“HADDAD E BORGHI CANTAM O TEATRO,
LIVRES EM CENA”
ou
(UMA DUPLA
AULA MAGNA
DE TEATRO.)
ou
(UMA CELEBRAÇÃO
AO TEATRO
E À AMIZADE.)
ou
(UM DOCE AFAGO
DIONISÍACO.)
Mais uma vez, sinto-me impelido a escrever
sobre um espetáculo que já saiu de cartaz ontem (01 de junho de 2025),
porém me marcou, sobremaneira, quase me levando às lágrimas, em alguns
momentos. Infelizmente, só consegui assistir a ele no antepenúltimo dia de
exibição. Trata-se de “HADDAD E BORGHI
CANTAM O TEATRO, LIVRES EM CENA”, que acabou de cumprir uma curtíssima
temporada, de menos de um mês, no Teatro Adolpho Bloch. Ao final do
espetáculo, eu não disse “Parabéns!” a nenhum dos amigos e/ou
conhecidos envolvidos no projeto; troquei a felicitação por um “OBRIGADO!”, que é o mínimo que se pode dizer
a cada um deles. Obrigado por terem criado um espetáculo tão lindo quanto
emocionante e poético. Uma montagem tão singela, porém profunda, na mesma proporção,
em história do TEATRO BRASILEIRO, contada por dois exímios mestres, uma dupla
de gênios, testemunhas oculares dos fatos, duas figuras com décadas de vida – 88
anos cada um – muitos desses dedicados aos palcos e ao TEATRO de rua, duas
memórias ativas do desenvolvimento e do crescimento da arte de representar no
nosso país.
SINOPSE:
Em cena, ao lado de alguns outros
artistas amigos, AMIR HADDAD e RENATO BORGHI discorrem sobre vários temas,
como a existência, o ofício do ator, os diversos “brasis” que lhes habitam
e, claro, momentos marcantes de suas trajetórias pessoais e profissionais,
as quais somadas, ambas, a essa altura, atingem mais de 300 anos.
O elenco conversa com a dupla a cada
sessão, a fim de trazer, para a roda, assuntos, referências e lembranças
preciosas da vida dos dois grandes mestres do TEATRO, dentro e fora dos
palcos.
Ícones das artes cênicas e do TEATRO
moderno, RENATO BORGHI e AMIR HADDAD são personagens
fundamentais do fazer teatral. Os dois homenageados, cada um à sua maneira,
seguem sendo as mais potentes e comunicativas referências vivas para o TEATRO
BRASILEIRO, inclusive internacionalmente, tendo em suas trajetórias
espetáculos premiados e montagens antológicas. Os dois festejam 70
anos de amizade e de entrega ao TEATRO, número que acho que só se encontre
em alguns poucos outros, na mesma intensidade.
A felicíssima ideia de unir esses dois “monstros
sagrados” do TEATRO partiu do produtor EDUARDO BARATA, que se pôs ao trabalho,
contando com algumas valiosas colaborações, como as de DÉBORA DUBOC, ELAINE MOREIRA e ELCIO NOGUEIRA SEIXAS (equipe
criativa); CLAUDIA CHAVES (pesquisa);
e ELAINE MOREIRA (redação final).
Além de produzir o espetáculo e de dirigi-lo, BARATA também se ocupou, ao lado de ELAINE MOREIRA, da redação final do texto e da dramaturgia,
que tem como espinha dorsal a liberdade de AMIR
e RENATO, fundadores do Teatro
Oficina, ao lado de Zé Celso Martinez Corrêa.
Não resta a menor dúvida
de que a dupla de homenageados é formada por dois talentos excepcionais, que se
conheceram, esdruxulamente, nos bancos da tradicional Universidade de Direito do Largo
de São Francisco, da Universidade de São Paulo, sendo que
ambos, definitiva e ironicamente, não tinham a menor inclinação para a prática
da advocacia.
BORGHI atingiu os 88 anos de idade em março último; AMIR estará completando a mesma idade
em julho próximo, ambos, evidentemente, atingidos, fisicamente, pela ação do
implacável tempo, porém guardadores de uma memória esfuziante e prodigiosa,
ambos de uma lucidez a toda prova. São muitas histórias reunidas em duas únicas
pessoas, as quais não poderiam ficar restritas só a eles mesmos; mereciam ser
divididas com quem ama o TEATRO e reverencia os dois grandes
artistas. Como eu aprendi com aqueles dois!!!
O espetáculo tem início na
pérgula de um espelho d’água, na área externa do Teatro Adolpho Bloch, nos
fundos do palco, que também se abre para essa área contígua, com a exibição de
um trio musical, que executa canções carnavalescas, do auge da “Era
de Ouro da Rádio Nacional do Rio de Janeiro”; mais alguns solos, à
capela, de uma cantora lírica; algumas “gags” criadas por
duas palhaças; e a música de Dona Ceiça Moreno, ao acordeão, ao
fim do que todos esses artistas seguem, em cortejo, até o palco, no interior
do Teatro,
acompanhados pelo público, que é convidado a cantar com eles, no “foyer”,
enquanto se dirigem, os espectadores, aos seus lugares. Está iniciada a grande celebração.
Segundo os redatores
finais da dramaturgia, havia uma preocupação em construir e desconstruir,
“desafiando
as perspectivas do espaço cênico. Nossa ideia é narrar, cantar e apresentar ao
público um panorama, com recortes da cena nacional, pelos olhos de dois homens
de TEATRO, dois operários, trabalhadores, contemporâneos, dois pensadores das
artes, que não separam vida e TEATRO, TEATRO e vida”, como explica o
diretor EDUARDO BARATA.
O roteiro surgiu, depois de
dez encontros entre os redatores finais, os dois atores e outras duas pessoas: DÉBORA DUBOC e ÉLCIO NOGUEIRA, dois grandes amigos de RENATO BORGHI e muito próximos a ele. “É uma narrativa em trânsito, em
ebulição e com imensa liberdade artística, assim como a trajetória de AMIR e RENATO.
Tudo para homenagear estes gigantes da cena”, conta ELAINE MOREIRA.
“Eu e o RENATO convivemos mesmo por
muito tempo. São 70 anos de bem-estar e alegria ao lado dele. Nenhuma vez,
tivemos qualquer destemperança nessa vida. Fizemos um grupo de TEATRO juntos,
faculdade, e também desistimos dela juntos. RENATO é parte integrante. Agora, é
muito bom estarmos aqui reunidos. Sou feliz de tê-lo conhecido e por termos
caminhado tanto pela vida cultural brasileira”, afirma AMIR HADDAD.
Em reciprocidade, diz BORGHI: “AMIR é muito importante para
mim. Quando eu comecei a fazer TEATRO, ele me dirigiu na peça do Zé Celso, “A
Incubadeira”. Era para termos feito apenas por 15 dias e acabamos ficando seis
meses. Foi o primeiro sucesso da minha carreira. AMIR ficou com a gente nesse
período, e foi um acontecimento, um assombro; ainda era meio amador. Depois,
ele veio para o Rio, mas continuamos sempre em sintonia.”.
O espetáculo reúne algumas vertentes de
expressões artísticas, como a ópera, o circo, as artes visuais e o carnaval,
inspiradas em nomes, como os de Lygia Clark, Hélio Oiticica, Elis
Regina, Zé Kéti, Braguinha, Emilinha Borba, Bizet,
Donizetti
e Charles
Gounod. Tudo junto e misturado, numa grande e deliciosa “salada
tropical e tropicalista”.
No transcorrer da peça, entrecortando a
trajetória intelectual e profissional de AMIR
e RENATO, contribuindo para o
universo haddad-borghiano, são evocados nomes de grandes artistas e
intelectuais, como Clarice Lispector, Cecília Meirelles, Cora
Coralina, Vinícius de Moraes, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade,
Arthur
Miller, Gianfrancesco Guarnieri, Oswald de Andrade e Bertolt
Brecht.
Embora não seja um musical, com
bastante propriedade, a encenação comporta a execução de algumas emblemáticas
canções populares brasileiras, tais como “Ave Maria no
Morro”, “Se Acaso Você Chegasse”,
“Vaidosa”,
“Minha
Terra”, “Bandeira Branca”, “Alegria, Alegria” e “Carinhoso”,
entre outras, uma trilha sonora eclética e da maior responsabilidade. Além disso,
são levadas à cena três músicas compostas especialmente para o TEATRO:
“Canção
do Jujuba”, musicada por Caetano Veloso, para “O
Rei da Vela”; “Roda Viva”, composta por Chico
Buarque, para o espetáculo de mesmo nome; e “Por Causa do Teatro”, de
Jonathan
Silva, composta para o espetáculo “O Que Nos Mantém Vivos”; três
excelentes composições.
Como elementos de apoio para
esta ótima montagem, devem ser citados o cenário, projetado por ROSTAND ALBUQUERQUE; os figurinos,
criados por RUTE ALVES; e a iluminação,
desenhada por RICARDO VIANA.
Considerados como elementos
cenográficos, destacam-se dois tronos sobre rodas, para os muitos
deslocamentos dos dois “reis do TEATRO”. Um depoimento do cenógrafo:
“Assim,
AMIR HADDAD e RENATO BORGHI são levados a visitar e contar suas histórias de
vida e de TEATRO, por entre cortejos, músicas e atores encenando suas
peças. O palco também serve de camarim aos dois atores, com detalhes
realistas, como fotografias e objetos pessoais e inspiração nas obras de Hélio
Oiticica e Lígia Clark”.
O espetáculo é bastante dinâmico,
graças, em parte, ao trabalho de direção de movimento, a cargo de MARINA SALOMON, que cria uma atmosfera de liberdade, para um grande encontro no
tablado.
Recuso-me,
peremptoriamente, a escrever qualquer coisa mais sobre o que representam, para
o TEATRO
BRASILEIRO, AMIR HADDAD e RENATO BORGHI, e menos ainda, sobre a
estupenda “performance” de ambos neste espetáculo, mas não poderia deixar
de dizer quão importantes são as participações dos atores que se apresentam
como uma espécie de entrevistadores da dupla: DÉBORA DUBOC, DUDA BARATA, ELCIO NOGUEIRA SEIXAS e MÁXIMO CUTRIM, um trabalho coadjuvante de “escadas” muito bem executado pelo
quarteto.
FICHA
TÉCNICA:
Criação e Direção:
Eduardo Barata
Roteiro Final:
Eduardo Barata e Elaine Moreira
Equipe Criativa:
Débora Duboc, Elaine Moreira e Elcio Nogueira Seixas
Pesquisa:
Claudia Chaves
Elenco: Amir
Haddad, Renato Borghi, Débora Duboc, Duda Barata, Elcio Nogueira Seixas e
Máximo Cutrim
Cantora Lírica:
Ana Lia
Palhaças:
Lenita Magalhães e Laura Barbeiro
Participação Especial: Dona Ceiça Moreno
Direção Musical
/ Música ao Vivo: Trio Júlio
Direção de Movimento:
Marina Salomon
Programação
Visual / Cenografia: Claudio Attademo
Preparação Vocal:
Jane Celeste e Julie Wein
Cenário:
Rostand Albuquerque e Barbara Quadros
Figurinos:
Rute Alves
Iluminação e
Operação de Luz: Ricardo Vianna
Desenho de
Som e Operação de Som: Enrico Baraldi
Fotos /
Cenografia: Coleção Marcelo Del Cima
Foto / Zé
Celso Martinez Corrêa: Gabriel Rinaldi
Assistente
de Cenografia: Ricardo Barata
Assistente
de Figurinos e Costura: Emerson Vianna
Macramê e
Fuxico: Amarrações Macramê
Adereços de
Palco: Fábio Costa
Pintura de Arte:
Fabiano Fernandes
Microfonista:
Daniella Nanni
Diretores de
Palco: Roy D’Peres, Rodrigo Ferreira e Juan Patrick
Camareiras:
Ced e Ingrid dos Santos
Fotos:
Cristina Granato e Daniella Nanni
Captação de
Vídeos: Ketrolin Rossetto e Louise Guima
Edição de Vídeos:
Ketrolin Rossetto
Programação
Visual / Vídeo-Exposição: Luciano Cian
Assessoria
de Imprensa: Barata Comunicação e Dobbs Scarpa
Direção de Produção:
Elaine Moreira
Produção Executiva: Luciano Pontes
Produção de Base: Bruno Luzes
Assistente de Produção: Daniella Nanni
Administrativo-Financeiro: Lilian Santiago
Produção e Realização Barata Produções
Por motivos óbvios, deixo de apresentar
o SERVIÇO
da peça.
Fiquei extremamente emocionado com o
que vi e ouvi e me senti um privilegiado diante de tanto saber e poesia que os
dois imensos artistas nos passam. É uma pena que a temporada tenha sido tão
curta e que os estudantes de TEATRO não tenham tido a oportunidade
de assistir, em massa, a essa dupla aula magna, uma verdadeira “mastercass”
de TEATRO,
a qual, possivelmente, não poderão assistir mais.
E viva o Teatro! E viva a amizade! E viva AMIR
HADDAD e RENATO BORGHI!
Fotos de Gilberto Bartholo:
FOTOS: CRISTINA
GRANATO
E DANIELLA
NANNI
GALERIA
PARTICULAR
(Fotos Ana
Cláudia Matos.)
É preciso ir ao
TEATRO, ocupar todas as salas de espetáculo,
visto que a arte educa e constrói, sempre; e salva. Faz-se necessário resistir sempre
mais. Compartilhem esta crítica, para que, juntos, possamos divulgar o que há
de melhor no TEATRO BRASILEIRO!
Assisti duas vezes! Apaixonante ♥️
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