachorros são Azuis”, ficou bastante impressionado pela obra e solicitou a seu autor uma entrevista, que lhe foi concedida, com a condição de que o entrevistador fosse à sua casa, de onde ele disse não sair havia 20 anos. E assim se deu o encontro e o início de uma amizade, que durou apenas um ano, uma vez que, no dia 2 de julho de 2009, com apenas 43 anos de idade, RODRIGO morreu, numa clínica psiquiátrica, no Rio de Janeiro. 19 anos antes, em 1990, ele havia sido diagnosticado como portador de esquizofrenia. Após sua morte, RAMON passou a ser o curador de sua obra. (Algumas das informações que constam deste parágrafo devem ser creditadas ao site www.acritica.net)



Ramon Nunes Mello.
(Foto: fonte desconhecida.)

Gostaria de explicar o subtítulo que criei para esta crítica, o qual, a princípio, poderia levar o leitor a pensar que eu também merecesse uma internação (Momento descontração.). Detalhes sobre a morte de RODRIGO deixam tudo bem claro.



A esquizofrenia é “caracterizada por sintomas psicóticos, que incluem delírios, alucinações, pensamento e fala desorganizados e comportamento bizarro e inadequado. Os sintomas psicóticos envolvem uma perda do contato com a realidade”. Mania de perseguição também está presente nesse quadro patológico, como pode ser visto na peça, em cenas em que o personagem se diz perseguido por agentes da KGB e da CIA, ainda que tivesse a consciência de que a primeira não mais existisse.



Depois de diagnosticado com esse distúrbio da saúde mental, RODRIGO passou por três internações. O livro que deu origem à peça retrata os momentos em que passou recluso, durante a segunda. Após esta, voltou para casa, entretanto podemos dizer que ele “decidiu morrer”, na sua última passagem por uma clínica de internação psiquiátrica, uma vez que começou a gritar sem parar, pois sabia que receberia uma injeção com um “sossega Leão” e continuou a gritar, mesmo após a primeira aplicação, o que levou os profissionais de saúde que lhe assistiam a lhe ministrar uma segunda ampola do forte calmante, o que lhe rendeu uma parada cardíaca. Podemos, pois, afirmar que ele “decidiu” se livrar do sofrimento em que vivia, uma espécie de “suicídio consciente e programado”.


Adriano Garib (diretor) e Manoel Madeira (ator).

(Foto: fonte desconhecida.)

A peça termina com a leitura, em “off”, de uma carta “de despedida”, de RODRIGO à família, deixada em seu quarto, antes de quebrar toda casa, para que fosse internado, custasse o que custasse. Custou-lhe a vida.



Ainda que trate de um tema muito sério e que causa bastante sofrimento, o solo é levado ao público com respeito, reflexão, leveza e bom humor, ingênuo, por vezes, o que leva a plateia a rir em determinados momentos, muito embora, “no frigir dos ovos”, não devesse ser motivo para risos. Diria que "rimos um riso nervoso". A propósito, incomodou-me um pouco um jovem que, na primeira fila, à minha frente, ria bastante, como se estivesse assistindo a uma COMÉDIA. De qualquer forma, acredito que o tom escolhido pelo dramaturgo, para desenvolver seu texto, foi bastante acertado, levando o público a se voltar mais para tão crucial trema, denso e pesado, por isso mesmo, normalmente, evitado, negligenciado, “varrido para debaixo do tapete”. Segundo o autor do texto, “RODRIGO era leve e bem- humorado, até nos momentos de internação”. Ponto positivo para o texto e a proposta. No “release”, quanto ao gênero, o espetáculo é vendido como uma “performance solo / comédia”.


(Foto: Gilberto Bartholo - antes do início da peça.)

A estrutura do texto poderia levar a um espetáculo monótono, não despertando tanto o interesse da plateia, entretanto, graças a uma criativa direção, de ADRIANO GARIB, e, sobretudo, ao trabalho de ator, pesquisado, à exaustão, e desenvolvido por MANOEL MADEIRA, que demanda um esforço hercúleo de interpretação, com uma profunda exploração de seu potencial em se expressar através do corpo, das máscaras faciais e dos sons que emite, o espetáculo atinge um elevado patamar de excelência.



No palco, MANOEL MADEIRA atua como um ‘performer’, em alguns momentos, contando a situação vivenciada pelo escritor e, em outros, colocando-se no lugar dele, como artista e cidadão. Sem a pretensão de “ser” RODRIGO, há semelhanças entre o personagem e ele, mas o que interessa, aqui, é a linguagem cênica que ele cria. E a recriação que o TEATRO traz ao público, ressignificando a história”. Achei bastante interessante e oportuno esse trecho, extraído do “release” que recebi da produção do espetáculo. Penso que essa alternância de papéis é bem equilibrada e agrega muito valor à encenação.



Como vem ocorrendo com grande parte das últimas encenações a que tenho assistido, a montagem, por não contar com muitos recursos financeiros, precisou ser modesta, sem que fossem esquecidos o bom gosto e a criatividade, para que o espetáculo pudesse gerar prazer em quem assiste a ele. Dos elementos de criação, nada de “pirotecnias”. NELLO MARRESE, responsável pela cenografia da peça, criou uma caixa, vazada, uma espécie de baú, de dentro do qual o ator vai retirando objetos, usados em cena, durante todo o espetáculo, sempre uma surpresa nova. Extremamente significativo, esse baú também se relaciona a um “baú de ideias e de memorias”, reviradas e reveladas. NELLO também assina o figurino, simples, que recebe um reforço, na cena final da peça, de grande beleza plástica. Um lindo desenho de luz, que se destaca em muitos momentos do espetáculo, principalmente pelas projeções e alguns efeitos especiais, foi idealizado por RODRIGO BELAY, nome do qual sempre me lembro, por ter sido o iluminador de outra grande peça protagonizada por MANOEL MADEIRA, “Ludwig II”, um dos mais lindos trabalhos de iluminação que já vi e o melhor, como intérprete, na carreira de MANOEL. Todas as cenas são enriquecidas pela ótima trilha sonora, de THALES CAVALCANTI. Seria imperdoável eu me esquecer de citar o nome de TONI RODRIGUES, que assina um excelente trabalho de direção de movimento, como sempre faz.

 



 

 FICHA TÉCNICA: 

Idealização: Ramon Nunes Mello

Dramaturgia: Ramon Nunes Mello

Direção Artística: Adriano Garib

Assistência de Direção: Anita Mafra

 

Atuação: Manoel Madeira

 

Direção de Movimento: Toni Rodrigues

Cenografia: Nello Marrese

Figurinos: Nello Marrese

Desenho de Luz: Rodrigo Belay

Trilha Sonora: Thales Cavalcanti

Desenho de Som: Fábio Storino e Thales Cavalcanti

Operação de Som: Fábio Storino

Operação de Luz: Clarice Sauma

Produção Executiva: Anita Mafra e Manoel Madeira

Assessoria de Imprensa: Marrom Glacê Assessoria

Identidade Visual: Tinta Labs

Fotografia e Videografia: Wagner Alonge

Depoimento em “Off”: Rodrigo de Souza Leão (entrevistado por Ramon Nunes Mello)

Vozes em “Off”: Adriano Garib (participação Gael)

Assessoria Contábil: LA Contabilidade

Coordenação Administrativo-Financeiro: Anita Mafra

Realização: Proposta A6 Produções Culturais

 

 



         Por oportuno, acrescento que, no decorrer da peça, são ouvidos alguns áudios documentais, que são as vozes de RAMON NUNES MELLO e RODRIGO DE SOUZA LEÃO, fragmentos de uma entrevista feita, em 2008 por aquele, que é o curador e representante legal da obra do entrevistado e personagem principal da peça.



         Por motivos óbvios, visto que o espetáculo já encerrou sua temporada, não faz sentido publicar o SERVIÇO da peça, entretanto, tão logo ela volte ao cartaz, pelo que torço bastante, republicarei a crítica, com o acréscimo de todos os detalhes para que as pessoas possam assistir a ela.



 

 

FOTOS: WAGNER ALONGE

 

 

GALERIA PARTICULAR:


Com Manoel Madeira e Anita Mafra.


Com Manoel Madeira.

 

 

VAMOS AO TEATRO!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS

DE ESPETÁCULO

 DO BRASIL!

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI,

SEMPRE!

RESISTAMOS, SEMPRE MAIS!

COMPARTILHEM ESTE TEXTO,

PARA QUE, JUNTOS,

POSSAMOS DIVULGAR

O QUE HÁ DE MELHOR

NO TEATRO BRASILEIRO!

 














 

























































Nenhum comentário:

Postar um comentário