AQUILO
QUE ACONTECE
ENTRE NASCER
E MORRER
(QUANDO SE CELEBRA A
VIDA,
FALANDO-SE DA MORTE.)
Gosto de solos. Gosto de solos bem
feitos. Gosto de solos que me fazem deixar o Teatro feliz, recompensado.
Gosto de FABRICIO MOSER. Comecei a gostar dele, depois de ter assistido
a um outro solo seu, “Laura”, em agosto de 2018, um espetáculo
comovente, tanto quanto o que está servindo de inspiração e motivo para esta crítica,
“AQUILO QUE ACONTECE ENTRE NASCER E MORRER”, em cartaz na Casa Quintal
de Artes Cênicas (VER SERVIÇO).
Logo que saí, no ano passado (2108),
de um espaço alternativo, ligado à Sala Baden Powell, no Rio de
Janeiro (Copacabana), depois de ter assistido a “Laura”, caminhei
até a estação mais próxima do metrô (Cardeal Arcoverde), peguei o meu
carro, estacionado no final da linha do metrô (Jardim Oceânico) e
dirigi, por uns 20 minutos, até a minha casa, no Recreio dos
Bandeirantes, sem conseguir pensar em outra coisa, que não fosse aquela peça,
não vendo a hora de escrever sobre ela. Chegando a casa, comecei a escrever,
compulsivamente, sobre “LAURA”, o que não é um hábito. Por mais que um
espetáculo tenha me agradado, só escrevo sobre ele no dia seguinte. O que
aconteceu naquela noite posso contar nos dedos de uma as mãos, e vai sobrar
dedo. Mas o fato é que fiquei muito bem
impressionado com tudo: texto, direção, interpretação, elementos
cênicos... Assim também me senti, ontem, 24 de novembro de 2019,
depois de ter assistido ao monólogo aqui analisado, embora pensasse, até mesmo,
em que, infelizmente, não encontraria tempo para escrever sobre ele. Hoje, pus-me
a continuar o que eu já vinha fazendo, mas não deixava de pensar no solo de
ontem. De repente, decidi parar tudo e iniciar esta crítica.
A vida, pessoal, de FABRICIO foi marcada,
ou melhor, é, e, indelevelmente, o será, por momentos trágicos, de perdas
irreparáveis e de formas tão doídas, o que, paradoxalmente, ou, talvez, como um
instrumento de fuga, ou de autoterapia, para afastar seus fantasmas, move o ator/dramaturgo/diretor
a montar seus espetáculos, pelo menos, os dois aqui citados anteriormente.
Em “Laura”, prestava ele uma linda e comovente homenagem à sua avó, cujo
nome serve de título à peça, morta, a tiros, numa tarde, em 1982,
no meio de uma rua, em Cruz Alta, interior do Rio Grande do Sul,
por um desafeto amoroso, de apelido Candoca, o qual, em seguida, se
suicidou. Não há uma precisão quanto à idade de Laura, quando do crime,
oscilando entre 56 e 66 anos. Talvez, por ter sido registrada
incorretamente, o que, até hoje, é comum, no interior. Ela estava fazendo algo
de que muito gostava: dançava num baile para a terceira idade. FABRICIO,
seu neto, nascido em 1981, em Dourados, Mato Grosso do Sul,
tinha nove meses, na época da tragédia, e não pôde conviver com a avó
materna. O trauma, ocasionado pela forma como Laura morreu, provocou o
seu afastamento do convívio familiar, sobre a sua história de vida.
Estabeleceu-se um vazio existencial e só ficaram raras lembranças do seu passado. Um "apagão" inconsciente. (Será?). Ninguém falava dela.
Fora enterrada totalmente, o corpo e tudo o que pudesse lembrá-la. FABRICIO
mora no Rio de Janeiro, desde 2009. Após a morte dos seus pais,
em um acidente trágico , de carro, em 2014, decidiu criar a peça autobiográfica,
para homenagear a falecida, ao mesmo tempo que isso poderia servir para um
mergulho no seu passado, que o levasse a se autoconhecer melhor, utilizando as
suas descobertas, em pesquisas, que foram da reunião de fotos e documentos até
entrevistas com familiares, amigos e conhecidos de LAURA, que
testemunharam o crime ou estiveram próximos a ele. (Muito do que você está lendo, neste parágrafo, está na crítica que escrevi sobre "Laura".).
Agora, tomando por base o citado acidente
de carro, em 2014, mencionado no parágrafo anterior, FABRÍCIO volta
a se envolver numa espécie de catarse, criando este espetáculo, “Dando
continuidade às pesquisas que mesclam arte com vivências pessoais (...)”,
de acordo com o “release”, enviado por BRUNO MORAIS (MARROM
GLACÊ – ASSESSORIA DE IMPRENSA) Trata-se de um “espetáculo de
autoficção, documental e autobiográfico”, uma montagem muito
interessante, uma proposta diferente, que foge aos padrões “normais” de TEATRO
convencional e que merece ser vista pelo maior número possível de
pessoas, ainda que, de cada sessão, só possam participar 40 pessoas, em função das pequenas dimensões do espaço em que a peça
vem sendo encenada, com muito sucesso e casa lotada, um salão do andar
superior da Casa Quintal de Artes Cênicas. Acho ótima a proposta e muito
bem desenvolvida, contando, sempre, com a participação do público, sem o que não poderá existir a peça, participação esta que
pode gerar um bom rendimento ou não, a cada apresentação, dependendo da
plateia. Mas acho que nunca será ruim, porque FABRICIO sabe ser o maestro,
na regência do espetáculo. Na sessão a que assisti à peça, o
resultado foi excelente, porque o público embarcou, de cabeça, na proposta,
e o resultado foi o melhor possível, uma vez que as dores e sofrimentos dos
assistentes são divididos entre todos, e o vital sentimento de empatia,
para o - e pelo - ser humano, é totalmente exposto e explorado ao máximo.
SINOPSE:
Diante da
vida, como lidar com a morte?
Diante da
morte, como lidar com a vida?
“Nascer” e “morrer”, como verbos que delimitam o que entendemos por vida, viver como uma sucessão de
nascimentos e mortes – e o TEATRO como uma centelha de vida, que nasce e morre
diante dos nossos olhos.
Enxergando o
coração da experiência teatral na vida do artista, a peça, documental e
autobiográfica, toma, como parâmetros dramáticos, os verbos “nascer” e “morrer” e
coloca, no horizonte da criação artística, as vozes do passado, do presente e do
futuro, os documentos e a memória do ator e do público.
Mais que um
ator, no fundo, um homem convida o público a celebrar a vida, a partir de tantas dores e
perdas, causadas por mortes trágicas em sua existência, que não é diferente da de
todos; ou quase todos.
Não sabemos lidar com as perdas, menos ainda com a
morte. Não estamos preparados para ela. A morte, para nós, principalmente
quando nos tira da convivência um ente querido, familiar ou amigo, será sempre
uma bomba de efeito destruidor, que deixa marcas para o resto da vida; quando
não acelera a nossa própria. “Diante da vida, como lidar com a morte?
Diante da morte, como lidar com a vida?”
Como eu “Laura”, FABRICIO MOSER partiu
de uma experiência duplamente trágica e dos questionamentos advindos dela,
sobre o valor da vida, o significado da morte, o quão estamos vivos por um fio, o quanto dependemos que ele não se rompa, o que ganhamos ou perdemos com cada uma delas – vida e morte – e, dessas
questões, desenvolveu este novo, e excelente, trabalho cênico. Extraído
do “release”, já citado: “Enxergando o coração da
experiência teatral na vida do artista, o projeto autobiográfico toma, como
parâmetros dramáticos, os verbos ‘nascer’ e ‘morrer’ e busca a encenação de si,
sob o olhar do outro, e dos outros, sob o olhar sobre si. Desse modo, coloca,
no horizonte da criação artística, as vozes do passado, do presente e do
futuro, os documentos e a memória do ator, dos colaboradores e do público".
Diz FABRICIO: “O desafio de abordar
dramas íntimos surgiu em ‘DUO Sobre Desvios’ (2012) – a este,
infelizmente, eu não assisti - e se intensificou em ‘Laura’ (2015),
quando parti em busca da história da minha avó materna, assassinada em 1982. A
morte dos meus pais, durante o processo criativo da segunda peça, em 2014, e a
necessidade de renascer, de alguma forma, depois disso tudo, foram sinais para
continuar minha pesquisa autobiográfica e documental no TEATRO”. Os dois
primeiros trabalhos, aqui citados pelo ator, chegaram a ser apresentados
em Portugal e na Espanha.
Não só a concepção, como também a estrutura
deste solo, seguem o modelo de “Laura” e o de “DUO Sobre Desvios”,
com a utilização de muitas e diferentes linguagens, apelos sensoriais diversos,
um tom “artesanal” e contando com a colaboração de artistas de diversas áreas.
Se prestarem atenção à ficha técnica do espetáculo,
mais abaixo apresentada, perceberão a falta de citação dos nomes de profissionais
que assinaram o cenário, o figurino, a iluminação, a direção
do movimento, por exemplo, e outros elementos técnicos, necessários
a uma montagem teatral. Entenderão o porquê agora, quando passo a
transcrever o que me respondeu FABRICIO, quando lhe perguntei o que ele
queria dizer, na citada ficha técnica, com “Colaboração Artística”,
seguida de seis nomes: CASSIANA LIMA CARDOSO, GABRIEL MORAIS,
GABRIELA LÍRIO, RICARDO MARTINS, SILVANA ROCCO e TATO
TEIXEIRA. Resposta dele: “Como no ‘Laura’, neste processo, eu
convidei seis artistas, de diferentes áreas - do TEATRO, da dança, das artes
visuais, a colaborarem no processo. Então, esses seis colaboradores
participaram, sem hierarquia ou especificidade, vindo aos ensaios e fazendo
provocações, para ajudar a orientar a criação. Eles também podem ser entendidos
como parte da direção. Gosto de ter esse olhar de fora, para ampliar a
experiência coletiva da proposta. Eles trouxeram propostas, durante a criação,
ou observaram o material que eu oferecia, traçando caminhos, fazendo sugestões,
apontando problemas.”. Seria, portanto, contando com a generosidade de FABRICIO,
um trabalho que partiu de uma ideia e de uma criação coletiva.
Transcrevo, porque gosto dela, a afirmação do ator,
com a qual também faço coro: “Acredito num TEATRO que se caracterize pelo
desejo de transformar vivências pessoais em experiências coletivas de
aprendizado. Elas podem ser trágicas, cômicas, sublimes, delirantes ou até
cruéis. (...) Talvez, de alguma forma, realizando as apresentações públicas,
ocorra comigo um processo de cura ou catarse, mas as três peças não nasceram
desse desejo. E, se há cura ou catarse, ela não é só minha; é também do
público”.
A participação da plateia, a qual é recebida, com
muito carinho e respeito, pelo ator, uma pessoa que transborda
afetividade, além de talento profissional, é fundamental nesta peça,
tecnicamente, um monólogo, mas que, também, não poderia ser assim
considerada, pela participação efetiva do público, com o qual o ator
interage, mais do que representa, da primeira à ultima cena, com um final muito
surpreendente, lindo e delicioso, denotativa e conotativamente falando, sobre o
qual não me cabe dizer nada, para não dar “spoiler” e roubar, aos
que ainda vão assistir ao espetáculo, a surpresa e o imenso prazer que tive.
Foi uma experiência difícil se ser descrita em palavras.
Ainda extraído do “release”: “Se ‘morrer’
e ‘nascer’ são os verbos que delimitam aquilo que entendemos por vida, o TEATRO
pode ser compreendido como um grande ritual de passagem, em que viver pode ser
um limite.”. Concordo plenamente, e acrescento: um grande ritual de passagem.
FICHA TÉCNICA:
Criação,
Direção e Atuação: Fabrício Moser
Colaboração
Artística: Cassiana Lima Cardoso, Gabriel Morais, Gabriela Lírio, Ricardo
Martins, Silvana Rocco e Tato Teixeira
Programação Visual: Davi Palmeira
Programação Visual: Davi Palmeira
Fotos: Ricardo
Martins e Pedro Bonfim Leal
Consultoria Audiovisual: André Boneco
Assessoria de Imprensa: Marrom Glacê – Gisele Machado & Bruno Morais
Produção: Fabrício Moser e Gabriel Morais
Consultoria Audiovisual: André Boneco
Assessoria de Imprensa: Marrom Glacê – Gisele Machado & Bruno Morais
Produção: Fabrício Moser e Gabriel Morais
SERVIÇO:
Temporada: De 09
de novembro a 15 de dezembro de 2019.
Local: Casa Quintal
de Artes Cênicas.
Endereço: Rua
Sílvio Romero, 36 – Lapa – Rio de Janeiro.
Dias e
Horários: Sábados e domingos, às 20h.
Valor dos Ingressos:
R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia entrada)
Classificação Etária:
16 anos.
Duração: 60
minutos.
Capacidade: 40 pessoas.
Gênero:
Autoficção
Para mim, não chegaram, com o encerramento da peça,
as respostas exatas para estas duas perguntas: “Diante da vida, como lidar com a
morte? Diante da morte, como lidar com a vida”. Por outro lado, com
muito mais valor e importância, ficaram a provocação e o desafio, para
continuar a perseguição às respostas para elas, as quais, com quase totalíssima
certeza (O pleonasmo é proposital.), jamais encontrarei. Mas o importante é
continuar tentando, e aprendendo, e vivendo, e sonhando, e aproveitando cada
fração de segundo, enquanto estamos respirado, uma vez que “A Vida è Bela” e devemos seguir a máxima “Carpe
Diem!”.
Não deixem de participar, mais do que assistir, a
este ótimo espetáculo, uma experiência boa, muito boa, pela qual todos deveriam passar. Recomendo, em especial, aos meus queridos amigos e leitores, com os quais
tenho um enorme prazer em dividir as coisas boas a que tenho acesso.
E VAMOS AO TEATRO!!!
OCUPEMOS TODAS AS
SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!
A ARTE EDUCA E
CONSTRÓI!!!
RESISTAMOS!!!
COMPARTILHEM ESTE
TEXTO,
e
PEDRO BONFIM LEAL.)
(GALERIA
PARTICULAR.)
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