MEMÓRIAS
DE
ADRIANO
(“AJUDEM-ME
A MORRER!”)
Ultimamente, mais do
que antes, muitos livros vêm sendo adaptados para o TEATRO, como é o caso de “MEMÓRIAS
DE ADRIANO”, “best-seller” da
consagrada escritora belga MARGUERITE
YOURCENAR, considerado sua obra-prima,
publicado em 1951, que chegou aos palcos numa adaptação de THEREZA FALCÃO,
com direção de INEZ VIANA, em forma de monólogo, interpretado por LUCIANO
CHIROLLI, completando 30 anos de profissão.
SINOPSE:
A peça,
como no livro, é escrita em primeira pessoa, em tom narrativo, como uma
autobiografia imaginária, narrando a trajetória de ADRIANO, imperador romano (76
d.C 138 d.C) e suas reflexões sobre a vida, o amor, a amizade, o poder, a
guerra e o dinheiro.
Ciente da
proximidade de sua morte, o imperador decide escrever uma carta ao filho
adotivo, e futuro imperador, Marco
Aurélio, prometendo-lhe contar a sua história e prepará-lo para ser um bom
governante e para lançar, pela última vez, um olhar sobre si.
A
intenção de ADRIANO é prepará-lo
para assumir o poderoso Império Romano.
Parte da dinastia dos Antoninos, ADRIANO é considerado, pelos historiadores, como um dos “cinco bons imperadores”.
LUCIANO CHIROLLI, que vive o personagem ADRIANO, afirma que “é a história de um homem que passou por
muitos fracassos e rejuvenesce, ao se apaixonar por um jovem”.
Já a diretora
do espetáculo, INEZ VIANA, completa:
“A
gente transpôs para o presente o que esse personagem poderia contribuir para os
dias atuais. Ele era um adepto da paz. Ele se preocupava com a humanidade”.
O embrião do espetáculo surgiu em 2013, quando
o ator FELIPE LIMA conheceu o livro
de YOURCENAR e ficou, de tal forma,
fascinado por ele, que comprou os direitos e é o idealizador do espetáculo, como já o foi, sozinho ou com outras
pessoas, em “R&J de Shakespeare – Juventude Interrompida”, “Mas Por Quê? – A História de Elvis”, “Cock – Briga de Galo” e “Fonchito e a Lua”, quatro grandes sucessos, de
público e de crítica.
NÃO FALTAM MÉRITOS, NESTA MONTAGEM, PARA DIZER QUE SE TRATA DE UM
EXCELENTE ESPETÁCULO, a começar pela brilhante adaptação
para o palco. Embora eu não tenha lido o livro, pessoas que o leram e
assistiram à peça, são unânimes em dizer que THEREZA FALCÃO foi perfeita, direta no alvo, nessa adaptação. Certamente, foi um grande
desafio, para ela, ter conseguido concentrar o conteúdo de 359 páginas de um livro denso, de difícil compreensão, para muitos,
em cerca de 60 minutos de ação,
valorizando o que há de mais importante na obra. Tudo escrito em linguagem fluente,
coloquial, no sentido de facilmente compreensível, e atual.
Segundo FELIPE LIMA,
“THEREZA
FALCÃO conseguiu pegar o cerne do livro e fazer uma belíssima adaptação. Ela privilegiou a essência do personagem ADRIANO,
o homem”. “Todo
o pano de fundo da época é bem diferente do atual, mas o sentimento é igual”,
complementa INEZ VIANA.
THEREZA,
pelos comentários que ouvi, preocupou-se em conservar alguns emblemáticos
trechos do romance e privilegiou a relação homossexual entre ADRIANO e Antínoo, um belíssimo adolescente, por quem o imperador foi
profundamente apaixonado (conheceu-o quando o rapaz tinha apenas 17 anos), de cabelos encaracolados,
detalhe que encantava ADRIANO, e que
se suicidou, em circunstâncias não tão bem esclarecidas, no ano 130d.C, aos 20 anos, afogado no Rio Nilo, durante uma viagem dos dois. Especula-se que o
próprio Antínoo se ofereceu, como sacrifício aos deuses, de modo a assegurar a
prosperidade de ADRIANO. Há, por
outro lado, quem acredite que o jovem possa ter cometido suicídio,
ao constatar que, “já” aos 20 anos,
os seus encantos juvenis começariam a deixar de interessar ao imperador,
hipótese menos provável para a morte do rapaz.
ADRIANO costumava
referir-se a Antínoo como “a Criança”. A pedido deste, em vida,
mandou embalsamar o seu corpo, pelos egípcios, e depositou-o, “para o descanso
eterno”, num túmulo semelhante ao de um faraó. E não ficou só nisso a sua deificação, por parte de ADRIANO, que era 34 anos mais velho que
o amado. Em sua honra, mandou construir uma cidade com o seu nome, Antinoópolis, no Egito, na qual
implantou o “Culto a Antínoo, atribuindo-lhe um caráter de
semideus.
Por todo o Império Romano,
foram erguidas numerosas estátuas de Antínoo
e, na parte oriental do Império,
levantaram-se templos, dedicados ao jovem. Foi dado o nome Antínoo a uma estrela e o imperador escreveu um epitáfio dedicado ao jovem, que mandou gravar
no chamado Obelisco de Antínoo, que se encontra, hoje,
nos Jardins do Píncio, em Roma. Ainda mais: os retratos de Antínoo eram, por determinação de ADRIANO, feitos de forma que ele se parecesse com Dionísio.
Mas
THEREZA não deixou de fora detalhes
das viagens do imperador às terras
do seu Império Romano, os seus
sentimentos para com os seus amigos e inimigos, as intrigas palacianas da sua
corte, os seus pensamentos políticos e filosóficos sobre Roma e os romanos, as suas campanhas
militares...
Também não passou ao largo a relação de ADRIANO com seu avô, a quem considerava
um feiticeiro, e ainda fala de seu pai, Élio Afer
Adriano, e da sua mãe, cujo nome não refere (Paulina). Não deixou de fora a predileção
de ADRIANO pela cultura e sociedade
grega, afirmando um especial gosto pela língua grega. Ele estudou em Atenas e
afirma que o grego o ensinou a ser o que é, um imperador (“Este grego duro ensinou-me o
método.”).
A adaptadora
não deixou de lado as suas aventuras, ao se tornar iniciado no culto de Elêusis, e o seu profundo medo da
morte, criticando a si próprio, pela sua falta de coragem, tanto que implora
que o ajudem a morrer. Conta, também, como se deu o seu casamento com Sabina e não deixa escapar o que o
imperador pensava das mulheres da época,
criticando-as por falta de amor verdadeiro e por uma crescente vaidade.
Faz referência às invasões bárbaras, que
se estendiam e que, pela vontade de ADRIANO,
tinham que ser travadas, culminando com a vitória dos romanos. Apesar de todo
este clima de guerra, o imperador defendia a política de que não deveriam
expandir mais os seus territórios, mas sim defender as suas fronteiras o mais
eficaz possível, embora fosse necessário pacificar os focos de instabilidade (“Qualquer
novo acréscimo do vasto organismo imperial parecia-me uma excrescência doentia,
um cancro ou o edema de uma hidropisia que acabaria por nos causar a morte”).
Na adaptação,
como no original, o personagem demonstra gratidão e fidelidade a Plotina,
mulher de Trajano, que o antecedeu
no poder, com a qual mantinha uma relação de amizade muito forte e que foi a
responsável pela indicação de ADRIANO
ao trono, quando da morte do marido.
Antevendo o seu fim, e não tendo Antínoo vivo, ao seu lado, para
ocupar-lhe o trono, ADRIANO adotou Lúcio, para que este o sucedesse, mas isso
não se concretizou. Tinha que pensar em outro pretendente e, por isso, nomeou Antonino, como sucessor e Marco Aurélio, como seu neto, acabando
este por vir a ocupar o seu lugar no comando do Império.
Considero
muito pertinente lembrar que THEREZA
FALCÃO também foi a responsável por uma outra adaptração de livro, de
grande sucesso, em 2007, que deverá voltar ao cartaz, no próximo ano, para
comemorar os dez anos de seu lançamento no palco, estrelada por INEZ VIANA. Refiro-me à peça “A Mulher Que Escreveu A Bíblia”,
adaptação do livro homônimo do saudoso Moacyr Scliar.
O segundo grande mérito, não por
ordem de importância, deve ser conferido à ótima direção de INEZ VIANA,
mais uma para o seu vastíssimo currículo, marcado por grandes sucessos,
principalmente na direção de
montagens da companhia que ela ajudou a fundar e da qual faz parte até hoje, a Cia. OmondÉ.
Com a rara matéria-prima que tinha a
mão, um ator do gabarito de LUCIANO
CHIROLLI, INEZ não deve ter tido
muito trabalho para atingir o tom que desenhou para o espetáculo.
Luciano Chirolli.
Sua
ideia de trazer, para a contemporaneidade, o texto, aproximando-o do público, por meio da utilização de recursos
e elementos modernos, atuais, é de um bom gosto e de uma criatividade
invejáveis. Posso citar alguns exemplos disso, como a utilização de música
eletrônica e ruídos dissonantes, para sublinhar as cenas; a mudança de figurino
do personagem, que troca um curioso tipo de roupão por um bem recortado terno,
retornando, em seguida ao traje anterior, como marca da passagem de épocas; a
utilização de um microfone, para realçar algumas falas do personagem; sem falar
no cenário, que será motivo de comentários particulares. Na verdade, pode-se
dizer que a direção optou pela
atemporalidade na peça.
INEZ parece ter passado a LUCIANO o que ela havia traçado para o
personagem, pondo em relevo o seu lado mais humano, sofrido e apaixonado, dando-lhe
liberdade para desenvolver o seu trabalho. São excelentes as marcações e a
ideia de o ator se aproximar, ao máximo, da plateia, logo na primeira cena,
pedindo a alguém que o ajude a morrer. Cria-se um grande impacto, nesse
momento, que manterá as pessoas ligadas à ação, até o seu final.
E
o que dizer da fantástica atuação de LUCIANO
CHIROLLI? Às vezes, é difícil encontrar o adjetivo certo, na medida, para
qualificar algo ou alguém, que é o se dá neste caso. LUCIANO é, sem dúvida, um dos melhores atores de TEATRO deste país e o prova, mais uma
vez, neste espetáculo. Infelizmente, suas passagens pelo Rio de Janeiro não são tão frequentes, já que é radicado em São Paulo. Sempre que posso, procuro
assistir às montagens de que participa. Creio que sua última atuação que tive o
prazer de ver, no Rio, foi em “As Três Velhas”, trabalho pelo qual
ganhou prêmios, ao lado de Maria Alice
Vergueiro, com quem vem dividindo o palco há cerca de 20 anos. Curiosa e
coincidentemente, vi-o, em cena, há um mês, mais ou menos, em Salvador, mais uma vez, ao lado de Maria Alice, em “Why The Horse”, um “happening”,
quando do lançamento do Projeto Palco
Giratório 2016, do SESC, para o
qual fui convidado.
LUCIANO concentra todas as suas energias
de ator neste personagem, ganhando a simpatia e a cumplicidade da plateia, logo
nos primeiros minutos da peça, quando sai de seu leito de morte, à beira desta,
e caminha, até a primeira fila, olhando, fundo, nos olhos de algumas pessoas,
implorando a elas que o ajudem a morrer, num tom patético de quem está fragilizado,
externa e internamente. Cria-se, ali, um vínculo tão estreito entre espaço
cênico e auditório, que se mantém inalterado, até o final da peça, como já
disse. O público parece hipnotizado por ADRIANO
(Ou seria por LUCIANO?). Eu me projetei, totalmente, para perto dele, quase
me descolando da cadeira, na primeira fila, como se lhe desse a mão e me
deixasse conduzir, por ele, pelos meandros de suas histórias e aventuras.
O
ator desnuda-se de todo pudor,
arrisca-se, num tom confessional, a mostrar a verdade do personagem com a sua própria
verdade de intérprete, fazendo uso de grandes e pequenos gestos, às vezes,
mínimos, explorando detalhes de volume e projeção da voz e peculiaridades de
movimentos faciais poucas vezes vistos num palco.
Ele
trabalha, com igual intensidade e importância, situações de medo, piedade,
paixão, desejo carnal, até uma dissimulada ironia zombeteira. O personagem
parece ter sido escrito para ele e ele parece ter aguardado 30 anos de
profissão, para representar o grande papel de sua carreira, a despeito do
destaque que demonstrou em tantos outros trabalhos anteriores.
E,
ainda por cima, brinda-nos com uma interpretação, mais afetiva que técnica, da
linda canção “Canzone Per Te”, de Sergio Bardotti, cuja letra se ajusta, totalmente,
ao momento da peça, após a morte de Antínoo.
Mais um ponto alto do espetáculo se
concentra em dois elementos conjugados: o cenário
e a iluminação. AURORA DOS CAMPOS criou, dentro da contemporaneidade proposta nesta
montagem, um cenário inesquecível,
com um grande painel, ao fundo, feito de uma quantidade incalculável de
radiografias e tomografias, colocadas umas ao lado das outras, que, na minha interpretação,
revelam o recôndito, o íntimo do personagem, chamando a atenção do público pra
o fato de o interior daquele homem, de enorme estatura, estar tão fragilizado,
doente, quando visto por dentro. A imagem do âmago de um ser humano, que
implora por quem o livre do sofrimento de viver, facilitando-lhe o caminho para
um merecido descanso, que só a morte lhe poderia proporcionar. Completam o cenário, uma banheira, que substitui,
de forma genial, a cama, o leito de amor e de morte do grande imperador; uma
cadeira; um microfone, num pedestal; umas finas pilastras de ferro e uma diáfana
parede (ou cortina) por trás da qual pode ser observado o trabalho de MARCELLO H, sobre o qual falaremos
adiante.
A iluminação, de TOMÁS RIBAS,
de forma precisa e correta, põe em destaque o cenário e as ações do personagem.
Grande mérito, que não me
surpreendeu, vai para MARCELLO H,
sem cuja participação, o espetáculo perderia muito de sua enorme qualidade.
Assim como fez, em “Trágica.3”, com
direção de Guilherme Leme Garcia, MARCELLO acumula as funções de músico e ator. Em “MEMÓRIAS DE
ADRIANO”, ele esbanja talento, comandando uma “mesa de produzir sons”, além de tocar guitarra e fazer algumas
intervenções de texto. Atento à atuação de CHIROLLI,
MARCELLO “dialoga” com ele, atuando
em 90% do espetáculo, na sonoplastia,
além de assinar, junto com JOÃO CALLADO,
a trilha sonora do espetáculo.
Marcello H e sua mesa “mágica”.
Com relação ao figurino, de JULIANA NICOLAY,
achei belíssimo e criativo o misto de roupão
/ “robe de chambre” / manto real, em tom sóbrio, com alguns detalhes de
bordados, que lhe conferem destaques aristocráticos, que o personagem usa no
início e no final da peça, assim como o discreto e belo terno, moderno e bem
talhado, que ADRIANO usa, no auge e
no vigor de sua vida, durante momentos de “flashback”
(?).
Vale a pena um aplauso para o
trabalho de preparação corporal, excelente,
como sempre, a cargo de Márcia Rubin.
Eu disse que NÃO FALTAM MÉRITOS A SEREM DESTACADOS NESTA PRODUÇÃO e espero não
ter me esquecido de citar nada que merecesse destaque. Talvez mais fácil, e
economizando o tempo do meu leitor, seria dizer que TUDO, NESTA PEÇA, É DIGNO DOS MAIS LOUVÁVEIS ELOGIOS.
Tenho certeza de que o espetáculo fará uma bela
carreira no Rio de Janeiro e que a
curta temporada, na Sala Multiuso do
SESC, seja seguida de outras, em espaços que permitam esta montagem bem
intimista.
“MEMÓRIAS
DE ADRIANO” é um dos melhores
espetáculos em cartaz no Rio de Janeiro.
FICHA TÉCNICA:
Idealização: Felipe
Lima
Adaptação Dramatúrgica: Thereza
Falcão
Direção: Inez
Viana
Diretora Assistente: Marta Paret
Elenco: Luciano Chirolli
Músico: Marcello H
Direção de Produção: Mariana
Serrão
Cenografia: Aurora dos Campos
Iluminação: Tomás Ribas
Trilha Sonora: João Callado e
Marcello H
Figurino: Juliana Nicolay
Arte Gráfica: Flávio Albino
Fotos: Renato Mangolin
Preparação Corporal: Márcia Rubin
Assessoria de Imprensa: Bianca
Senna e Paula Catunda
Consultoria Histórica: Cláudia
Beltrão
Produção Executiva: Arilson Lucas
Assistência de Produção: Carlos
Darzé
Assistência de Figurino: Camila
Cunha
Estagiária de Produção: Luiza
Martinez
Gestão das Leis de Incentivo:
Natália Simonete
Realização: Sevenx Produções
Artísticas e A Coisa Toda Produções
“Canzone
Per Te”.
SERVIÇO:
Temporada: De 15 de abril a 15 de maio de 2016.
Local: Espaço Sesc (Sala
Multiuso).
Endereço: Rua Domingos Ferreira, 160 –
Copacabana – Rio de Janeiro.
Informações: (21)
2548-1088.
Dias e Horários: 6ª feira e sábado, às 19h; domingo, às 18h.
Capacidade: 60 lugares.
Acesso para deficientes físicos.
Valor dos Ingressos: R$20,00
(inteira) e R$10,00 (meia-entrada).
Duração: 60 minutos.
Classificação Etária: 16 anos.
Gênero: Drama.
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“Duvido
que toda a filosofia do mundo consiga suprimir a escravatura: o mais que poderá
suceder é mudarem-lhe o nome”.
“Uma
parte dos nossos males provém de haver demasiados homens excessivamente ricos
ou desesperadamente pobres”.
(Observação final: muitas das informações contidas neste texto foram pesquisadas na Wikipédia, e extraídas de lá, na íntegra ou com adaptações, e são totalmente confiáveis.)
(FOTOS DE CENA: RENATO MANGOLIN.).
Busto do imperador Adriano –
Museu Capitolino (Roma)
(Wikipédia).
Busto de Antínoo – Museu do Louvre
(Wikipédia).
Aplausos na sessão para convidados.
Equipe.
Com Luciano Chirolli.
Com Marcello H.
Com Inez Viana.
Com Felipe Lima.
(FOTOS PESSOAIS: LEO LADEIRA.)
Espetáculo maravilhoso! Crítica fantástica !
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