quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

“NA MINHA ÉPOCA”

ou

(MUITO ALÉM

DO QUE APARENTA.)


 



        Dando continuidade à minha política de só escrever sobre peças teatrais que me agradam, não importa se em maior ou menor grau de intensidade, mesmo que tenham saído de cartaz e não contem com nenhuma outra temporada garantida, passo a escrever sobre um espetáculo que me pegou “de jeito”, no último sábado (21). A expressão em destaque será explicada quase ao final da crítica.

Trata-se de “NA MINHA ÉPOCA”, texto de um jovem estudante de TEATRO, da UNIRIO, de apenas 21 anos, GUSTAVO KAZ, que também assina a sua direção. A temporada foi encerrada no dia seguinte ao que eu assisti à peça. Cumpre dizer que foi a segunda, graças ao grande sucesso que alcançou na primeira, no Teatro Glaucio Gill, quando, embora tivesse ouvido muitos comentários favoráveis, da parte de muita gente em cujas opiniões confio, não consegui achar uma data disponível, na agenda, para conferir isso. Como desejava muito ter assistido ao espetáculo, embora com muitas peças para ver, graças, felizmente, à grande quantidade de produções que surgiram simultaneamente, no início deste ano, consegui, “no apagar das luzes”, ir até o Teatro Candido Mendes e ver esta montagem, que muito me agradou.

 

 

 

     Não fui, confesso, esperando encontrar uma superprodução, entretanto essa condição é muito relativa, para que uma peça de TEATRO possa ser reconhecida como boa ou ruim. Às vezes, “muita purpurina” não é garantia do brilho de uma montagem, todavia se a encenação é feita sem grandes pretensões, porém com muito amor e cuidado, um espetáculo para toda a família, respeitando o público e com uma mensagem bastante positiva, a peça pode se tornar um sucesso, de público e de crítica, o que alguns chamam de “um azarão”. Essa é a receita aplicada em “NA MINHA ÉPOCA”.

      Não sei se algum colega de ofício se manifestou, nas suas colunas de jornal, revista ou nos seus próprios blogues, sobre esta produção. Não sei sequer se conseguiram assistir à peça, mas eu, fiel aos meus princípios, resolvi dedicar uma parte do meu tempo para tecer comentários sobre a montagem, porque ela o merece.

 

 

 

       Bastante “franciscana”, porém de inquestionável bom gosto, em todos os sentidos, dentro das parcas possibilidades de uma produção barata, para a qual muito se “ralou”, a fim de que a peça fosse “levantada”, trata-se de uma COMÉDIA e parece não ter outras pretensões, a não ser divertir o público, por meio dos diálogos entre um avô e seu neto. Mas ela vai muito além disso; muito além mesmo! “‘NA MINHA ÉPOCA’ é uma tarde da vida desses dois personagens.” – frase retirada do “release” que me chegou pelas mãos de GUSTAVO KAZ. Diverte, mas também faz pensar.

 

 



SINOPSE:

Mário Lucas (PEDRO MOTTA), um jovem de 17 anos, igual a tantos da sua idade, vai até o apartamento de Seu Antônio (SÁVIO MOLL), de 75, seu avô, o qual, por não atender ao celular, deixou a família preocupada.         

O que era pra ser uma “passadinha rápida, para ver se estava tudo bem”, acaba virando uma longa tarde de conversa e vivência do velho com o jovem.

Entre desentendimentos, conflitos e lições de ambas as partes, mas, também, demonstrações de afeto, por parte de ambos, os dois encontram os pontos comuns que transformam um avô e um neto em amigos que se amam verdadeiramente. 

 



    O que o autor do texto desejou, e, a meu juízo, conseguiu, era “acompanhar” o adolescente, naquela visita a seu avô, “entrar”, com ele, no lar de Seu Antônio e expor os conflitos entre os dois, muito mais marcados pela diferença de idades, pelo chamado “choque de gerações”, diferenças essas que, na realidade, “refletem grandes e simples questões da nossa sociedade, com diferentes visões sobre masculinidade, homofobia, as recentes mudanças no mundo, as antigas, a solidão e o amor”, por exemplo.

       É importante dizer que eles não se agridem e nenhum dos dois se considera dono da verdade. Pontos de vista divergentes são defendidos de forma natural e espontânea. Era de se esperar, a julgar pelo título do espetáculo, que o avô ficasse “batendo, insistentemente, naquela tecla” do “No meu tempo, as coisas eram diferentes e melhores”, mergulhado, profundamente, no saudosismo. É lógico que ele se mostra, como não poderia deixar de ser, um pouco desconfortável com as “modernidades” e com uma certa dificuldade de acompanhar o avanço da tecnologia e dos conceitos da sociedade moderna, mas não a ponto de deixar que isso inviabilize um diálogo com o neto. Este, de sua parte, procura compreender as dificuldades do avô e mostrar-lhe que é necessário acompanhar o ritmo de um novo tempo, porque “dói menos” e é inevitável. Tudo isso se dá por meio de diálogos leves e engraçados, porém recheados de seriedade e sabedoria, nos seus conteúdos.  

 

 

  

   Outro aspecto bastante interessante do texto é ele também encontrar espaço para falar sobre o “etarismo”, que nada mais é do que a discriminação por idade, algo abominável, que jamais deveria ser praticado, como, aliás, qualquer tipo de discriminação.

Graças aos avanços tecnológicos, com destaque para tudo o que está ligado à medicina, por exemplo, as pessoas, no Brasil e no mundo, de uma forma geral, estão vivendo mais, o que implica um aumento considerável da população idosa. Quando criança, eu ficava admirado, ao saber que alguém atingira a “notável” marca dos 50 anos de idade. Esses eram considerados “velhos”, quase sinônimos de “improdutivos”. Eu, entrando na adolescência, não conseguia me imaginar “velho” e, hoje, aos 73 anos, considero-me “na ativa”, participando, “a todo vapor”, da vida social e cultural ao meu redor. Quanto a esse aspecto, considero a peça de “utilidade pública”.

“Com humor e emoção, a peça é, sobretudo, a respeito dos pontos de vista das diferentes gerações”, que sempre existiram e existirão, mas podem se aproximar, através do bom e salutar diálogo, permitindo um convívio amigável entre representantes de diferentes gerações.

 

 

    Além de escrever o texto, GUSTAVO KAZ tomou para si a responsabilidade pela direção desta montagem e, por saber, exatamente, quais as mensagens que queria passar ao público, conduziu seu trabalho com muita proficiência e simplicidade, construindo uma encenação leve, divertida e dinâmica; muito agradável, enfim. Como é seu primeiro trabalho como diretor, achei bem acertada a sua decisão de ter uma profissional tarimbada, como REGIANA ANTONINI, para cuidar da supervisão artística.

O próprio GUSTAVO KAZ responde por um cenário bem simples, porém significativo: o apartamento de uma pessoa idosa, um homem, que mora sozinho e cuida de si, sem recorrer à ajuda de terceiros. Poucos móveis, uma velha eletrola, na qual avô e neto fazem tocar alguns discos de vinil, hábito do qual Seu Antônio, como eu, cultiva até hoje, não dando bola para as plataformas “modernosas” de música que há por aí. Objetos simples, de decoração; algumas plantas; um porta-retratos, com um certificado, alcançado por algo de que não me lembro, destacam-se naquele ambiente.  

      Nada de especial no que diz respeito aos figurinos. O jovem, despojado, como os seus iguais, e o avô também vestido com discrição e simplicidade. CONSTANÇA WHITAKER assina os dois trajes dos personagens.

      PEDER SALLES é quem criou o desenho de luz para a peça, sem se preocupar com “pirotecnias” desnecessárias.

 

 

 

      O visagismo, elemento de criação tão importante numa peça, aqui, está ligado ao nome de SID ANDRADE, que só teve de se preocupar em “envelhecer” o ator SÁVIO MOLL, que poderia ser pai de PEDRO, sem os recursos de maquiagem e da peruca, mas, como avô, sem esses recursos da caracterização, de certo, não convenceria.

     SÁVIO MOLL e PEDRO MOTTA já haviam trabalhado juntos, como pai e filho, na série “Detetives do Prédio Azul”, uma série da televisão brasileira, produzida pela Conspiração Filmes, exibida pelo canal de TV fechada GLOOB, mais conhecida como "D.P.A.", daí a intimidade e cumplicidade dos dois juntos. SÁVIO, com muita experiência de palco, um ator muito versátil; PEDRO, com pouca experiência nas tábuas, mas parecendo já um veterano do palco, bem à vontade. É excelente a "química que rola entre os dois, em cena"!

      Conhecido, pelo seu trabalho na TV, PEDRO MOTTA é uma boa influência, para crianças e adolescentes. É um ator que me parece estar iniciando uma carreira bem promissora.

 

 


FICHA TÉCNICA:

Texto: Gustavo Kaz

Direção: Gustavo Kaz

Assistência de Direção - Agnes Dyas

Supervisão Artística - Regiana Antonini

Direção Musical - Nigga Albuquerque

 

Elenco: Pedro Motta (Mário Lucas, o neto) e Sávio Mall (Seu Antônio, o avô)

 

Cenografia - Gustavo Kaz

Figurinos - Constança Whitaker

Iluminação - Peder Salles

Visagismo - Sid Andrade

Mídias Sociais - Thais Soares

Programação Visual - Pedro Romani

Fotos: Vinícius Nesi, Vítor Adnet e Produção

Direção de Produção - Carlos Motta

Produção - Carlos Motta, Gustavo Kaz e Pedro Motta

Assistente de Produção - Thais Soares

 


 


       Chegou o momento anunciado no início destes escritos, quando disse que a peça me “pegou de jeito”. Meu pai perdeu o seu, quando era criança, com menos de dez anos de idade. O de minha mãe faleceu um ano antes de ela se casar. Isso significa que não tive o prazer, o “sagrado direito” de conviver com meus dois avôs, o que sempre me deixou muito triste. Restou-me, quando adulto, e pai de dois filhos, testemunhar como meu pai foi um ótimo avô, para Flávia e Pablo. De alguma forma, aquilo me proporcionava um certo conforto. Nunca planejei como eu seria, na condição de avô e, quando isso aconteceu, pela primeira vez, descobri um mundo novo, experimentei um amor que nunca poderia imaginar que existisse. Parafraseando o “Poetinha”, os pais que me perdoem, mas se é boa a paternidade, ser avô é muito melhor. Tenho certeza de que sou um ótimo avô, para Tomás, Joaquim e Carolina.

     Sou bem mais velho que SÁVIO MOLL, entretanto, na minha poltrona, na primeira fila, “encolhi”, durante cerca de uma hora, a duração da peça, e me projetei no palco, na figura de Mário Lucas, para aproveitar as delícias de ter um “vô” fictício.

    CARLOS MOTTA, pai do PEDRO, um dos produtores do espetáculo e diretor de produção, me disse, antes do início da sessão, que muitos jovens, depois que veem a peça, saem dizendo que precisam visitar mais os avôs. E precisam mesmo! E disse mais: que alguns retornam, para rever a peça, levando seus avôs. Isso é lindo e me comoveu bastante.

 

 

 

     Por motivos mais que óbvios, não há sentido em publicar o SERVIÇO de um espetáculo que já saiu de cartaz, entretanto tenho esperança de que, pelo menos, mais uma temporada a peça irá “emplacar”. Caso isso venha a ocorrer – e espero que aconteça -, republico esta crítica, acompanhada do SERVIÇO de então.

 

 

 

FOTOS: VINÍCIUS NESI,

VITOR ADNET

e PRODUÇÃO.

 

 

GALERIA PARTICULAR

(FOTOS: JOÃO PEDRO BARTHOLO.):


Com Sávio Moll.


Com Sávio Moll.,


Com Gustavo Kaz.


 

 

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