terça-feira, 19 de novembro de 2019

A MANDRÁGORA

(TEATRO COMO O VINHO:
“QUANTO MAIS VELHO, MELHOR”.)



            TEATRO é uma coisa muito boa mesmo. Se, de qualidade, melhor. Se, de muito boa qualidade, melhor ainda. Quando a entrada é franca, é o “Nirvana”. Você pode encontrar tudo isso, se for assistir a um espetáculo em cartaz no Armazém da Utopia (Armazém 6 - Cais do Porto do Rio de Janeiro) (VER SERVIÇO.). Trata-se de “A MANDRÁGORA, o mais recente trabalho apresentado pela COMPANHIA ENSAIO ABERTO.

            É impressionante como um texto que foi escrito no século XVI, há, praticamente, meio milênio, pode continuar tão atual, em função de seu enredo, das críticas que apresenta - todas pertinentes às pessoas e instituições de hoje -, das lições de vida que ele nos apresenta e do incentivo a reflexões, para que cada espectador, ao julgar as atitudes dos personagens, também possa fazer a sua “mea culpa” e procurar melhorar, na condição de ser humano, animal pensante.







SINOPSE:
“A MANDRÁGORA” Conta a história do jovem florentino CALÍMACO (JOÃO RAPHAEL ALVES), que, por conta de uma aposta, conhece e passa a desejar, furiosamente, uma mulher casada, linda e jovem, LUCRÉCIA (LUIZA MORAES), que não consegue ter filhos com seu marido, o velho MESSER NÍCIA (LUIZ FERNANDO LOBO).
Para conquistá-la, com ajuda de um jovem embusteiro, LIGÚRIO (LEONARDO HINCKEL),  de um frei sem escrúpulos, FREI TIMÓTEO (GILBERTO MIRANDA) e da mãe da recatada esposa, SÓSTRATA (TUCA MORAES), ele finge ser médico e receita um tratamento à base de mandrágora, “uma planta afrodisíaca”, “milagrosa”, capaz de tornar fértil qualquer mulher incapacitada para engravidar.
A história se passa em Florença, em 1504.
CALIMACO, recém-chegado de Paris, apaixona-se por LUCRÉCIA, que é casada com o ingênuo doutor MESSER NICIA, um doutor da lei, amargurado por não ter tido um filho.
CALÍMACO, com a ajuda do servo SIRO (CLÁUDIO SERRA) e do astuto amigo LIGÚRIO, finge ser um médico famoso e convence MESSER NICIA de que a única maneira de fazer sua esposa engravidar seria obrigá-la a tomar uma infusão de mandrágora.
Diz-lhe, entretanto, que o primeiro homem que mantiver relações sexuais com ela, após a ingestão da droga - apenas este -, morrerá envenenado.
NICIA recusa-se a aceitar a “ajuda”, de imediato, porém LIGÚRIO intervém e encontra, rapidamente, uma “prática solução”, ao “raptarem um rapaz” e fazê-lo ter um encontro com sua esposa, o que deixa NICIA um pouco tranquilizado, porém perplexo, pois alguém teria que se deitar com sua esposa.
LIGÚRIO, então, ardilosamente, trama, com CALÍMACO, para que este se disfarce e se vista como um rapaz qualquer (É o tal que foi “raptado”.), para que possa ter uma noite de amor com sua paixão.
CALÍMACO, disfarçado, é golpeado, levado à casa de NICIA e, enfim, é conduzido até o leito de LUCRÉCIA.
Esta, por fim, é convencida por FREI TIMÓTEO a consumar o adultério e, no momento em que é revelada a verdadeira identidade de CALÍMACO, ela concorda, finalmente, em se tornar sua amante.
Após a noite do “engano”, CALÍMACO, desta vez, fazendo-se de médico, novamente, consegue, de NICIA, satisfeito com a “futura paternidade”, autorização para habitar em sua casa.
O resto já se pode imaginar...






            “A MANDRÁGORA” é um clássico da dramaturgia universal, que atravessou, e ainda atravessa, os séculos. É uma comédia escrita pelo italiano NICOLAU MAQUIAVEL, considerada uma obra-prima do Renascimento italiano. Originalmente, não na montagem em tela, é composta de um prólogo e cinco atos. Trata-se de uma sátira poderosa e contundente à corrupção da sociedade italiana da época (Eu disse “da época”?). O título da peça faz referência à mandrágora, uma planta, a cujas raízes são atribuídas propriedades afrodisíacas. Acreditava-se que a obra havia sido escrita em 1518, mas estudos recentes apontam que pode ter sido escrita quatro anos antes. Foi publicada, pela primeira vez, em 1524. É uma das comédias clássicas mais montadas, pelo mundo inteiro e ao longo de quase 500 anos.
           
Os seis personagens principais da trama, CALÍMACO, LUCRÉCIA, SIRO, LICÚRIO, SÓSTRATA e FREI TIMÓTEO, os quais, cada um a seu modo, representam, de certa forma, a podridão humana, em termos de caráter; são arquétipos de vários aspectos negativos da sociedade, com destaque para a corrupção.




A montagem aqui analisada foi compactada em dois atos, com um total de 105 minutos de duração, com intervalo, e, nela são mostrados os níveis absurdos a que pode chegar a sanidade humana, porém de forma cômica, muito bem reformatada, com as armas voltadas, principalmente, para a corrupção dentro da Igreja, um dos  maiores focos de crítica, na obra de MAQUIAVEL, de cuja vida pouco se sabe, até 1948. É certo que, depois de sofrer prisão e tortura, recolheu-se em sua propriedade rural, nas imediações de San Casciano, onde, em companhia da esposa e dos seis filhos, se dedicou a estudar e escrever. Entre suas obras principais, podem ser citadas as seguintes; “O Príncipe”, “Discursos Sobre A Primeira Década De Tito Lívio”, “A Arte Da Guerra” e “A Mandrágora”, “uma sátira sobre a sedução”. Em 1520, o cardeal Giulio de Médici encomendou-lhe uma história de Florença, que ele concluiu em 1525. Após um breve retorno à vida pública, da qual fora banido, quando, então, resolveu se recolher, como já foi dito, MAQUIAVEL faleceu em 1527.




O adjetivo “maquiavélico”, que tanto empregamos e vemos empregado, foi criado a partir dos pensamentos de MAQUIAVEL, famoso filósofo político, conhecido por sua negatividade, diante da vida e dos seres humanos. Quem nunca ouviu, pelo mesmo, alguém falar de um “plano maquiavélico” ou que uma pessoa “é maquiavélica”? O adjetivo se refere “maquiavelismo”, que nega as leis morais. A doutrina de MAQUIAVEL é considerada como “a negação de toda moral”, “que envolve perfídia, falsidade; doloso, pérfido”. Seu emprego é sempre com valor conotativo. Uma “pessoa maquiavélica” é aquela que “age de forma pragmática, não se importando com os meios, desde que seu objetivo possa ser alcançado”. Maquiavélicos são pessoas ardilosas, astutas, amorais. Dois célebres pensamentos de MAQUIAVEL podem sustentar o sentido de tal adjetivo. Um deles: “Quando você tiver de fazer algum mal a alguém, faça-o todo de uma só vez. A dor será intensa, mas apenas uma. Já o bem, faça-o em parcelas. O favorecido ficará alegre e grato a você várias vezes”. O outro, bem mais conhecido: “O fim justifica os meios”. Ambos estão presentes em “A MANDRÁGORA”. Muito presentes!!!

De acordo com o “release”, enviado por THAINÁ ROSA (LEAD COMUNICAÇÃO), MAQUIAVEL, em tempos em que expor a verdade era um perigo, alerta aos espectadores: ‘se um velho imbecil, um frade astuto, um parasita matreiro e corrupto serão hoje o vosso passatempo, a culpa não cabe ao autor, e sim ao seu tempo’”. (Texto dito logo no início da peça.)




A encenação me agradou muito, como, aliás, vem acontecendo em todos os trabalhos da COMPANHIA ENSAIO ABERTO, da qual sempre procuro assistir às montagens, naquele espaço muito bem aproveitado por eles (Armazém da Utopia.), que deveria servir de modelo, para que outros semelhantes, nas cercanias, fossem revitalizados, em prol da CULTURA.  Surgida em 1992, com a proposta de “retomar o teatro épico no Brasil e fazer dos palcos uma arena de discussão da realidade, resgatando sua vocação crítica e politizada”, foi fundada pelo diretor LUIZ FERNANDO LOBO e pela atriz TUCA MORAES, “a COMPANHIA explora a ideia do ensaio como experimento e busca romper a ilusão do TEATRO, questionando e reinventando a relação palco-plateia”. E nisso eles são muito bons. Desde seu primeiro trabalho, “O Cemitério dos Vivos”, a partir da obra de Lima Barreto, em 1993, a ENSAIO ABERTO ganhou um lugar de destaque, para mim, em função da qualidade e do arrojo, marcas de suas produções, aquelas às quais assisti, como “Cabaré Youkali”, de Bertolt Brecht e Kurt Weill (1995); “A Mãe”, de Bertolt Brecht (1996); “Missa dos Quilombos”, de Milton Nascimento, Pedro Casaldáliga e Pedro Tierra (2002), que considero uma obra -prima; “Havana Café”, de João Batista e Luiz Fernando Lobo (2004); “Estação Terminal”, de João Batista e Luiz Fernando Lobo (2008)“Sacco e Vanzetti”, de Maurício Kartun (2014), outra obra-prima; “Que Tempos São Esses?”, a partir da obra de Bertolt Brecht (2016); “Dez Dias Que Abalaram O Mundo”, a partir do livro, homônimo, de John Reed (2017); e “Luz Nas Trevas”, de Bertolt Brecht (2019).






Este “A MANDRÁGORA” me impressionou, positivamente, por vários motivos. Não preciso falar do texto original, tão interessante e atual, mas louvo a adaptação, a dramaturgia, escrita por LUIZ FERNANDO LOBO, que manteve a linguagem clássica de uma época, porém inseriu algumas frases num linguajar bem moderno (Algumas vezes, pareceram-me “cacos”, de verdade.), sem, contudo, descaracterizar a obra de um mestre.

A direção, que também cabe a LUIZ FERNANDO LOBO, é muito firme e criativa. Agrada-me muito a ideia de o espetáculo ter sido montado numa arena (Não consigo vê-lo em outro formato.), que serve a tantas locações, como uma praça, em Florença, a rua, a casa de MESSER NÍCIA, os aposentos de LUCRÉCIA, tudo sobre três pequenos palcos, com acesso por escadas, e mais o entorno, baixo, desse ambiente cênico, o qual é montado sobre um palco maior. O diretor imprime muito ritmo e movimento às ações, o que mantém o público mais atento e interessado na história contada, já não fosse o enredo motivo de interesse. É muito positiva a concepção da montagem, com a encenação sendo feita por uma trupe de menestréis, mambembes e brincantes, totalmente compatível com o que se vai encenar, à moda do Teatro Medieval, misturado com a “Commedia Dell’Arte”, em exibições nas praças, nas ruas, nos adros de igrejas e outros locais afins.






O cenário e toda a ambientação cênica, de excelente bom gosto, diga-se de passagem, que já começa quando o público adentra a área em que se dará a peça, propriamente dita, é obra de J. C. SERRONI e, além do que já foi descrito, no parágrafo anterior, comporta “um céu de Galileu”, que se abre e se fecha, e um quadro de Bruegel, “disparatada e propositalmente”, pareceu-me, exposto numa praça pública, além de objetos de cena e araras, com partes das peças dos figurinos.




São igualmente interessantes os figurinos, puxados para o exótico, alguns, e bem de acordo com a época, com peças que realçam a natureza e a têmpera de cada personagem. São assinados por BETH FILIPECKI e RENALDO MACHADO.

Mais dois elementos técnicos que merecem destaque nesta montagem são a iluminação, de CÉSAR DE RAMIRES, e a trilha sonora, feita a quatro mãos, por LUIZ FERNANDO LOBO e ANNA CAROLINA MAGALHÃES.

Fechando os comentários críticos, reservei este espaço para o excelente elenco, no qual não vejo destaques individuais, embora os personagens masculinos, na trama, sejam beneficiados pelas luzes do foco do autor. De uma forma geral, todas as “performances” são corretíssimas, e devo realçar não só a propriedade particular de cada um, para interpretar seus papéis cômicos, o “timing”, na medida, para a comédia (Seriam cômicos, se não fossem cretinos.), bem como a resistência física de cada um, o que já frisei, em outras críticas, feitas a montagens de espetáculos anteriores, uma vez que todos vivem correndo o tempo todo, subindo e descendo escadas, o que demanda um preparo corporal invejável (Parte do mérito vai para PAULO MAZZONI, preparação corporal.), e o desgaste vocal, uma vez que não existe o menor tratamento acústico, no local das apresentações, e os atores são obrigados a projetar a voz e a articular, muito claramente, todos os fonemas, cuidadosamente, para que o público não se sinta prejudicado, na decodificação das falas. Esse é outro grande mérito do ótimo e aplicado elenco.







FICHA TÉCNICA:

Baseado na obra “A MANDRÁGORA”, de Nicolau Maquiavel.

Dramaturgia: Luiz Fernando Lobo
Direção: Luiz Fernando Lobo
Assistente de Direção: Anna Carolina Magalhães

ELENCO: Atores / Personagens:
Lucrécia: Luiza Moraes
Calímaco: João Raphael Alves
Messer Nícia: Luiz Fernando Lobo
Ligúrio: Leonardo Hinckel
Frei Timóteo: Gilberto Miranda
Sóstrata: Tuca Moraes
Siro: Cláudio Serra
Mulher: Natália Gadiolli

Trupe: Tayara Maciel, Letícia Viana, Amarildo Moraes, Júlia Parreiras, Kauane Ribeiro, Ritcheli Santana e Felipe De Góis

Direção de Produção: Tuca Moraes
Conselheira Artística: Iná Camargo Costa
Cenografia e Espaço Cênico: J. C. Serroni
Figurinos: Beth Filipecki e Renaldo Machado
Iluminação: César De Ramires
Trilha Sonora: Luiz Fernando Lobo e Anna Carolina Magalhães
Programação Visual: Marcos Apóstolo, Marcos Becker e Tatiana Rodrigues
Fotos: Marcelo Valle
Produção Executiva: Roberta Mello
Gerente Siconv: Cida De Souza
Assistente Executiva: Catarina Maciel
Assistente de Produção: Willian Silva
Preparação Corporal: Paulo Mazzoni
Caracterização: Luiza Moraes
Máscaras: Rodrigo Sàngódaré
Ciência do Novo Público (?): João Raphael Alves, Agnes de Freitas e Gilberto Miranda





 






SERVIÇO:

Temporada: De 28 de outubro até 1º de dezembro de 2019.
Local: Armazém da Utopia (Armazém 6 do Cais do porto do rio de Janeiro – Estação do VLT em frente: Parada Utopia / aquaRio.).
Dias e Horários: De 6ª feira a 2ª feira, às 20h.
Abertura da casa 1h antes do espetáculo, com bar.
Tel. 21.2516-4893 / 21. 98909-2402 (WhatsApp).
Classificação Etária: 12 anos.
Capacidade: 250 Lugares.
Duração: 105 minutos.
GRATUITO

Informações para a imprensa:
LEAD Comunicação – Rio de Janeiro
(55 21) 2222-9450 | 99348-9189 (Claro)
leadcom@terra.com.br   skype: lead.comunicacao1
www.leadcomunicacao.com







“A MANDRÁGORA” é, sem dúvida, uma peça que merece ser recomendada e vista por quem aprecia um bom TEATRO.

E VAMOS AO TEATRO!!!

OCUPEMOS TODAS AS SALAS DE ESPETÁCULO DO BRASIL!!!

A ARTE EDUCA E CONSTRÓI!!!

RESISTAMOS!!!

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PARA QUE, JUNTOS, POSSAMOS DIVULGAR
O QUE HÁ DE MELHOR NO
TEATRO BRASILEIRO!!!



 



CENSURA NUNCA MAIS!!!






(FOTOS: MARCELO VALLE.)




































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