segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

“VALENTIM

VALENTINHO”

ou

(TEMAS MUITO SÉRIOS

TRATADOS COM

LEVEZA, BELEZA

E SENSIBILIDADE.)

ou

(O TEATRO EDUCANDO E DIVERTINDO.)

 

 

 

    Sempre que tenho oportunidade de escrever uma crítica sobre um espetáculo infantojuvenil, não penso duas vezes. É uma pena que isso só aconteça muito amiúde, por dois motivos, que acabam se transformando em um só: a quantidade de peças voltadas para o segmento de crianças, pré-adolescentes e adolescente é pequena, em relação à que é oferecida aos adultos, e as de boa qualidade podem ser computadas nos dedos de uma das mãos. E vai sobrar dedos, infelizmente.




"Aquecimento", com o público adentrando 

o auditório do Teatro SESC Belenzinho.

(Foto: Gilberto Bartholo.)


 Não aceito, e muito menos divulgo, montagens sem o menor comprometimento com a qualidade, simplesmente porque “é pra criança, serve qualquer coisa”. Considero essa “justificativa” uma ignomínia!!! Aqui, faço questão de aplaudir Dib Carneiro Neto, que escreve, há 26 anos, sobre esse segmento do TEATRO, e cunhou a frase nominal “Pecinha é a vovozinha!”, que também é o título de seu blogue, voltado para esse “métier”. O diminutivo “pecinha”, em geral, é empregado com um valor pejorativo, ou seja, um desvalor. E, também, aproveito para lembrar, mais uma vez, nos meus escritos, o lema do TIC (Teatro Íntimo de Comédia), de Santos, criado por um de seus fundadores, Paulo Lara: “TEATRO INFANTIL não é imbecil!”. Sob sua direção, atuei, em 1971 e 1972, no musical “Dom Chicote Mula Manca e Seu Fiel Companheiro Zé Chupança”, grande sucesso, de público e de crítica, na época. Foi a partir de lá que aprendi a reconhecer o mérito e a importância do TEATRO INFANTOJUVENIL; e a lutar por ele.




Boa qualidade é um requisito indispensável a qualquer obra ARTE. Além disso, as crianças formam uma plateia muito especial, por sua espontaneidade, quando respondem, com a maior sinceridade, àquilo que lhes é oferecido, num palco, e, principalmente, porque serão as plateias do futuro. É preciso, pois, que o TEATRO seja algo muito agradável para elas, que as cative, para que não saiam a procurar outros atrativos de lazer. A concorrência com as “facilidades da vida moderna” já é assaz imensa e “desleal”.



 “VALENTIM VALENTINHO” já saiu de cartaz, no dia 29 de janeiro próximo passado. Estava sendo apresentado no Teatro do SESC Belenzinho, em São Paulo. Para mim, o fato de não estar mais em cartaz não representa nada. Se o espetáculo merece uma crítica, escrevo-a, sempre na esperança de que a peça retorne aos palcos, em novas temporadas, meu desejo aqui. E que venha para o Rio de Janeiro, o que julgo muito difícil acontecer.



Assim que soube do espetáculo ora analisado, fiz questão de assistir a ele, porque aprecio muito o trabalho de seu diretor, MARCELO VARZEA (Na verdade, ele dividiu a enorme responsabilidade da direção com ERICA RODRIGUES.), gostei da SINOPSE e vi que, no elenco, de três atores e uma atriz, estavam dois nomes que aprendi a admirar no TEATRO MUSICAL: ANDRÉ TORQUATO e ARTUR VOLPI. Dispus-me, pois, a ir ao SESC Belenzinho, à hora do almoço de um sábado, para iniciar uma “maratona” de três peças num mesmo dia. E não me arrependi nem um pouco. Muito pelo contrário, diverti-me e fui testemunha de como se pode fazer um TEATRO INFANTOJUVENIL de excelente qualidade, sem querer “inventar a roda”. Simplicidade e verdade, acima de tudo.


   


SINOPSE:

O espetáculo infantojuvenil “VALENTIM VALENTINHO” narra a história de um menino prestes a completar onze anos de idade e que sonha em ganhar coragem, como presente de aniversário.

Valentim (ANDRÉ TORQUATO) vive com a mãe, em uma vila de São Paulo, onde também moram seus melhores amigos: Ana (FRAN FERRARETTO), Biel (ARTUR VOLPI) e Demetrius (VITOR BRITTO).

Temas como medo, “bullying”, opressão, os efeitos da masculinidade tóxica, na infância, e racismo são tratados com muita delicadeza e responsabilidade.

A trama se desenvolve com descobertas importantes para a infância, sem perder a diversão e a leveza.

Entre confusões e reviravoltas, muito aprendizado acontece. 

 


O elenco.


 O texto do espetáculo foi escrito por FRAN FERRARETTO, a quem eu ainda não conhecia, a qual também é a idealizadora do projeto e interpreta a única personagem feminina da peça, Ana. A dramaturga pensou numa história para a qual fosse possível  selecionar e trabalhar, com profundidade, sem meias palavras, porém de uma forma leve e divertida, temas da maior importância para a criança, na sua formação de uma identidade civil adulta, principalmente nos dias de hoje, como medo, “bullying”, opressão, os efeitos da masculinidade tóxica, na infância, e racismo.



 Valentim tem medo, o que não é, de todo, um “desastre”, mas passa a ser, quando em excesso, seu caso. Medo de tudo. Inseguro até a raiz. Na convivência com os amigos da vila, aprende que o medo é um grande inimigo do homem e como se deve proceder para enfrentá-lo e vencê-lo. Ele é um menino, até certo ponto, ingênuo, para a sua idade, a ponto de desejar ganhar - sabe-se lá de quem – coragem, como presente de aniversário. É muito difícil, para um ator ou atriz, interpretar uma criança ou uma pessoa idosa, sem cair no caricaturesco; soa “falso” e, a mim, particularmente, chega a irritar. ANDRÉ TORQUATO, no entanto, procura agir com muita naturalidade, e sua "criança" é, perfeitamente, aceita pelo público, formado por pequenos e grandes espectadores. Aliás, o mesmo pode ser dito sobre os seus três companheiros de elenco. Parabenizo ANDRÉ por seu delicado trabalho!


André Torquato.


 Dos que acompanham Valentim, em seus folguedos, há um, Biel (ARTUR VOLPI), que se apresenta como amigo “até a página 5”, visto que implica com o menino medroso, humilha-o, coloca-o em situações de “saia justa”, para, como deveria mesmo acontecer – e aí está um dos maiores ensinamentos do texto: reconhecer o erro, pedir desculpas e mudar o comportamento -, no desenlace da trama, transformar-se num amigo de verdade. O tom de verossimilhança que o ator imprime a seu personagem é tal, que consegue angariar a antipatia das crianças, como seria mesmo o propósito do texto, até atingir a reversão do sentimento provocado nos pequenos espectadores. Excelente trabalho!


Artur Volpi.


Ana (FRAN FERRARETTO) é, dos três amigos, quem demonstra maior carinho e preocupação por/com Valentim. É quase uma espécie de sua protetora e consegue enxergar, mesmo na sua pouca idade e vivência, quão nocivo é o modo como Biel trata o menino, e faz de tudo para ajudá-lo a vencer seus medos. Ela é bastante esperta e, de uma maneira muito inteligente, conseguiu desenvolver alguns mecanismos de defesa para sobreviver, com dignidade e marcando presença, num ambiente muito hostil, predominante masculino. Ana age de igual para igual com os meninos. Vejo aí um excelente “gancho”, para ensinar às meninas como proceder ante o machismo tóxico. A menina tem interesse por robótica, sonha em ser engenheira e é apaixonada por matemática, coisas bem “de menino”. Qual nada! A personagem deixa bem claro que esse negócio de “menino veste azul, menina veste rosa” é coisa do passado, que só existe, ainda hoje, na cabeça de... (“PREFIRO NÃO COMENTAR!”, “bordão” da personagem Copélia, no “sitcom” “Toma Lá, Dá Cá”, criado por Miguel Falabella, para a TV.). Sua generosidade e amor pelo amigo chegam a ser comoventes. É claro que as crianças a adoram! Ótimo o trabalho da FRAN!


Fran Ferraretto.


  Completa o quarteto do elenco o ator VITOR BRITTO, que interpreta Demetrius, o único amigo que não mora na vila, mas adora estar lá, chegando a passar dias na casa de Valentim. Até certo ponto, o personagem contribui para aumentar o medo do protagonista, entretanto, com o desenrolar da história, consegue perceber, muito por conta das “dicas” de Ana, o mal que aquilo representava e passa a deixar de “bater palmas” para as desagradáveis e descabidas “brincadeirinhas” maldosas de Biel, chegando mesmo a defender o menino oprimido e a deixar explícita sua discordância com relação às atitudes do implicante. VITOR também encarna seu personagem com total segurança, numa ótima atuação!


Vitor Britto.


  A “desculpa esfarrapada”, de que “o espetáculo não é melhor, porque houve falta de dinheiro” é totalmente fora de qualquer propósito. Percebe-se que, para a montagem ora analisada, a produção não contou com uma vultosa verba, todavia o que falta em dinheiro sobra em criatividade e bom gosto, de forma que nos deparamos com um cenário “pobre”, porém de profunda funcionalidade, posto a serviço do texto, com pouquíssimos elementos cenográficos, o suficiente para o público praticar a sua imaginação e conseguir “enxergar”, no palco, o que é somente sugerido. São apenas três portas, com seus batentes ou portais, uma para cada casa, de Valentim, Ana e Biel, e um baú, de dentro do qual saem objetos cênicos, utilizados na resolução das cenas. Muito bom o trabalho de MÁRCIO MACENA, que também assina os figurinos da peça, bem ajustados aos personagens e de muito bom gosto, em tons de preto, branco e cinza, contrariando o que, normalmente, encontramos em figurinos de espetáculos infantojuvenis, ou seja, uma festa de cores. Pode parecer "estranho", mas a escolha das três cores funciona muito bem em cena, e é um diferencial.




 Como não consegui registrar nada que pudesse comprometer a qualidade do espetáculo, é preciso que se faça justiça, também, ao correto desenho de luz, a cargo de CESAR PIVETTI, a uma conveniente trilha sonora original, composta por MÁRCIO GUIMARÃES, a cujo nome está atrelada a direção musical da peça (As canções são bem simples e “gostosas” de se ouvir e, não raro, pessoas saem do Teatro cantarolando partes delas.) e à excelente direção de movimento – e, aqui, também incluo a coreografia – de ERICA RODRIGUES, que agrega muito dinamismo à montagem.



 No que diz respeito à direção, MARCELO VARZEA e ERICA RODRIGUES souberam muito bem trabalhar com o que tinham a mão -  principalmente o rico material humano -, puseram em prática suas experiências profissionais, com ótimas marcações e soluções práticas para todas as cenas, e o resultado é merecedor de muitos aplausos. Há duas ideias muito simples e que funcionam bastante, ambas com a mesma intenção, qual seja a de criar uma intimidade, uma cumplicidade entre os pequenos e os atores: enquanto o público vai entrando no auditório e se acomodando, o elenco já está no palco, "aquecendo-se" e, vez por outra, ANDRÉ, ARTUR, FRAN e VITOR, antes de se tornarem personagens, fazem ligeiros acenos para algumas pessoas da plateia; não lembro se a peça começou com algum atraso, mas achei muito interessante os atores, ao final do tal "aquecimento", prontos a dar início à sessão do dia, se dirigirem ao público, incentivando-o a bater palmas e a gritar: COMEÇA! COMEÇA! COMEÇA!... - uma forma de ensinar aos pequenos o que é ser pontual e como exercer os direitos de um cidadão.




 


FICHA TÉCNICA:

Idealização: Fran Ferraretto

Texto: Fran Ferraretto
Direção: Marcelo Varzea e Erica Rodrigues

Assistência de Direção: Bruno Rods

 

Elenco (por ordem alfabética): André Torquato, Artur Volpi, Fran Ferraretto e Vitor Britto
“Stand-in”: Bruno Rods


Cenografia: Marcio Macena

Figurino: Marcio Macena

Produção de Cenário e Figurino: Morena Carvalho

Costureira: Salomé Abdala

Cenotécnico: Marquinhos Santos
Iluminação: Cesar Pivetti
Direção Musical: Marcio Guimarães

Trilha Sonora Original: Marcio Guimarães
Direção de Movimento: Erica Rodrigues
Fotografias: Julio Aracack e Thalles Tramon
“Designer” de Projeto: Lucas Sancho
Assistência de Produção: Bruno Ribeiro
Operação de Som: Vinicius Reis
Operação de Luz: Rodrigo Pivetti
Administração e Gestão: EXEDRA

Direção de Produção: Danielle Cabral
Produção Geral e Coordenação de Projetos: DCARTE

 


 

         Por motivos mais que óbvios, deixo de divulgar o SERVIÇO da peça, entretanto, caso ela volte ao cartaz, voltarei a publicá-la, com o devido SERVIÇO. No mais, é só torcer para que “VALENTIM VALENTINHO” consiga novas temporadas, visto que o TEATRO INFANTOJUVENIL precisa, e muito, de espetáculos como esse.


 

 

 

FOTOS: JULIO ARACACK

e

THALLES TRAMON

 

 

GALERIA PARTICULAR

(FOTO: LEONARDO

BRAGA SOARES.)

 


Com os amigos Marcelo Varzea 

e Thelmo Fernandes.


 

VAMOS AO TEATRO,

COM TODOS OS CUIDADOS!!!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO

 DO BRASIL,

COM TODOS OS CUIDADOS!!! 

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI, SEMPRE!!!

RESISTAMOS, SEMPRE MAIS!!!

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