PERDAS
E
GANHOS
(O QUE SE LEVA DESTA VIDA
ou
SIMPLESMENTE, NICETTE!)
LYA LUFT, de quem
sou um fã ardoroso, autora do livro, publicado em 2003, no qual foi baseada a
peça, que me perdoe, por um dos subtítulos desta resenha, mas não caberia
outro, já que quem estava no palco do Teatro
do Leblon (Sala Fernanda Montenegro), naquela memorável noite de 9 de
janeiro de 2015, era, nada mais, nada menos que uma octogenária, NICETTE BRUNO, abrindo o seu coração e
tirando, lá das mais profundas cavidades, tudo de mais consistente e,
paradoxalmente, concreto dos seus sentimentos.
NICETTE, generosamente, nos
convidou a refletir, com ela, sobre o próprio mistério da vida, que,
inevitavelmente, termina na morte.
O livro, embrião do espetáculo, fala
da capacidade de “levanter a poeira e dar a volta por cima”, de seguir em
frente, encontrando força dentro de si, para superar momentos difíceis; ou
seja, ainda que não deva ser considerado um manual de autoajuda, mostra,
indiretamente, o “caminho das pedras” para se driblar as perdas e alcançar
ganhos.
Há dois momentos, na peça, muito interessantes
(não que os outros não o sejam). O
primeiro é quando NICETTE diz que “Perder
o amor para a morte é a perda das perdas.” O outro é quando a atriz, não uma personagem,
dirige-se à plateia: “A melhor maneira de homenagear é viver da
maneira que ele (PAULO GOULART) gostaria que eu vivesse’. É isso que estou fazendo”.
Elegância em cena.
A volta aos palcos,
além de uma homenagem ao marido, pode ser encarada, também, como um
agradecimento a todos os que ajudaram toda a família a superar a mais terrível
das perdas, a morte de seu patriarca, em 13 de março de 2014. A estreia no Rio, depois de ter passado por
outras capitais, aconteceu, exatamente, no dia em que PAULO fazia aniversário, mais um motivo para fazer com que uma
plateia inteira chorasse, ouvindo os discursos, agradecimentos, de NICETTE e BETH, ao final do espetáculo.
NICETTE, também tão presente em trabalhos para a TV e, em menor
quantidade, para o cinema, fez questão de dizer que sua vida é marcada pelo TEATRO. Não a sua “carreira”,
mas, sim, a sua “VIDA”, visto que
foi nele que ela estreou, como atriz, conheceu o amor da sua vida, casou no TEATRO, viu os filhos iniciarem suas
brilhantes carreiras, na mesma profissão dela e do marido, e se despediu deste,
após 60 anos de casamento, em um velório, no Teatro Municipal de São Paulo.
Não há coração que suporte tudo isso num discurso só, ratificado pelo de
BETH.
PERDAS E GANHOS: Um título simples,
singelo, que traduz tudo o que conseguimos acumular na nossa curta passagem por
esta vida. Mais ganhos do que perdas;
mais perdas do que ganhos. Varia, de uma
pessoa para a outra, mas são “personagens” do enredo de cada um de nós. Não importa o que ficou de mais para cada
pessoa; importa, sim, saber se ambos serviram para um aprendizado, para que
possamos voltar melhores, numa outra oportunidade. É nisso que eu acredito.
Quem perde dá
valor; o que ganha – Que pena! – nem sempre.
NICETTE, tenho certeza, emite
uma luz interior tão intensa, que nos dá a segurança de que sabe valorizar
ambos e, ainda num aprendizado, porque está cada vez mais viva, vai nos
encantando com sua arte, queira Deus que por muitos anos mais.
Sensibilidade em cena.
Trata-se de um monólogo, o
primeiro em sua carreira de mais de 60 anos de TEATRO, mas NICETTE não
está sozinha em cena. Ela “contracena”
com suas memórias, suas vivências, seus entes queridos; com a dor, a fé, a
esperança, a alegria de viver, mesmo depois de um corte tão profundo na
garganta, mas não suficiente para lhe fazer calar a voz. Além de narradora do texto de LYA, NICETTE interpreta três personagens de um outro livro da escritora, O Silêncio dos Amantes, que BETH GOULART resolveu agregar à peça: uma mãe que perde o filho (Cena
linda!), uma dona de casa submissa e uma mulher traída pelo marido. Apesar de se constituírem em grandes perdas, há,
ao término de cada texto, uma mensagem de esperança e um final, de certa forma,
feliz, como acontece na nossa vida, quando sabemos tirar partido das perdas e direcionar
o foco para os ganhos.
A
estrutura do texto da peça, como já se pode ver, intercala um tom confessional,
vindo da “narradora” NICETTE, com
dramatizações, contando, ainda, com imagens projetadas num telão, no fundo do
palco, numa das quais a atriz aparece tocando piano, uma composição dela, feita
para o marido, ele que pediu à filha, BETH,
que não deixasse de pôr a mãe tocando piano em cena.
SINOPSE:
Neste espetáculo, as palavras e
reflexões de LYA LUFT, uma autora
conectada com seu tempo, recebem a sabedoria e a presença iluminada de NICETTE BRUNO, atriz cuja trajetória de
vida se confunde com a própria história do TEATRO
BRASILEIRO e será a condutora narrativa do espetáculo.
Emoção em cena.
Talento
em cena.
Por sua temática, a peça traz um texto de muito
fácil identificação com o público, uma vez que as perdas e os ganhos de que fala estão
presentes na vida de todos. De acordo
com NICETTE, em várias entrevistas, “É
muito fácil ficar envolvida pelas perdas, que todo mundo tem, e não se lembrar
dos ganhos que existem na vida, até através de uma perda, porque é também um
aprendizado”.
Essas perdas e ganhos estão relacionadas ao nascimento,
à educação, passando pelos valores familiares, relações afetivas, chegando ao amadurecimento,
atingindo a velhice, aproximando-se da solidão, cutucando a autoestima e aguardando
a morte, temas abordados, na peça, com o objetivo de chamar a atenção para o
diferencial que existe entre o (saber) viver e o (conseguir) sobreviver.
O projeto desta
montagem, que contou com o maior incentive de PAULO GOULART, o homenageado, foi parar nas mãos de BETH e NICETTE há quase cinco anos e foi muito bem desenvolvido, com uma
indesejável interrupção, por conta do falecimento de PAULO, e foi tomando corpo, até chegar ao patamar que o credencia
como uma das grandes produções deste ano, ainda em seu primeiro mês,
independentemente do que vier por aí, pelos próximos onze.
O espetáculo é lindo,
emocionante, tocante e jamais será esquecido por aqueles que tiverem a
oportunidade de assistir a ele.
Tudo funciona
perfeitamente neste espetáculo: a beleza do texto, de LYA LUFT; a
delicadeza da adaptação e direção, de BETH GOULART; a interpretação,
de NICETTE BRUNO, para a qual todos
os adjetivos existents seriam insuficientes para incensá-la; a preparação vocal, de ROSE GONÇALVES; a belíssima iluminação, de MANECO QUINDERÉ; o justo cenário,
simples e belo, de RONALD TEIXEIRA;
a trilha sonora, de ALFREDO SERTÃ; a discreta e fina
preparação do figurino, de BETH GOULART; a fotografia, de NANA MORAES;
o visagismo, de VAVÁ TORES e GRAÇA TORRES;
o videografismo e “mapping”, dos irmãos RENATO e RICO VILAROUCA; tudo isso sem falar na equipe de produção.
Generosidade em cena.
Falar de NICETTE é tecer comentários sobre o
óbvio. Apesar de sua pequena estatura,
transforma-se, no palco, num Golias,
um gigante, alimentado pela fome do amor e da dedicação ao TEATRO.
Parafraseando
o poeta maior, Carlos Drummond de
Andrade, em sua crônica Fala Amendoeira,
NICETTE sabe “outonear-se com dignidade”, e quem lucra são os que gravitam em
torno dela: familiares, amigos e admiradores.
Encerro esta resenha,
que tanto me emociona, com o texto que postei, numa rede social, assim que
cheguei a casa, na noite inesquecível daquela 6ª feira, 9 de janeiro de 2015:
Pensei ter ido, esta
noite, ao Teatro do Leblon,
preparado para me emocionar muito, com PERDAS
E GANHOS, monólogo interpretado pela diva NICETTE BRUNO, com direção de BETH
GOULART, baseado no livro homônimo, de LYA
LUFT.
Estava redondamente
enganado.
Não há como se preparar,
emocionalmente, para um evento tão especial como aquele.
Chorei, sim.
A plateia, aos prantos,
aplaudindo, freneticamente, durante alguns minutos, DE PÉ, o comovente trabalho, a homenagem que PAULO GOULART merecia mesmo, ainda mais no dia de seu aniversário.
Muita coragem de mãe e
filha.
Só mesmo muito amor e
espiritualidade para superar uma PERDA
tão grande.
Obrigado, NICETTE e BETH por esse GANHO.
Paixão em cena.
FICHA TÉCNICA:
Texto: LYA LUFT
Adaptação e Direção: BETH GOULART
Assistente de Direção: ANA PAULA BOUZAS
Interpretação: NICETTE BRUNO
Cenário: RONALD TEIXEIRA
Iluminação: MANECO QUINDERÉ
Preparação Vocal: ROSE GONÇALVES
Trilha Sonora: ALFREDO SERTÃ
Programação Visual: STUDIO C – CAROL VASCONCELLOS
Assessoria de Imprensa Nacional: PIERINA MORAIS COMUNICAÇÃO
Fotografia Programa: NANA MORAES
Direção e Realização das Peças Audiovisuais: RODRIGO BENATTI e RAQUEL COUTO
Coordenação Geral de Produção / Supervisão: PIERINA FERREIRA DE MORAIS
Direção de Produção: AMORA XAVIER
Produção Executiva: MANOELA REIS
O anjo Nicette.
SERVIÇO:
Gênero: Drama
Teatro: Teatro do Leblon – Sala Fernanda Montenegro
Endereço: Rua Conde de Bernadotte, 26 – Leblon – RJ
Informações: (21) 2529.7700
Site: http://www.teatros.art.br/teatro-do-leblon-rj
Capacidade: 346 Lugares
Temporada: De 9 de janeiro a 29 de março
Dias da Semana: Quinta 18h / Sexta e Sábado 21h / Domingo 20h
Valores: 5ª feira e 6ª feira, R$ 70,00; sábado e domingo, R$ 80,00
Classificação: 12 Anos
Duração: 60 minutos
Beth Goulart e Nicette
Bruno.
Amor, talento, cumplicidade...
Ufa! Emoção total só em ler a resenha!
ResponderExcluirBelo texto mesmo. Tive a oportunidade de assistir em Porto Alegre a estreia da peça e é realmente algo que ficou marcado, não tem como não se emocionar e lendo a resenha já tendo assistido, acho que a emoção foi mais forte..Espetacular..
ResponderExcluirEmocionante! Não vi a peça mas posso imaginar...Singelas palavras, mais do que merecidas para essa família iluminada! Parabéns!
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