quarta-feira, 7 de junho de 2023

 

“MEUS 2 PAIS”

ou

(FALANDO DE

COISA SÉRIA,

DE FORMA LÚDICA

E ATÉ POÉTICA.

ou

(TEATRO

INFANTIL /

INFANTOJUVENIL

COMO DEVE SER FEITO.)

 


        Não posso, nem quero, me estender muito, na análise crítica de um espetáculo infantil, ou infantojuvenil, ao qual assisti num domingo, dia 28 de maio próximo passado, no “Teatro OI Futuro” (Centro Cultural Futuros - Arte e Tecnologia), no Rio de Janeiro. A peça chama-se “MEUS 2 PAIS”, e nada mais é do que uma transposição das páginas de um livro, escrito por WALCYR CARRASCO, para o palco, pelas mãos de CESAR AUGUSTO, diretor da montagem. Reparem que não falei em “adaptação”, uma vez que o texto está “ipsis litteris” no palco, dito pelo ator PEDRO MONTEIRO, interpretando o personagem Naldo, um menino de 9 anos.



O que me leva a procurar ser conciso na minha análise, além da falta de tempo, é que posso dizer o quanto a encenação me agradou – MUITO MESMO – sem precisar me estender tanto. A peça encerra uma trilogia sobre “paternidade”, idealizada e realizada por PEDRO, iniciada, em 2021, com “Pão e Circo”, seguida de “Pai Ilegal”, em 2022.




SINOPSE:

A peça conta a história de Naldo (PEDRO MONTEIRO), um menino de 9 anos, que tem que lidar com a separação dos pais, o que já é bem difícil, em qualquer idade.

Quando a mãe (KELZY ECARD) precisa se mudar de cidade, por conta de uma promoção no seu emprego, Naldo passa a morar com o pai (CLAUDIO LINS) e um amigo deste, Celso (RODRIGO FRANÇA).

Não demora muito, o garoto começa a sofrer “bullying”, na escola, e descobre que o pai é “gay”.

Será que ele vai aceitar sua nova família?

 

 


 E vamos diretamente ao assunto, a começar pelo texto. Tendo recebido o original do livro, alguns dias após ter assistido à peça, constatei o que já me dissera PEDRO MONTEIRO, no dia em que estive no “OI Futuro”: o texto não sofreu nenhum corte ou acréscimo. O que houve foi o dedo “mágico” de um inteligente, criativo e sensível diretor, CESAR AUGUSTO, para dar um toque de mais contemporaneidade à história, construindo uma encenação a partir de algo tão presente e agradável no dia a dia das crianças, pré-adolescentes e adolescentes de hoje, ou seja, a linguagem dos jogos eletrônicos. Considero uma “jogada genial” a ideia da utilização dessa linguagem, os “videogames”, o que concede muito dinamismo à encenação, bem ao gosto dos pequenos. E necessário, para que mantenham a atenção e o interesse pelo que acontece no palco.



 WALCYR CARRASCO, consagrado novelista e autor de obras literárias, é conhecido por abordar temas considerados tabus, sempre com um foco voltado a informar, esclarecer e, se possível, influenciar e modificar pensamentos que já não encontram respaldo nos dias hodiernos. Chega de intolerância, de apontar o dedo aos outros, sem, primeiramente, “olhar para o próprio umbigo”! Chega de julgamentos e pensamentos retrógrados, principalmente quando apoiados em preconceitos e escrúpulos impostos por religiões, quaisquer que sejam elas. Antes que alguém se abaixe, para pegar pedras, com o firme propósito de me apedrejar, quero deixar bem claro que respeito todas as religiões, porém custa-me acreditar que, em nome de um Deus, “perfeito”, ou lá qual seja o seu nome, pessoas promovam verdadeiras “guerras” aos “imperfeitos”.




 Um autor comprometido com a verdade e o que existe de real nas sociedades, seja em que lugar for, com relação a tudo, principalmente no que diz respeito às relações de amizade, afeto e amor entre as pessoas, WALCYR, de forma bem corajosa e realista, nos apresenta os percalços que surgem no caminho de uma criança de 9 anos, que precisa entender o porquê da separação de seus pais e de o pai ter encontrado um ser humano do mesmo gênero para amar. Um ser humano, antes de tudo.



 Chega a ser comovente a forma como o autor trata o delicado assunto e vai desenvolvendo a trama com muito carinho e respeito aos espectadores, seja lá qual for o que cada um pense a respeito disso. Ele usa um vocabulário simples, acessível a todos, inclusive, ou principalmente, os pequenos, sem rebuscamentos e meias palavras. Nunca, em momento algum, de uma forma grosseira ou agressiva. Se vai conseguir “fazer a cabeça” das pessoas não importa tanto; o que é relevante é o fato de abordar o assunto, que “não pode mais ser jogado para debaixo do tapete”.



 O fato de o pai do menino se assumir “gay”, após a separação, é um dos focos, ou o que faz disparar o gatilho, nesta encenação, todavia outros assuntos, temas paralelos, estão em jogo e também recebem o devido tratamento e atenção, como as diferentes configurações familiares, o detestável, inexplicável e inaceitável “bullying” nas escolas, a influência dos amigos e os conflitos internos, causados pela separação dos pais.



 Seguindo os passos do escritor, CESAR AUGUSTO estabeleceu uma linha de direção e, antes disso, uma proposta, que, sem fugir ao propósito primeiro do texto, atingisse, facilmente o público-alvo. Se bem que não podemos negar que este também possam ser os adultos, principalmente os mais ortodoxos, do ponto de vista “moral”. Na verdade, não se trata de ser mais ou menos “moralista”, mas, sim, de estar em consonância com os tempos modernos.



 Por oportuno, transcrevo um trecho do “release”, que me chegou, via PAULA CATUNDA (Assessoria de Imprensa), com cujo conteúdo comungo inteiramente: “Não é de hoje que o conceito de família se expandiu, se diversificou, e suas múltiplas configurações estão presentes e felizes na sociedade. Mas quem foge do modelo considerado tradicional sempre encontra alguns (ou muitos) desafios.”. Por que não aceitar – pergunto eu - famílias com dois pais ou duas mães, por exemplo? O importante é que haja amor, respeito e harmonia entre os que as compõem.



 WALCYR escreveu o livro para falar dos desafios contidos numa relação “incomum” entre um menino e seu pai e mostrar, para crianças, o que todos os adultos já deveriam saber, que é a importância de aceitar as diferenças. No tocante a isso, bastante importante é o fato de WALCYR ter pensado num homem negro para ser o novo amor de um branco, “cutucando” a celeuma que, via de regra, existe, com relação ao preconceito racial.



  PEDRO MONTEIRO, pai de uma menina de três anos, é um ser humano, por demais, sensível, além de um excelente ator. Seu trabalho, na pele de uma criança de 9 anos, é irretocável, porque, em momento algum, ele cai no estereótipo que estamos acostumados a ver nos palcos, por parte de muitos adultos interpretando papéis infantis. Um homem de porte avantajado, como ele, consegue ser “visto” como um menino, sem precisar utilizar recursos não recomendados, como uma “vozinha infantiloide”, que soa, na maioria das vezes, como algo desagradável aos ouvidos. E extremamente falso. PEDRO convence, como o guri Naldo.




 Ainda que o ator esteja sozinho, presencialmente, no palco, não se pode dizer que se trate de um monólogo, uma vez que ele contracena, em vídeos, com seis admiráveis atores:  KELZY ECARD (a Mãe), CLAUDIO LINS (o Pai), BETINA VIANY (a Avó Materna), RODRIGO FRANÇA (Celso, o “Amigo” do Pai), GABRIELA ESTEVÃO e TAMIRES NASCIMENTO (Amiguinhas, de escola, de Naldo).



 O espetáculo dispensa o luxo, mas prima pela qualidade e o bom gosto, expressos pelos elementos de apoio: cenário, figurino, desenho de luz, trilha sonora original, visagismo, projeção mapeada e animação.



 BELI ARAÚJO, por exemplo, assina um cenário simples e funcional, deixando o palco nu, à exceção de uma cadeira apropriada para jogadores de “videogames” e duas grandes telas, ao fundo, que servem às muitas projeções as quais atravessam toda a encenação.





 MARCELO OLINTO é o responsável pelos figurinos, muito bem acertados, não só para o protagonista como para os demais personagens. Naldo é um menino de 9 anos, vestido discretamente, em tons pastéis, com um pequeno detalhe que ajuda na composição do personagem: um boné, usado ao contrário.



 ANA LUZIA DE SIMONI ilumina a peça, com um trabalho corretíssimo, em seu desenho de luz.



 ANDRÉ POYART compôs uma trilha sonora original que se encaixa, com perfeição, no espetáculo, com muitos sons ligados aos jogos eletrônicos.



 ANDY LIMA responde pelo visagismo da peça e, seguindo os passos do figurinista, criou uma maquiagem comedida, um possante reforço no trabalho de composição externa do personagem; ou melhor, dos personagens, incluindo os que aparecem virtualmente.



 Um dos elementos da maior importância, nesta montagem, é a projeção mapeada, que não apresenta uma mínima falha e que requer uma profunda atenção e acuidade do responsável por ela, RENATO KRUEGER. É ele quem aciona os botões, para fazer com que os seis personagens virtuais “entrem em cena”, dentro de uma sincronização perfeita, entre eles e o ator que está no palco. RENATO também executou o belo trabalho de reunir as imagens captadas e guardadas por SANDRO DEMARCO, em excelentes animações. 

 



 

 FICHA TÉCNICA:

Texto: Walcyr Carrasco

Direção: Cesar Augusto

Diretor Assistente: João Gofman

Assistência de Direção: Romulo Chindelar

Direção de Movimento: Carol Ozório

 

Elenco: Pedro Monteiro (presente, no palco), Betina Viany, Claudio Lins, Gabriela Estevão, Kelzy Ecard, Rodrigo França e Tamires Nascimento (aparições em vídeo)

 

Cenário: Beli Araújo

Figurinos: Marcelo Olinto

Desenho de Luz: Ana Luzia de Simoni

Trilha Sonora Original: André Poyart

Pesquisa Sonora: João Gofman

Visagismo e Maquiagem: Andy Lima

Projeção Mapeada: Renato Krueger

Operador de Câmera: Hernane Cardoso

Som Direto: Lucca Valor

“Logger” e “Still”: Sandro Demarco

Costura e Tingimento de Figurinos: Almir França

Costura de Cenário: Nice Tramontin

Cenotécnico: M W Serviços Cenotécnicos

Assistência de Iluminação: Pedro Carneiro

Camareira (estúdio): Jacyara de Carvalho

Assessoria de Imprensa: Paula Catunda e Rachel Almeida

Fotos de Divulgação: Beto Roma

Redes Sociais: Rafael Teixeira

Designer Gráfico: Davi Palmeira

Assistência de Produção: Caroline Matos

Direção de Produção: Dani Carvalho (Desejo Produções)

Realização: Pedro Monteiro 



 

 


SERVIÇO:

Temporada: De 20 de maio a 9 de julho de 2023.

Local: Teatro OI Futuro (Centro Cultural Futuros - Arte e Tecnologia).

Endereço: Rua Dois de Dezembro, nº 63 – Flamengo – Rio de Janeiro. (Acesso próximo à estação do Metrô do Largo do Machado).

Telefone: (21)3131-3060.

Dias e Horários: Sábados e domingos, às 16h.

Valor dos Ingressos: R$40,00 (inteira) e R$20,00 (meia entrada).

Venda de ingressos: www.sympla.com.br

Lotação: 63 pessoas.

Duração: 50 minutos.

Classificação Etária: Livre.

 

 

 

  Para finalizar, cabe uma declaração do diretor da peça, CESAR AUGUSTO: “Nosso espetáculo usa a linguagem dos jogos eletrônicos para simular a cabeça criativa de uma criança. Queremos tratar de um tema importante de maneira saborosa, com abstrações, onomatopeias e sensibilidade. Afinal, TEATRO também é jogar com a plateia.”. Quanto a isso, não resta a menor dúvida de que a peça já é um grande sucesso e merece uma vida bem longa. Basta testemunhar a interação dos pequenos com o ator em cena. Não raro, muitos participam, de uma forma direta, do espetáculo, apoiando o que diz o personagem ou complementando suas falas, com comentários sobre a sua própria vivência e realidade familiar.



  “MEUS 2 PAIS” apenas solidifica a teoria que aprendi com o finado ator, diretor e produtor, Paulo Lara, por quem fui dirigido, no intantil “Dom Chicote Mula Manca e Seu Fiel Companheiro Zé Chupança”, um pregado de que “TEATRO Infantil não é imbecil”. Além disso, esta peça prova que as montagens voltadas ao público pueril não podem, nem devem, ser longas, chegando, no máximo, aos 60 minutos, com raras exceções admitidas. Esse tempo é mais que necessário e suficiente para se dar todos os recados e se produzir TEATRO para os pequenos da melhor qualidade, como a peça em tela.



 Acima de tudo, “MEUS 2 PAIS” é um espetáculo didático, sem ser “chato”. É mais que óbvio que merece a minha total recomendação.


Claudio Lins e Renato Krueger.


Kelzy Ecard.


Rodrigo França.


Betina Viany.


Gabriela Estêvão.


Tamires Nascimento.



 

FOTOS: BETO ROMA (ESTÚDIO)

e AMANDA EYER (CENA)

 

GALERIA PARTICULAR

FOTOS: JOÃO PEDRO BARTHOLO)

 

 

Com Pedro Monteiro.


Idem.

 

 


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